As
primeiras associações - 3
Estes apontamentos ficariam incompletos se aqui não fossem
incluidas a resposta destes jornais. A ‘Gazeta’ replicou desta forma: Acabamos
de ler uma correspondencia d’esta povoação para o “Povo da Figueira”, datada de
24 do corrente, que nos surpreendeu... por sabermos que n’esta pequena terra ha
um rival do tão festejado Caracoles da Folha do Povo, tal é o chiste da graça
avaporada com que o tal correspondente critica o espectaculo dos Reis no
theatro Bijou Feminino.
Com certeza certa que os desempenhantes eram mal educados...
para o theatro; mas isso não é razão para critica, porque tambem o sr.
correspondente está mal educado... para escrevinhador de correspondencias, em
que a nossa lingua é torpemente assassinada, sem haver uma alma caridosa que a
livre de tal verdugo, mandando-o para a Cova da Serpe, onde, com o seu fino
espirito, póde representar algum papel de grande effeito, na peça de sensação -
Judas... no deserto; ou então s’achar batatas para os Carritos.
Em todo o caso, não me lembra que nenhum desempenhante
arrincase coisa alguma, pois que a peça era desempenhada por pessoas do sexo
feminino, que, se disseram mortiféros, conseguiram tambem justos applausos, mas
não avaporados (que não sabemos o que seja, a não ser alguma subida de vapores
que fazem ver as coisas d’este mundo em duplicado ou reduplicado, conforme a
quantidade).
Assim o sr. Pum (que pseudonymo tão avaporado!) com a sua
intelligencia, não contente em criticar, o que certamente não viu (temos a
certeza d’isso) e o que não percebe, não satisfeito em escavacar a pobre
grammatica, que não tem culpa alguma da pouca intelligencia de qualquer quidem,
que se arvora em critico... de si mesmo, ainda (naturalmente por estar
avaporado) confunda Lucifér ou Luciféro, com o executor das ordens de Herodes,
que, em vez de mandar degollar os innocentes, devia mandar cortar o pescoço a
certos criticos... que nós conhecemos. Diz elle (correspondente) que viu (pelo
telephone?) um desempenhante (que por sinal não estava avaporado) arrincar os
mais avaporados (?) applausos que reduplicaram (por causa da avaporação) quando
elle, aliás ella, arrincou um dos innocentes dos braços do capitão da guarda de
Herodes a quem o sr. Pum, certamente por ignorancia, chama Lucifer! Oh! homem
de Deus, olhasse-lhe para a cabeça e para os pés... a ver se assim o não
confundia!
Ora... abobora, sr. Pum.; trate d’outro officio por que esse
não lhe serve; metta-se com a sua vida e deixe divertir os outros, muito embora
digam calinadas; olhe para si antes de criticar os outros; ponha a mão na
consciência (caso não esteja avaporada) e... durma, que isso é somno, e olhe
que de pobres de espirito está cheio o reino dos ceus... e tambem Tavarede.
Fique-se em paz.
E veio a tréplica: Por mero
acaso, e não porque esperasse emproadas replicas à minha inocente carta de 24
do mês último, é que vi, depois de decorridos alguns dias, referências
abespinhadas de um quidam que entende na sua, e lá isso entende muito bem, não
merecer sequer uma simples designação, embora ela seja tão estapafúrdia como a
sua figura picaresca do pingurrio que veio de reforço… ao mestre.
De
resto, cá na minha também opino porque o interessantíssimo anónimo, heróico
defensor das prendas e mais partes que concorrem na pessoa das desempenhantes
do Bijou, se alaparde o mais possível por detrás do mais bem vedado tapume.
Quem me diz a mim que não poderia eu tomar a nuvem por Juno e o mestre António
pelo mestre João? Nada mais fácil do que querer filar um farçola emproado e
pimpão e, em vez disso, deitar os gatazios a um pândego que conheça a gramática…
parda (?) tão bem como o Mandarim The-chin-pó sabia de cor as máximas do
moralista Confúcio. Isso nunca! O mais prudente é uma pessoa não se arriscar da
zona da certeza e não avaporar a imaginação pelas regiões mortiféras onde
brilham sideralmente as pedras finas do decantado Bijou, parte das quais têm
sido lavradas pela mão (?) do primeiro mestre – o que tem pouca gramática – e
não pela do segundo, - que tem a gramática toda! – e que afinal, bem se vê,
segundo afirmam testemunhas oculares e guturais, costuma escrever de um borco e
com rara perfeição.
Eu,
se neste momento, ou em qualquer outro, me achasse com tendências para
responder à carta-dueto do ninguém, ver-me-ia, declaro-o com toda a
franquelidade, seriamente atrapalhado, porque por mais que se faça suar o
topete, por mais agudeza que um cérebro possua, é verdadeiramente impossível
ajudar o que haja de fino espírito no remelgueiro mistifório do púfio. Chega
até uma pessoa a pensar que quem aponta à execração pública os crimes (isso é o
que nós havemos de ver?) gramáticos dos outros, não deve declinar a obrigação
de perpetrar correspondências com algum bom senso.
