sábado, 4 de maio de 2013

O Associativismo na Terra do Limonete - 21


Escrevemos, atrás, da polémica travada entre os directores do Grupo e o correspondente local, Anibal Cruz. Tal como as colectividades, também Anibal Cruz fez as pazes com os seus antigos consócios. Um dia, um tavaredense emigrado no Brasil, saudoso da nossa terra, procurou notícias. Foi aquele correspondente que lhe respondeu e vale a pena aqui deixar recolhidas as notas que publicou na imprensa figueirense, sobre as nossas associações e para informação daquele conterrâneo.     Perguntas-me como vae a Sociedade d’Instrucção, a collectividade que, com o teu esforço, ajudas-te a fundar. Dizer-te-ei que tem tido grandes progressos nos ultimos annos, principalmente no meio theatral, onde se evidenciaram alguns dos nossos prezados conterraneos, taes como o José Ribeiro (o filho mais velho do Gentil, conheces?) o Armeniosito, como lhe chamavas, e o nosso pandego Jayme Broeiro, que trabalharam pela Sociedade d’Instrucção com amor, sabendo assim erguel-a ao nivel das boas aggremiações educativas. Hoje não há tanto enthusiasmo, porque o Zé Ribeiro foi como sargento para as longinquas paragens africanas defender o nosso dominio colonial, e o Armenio Santos e outros socios foram tambem chamados ás fileiras militares.
         Olha que os nossos rapazes já representaram aqui o Amor de Perdição, aquella soberba peça de Camillo que tu, de quando em vez, me falavas e dizias não haver coisa melhor. E representaram-na muito correctamente, ensaiados por um distincto amador e meu amigo sr. Vicente Ferreira, da Figueira. N’esse dia foi uma enchente á cunha. Pessoas de muitas partes do concelho a Tavarede vieram para assistir ao espectaculo. E eu ao admirar as bellas scenas do drama, muita vez me lembrei de ti, que, apaixonado como és de tudo que seja de Camillo, devias gostar de vêr os nossos patricios a interpretar a sua melhor obra sem a anavalhar como se costuma dizer.
         Pois a Sociedade d’Instrucção tem já uma boa folha de serviços prestados ao nosso povo, ora instruindo-o pela escola, ora educando-o pelo palco. Mas ainda mais fez: - promovem na sua séde algumas conferencias interessantes, sendo conferente o dr. José Cruz que muito tem feito em prol do bem-estar do povo trabalhador. A sua palavra auctorisada combate os vicios prejudiciaes á saude e á bolsa do operario que, n’este meio pequeno, passa o tempo nas tabernas. Emfim já vês que a tua Sociedade vae progredindo consideravelmente.

         O Grupo Musical é uma aggremiação que está em principio, mas já com progressos rasoaveis. Fundou-se sem meios e installou a sua séde n’uma casa pequena, onde construiu um theatrito para as familias dos associados passarem as noites grandes. E foi vivendo com este auxilio e com qualquer donativo recebido quando a sua tuna fazia serviço em festas, e que hoje, dizem me, já vive mais desafogadamente. O sr. Manuel da Silva Jordão, dos Carritos, cidadão de fortuna, offereceu lhe para séde a casa que pertencia ao sr. João Aguas, na rua Direita, e a direcção do Grupo, n’um impulso de vontade, ao receber tão valiosa offerta, metteu obras na casa e construiu um elegante theatro. Mas avalias pelas coisas do teu tempo, o interesse com que os rapazes trabalhavam na realisação das obras. Trabalhavam de noite e aos domingos, os socios, que eram pedreiros, carpinteiros, pintores, etc., sem quererem um centavo sequer. O interesse d’elles era só que a sua sociedade progredisse e isso assim tem acontecido, pois que, o theatro acabado, ali teem effectuado récitas magnificas, representando se dramas de sensação, d’aquellas peças tragicas de que tu eras apaixonado. Os Medinas (principalmente o Zé), são as fabricas do riso d’esses espectaculos. Que fartadella tu apanhavas se o visses na comedia O Cabo de Ordens...
         O João da Simôa é o regente da tuna e, tem sido incansavel, os rapazes apresentam-se afinadinhos e executam módinhas de gosto. O Antonito Medina, o filho do Antonio que tu, por certo, conheces, é tambem muito activo e dedicado socio do Grupo Musical e vem a ser ainda outro tio... Ora aqui tens mais uma sociedade com futuro.

