Para as V Jornadas do Teatro Amador da
Figueira, o grupo cénico tavaredense levou à cena mais uma comédia de Molière, O tartufo. Na penúltima sessão, no dia 27 de Abril, das V Jornadas de Teatro
Amador da Figueira da Foz foi a vez do Grupo Cénico da Sociedade de Instrução
Tavaredense apresentar o seu espectáculo, com a peça “Tartufo” de Molière. A
partir deste facto há uma série de considerações importantes, na nossa opinião
é evidente, relacionadas com a organização das Jornadas, com o grupo de
Tavarede e com o próprio texto dramático que são pertinentes. Porém, o tempo e
o espaço não nos permitem fazê-las todas de imediato, agora ficaremos pelas
mais adequadas.
Molière
é um autor clássico e “Tartufo” uma das suas peças mais conhecidas e
representadas, pelo que afirmar que nos últimos anos já assistimos a várias
montagens deste texto dramático não será motivo de grande admiração. O que
talvez alguns não saibam é que a versão “oficial”, que chegou até nós como peça
acabada de Molière, não é única, pois há mais versões feitas pelo próprio
autor. Quando se pega num clássico para montar um espectáculo, há dois caminhos
que se podem seguir: ou se considera o texto intocável, embora sem esquecer os
meios técnicos de que se pode dispor hoje na produção teatral, ou propõe-se uma
releitura do mesmo, capaz de explicitar melhor os seus valores no mundo actual.
O grupo
cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense optou por ser “fiel à obra”, o que
não surpreende por estar de acordo com os seus trabalhos anteriores e as ideias
do se encenador. Apesar de fazer apenas dois intervalos, entre o 2 e 3º actos e
o 4º e 5º actos, o pano de boca desce sempre no final de todos os actos e não
podem ser designados por intervalo só porque os espectadores não saiem da sala.
Pequeno pormenor sem interesse pensarão alguns, mas que demonstra bem que nem
todas as novas técnicas de produção teatral foram seguidas neste espectáculo.
No final desta montagem de Mestre José Ribeiro tivemos a sensação de que
Tartufo não tinha mostrado a sua verdadeira face dos dias de hoje, apesar de
todas as qualidades que o espectáculo encerra.
O
bom trabalho da maioria dos actores, apesar da sua representação convencional
não impede a impressão de termos estado na sala de um museu onde às obras
expostas não são fornecidas as melhores condições para serem admiradas na sua
plenitude. Porém, tudo isto não nos impede de afirmar que este é até agora o
melhor espectáculo destas V Jornadas de Teatro Amador da Figueira da Foz, e que
Ana Paula Fadigas confirma as suas grandes potencialidades como actriz.
Durante as comemorações do 70º
aniversário do Grupo, os sócios tomaram conhecimento de que se iniciariam
brevemente as obras para a construção da tão ambicionada sede. Foi uma festa simples, mas que marcou uma
efeméride importante associada com o arranque da nova sede, estando
praticamente pronto o projecto e uma pequena maquete que dá uma ideia do que
vai ser esta extraordinária obra.
Também o Diário de Coimbra se associou à
iniciativa, publicando uma nota, de que recortamos esta passagem. Não foi fácil, porém, a vida da
colectividade. O seu ecletismo e o carácter restrito do seu substrato humano,
apesar de toda a carolice, não conseguiram a implantação que se desejava. ...E
para tanto terá contribuido a inexistência de uma sede própria e condigna, pois
gorada que foi a hipótese de instalação na antiga Loja do Povo, o Grupo Musical
e de Instrução Tavaredense passou a albergar-se, desde 1936 (?), no cada vez
mais degradado palácio dos condes de Tavarede. Estas vicissitudes podem, porém,
a curtyo prazo dissipar-se caso a agremiação consiga levar por diante os seus
intentos. Intentos que não são já meros projectos pois, em grupos de audácia,
com suor e sacrifícios, os Associados da colectividade levantam o que é o seu
desiderato maior: a sede. É uma fase importante da vida do Grupo Musical e de
Instrução Tavaredense, nós (e certamente todos os que não têm da cultura uma
noção abstracta) fazemos votos para que a sua conduta futura seja de facto mais
um bastião numa terra que sabe reconhecer (e respeitar) os valores elementares
e nobres da convivência humana.
