FERNÃO GOMES DE QUADROS
4º. Senhor de Tavarede - Morgado
Nasceu cerca do ano de 1590. Casou no ano de 1618 com D. Mariana de Melo, filha de António de Melo e Silva e de D. Ana de Melo. O contrato relativo ao dote tem a data de 31 de Outubro do ano do casamento e aquela Senhora foi dotada com o valor de 8 000 000 reis, em bens móveis, jóias e no prazo da Quinta de Valverde, em Rendide, Torres Vedras.
Faleceu no dia 5 de Setembro de 1665. Do casamento houveram três filhos: - Pedro Lopes de Quadros, que seria o herdeiro do morgado mas que faleceu antes de seu pai, em 1663;
- Manuel de Melo de Quadros, que foi servir, como militar, para o Brasil, onde casou com D. Maria Vargas. Julga-se que anteriormente frequentou a Faculdade de Cânones, da Universidade de Coimbra. Regressado a Portugal, esteve na guerra da Restauração, na qual faleceu, em Almeida, na batalha travada em 5 de Julho de 1664;
- e D. Ana de Barros, que foi baptizada na igreja de S. Julião da Figueira da foz do Mondego, no dia 24 de Abril de 1629. Foi em consequência deste parto que D. Mariana de Melo faleceu, quatro dias após ter dado à luz esta filha.
Ainda teve mais um filho, bastardo, de Maria Antónia Cunha Samea. Fernão Gomes deixou a esta senhora uma casa e uma quinta para sustento de seu filho atè à idade “de o poderem fazer frade, ou mandarem para a India, como militar”. Ainda sobre este filho deixou o seguinte recado: “… porque meu filho António é muito pequeno e o padre Miguel de Oliveira é seu padrinho, pelo amor que conheço nele lhe peço que o queira criar…”
Foi cavaleiro professo na Ordem de Cristo e serviu, como militar, em Tânger, África. Como adiante se verá, teve diversos desentendimentos com a Universidade de Coimbra, muitos problemas com vários capitães subordinados ao Duque de Cadaval e, até, com o capitão mor de Coimbra. Terão sido estes problemas a causa de ter sido condenado a pena de degredo por dois anos, em África, tendo recebido carta de perdão em 9 de Dezembro de 1626.
Por alvará de El-Rei D. João III, datado de 10 de Junho de 1624, Fernão Gomes de Quadros foi nomeado capitão mor da praça de Buarcos: Eu Elrey faço saber aos que este Alvará virem que por ser necessaria a segurança dos logares de Buarcos e Tavarede, e quer pessoa que sirva de capitam mór delles sobre quem se encarrege da deffençam nas occasiões em que se offerecerem de inimigos que ja em outras occasiões o tem intentado e tendo por certo que Fernam Gomez de Quadros, fidalgo da minha caza, que no dito cargo me servirá com satisfaçam e dará de si a boa conta que se deve esperar, hei por bem e me apraz que elle sirva o dito officio de capitam mór dos logares de Buarcos e Tavarede, em quanto eu o houver por bem e nam mandar o contrario, com declaraçam de que o Juiz de Fóra de Montemór o Velho, ha de levantar a gente, fazer officio da melicia e ter a seu cargo o exercicio della na forma do regimento das ordenanças em todos logares em que tiver jurisdiçam crime; procedendo e castigando os desobedientes como dis põe o dito regimento, por isso ser conforme as doações do Duque de Aveiro, meu muito amado e prezado sobrinho, cujo he a ditta villa e logares o que está disposto por Provizões muitas e sentenças, que estão dadas no caso; porem nas occasiões de guerra, que succederem nos ditos logares de Buarcos e Tavarede que sam perto do mar, o que a dita de Montemor e mais logares d’aquella jurisdiçam de Duque forem, obrigados a acudir conforme o que neste está disposto; hei por bem e mando que nos ditos cazos, e occasiões de guerra acudam as companhias da villa e logares do Duque ao dito Fernam Gomez de Quadros e estejam á sua ordem em quanto durar a occasiam de inimigos sem elle ter nella alguma outra jurisdiçam e nas mais companhias que nam forem do Duque uzará o dito Fernam Gomez de Quadros do que lhe tocar pelo regimento das ordenanças e desta forma mando a todos officiaes das companhias, e a quem tocar, e a todas minhas justiças e a quem pertencer que haja por capitam mór dos ditos logares de Buarcos e Tavarede, o dito Fernam Gomez de Quadros, e o deixem uzar inteiramente da jurisdiçam, que por esta lhe concedo, o qual por firmeza de tudo lhe mandei dar este Alvará pelo tempo de 4 mezes, se antes disso nam ouver outro assinado meu; em Lisboa, Antonio Correa a fez aos 10 de Junho de 1624.