         Enquanto o Grupo Musical prosseguia activamente, com o teatro e com a música, a Sociedade de Instrução, pelos motivos que já referimos, pouca actividade tinha além da sua escola nocturna. Talvez por isso começassem a surgir os mexericos e, para esclarecer a situação, o correspondente local de um peródico figueirense fez publicar a seguinte notícia. Alguem terá dito que esta briosa colectividade morreu, isto por não se ter ouvido falar nela há muito tempo. Não, senhores. Ela vive e viverá sempre, continuando na sua obra altruista de há já 13 anos.
         Abriu na segunda-feira as portas da sua escola nóturna, não só para os associados e filhos destes, mas para todos que queiram arrancar-se ao analfabetismo. Os alunos são já em numero de 25, e espera-se que seja aumentado. Na abertura da escola fez-se uma preléção aos alunos, estando tambem presentes varios socios, a todos se dizendo o fim para que se fundou aquela Sociedade e o caminho que ela tem seguido e seguirá sempre, os deveres que a todos compete satisfazer para serem homens dignos, etc., etc.
         A Sociedade d’Instrução Tavaredense está a cumprir a sua obra em prole da educação do povo. Da sua escola teem saído elementos que agora sabem honrar o seu nome. Vendo isto, eis porque ela, querendo continuar a afirmar a sua boa vontade, auxiliando o progresso dos filhos desta terra, abriu agora as suas aulas       Os paes não teem razão de se queixar da falta de escolas.
         O que é preciso é que ali mandem os filhos todas as noites e saibam dar o valor ao sacrificio daqueles que estão ali para os educar e os querem vêr seguir bom caminho.
         A obra da Sociedade d’Instrução Tavaredense foi sempre baseada na educação do povo e no levantamento moral da sua terra. Mas para elevar o excelente nome da Sociedade é preciso que todos trabalhem, cumprindo os seus deveres, não desprezando, não pondo ao canto o que tanto trabalho tem levado a exaltar. A Sociedade d’Instrução Tavaredense tem dentro do seu gremio homens firmes. Há de viver sempre e cumprir o seu honrado programa. Levantar, pois, a Sociedade d’Instrução Tavaredense, é erguer o bom nome da nossa terra!

         Depois de fazer a habitual representação do Presépio, pelo Natal, em Janeiro de 1918 o Grupo Musical repôs em cena o Auto dos Reis Magos. E apesar das dificuldades, o grupo da Sociedade, por ocasião do seu 14º. aniversário, representou o emocionante drama social Honra e Dever e a chistosa comédia Um julgamento no Samouco.

         E depois de uma enorme série de representações com o drama Erro judicial, o Grupo Musical saíu fora do concelho, para ir dar um espectáculo com esta peça a Verride, terra natal dos seus fundadores, os irmãos Medina. Foi uma noite bem passada e há muito tempo que nas tábuas do nosso velho palco não são executadas peças com tanta correcção. O programa constou do citado drama e da comédia Os gagos.

         Em Junho de 1918,  o Associativismo tavaredense e a Sociedade de Instrução, em especial, sofreram um rude abalo com o falecimento de Gentil Ribeiro, pai do ensaiador, ausente em África, no cumprimento do serviço militar, regente da sua orquestra, autor do hino da colectividade e que havia sido um dos fundadores da Estudantina, chegando a ser regente da sua tuna.

         Mas em Maio de 1919 regressou a Tavarede, José Ribeiro. A colectividade, plena de regozijo, realizou uma festa de homenagem. Subiram á scena chistosas comedias, cujo desempenho nada deixou a desejar, salientando-se os excellentes amadores Jayme, Graça, Coelho, Emygdio, etc., e a simpatica amadora Helena de Figueiredo que, interpretando varios papeis com toda a correcção, mais uma vez deu provas abundantes das suas largas aptidões para a famosa Arte de Talma.

 
 








                                 José Ribeiro - militar
         Todas as sallas, lindamente ornadas de verdura e flôres naturaes, ostentavam varios retratos do homenageado, caprichosamente engalanados, com sêdas preciosissimas, rosas, cravos, etc., dispostos com fino gosto por mãos habeis de sympathicas meninas da nossa terra, o que dava ás mesmas sallas um aspecto bonito e encantador.
         Foi sem duvida uma festa muito sympathica, reinando sempre a mais franca e sincera alegria em todos os corações dos que a ella assistiram. Foi uma festa familiar. Foi uma festa que deu jus aos homenageandos, que tendo em consideração que José Ribeiro foi para a Sociedade d’Instrucção, antes de se auzentar para Africa, um dos melhores, senão o melhor elemento e um incansavel e desinteressado trabalhador, quizeram provar-lhe que com a festa em sua honra o seu inesquecivel reconhecimento e a sympathia que lhe dedicam.
         Não somos socios d’aquella collectividade, nem tampouco contribuimos com a nossa modesta cooperação, mas, com franqueza, gostámos immenso; a nossa satisfação é tão grande, que não podemos de forma alguma deixar de felicitar os seus organisadores, sendo extensivos até á pessoa do homenageado os protestos do nosso jubilo não só pelo seu feliz regresso, mas ainda por ser alvo d’uma manifestação que revestiu a maior imponencia e brilhantismo.

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