Estava
em curso mais uma campanha para angariação de fundos. Foi desenvolvido enorme
trabalho e a imprensa também colaborou activamente. O Grupo Musical e Instrução Tavaredense é uma Associação de Cultura e
Recreio que há setenta anos tem a sua existência em Tavarede.
Mas...,
o que é o GMIT? – O Grupo Musical e Instrução Tavaredense, à semelhança do que
prolifera por todo o concelho da Figueira da Foz, nasceu da boa vontade de uns
tantos, e a sua actividade tem sido continuada pela carolice de bons
tavaredenses. – Foi famosa a sua secção dramática, onde se iniciaram figuras
que alcançaram lugar cimeiro na arte de bem representar. – Estamos a
lembrar-nos de Manuel Nogueira (já falecido), António Jorge da Silva, Violinda
Medina e Silva, - (autênticos expoentes máximos do teatro amador em Portugal)
-, e tantos outros que foram figuras marcantes da nossa vida artística. – Foi
ainda famosa a Tuna do Grupo Musical, assim como a sua Escola de Música
dirigida por aquele outro homem que só a sua humildade o não projectou mais
além, e que se chama José Nunes Medina.
De
momentos de glória, o Grupo Musical veio a conhecer momentos de extrema
decadência. – A razão esteve menos nos homens do que nas dificuldades que
progressivamente foram encontrando. – A sua última sede foi, (é?), no velho
palácio dos Condes de Tavarede, presentemente em completa ruína. – Por falta de
sede a actividade do GMIT ficou completamente paralizada, mas o entusiasmo dos
homens nunca foi vencido, e eis que neste momento se encontram a construir a
sua nova sede.
Mar Alto
foi até lá e conversou com elementos da Direcção e da Comissão de Obras, e pôde
verificar o entusiasmo com que aquele punhado de grupistas se entregam à tarefa
de erguer as paredes da sua Associação. – Ficámos a saber que a obra está
orçada em cinco mil contos, mas que, com a ajuda de mão de obra dos seus
associados, conseguirão erguer as novas instalações com um pouco mais de dois
mil contos, quantia que necessariamente não possuem mas que esperam conseguir
com a ajuda de todos. – Até este momento gastaram em materiais a quantia de
quase duzentos e cinquenta contos, e as paredes estão a atingir a placa do 1º.
piso.
É
inegável o reconhecimento daquela boa gente pelo actual Presidente da Câmara
Municipal, Dr. Joaquim de Sousa, ao apoio e estímulo que lhes tem dado. Pela
Câmara foi oferecido o terreno bem situado na urbanização da Quinta do Paço, e
o projecto da obra foi cedido pelo GAT. – Esperam agora, os elementos da
direcção do GMIT e da comissão de obras, a ajuda monetária de toda a população
para levar a bom termo a grandiosa obra que se propõem levar a cabo. – Homens,
e mulheres, naturalmente, que assumiram esta responsabilidade, merecem todo o
apoio da sociedade. Em conversa com aquela gente descobrimos já um outro sonho
que lhes vai na alma: - Quando tiverem a sede construída, dispõem-se a lançar
mão de outro gigantesco empreendimento que é a construção de um pavilhão que
ficaria de portas abertas a toda a população, nomeadamente à juventude.
Leitor amigo, aqueles homens que ao
sábado e domingo ocupam o seu tempo na edificação de uma coisa bela, bem
merecem que os ajudem. – Nós vamos ajudar!
No ano de 1982 comemorou-se o primeiro
centenário da elevação da Figueira da Foz a cidade. A Sociedade de Instrução e
o seu teatro participaram nas festividades. Mas, antes de nos debruçarmos sobre
esta participação, vamos copiar mais uma nota publicada, bastante elogiosa para
a nossa terra. Leitor amigo: merece a
pena saber o que se passa e se faz numa pequena aldeia próximo da Figueira da
Foz e que dá lições às grandes cidades – TAVAREDE.
