E
no dia 30 de Junho, o Grupo Musical também foi à Figueira representar, no
Parque Cine, a opereta Mãe Maria. Conforme o nosso jornal noticiou, tivemos no
domingo passado, no teatro Parque-Cine, a representação da opereta em 3 actos A
Mãe Maria, original de Raul Martins, com versos de Antonio Amargo e musica de
Herculano Rocha.
A
acção é rasoavel, bem conduzida, e, para não fugir à tradição das peças do
genero, é passada numa aldeia do verdejante Minho.
O
enrêdo não é de todo vasio de intuitos. Consegue conquistar desde o começo a
atenção do publico, mantendo-se o diálogo animado, natural e sugestivo,
especialmente quando entra a Mãe Maria e o Prior.
Nota-se,
contudo, uma sensivel falta de observação psicológica que embora não seja de
gravidade, é deveras lamentavel.
O
prior não desempenha ali o papel que aos padres está confiado na terra.
Anda
na pandega, bebe rasoavelmente, e chega a sustentar conversas pouco correctas
com uma caricata velhota, censurando-a ironicamente e troçando-a – o que não é,
positivamente, o dever dum padre. E a mais rudimentar logica não permite
aceitar como verosimil que o prior duma aldeia minhota ande a peitar este ou
aquele para tirar um desforço violento do boticario e do sacristão, por estes
terem tido o desplante de escreverem umas declarações d’amôr a uma sua irmã –
como absurdo é alguns dos freguezes deste prior tratarem-no por tu, com uma
familiaridade inadmissivel para quem conhece os usos e costumes das boas terras
d’Entre-Douro-Minho.
Em
suma: O sr. Raul Martins creando d’est’arte o prior da sua peça, deu-nos
claramente a perceber a falta total de informação religiosa que domina o seu,
aliás, inteligente espirito.
A
missão do sacerdote não comporta, certamente, dentro dos fins da paz e amor que
a orientam – o perfil moral do seu inverosimil prior que... apenas se sabe que
o é por envergar em scena as vestes talares.
Apesar
disso é “A Mãe Maria” uma peça interessante, devendo, contudo, dizer que
esperavamos melhor, mesmo muito melhor – dada a impressão que nos deixou a
representação da opereta dos mesmos auctores “A noite de Santo António” que tem
sobre esta evidente superioridade de urdidura e de tecnica.
Não esperavamos, evidentemente, uma
obra-prima, mas não previamos que, sobretudo, os versos de “A Mãe Maria”, -
fossem duma tão manifesta inferioridade em relação aos da “Noite de Santo
António”. Quasi que não parecem do mesmo auctor, poeta brilhante e de destra
cultura.
Foto de Mãe Maria
Quanto
ao desempenho, destacamos em primeiro logar, Violinda Medina, no papel de Mãe
Maria que desempenhou com um á-vontade e uma perfeita correcção, que vieram
confirmar os seus anteriores triunfos scenicos. A sua voz é como que um veio de
agua cristalina, murmurando suavemente por entre fraguedos, modulando o canto
com um raro e precioso sentimento que muitas artistas profissionais,
certamente, invejariam. É, sem duvida, uma muito distincta amadora que honra,
sobremaneira, Tavarede.
Adriano
Silva no Bento Boticário satisfez-nos plenamente, como amador seguro, dizendo
com graça e naturalidade. Egualmente Manuel Nogueira no Antonio Sacristão foi
um comico impagavel, conquistando a simpatia do publico pela vida invulgar que
imprimiu ao papel.
É
sem a menor duvida um dos melhores elementos do seu grupo scenico.
Raul
Martins, pela forma como se houve no Morgado, bastaria para, com Violinda
Medina, salvarem a peça, se ela não tivesse outros méritos.
Foi
o correcto galan de sempre, vincando com certeza e consciencia o seu logar.
Manuel
Cordeiro, bem. É um novo nas lides de Talma, mas com marcada propensão para a
scena e dotes muito apreciaveis.