Seguindo a política dos seus antecessores, procurou aumentar e consolidar os bens pertencentes ao morgado. Assim, no ano de 1635, fez um contrato com suas irmãs, todas elas freiras em Coimbra, sobre os bens de raíz que haviam sido de seu pai. Aqui fica cópia desse contrato:
Saibam quantos este público instrumento de contrato de transação e amigável composição e obrigação ou como melhor em direito dizer chamar se possa, virem, que no ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil seiscentos e trinta e cinco, aos dezanove dias do mês de Outubro do dito ano, no Mosteiro de Santa Clara, junto à cidade de Coimbra, à grade do palratório do dito Mosteiro, onde estavam presentes, da dita grade para dentro, D. Ana de Távora, D. Jacinta de Távora, D. Catarina de Sousa e D. Isabel de Carvalho, todas quatro irmãs e freiras professas no dito Mosteiro, e bem assim, estando igualmente presente, da banda de fora da dita grade, Fernão Gomes de Quadros, fidalgo da Casa de Sua Majestade, cavaleiro professo de Nosso Senhor Jesus Cristo, morador no Couto de Tavarede, pessoa reconhecida de mim, tabelião, e irmão de todas as ditas quatro religiosas atrás nomeadas, logo por elas e pelo dito Fernão Gomes de Quadros, seu irmão que presente estava, foi dito perante mim tabelião e das testemunhas deste instrumento ao diante nomeadas, que elas, partes, estavam contratadas pela maneira seguinte, a saber: que elas, senhoras, todas juntas e cada uma por si, largarão, ao dito seu irmão Fernão Gomes de Quadros, tudo aquilo que precederam de seu pai e mãe, que Deus tem, de suas legítimas, que o Mosteiro lhes largou por ele, Fernão Gomes de Quadros, dar ao dito Mosteiro, além do que era por este público instrumento, se obrigar a lhes dar por suas terras 500 mil reis, em dinheiro de contado, os quais lhe deu por largar as ditas suas irmãs, o mais que além destes 500 mil de suas legítimas, os quais elas sobreditas senhoras todas quatro, lhe largam de hoje para todo sempre, assim e da maneira que foi suas folhas de partilhas lhes couberam e por sentença das ditas partilhas lhes foi julgado, para ele Fernão Gomes de Quadros e para seus filhos herdeiros e sucessores.