Que belo exemplo de sacrifício. Paixão
e dedicação! Quanto daria eu para que a estrela da minha simpatia me iluminasse
o espírito, dando-me a verve necessária para dizer por intermédio deste bocado
de prosa, e comunicá-lo aos leitores, aquilo que senti e vi na noite de 23 do
corrente mês no teatro da grandiosa (grandiosa na maneira de agir) Sociedade de
Instrução Tavaredense, na qualidade que fui de espectador daquele mimo de
teatro de assuntos regionais e patrióticos, peça em 2 actos e 13 quadros
intitulada “Viagem na Nossa Terra”, de que é autor o superior teatrólogo José
da Silva Ribeiro.
Quanto maior número de vezes vejo
trabalhar o grupo de amadores dramáticos tavaredenses mais se radica em mim a
opinião da sua superior categoria.
Quem é que crê, se o não soubesse
previamente, que numa terra de tão pequenos recursos se pode realizar Teatro
desta qualidade? Sempre que vejo representar os discípulos do grande mestre
José Ribeiro, fico chorando a falta que em certas terras (por exemplo, Torres
Vedras) faz um homem desta categoria!
Mas, vamos à peça, sobre assuntos
regionais e patrióticos, que é um mimo de literatura popular, escrita para o
povo entender, sem pruridos de frases bombásticas, não deixando de referenciar
factos proeminentes da História de Portugal.
Os seus dois actos, de um movimento
cénico digno de nota, porque até causa admiração conseguir-se reunir em
instalações de tão diminutas dimensões, um conjunto de intérpretes tão
numeroso, de tão vistosos trajos folclóricos, e pela maneira como se
desempenham, quer proseando, cantando ou dialogando.
Não farei referência especial a nenhum
dos intérpretes, porque me foi impossível referenciá-los, pela falta de luz no
lugar em que me encontrava, e poder anotá-los, acompanhando a exibição. Mas
razões há que sobrelevam o que deles se possa dizer – a quantidade de elementos
em cena, que não exagero se disser que por vezes eram mais de vinte; a forma certa
como executavam os jogos de cena, por se movimentarem tantos executantes; os
vistosos trajos com que se apresentam, que deslumbram a vista do espectador; a
maneira como, quer orando quer dialogando, como os amadores – e que amadores! –
se exprimem, ouvem e contracenam, que nos parece estar em presença de
profissionais de certa categoria.
É claro que tudo isto é possível devido
ao competentíssimo e modestíssimo José da Silva Ribeiro, a quem não só se deve
a autoria da esplêndida peça em 2 actos e 13 quadros, com constantes mutações
de cena; como à direcção de cena, mudanças de cenário, ao folclore dos trajos
e, sobretudo, incutir em tantos executantes o seu extraordinário valor de homem
que em Portugal, na opinião do grande actor que foi José Ricardo, mais sabia de
teatro: José da Silva Ribeiro.
Não posso, não quero, nem devo deixar
de felicitar a Sociedade de Instrução Tavaredense pelo seu 78º aniversário,
pelo que tem realizado, pela educação popular através do teatro; como
proporciona aos seus associados, instalações, hábitos e práticas de vida que
não são aquelas que hoje, infelizmente, a mocidade dos grandes centros exerce e
pratica nos meios – “soi disent” – civilizados.
Findo este meu depoimento, pelo que vi
e sinto, por lançar três grandes e sinceros votos: - que a sorte conserve a
vida e o resto de saúde, hoje já tão abalada, a José da Silva Ribeiro; que a
Sociedade I. Tavaredense continue prosperando; e que o povo da incomparável
Tavarede continue dando exemplos de amor bairrista e patriótico a centenas de
terras de maiores posses e população, como a minha terra, por exemplo.
Para José Ribeiro vão as minhas
sinceras felicitações, pelo incomparável trabalho e dedicação que presta à
sublime e instrutiva Arte de Talma.
Um grande abraço do velho amador
dramático e amigo – Vítor Cesário da Fonseca.
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