Claro que o Conselho de Coimbra, face a tal queixa, fez o que lhe competia: mandou ao rei os documentos para que providenciasse sobre os mesmos.
Gonçalo da Costa Coutinho, capitão mor de Montemor-o-Velho, escreveu a Vossa Majestade a carta inclusa em que refere que quer Fernão Gomes de Quadros, capitão mor de Buarcos, subordinado a D. Luiz de Almada, capitão mor de Coimbra, intrometer-se naquele distrito que Vossa Majestade lhe tem encarregado, tomando a jurisdição que não tem, e dando ordens aos capitães dele, um dos quais mando com esta a Vossa Majestade para cujo serviço e acervo dele parece que lhe devia logo em primeiro lugar dar conta do aviso que diz teve, sem ser pelo meu, que tomou para se fazer superintendente no distrito que Vossa Majestade só a ele tem encarregado, e mais quando a barra, e entrada que esta costa tem que é a Figueira da Foz fica nele, e a defensa de Buarcos, que por todas as partes fica cercado daquele distrito, se há-de fazer principalmente com a gente dele.
É o ânimo e desejo do dito Fernão Gomes em querer mandar naquele distrito em que é morador muito conhecido e muito antigo, e a esse respeito lhe disseram que tem tido muitas questões com os juízes de fora daquela vila, que pelo Duque governador dele faziam aqui o ofício de capitães mores e parece ainda as continuar, do que lhe pareceu dar conta a Vossa Majestade para que mande nisso o que mais for servido.
Uma notificação lhe mandava fazer para que não excedesse, nem alterasse, a forma das ordens de Vossa Majestade, e indo dois escrivães com a dita diligência lhes não quis dar lugar para a fazerem, como não fizeram que conste da pergunta, e suposto lhes pareceu que podia e devia proceder contra ele por ser morador naquele distrito, o que não quis fazer sem ordem de Vossa Majestade, pois o ocupa e lhe dá nome de capitão mor de Buarcos.
Vossa Majestade ordenará o que for servido, e sendo o de dar-lhe licença para poder vir a esta cidade onde tem negócios precisos, receberá mercê, porque no tempo presente, naquelas partes há já inverno e parece que segura e defende aquela costa, e que tomará a assistência dela, ou a outro qualquer ponto que Vossa Majestade lhe ordenar de seu serviço, em que sempre determina confirmar.
Ao Conselho parece que Vossa Majestade tem mandado declarar nos alvarás que mandou passar a estes capitães, uns a jurisdição de que hão-de usar, e que se lhe deve escrever de novo encarregando-lhes que cada um use da que se lhes deu sem se intrometer na de outro, e a Gonçalo da Costa se lhe deve conceder dois meses de licença que pede, para usar dela depois de entrado o mês de Novembro.
El-Rei não tardou a advertir o capitão mor da praça de Buarcos. Fernão Gomes de Quadros. Eu, El-Rei, vos envio muito saudar. Tenho entendido que vos intrometeis na jurisdição que toca ao capitão mor de Montemor o Velho, Gonçalo da Costa Coutinho, com intento de ampliardes a vossa e porque no alvará que vos mandei passar se declara a de que haveis de usar, e foi a dos termos dela não convém em nenhuma maneira estendê-la, pelos inconvenientes que disso podem resultar a meu serviço como parece. Digo-vos e adverti-vos que não excedeis em coisa alguma os limites da vossa jurisdição, porque o estranharei com rigor, antes tratai em ajudar-vos em tudo, com as ordens que vos tenho dado, procurando cumpri-las muito pontualmente, para que assim se faça e ainda melhor ao que se oferecer de o meu serviço. Escrita em Lisboa, a 13 de Dezembro de 1642
Tudo se resolveu a contento de todas as partes. O rei D. João IV ficou satisfeito com a acção desenvolvida por Fernão Quadros. E entendendo que era muito conveniente estar tudo prevenido contra os sempre possíveis ataques dos espanhóis, resolveu emitir novo alvará ao capitão mor: Eu, El-Rei, faço saber aos que este meu alvará virem, que considerando quanto importa a todos os lugares do meu Reino estejam fortificados e com toda a prevenção necessária para qualquer invasão e cometimento que o inimigo intente fazer e principalmente os que estão mais perto da raia e costa do mar, e que para isso assistam neles pessoas de qualidade, partes e experiência, que com todo o cuidado tratem de os fortificar e defender com o zelo e fidelidade que convém, e por convir que na vila de Buarcos haja pessoa que sirva de capitão mor e na de Fernão Gomes de Quadros, fidalgo da minha casa, que há muitos anos exercita o mesmo cargo, com notória satisfação por nele concorrer tudo o referido e esperando que o continuará com a mesma e conforme a confiança que faço de sua pessoa por todos estes respeitos, hei por bem e me praz de lhe fazer mercê, como por este alvará faço, do posto de capitão mor da dita vila de Buarcos e seu distrito, para que o sirva e exercite enquanto Eu o houver por bem e não mandar o contrário.
Com toda a jurisdição, poder e alçada que por razão dele lhe pertencer e gozará de todos os privilégios, honras, preeminências, isenções e franquezas que direitamente lhe tocarem e que gozam os mais capitães mores das cidades e vilas destes meus Reinos, e servirá debaixo do juramento e posse que tem tomado e com que serve o mesmo cargo, pelo que mando ao governador de armas da província da Beira, de cujo distrito é, o tenha e haja por tal capitão mor, e a todos os capitães e oficiais e soldados das companhias da dita vila e que nela e seu distrito assistirem, e mais pessoas a que tocar, façam o mesmo e lhe obedeçam, cumpram e guardem as ordens que ele lhes der, como devem e são obrigados.
E quero que este alvará se cumpra e guarde bem inteiramente como nele se contém, tenha força e vigor, posto que seus efeitos hajam de durar mais de um ano, sem embargo da ordenação em contrário. Manuel Pinheiro o fez em Lisboa, aos 4 dias do mês de Junho de 1646 e eu, António Pereira, o fiz escrever. El-Rei.
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