Também no vizinho Casal da Robala, e certamente levada a efeito pela
colectividade local, se realizou uma festa em honra do S. João. Eis a notícia. Não conjecturámos mal, quando dissemos na
ultima carta que as raparigas e rapazes do Casal da Roballa iam ter, de sabbado
para domingo, uma noite de verdadeira folgança. Foi dançar até fartar, louvado
Deus! Começaram pelas 10 e meia e acabaram lá pela madrugada, já
cheias de pó, de cansaço e de somno! Mas como a mocidade d’este tempo não sente nem fadiga, e tudo é saúde e vigor, ellas, as
cachopas, não poderam dispensar aos tocadores o seu concurso para outra
dança, e eil-as novamente a dar á perna desde as 6 horas da tarde ás 9 e tal da
noite de domingo!
Os rapazes da
orchestra eram de Tavarede e parece terem empregado todos os esforços para
desempenharem bem o seu papel, o que, na verdade, foi reconhecido pelas
promotoras d’aquelles folguedos. O local estava ornamentado com pinheiros
ramalhudos, bandeiras, festões de buxo e loiro, etc. Á noite illuminaram-o com
uma fogueira grande, balões venezianos e
lanternas, e, durante o tempo em que as danças estiveram em acção, muitos
foguetes, estralejando nos ares, annunciaram-nos
a alegria que reinava no pequeno Casal, que estava em festa, indo por isso ali
muito boa gente passar alguns
bocados.
Não deixou de nos causar certa perplexidade uma
notícia inserta num jornal figueirense, em Fevereiro de 1903, que diz: Um novo grupo
musical acaba de organizar-se em Tavarede, sob a denominação de Grupo Instrução
Tavaredense. Dirige-o o meu patricio João Proa e a ele pertencem, segundo me
informam, alguns rapazes daqui que já têm feito parte de sociedades congéneres.
Sinceramente aplaudimos a sua louvável iniciativa. É sempre
pouco todo o movimento que se estabeleça para a união e harmonia comum, e a
existência de qualquer colectividade - desde que a sua criação obedeça a bons
fins e os seus agremiados trabalhem com dedicação para o seu engrandecimento -
é sempre um dos fautores primordiais para a educação de tantos espertos que
vivem alheados das coisas mais simples e rudimentares dos principios sociais. É
por isso que eu elogio os rapazes que acabam de fundar este grupo musical, e o
meu desejo é que eles por muito tempo se mantenham solidários e cheios de boa
vontade para a sua prosperidade. Desde que os seus deveres profissionais lhes
deixem livres algumas horas, bom é que as passem em convívio fraternal e
instrutivo.
Ora, se bem nos
recordamos, o Grupo de Instrução Tavaredense já existia há uns três anos,
instalado na casa do Terreiro, tendo o seu estandarte sido inaugurado
solenemente. Certamente que seria a organização de uma nova tuna, porque a
anterior se teria desfeito. Não podemos avançar muito sobre este assunto, mas a
verdade é que, muito pouco tempo após esta notícia, tanto o Grupo de Instrução Tavaredense como a
Estudantina acabaram. Em Dezembro, o correspondente de um jornal figueirense
lamentava-se assim: Houve tempos – e não
vão eles muito longe! – em que aqui, nesta minha terra querida, se representava
o presépio na noite de Natal e noutras da época que, de geração em geração, nos
tem vindo a relembrar a Natividade de Cristo. Era uma distração simples, mas
reunia ela muitas famílias num convívio fraternal, alegre, que nos
proporcionava uma horas de satisfação íntima.
Ia-se
ao presépio, revia-se a gente na garbosidade das moças tavaredenses, vestidas a
capricho no traje de pastoras, e admiravamos-lhes também as habilidades cénicas,
porque elas quase sempre debutavam nesses espectáculos... E daí, os felizes da
sorte, regressavam ao lar, e lá iam rodear a certã onde fervia o azeite com os
tradicionais filhós, ou onde o forno trasbordava com doces tortas! Era assim que se passava por aqui esta
feliz quadra do Natal. E hoje, se é certo que ao estômago dos afortunados não
faltam as abundantes consoadas com que se celebra a data natalícia, há no entanto
– triste é dizel-o – a falta de qualquer espectáculo que nos recreie o espírito
e que venha quebrar um tanto a insípida monotonia destas longas noites de
dezembro… Parece que a gente moça bem depressa adormeceu sobre os triumphos
colhidos!
Isto
escrevo eu, porque é a nitida expressão da verdade; porém, moralmente, sinto
muito dizel-o. Comprehendo eu bem que tudo cança, e sei que algumas pessoas há
que, por justos motivos, se teem affastado do meio em que tanto se accentoava o
desenvolvimento da educação dos meus patricios. Essa circumstancia, porém, não
obsta a que muitos rapazes deixem de trabalhar no intuito de se instruirem; e,
para isso, umas das primeiras coisas de que deviam tratar, era da creação d’um
grupo dramatico. No theatro aprende-se muito, todos o sabem; é uma escola que
educa e recreia o espirito sem enfado, e d’ella se auferem resultados
proficuos, desde que cada um comprehenda quaes os deveres que tem a cumprir.
Era
n’este caminho que eu desejava ver varios conterraneos meus, que bem precisam
de o trilhar, e que, tendo horas de descanço, mal as desperdiçam. Trabalhem,
por isso, para se instruir, e, fazendo-o, hão-de colher depois os fructos
d’esse esforço.
As duas colectividades haviam fechado
as suas portas. Não nos é possível esclarecer os motivos que a isso as levaram.
Mas Tavarede já não podia dispensar o Associativismo. O teatro e a música
haviam criado raízes profundas em todos os tavaredenses. Mais, a escola
nocturna, que já havia arrancado muitos conterrâneos do analfabetismo,
precisava de continuar e, para tal, tinha absoluta necessidade de um apoio
colectivo. Não faltaram boas vontades. Os tavaredenses uniram-se e decidiram
tomar o encargo de fundar uma nova colectividade que, baseados na prática já
adquirida, desenvolvesse a Instrução e o associativismo na nossa terra. Os seus
projectos concretizaram-se…
Não deixa de ser
curioso o facto de no teatro do Terreiro se ter realizado, durante os meses de
Maio e Junho de 1903, uma série de
espectáculos, mas com a participação de um grupo dramático da Figueira,
denominado ‘Companhia Esperança’, sempre muito aplaudidos e a que abrilhantava
um grupo musical dirigido pelo anterior regente da tuna do Grupo Musical, João
Proa, enquanto que o regente da tuna da Estudantina, Gentil Ribeiro, foi
dirigir e reger a ‘Estudantina de Vila Verde’.
E em 31 de Janeiro
de 1904 surge, no jornal figueirense ‘A Voz da Justiça’, a seguinte nota do seu correspondente em Tavarede: “Alguns rapazes daqui acabam de organizar uma
associação que tem por fim derramar a instrução pelos seus associados e filhos
destes. Como já conta grande número de sócios e bastantes elementos, tencionam
fundar brevemente uma caixa económica. Os fundadores de tão prestável
associação estão animados da melhor vontade. Por certo não faltará quem os
auxilie, jamais numa obra tão digna de apoio. Não desanimem, pois que ainda
podem recuperar o tempo perdido em coisas sem resultado para o seu
desenvolvimento intelectual, que é do que todos os homens devem tratar nas suas
horas de ócio”.
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