E que da prova terão elas nas almas todas quatro e demitem de si todo o direito, posse, ação, usufruto, util e directo senhorio que elas, e cada uma delas, tinham e podiam ter em todos os bens que a cada uma delas lhe coube das ditas legítimas heranças, e tudo cedem e trespassam deste dia para todo o sempre, no dito irmão e seus filhos herdeiros e sucessores, para que tudo hajam, logrem e possuam como coisa sua, que fique sendo livre e desembargada e lhe dão poder e licença, a ele, seu irmão, que ele por si ou por quem quiser e mandar sem mais outra ordem nem figura de juizo, para tomar posse de todos os ditos bens, assim de móveis como de raíz e que a tome quer não, a dita posse, que por este instrumento lha haveram elas senhoras por dada e haviam por metido e investido na dita posse real actual e corporal formal cível e natural e enquanto aí a não tornasse se constituam por suas simples inquilinas, até que com efeito a tome pessoalmente e isto com tal pleito e condição que ele Fernão Gomes de Quadros como de feito por este público instrumento, se obrigou, por si e por seus filhos herdeiros e sucessores, a dar às ditas irmãs e a cada uma delas, em dias de sua vida delas, em cada ano vinte e cinco mil reis de tença e vinte alqueires de trigo, pago tudo no dito Mosteiro, à custa e risco e despesa dele Fernão Gomes de Quadros e de seus herdeiros, pagos os 25 mil reis de cada uma delas, cada ano, em três partes iguais, cada quatro meses o que se mostrar a folda (?) livre e os 15 alqueires de trigo a cada uma delas em cada ano, por dia de S. Miguel, de Setembro de cada ano, ao que tudo se obrigaria como de efeito se obrigou em seu nome e de seus filhos herdeiros pagar dias adiados, sob pena de tudo lhe pagarem a fé de juizo, com todas as custas, perdas, danos e vinte vezes que elas senhoras e cada uma delas receberem por se lhe não fazerem os ditos pagamentos, assim do dinheiro como do trigo, e de cada uma delas em mais 200 reis por cada um dia, para a pessoa que andar sobre a cobrança do dito dinheiro e trigo, ou parte dele, ou em execução de alguma demanda com execução de alguma sentença, e para tudo cumprirem, ele e seus herdeiros, obrigou ele Fernão Gomes de Quadros, sua pessoa e todos os seus bens e rendas e dos ditos seus filhos e herdeiros, para o que disse que em seu nome e de seus herdeiros se obrigam responder por todo o conteúdo deste contrato e obrigação, por diante o Corregedor ou Juiz de fora desta cidade os que hoje são e ao diante forem e os ditos cargos servirem para o que disse renunciava todos os juizes de seu foro e dos ditos seus herdeiros, e … de pão e vinho e todos direitos ordenações de que se ajudar possam, porque de nada queira usar nem gozar sem tudo cumprir por si e por seus herdeiros, como neste se contém e havendo de ser citado ele e cada um dos seus herdeiros para o cumprimento deste, em parte ou em todo, constituiria, como logo constituíu, por seus procuradores em causa própria, ao solicitador e porteiro da casa da Santa Misericórdia, da cidade de Coimbra, a ambos e a cada um deles e pelas citações feitas na pessoa de cada um dos ditos seus procuradores, era ele Fernão Gomes de Quadros contente que entre ele e seus herdeiros se houverem sentenças e por elas tiradas do processo, queria fossem eles e cada um deles, ditos seus procuradores requerido e ele Fernão Gomes e seus herdeiros e cada um deles penhorados e executados em suas pessoas e bens, até com efeito pagarem tudo o que estiverem devendo do dito dinheiro e trigo e custas e esta procuração se obrigar ele Fernão Gomes de Quadros, em seu nome e de seus herdeiros, não revogarem até as ditas religiosas não estarem pagas e entregues de tudo o que se lhe estiver devendo por razão deste contrato e revogando-a a tal revogação não valha, e querendo, elas partes, uns e outros, em algum tempo vir com alguma dúvida, demanda, embargos de qualquer qualidade e condição, que sejam as requeiram arrepender que não possam ser ouvidos em juizo nem fora dele, nem ele Fernão Gomes, nem seus herdeiros em causa alguma que por si alegar pena, sem primeiro depositarem na mão e poder daquele que por este contrato estiver dois mil cruzados em dinheiro de contado, que serão entregues a qualquer delas partes que por este estar quiser, sem terem obrigação de darem fiança porque para tudo poderem receber sem ela se haviam uns e outros por abonados até cláusula depositaria juiz ou tabelião aqui de requerimento