De
Jorge Medina, sómente diremos que “filho de peixe sabe nadar”... Recordámos com
saudade seu pae, o malogrado José Medina, cuja boa tradição ele já sabe honrar,
registando nós com aprazimento os seus constantes progressos.
Clarisse
Cordeiro apesar das suas reaes aptidões para o teatro não poude brilhar no
papel de Berta como poderia, pois a sua voz não lhe permitiu dar o relevo
preciso. Tem, porem, uma boa dicção e pisa o palco com natural despreocupação.
Os
restantes, João Nogueira no Ricardo; Antonio Medina no Mordomo e Helena Gomes
na D. Ana, encarnaram bem os seus papeis, não desmanchando o conjuncto.
Os
córos geralmente bons; homogeneos e com forte sonoridade tendo, por vezes,
deslises sensiveis mas facilmente remediaveis para o futuro.
A
musica, ligeira, viva e alegre, dispondo bem o publico. Os scenarios agradaram.
O
que, porventura, não agradará é esta nossa critica aos distinctos amadores de
Tavarede... Notámos deficiencias, aliás bem naturaes – mas se acharem o nosso
juizo parcial ou incompetente – o melhor é recorrerem a qualquer critico amigo
que lhes teça o panegirico na Pagina Teatral de “O Século”. Já agora! Visto que
entrou em moda....
Um breve comentário nosso. A crítica
acima foi publicada no mesmo jornal que publicou as críticas ‘venenosas’ contra
a Sociedade. Por outro lado, esta opereta só foi representada uma única vez e
na Figueira. Encontrámos algures a informação de que o palco da sede do Grupo
não tinha condições para a montagem da mesma. Não deixa de causar estranheza o
facto de se ensaiar uma opereta, cuja montagem não deveria ser barata, para dar
uma única representação! Mas, assim aconteceu.
A imprensa figueirense, e curiosamente
não eram unicamente os correspondentes locais, tomou partido pelas duas
associações locais. Na ‘Voz da Justiça’ a Sociedade de Instrução, sempre no
seguimento da linha anteriormente tomada, era defendida, com unhas e dentes das bicadas que lhe
davam, tanto O Figueirense como o Jornal da Figueira, os quais, além
destes ataques, louvavam generosamente o Grupo Musical. Mas não o faziam
desinteressadamente, como veremos.
A tuna do Grupo, que tão apreciada e
requisitada havia sido, desorganizou-se, certamente em consequência dos graves
problemas existentes na sua colectividade. Mas, tendo sido requerida a sua
participação para abrilhantar umas festas na Martingança, conseguiu-se a sua
reorganização, sob a direcção e regência do tavaredense José Francisco da Silva,
o qual teve de recorrer à participação de diversos músicos afectos à Sociedade.
A deslocação teve lugar nos primeiros dias de Outubro de 1929, embora com o
nome de Tuna de Tavarede. Foi motivo de uma pequena polémica, pois enquanto uns
jornais anunciavam a deslocação do Grupo, outros assumiam posição contrária.
Foi o referido regente que veio a público, para afirmar que, embora fossem
utilizados os bonés, levado o estandarte e tocado o hino do Grupo, todos os
componentes tinham concordado em formar uma tuna da terra, apartidária das
associações. Recordamos que foi no regresso desta deslocação, que os
excursionistas passaram pelo Mosteiro da Batalha, onde deixaram uma placa
evocativa da sua passagem. Ainda há relativamente pouco tempo, esta placa
estava colocada numa parede junto ao sepulcro do ‘soldado desconhecido’.
O teatro continuava activo. A
Sociedade, após uma série de espectáculos com A cigarra e a formiga, fez a reposição de O sonho do cavador. Mas já foi diferente da primeira versão. A
censura começara a sua nefasta acção e grande parte dos números originais foram
censurados. A peça, com os quadros riscados com o célebre lápis azul,
encontra-se no antigo escritório de Mestre José Ribeiro. Embora mantendo o
enredo inicial, novos números foram escritos e musicados para substituição dos
eliminados. O êxito da peça, porém, manteve-se.
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