sexta-feira, 28 de outubro de 2011

UMA VISITA A TAVAREDE

AINDA A EXCURSÃO À FIGUEIRA DA FOZ

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Duas ou três voltas pela cidade… A música deixou de se ouvir, os foguetes calaram-se também… Numa torre distante, soaram, pesadas e lúgubres, as doze badaladas do meio-dia… Os estômagos daqueles quatro excursionistas (Medina, Gonçalves, Santa Bárbara e eu) deram horas, não sei bem se por espírito de imitação, se por necessidade…


Optemos pela última hipótese… O Santa Bárbara, sonhador, imaginava já um alto castelo de batatas cozidas, cercado por fortíssima muralha… e resistente barbacã de postas de bacalhau, vibrante e luzidio… E ele, qual conquistador da Idade Média, avançando, avançando sempre, eis que consegue tomar aquela fortaluza, embora sem prévia autorização do alcaide… Mas, tudo aquilo é um sonho…


Então, nunca largando o seu preciosíssimo sobretudo, resolve distribuir mais alguns prospectos lindíssimos do rico ramisco da Adega Regional, a estas ou àquelas espanholas que por ali cirandeiam… De súbito Medina chama um táxi e empurra-nos para dentro do auto… Alegram-se os semblantes e, para entreter, o Gonçalves admira a paisagem que, certamente, não consegue ver…


Somios chegados a Tavarede… Medina apresenta-nos sua mãi… Simpática velhota que nos recebe alegremente, pois estão ali, como ela diz, os amigos de seu filho… Percorremos as dependências da casa… Estamos encantados… Medina, cicerone atencioso, vai-nos indicando os retratos que se acham espalhados pelas paredes… São todos da família… Prestamos mais atenção às fotos do “velho” director quando era novo… O pai Medina aparece-nos de surpresa… “É o meu pai”, diz o Medina, cada vez mais satisfeito… Acolhimento cativante que nos faz despertar a vontade de jamais sairmos de Tavarede… Depois os manos… José, Pedro, Ricardo e Violinda… Todos nos recebem com agrado… Qualquer coisa nos atrai para a casa de jantar… É o almoço, o desejado almoço, que nos parece estar magnetizado… Qualquer coisa há, também, que nos provoca comentários… É a boroa, a característica boroa, que parece estar acanhada ao lado do pão de trigo… Supõe talvez que a desprezamos… Isso sim!... É ela que toma a presidência… - e nos convida, mais depressa, a baixar à adega…

À tardinha, um passeio pelos arredores… Vamos a Brenha, povoação encantadora… - São rapazes dos jornais de Lisboa e do meu, como diz o Medina… Recebem-nos às mil maravilhas, longe de nos tomarem por simples distribuidores de jornais, como se podia deduzir da afirmação feita pelo natural daquelas lindas regiões…


Que interessante!... Rapazes e raparigas, em volta duns coretos onde duas boas tunas tocavam, impecavelmente, canções em voga, fazem ouvir a sua cristalina voz:


Não deves trocar Maria,
As sedas por essa chita…


- Não há tempo a perder!... – exclama o Medina… Com muita pena, subimos para o carro que nos há-de levar a Quiaios e à Serra da Boa Viagem… Vamos visitar a Mata dos Cedros, a Vela, a Bandeira… Enfim, estávamos dispostos a trocar todos os passeios por mais alguns momentos de permanência naqueles sítios… Mas, não podia ser… E lá fomos… Chegam ainda até nós os acordes dos violinos e as vozes das raparigas:


Pois a flor quando é modesta,
Não deixa de ser bonita…


Alberto Cosme. (Jornal de Sintra - 22-9-1935)

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