Um
outro acontecimento digno de ser recordado nestas histórias, aconteceu no dia
22 de Julho de 1931. O grupo cénico da Sociedade de Instrução foi ao Parque
Cine colaborar na festa anual do Jardim Escola figueirense. ... E seguiu-se a reprentação da fantasia A Cigarra e a
Formiga, pelo modesto e simpático grupo de amadores da Sociedade de Instrução
Tavaredense. Todos foram calorosamente aplaudidos, como era de justiça. No 1º
acto houve a nota de arte culminante daquela noite de festa: Ilda Stichini
disse primorosamente, com o seu formoso talento, e as suas poderosas faculdades
de interpretação, A Fantasia e O Riso, belos versos dum artista de pintura que
é também um distinto poeta – Alberto de Lacerda. Quando Ilda Stichini apareceu
em cena, a assistência irrompeu numa extraordinária, prolongada e calorosa
ovação, que bem lhe deve ter mostrado como é querida do público figueirense. Os
versos da Fantasia disse-os a Artista ilustre com a vibração da sua delicada
sensibilidade e a magia da sua voz. A assistência aplaudiu demoradamente, com
sincero entusiasmo. Mas o número do Riso, que Alberto de Lacerda escrevera
expressamente para Ilda Stichini, deixou verdadeiramente encantados os que o
ouviram e se manifestaram com uma das mais vibrantes e expontâneas e demoradas
ovações que naquele teatro se têm ouvido. Parecia que as palmas não acabavam
mais, num desejo irreprimível de ouvir de novo a música arrebatadora daquela
voz.
Com a mudança da sede, o Grupo Musical
viu-se sem condições para continuar com o teatro e a sua tuna desorganizou-se.
Foi numa reunião em Agosto, que os sócios da colectividade resolveram
regorganizar a tuna, nomeando para seu regente José Francizco da Silva,
conseguindo de imediato a inscrição de 35 elementos e já actuando nas habituais
festas de verão, tocando num pavilhão montado no Largo do Paço.
Em Agosto de 1931, encontrámos a
seguinte nota, publicada num jornal figueirense: Como êste jornal já noticiou, foi grande a concorrência aos festejos
populares aqui realizados. No Largo do Paço tocou a Tuna de Tavarede e no Largo
do Forno a Tuna de Caceira.
A nota mais curiosa dos festejos deu-a o padre da freguesia,
que deve ter ficado definitivamente elucidado àcêrca do prestígio de que goza
nesta localidade. Realizavam-se na mesma ocasião festas religiosas que, como é
hábito desta população ordeira, ninguém perturbou. O padre, talvez porque não
conhecia bem os tavaredenses, cometeu a leviandade de afirmar que não consentia
que em Tavarede se realizassem os costumados ranchos na véspera da cerimónia
religiosa. Os rapazes da tuna de Caceira submeteram-se, e anunciaram as suas
danças só para domingo à tarde; em Tavarede, porém, ninguém quis saber do que
dissera o padre, não ligando a menor importância às suas fanfarronadas e
ameaças de excomunhão e parecidas coisas, e a tuna de Tavarede organizou o seu
festival para sábado e domingo. O padre empregou todos os seus esforços para
evitar isso, pedindo e ameaçando, mas nada conseguiu. De modo que... não teve
outro remédio senão dizer aos rapazes de Caceira que fizessem também festival
no sábado. Isto foi motivo de gargalhada, porque ninguém pôde perceber como é
que as leis da Igreja não permitiam que a tuna de Caceira tocasse na véspera da
festa religiosa, e, depois de se conhecer a deliberação da tuna de Tavarede,
que se não importou para nada com as absurdas e abusivas determinações do
padre, já o permitiam.
Se o padre tratasse apenas do que vai pela igreja, sem
querer emiscuir-se em assuntos a que não o chamaram, não se sujeitava a estes
desastres.
Continuavam, desta forma, as interferências da Igreja nas tradições
da aldeia e, por consequência, do associativismo local. E, nesse mesmo jornal,
também foi publicada esta nota: Mais uma manobra do padre da freguesia,
ajudado pelas duas ou três pessoas da terra que o acompanham, que falhou
estrondosamente. Encaminhavam-se as coisas para que o padre, com 20 e tantos
contos que para isso lhe entregavam – a Igreja é rica e dinheiro foi coisa que
nunca faltou aos jesuítas – comprasse o edifício da sede do Grupo Musical,
continuando êste ali a servir de instrumento nas mãos do clericalismo.
Descoberta a manobra, a assembleia geral do Grupo que se não deixou conduzir
como imbecilmente supunham que era fácil conseguir, repeliu altivamente a
manobra e abandonou a casa, mantendo a sua independência e colocando a
descoberto e no seu lugar o padre e os sacristães. A casa foi efectivamente
comprada, e nele gastará o padre uns bons 30 contos – o que não é nada para
quem de tanto dispõe – mas já não é possível qualquer equívoco porque tôda a
gente sabe para que aquilo vem a ser.
Analisando todos estes acontecimentos,
uma interrogação nos surge: O Grupo Musical havia sido forçado a mudar de sede
e, tendo o direito de opção, o edifício foi vendido à Diocese de Coimbra,
aparentemente sem qualquer lucro, e os sócios da colecrtividade aceitaram
passivamente a transacção? O que se pode concluir de tudo isto é que, como em
breve veremos, o padre Cruz Dinis conseguiu o que desejava.
Sem comentários:
Enviar um comentário