Terminando
por agora: Tavarede não está tão cheia de pobres de espírito que não comporte
de vez em quando mais alguns, os quais em tardes amenas costumam, para
refrescar a amizade, ir libar do divino licor… arranjando assim forças para bem
desempenhar o papel de Cireneu nas estrambólicas epístolas fabricadas nesta
aldeia e exportadas para a Gazeta.
E
adeusinho até breve. (Pum)
E voltamos à Estudantina
para contar o baile ali realizado pela Páscoa de 1896. “Com a curiosidade aguçada pelo que se nos constava dos
atractivos da risonha povoação de Tavarede, terra para nós estranha, lá fomos
domingo de Páscoa à noite, incitados pela espectativa de um baile que aí se
dava no velho solar dos condes de Tavarede, onde está instalada uma sociedade
recreativa, graças à persistente boa vontade de alguns filhos do povo. Nós, que
achamos encantos na arte de Terpsicore, envidámos diligências para conseguir o
gozo daquela festa íntima, pois o baile era oferecido às famílias dos
associados, e por isso intransmissíveis os bilhetes de admissão. Mas, enfim,
devido à amabilidade do sr. José Maria dos Santos, daqui, e membro da mesma
sociedade, podemos ter ingresso no recinto onde nos aguardavam umas horas de
agradável passatempo. A sala de baile
achava-se caprichosamente ornamentada com flores, louro e buxo, vendo-se ao
fundo uma espécie de estrado, onde uma orquestra composta da Tuna local,
habilmente regida pelo sr. Gentil Ribeiro, espalhava umas notas harmónicas e
alegres naquele espaço em que a mocidade doidejava no voltear das danças.
Podia-se estar ali horas e horas esquecidas, enlevado. Sucediam–se as danças populares, as valsas, polcas… o
redemoinhar contínuo daquela mocidade folgazã e cheia de vida. Entre as músicas executadas, uma houve que
agradavelmente nos surpreendeu, e que nos disseram ser original do sr. Gentil
Ribeiro. Terminou o baile cerca
da meia noite, sem que houvesse o mínimo dissabor entre tanta gente que ali
estava, pela vez primeira, talvez, em um baile regular. Como nós,
provavelmente, outros vieram satisfeitos acalentando o desejo de poderem gozar outras noites iguais”.
Em Abril daquele ano, encontrámos a
notícia de que a Tuna Bijou Tavaredense, sob a regência de J. Teixeira
Ferreira, ilustrado professor na Figueira da Foz, deu um concerto, na sua sede,
dizendo a nota que “… apesar do pouco
tempo que ainda têm de estudo, os executantes já tocam com alguma correcção…”.
Podemos acrescentar que alguns elementos desta tuna também tocavam no célebre
‘Rancho do Vapor’, da Figueira. E referimos que ainda em 1896, as duas tunas
tavaredenses foram tocar às festas da Senhora do Desterro, em Montemor-o-Velho.
Não vamos, contudo, referir todas as deslocações destas tunas às diversas
festas populares que todos os anos se realizavam por todo o concelho e lugares
limítrofes, mas somente as notícias que nos parecerem mais interessantes.
Um dos melhores amadores dramáticos daquela época, foi
José Medina q ue, além da
Estudantina, era frequentemente convidado para participar em espectáculos
realizados por diversas colectividades da Figueira, como, por exemplo, a
‘Sociedade Recreio Operário’, onde participou diversas vezes.
José Medina
A Estudantina festejava diversas datas
com a realização de bailes, abrilhantados pela sua orquestra, composta por
elementos da tuna. Eis mais um recorte noticiando mais um baile da Páscoa, no
ano de 1897.
Nem só nas grandes cidades a alma popular se expande no seu regozijo
íntimo. Nas pequenas povoações, como Tavarede, o mesmo facto se dá. O dia 18 do corrente passou ali como um dia de
festa. A Estudantina Tavaredense deu aos seus associados um dia de gozo,
proporcionando-lhes, no Paço dos Condes de Tavarede, um baile campesino. Muitas
raparigas e rapazes da povoação concorreram a ele, animadas de fraternal
convívio, e essa noite passou-se vaporosamente como um sonho de amor. A dança,
animada por dezenas de esbeltas raparigas, prolongou-se até às 11 horas da
noite, ficando todos com saudade das horas que ali passaram. Um delicado copo de
água, mandado distribuir pela direcção da Tuna, veio pôr termo àquela noite de
regozijo, como poucas se encontram na vida. À
Estudantina Tavaredense, que nos proporcionou umas horas de tanto prazer, aqui
deixamos inscritos os protestos de gratidão de que lhe ficamos devedores”.
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