delas partes e dele Fernão Gomes de Quadros na forma de lei … e as penas levadas ou não este recupere e guarde como nele se contém e outrossim fizeram este contrato em condições e declaração que falecendo qualquer das ditas senhoras atrás nomeadas, a dita tença dos ditos 25 mil reis e 15 alqueires de trigo ficará vaga (?) para ele Fernão Gomes de Quadros e para seus herdeiros e isto se entenderá em todas as quatro, de feição que, falecidas elas, ele e seus sucessores ficarão desobrigados do conteúdo neste contrato e por esta maneira se houveram elas partes e o dito seu irmão Fernão Gomes de Quadros por contratado e tudo prometeram e se obrigaram confiar muito inteiramente como neste se contém, obrigando outrossim ao cumprimento deste as ditas tenças e em fé e testemunho de verdade assim o outorgaram, elas partes presentes e mandaram fazer este instrumento de contrato de transação e amigável imposição e obrigação neste meu livro de notas, em que assinarão de que outorgaram e concederam os instrumentos que elas partes aceitaram, cada um pela parte que lhe cabe e eu, tabelião, estipulei e aceitei, em nome de todas as demais pessoas ausentes a que … pode tomar como pessoas … estipulante e … tanto tempo quanto em direito for herdeiro, a que foram testemunhas presentes, Francisco Fernandes, almocreve, morador na cidade de Coimbra e António Correia, sapateiro, morador na dita cidade. André Carvalho, tabelião, o escrevi, e declaram elas partes, que os pagamentos da ditas tenças na forma sobredita, assim como de hoje em diante e com esta declaração assinaram testemunhas sobreditas, o sobredito Fernão Gomes de Quadros, D. Ana de Távora, D. Catarina de Sousa, D. Jacinta de Távora, D. Isabel de Carvalho.
Continuaram, no entanto, os problemas com o Cabido da Sé de Coimbra. Os fidalgos de Tavarede insistiam em não pagar dízimos nas compras de terrenos que faziam. A este propósito, o Cabido deliberou a seguinte proposta: Aos vinte e sete dias do mês de Janeiro de 1638, sendo primeiro chamado para Cabido, se nomearam os senhores Bento de Almeida, Diogo Ribeiro e o doutor António Fernandes de Carvalho, para ouvirem a Fernão Gomes de Quadros e tratarem com ele a composição que queriam fazer com o Cabido sobre as duas demandas que com ele trazia.
Uma sobre os dízimos com que se havia levantado querendo isentar-se de os pagar, com o privilégio de cavaleiro de Cristo, e outra para se declarar que não podia anexar ao morgado os bens que tinha no Couto de Tavarede, e segundo a informação que os ditos senhores trouxeram ao Cabido, o dito Fernão Gomes assentou com eles que não queria demanda com o Cabido em nenhuma destas matérias, antes queria pagar os dízimos e tirar do vínculo do morgado todos os bens que a ele se achassem anexos e vinculados por morte de seu pai Pedro Lopes de Quadros, e que o Cabido, em reconhecimento deste seu bom ânimo, lhe havia de fazer dízimo a Deus acerca das casas que tem em Tavarede, assim a velha, com um pedaço que determinava meter de novo nela, e logo no dito Cabido foram nomeados para ir fazer vistoria na dita cerca nova e velha, os senhores António Alves e Diogo Ribeiro, e se assentou que com sua informação se tomaria resolução se convinha aceitar este concerto ou prosseguir as demandas com Fernão Gomes. E para constar do sobredito, fiz este assento de mandado do dito Cabido, por ora servir de secretário. O Deão, Francisco de Andrade.
Como sabemos, pouco depois teve lugar a restauração da soberania de Portugal, sendo aclamado rei D. João IV, duque de Bragança. Acreditamos que, por algum tempo, estas quesílias terão sito abandonadas devido à necessidade de se tomarem as medidas que se impunham para defesa dos previsíveis ataques dos espanhóis que procurariam recuperar a posse do nosso território.
Assim terá acontecido, pois no ano de 1641, seis meses após a restauração da independência de Portugal, a Espanha mandou barcos e tropas atacar diversas praças da costa portuguesa, pelo que o rei D. João IV mandou este aviso a Fernão Gomes de Quadros: Sua Majestade, que Deus guarde, ordena a Vossa Mercê se parta logo a acudir aos lugares que estão à sua conta na costa da vila de Buarcos e trate de os defender e fortificar, porquanto se tem avisos que à vista dela aparecem muitas velas do inimigo. Aviso a Vossa Mercê desta ordem para que a tenha entendido.
Nosso Senhor guarde a Vossa Mercê. 24 de Junho de 1641
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