sábado, 2 de março de 2013

O Associativismo em Tavarede - 12


Também no vizinho Casal da Robala, e certamente levada a efeito pela colectividade local, se realizou uma festa em honra do S. João. Eis a notícia. Não conjecturámos mal, quando dissemos na ultima carta que as raparigas e rapazes do Casal da Roballa iam ter, de sabbado para domingo, uma noite de verdadeira folgança. Foi dançar até fartar, louvado Deus! Começaram pelas 10 e meia e acabaram lá pela madrugada, já cheias de pó, de cansaço e de somno! Mas como a mocidade d’este tempo não sente nem fadiga, e tudo é saúde e vigor, ellas, as cachopas, não poderam dispensar aos tocadores o seu concurso para outra dança, e eil-as novamente a dar á perna desde as 6 horas da tarde ás 9 e tal da noite de domingo!
Os rapazes da orchestra eram de Tavarede e parece terem empregado todos os esforços para desempenharem bem o seu papel, o que, na verdade, foi reconhecido pelas promotoras d’aquelles folguedos. O local estava ornamentado com pinheiros ramalhudos, bandeiras, festões de buxo e loiro, etc. Á noite illuminaram-o com uma fogueira grande, balões venezianos e lanternas, e, durante o tempo em que as danças estiveram em acção, muitos foguetes, estralejando nos ares, annunciaram-nos a alegria que reinava no pequeno Casal, que estava em festa, indo por isso ali muito boa gente passar alguns bocados.

Não deixou de nos causar certa perplexidade uma notícia inserta num jornal figueirense, em Fevereiro de 1903, que diz: Um novo grupo musical acaba de organizar-se em Tavarede, sob a denominação de Grupo Instrução Tavaredense. Dirige-o o meu patricio João Proa e a ele pertencem, segundo me informam, alguns rapazes daqui que já têm feito parte de sociedades congéneres.

         Sinceramente aplaudimos a sua louvável iniciativa. É sempre pouco todo o movimento que se estabeleça para a união e harmonia comum, e a existência de qualquer colectividade - desde que a sua criação obedeça a bons fins e os seus agremiados trabalhem com dedicação para o seu engrandecimento - é sempre um dos fautores primordiais para a educação de tantos espertos que vivem alheados das coisas mais simples e rudimentares dos principios sociais. É por isso que eu elogio os rapazes que acabam de fundar este grupo musical, e o meu desejo é que eles por muito tempo se mantenham solidários e cheios de boa vontade para a sua prosperidade. Desde que os seus deveres profissionais lhes deixem livres algumas horas, bom é que as passem em convívio fraternal e instrutivo.

         Ora, se bem nos recordamos, o Grupo de Instrução Tavaredense já existia há uns três anos, instalado na casa do Terreiro, tendo o seu estandarte sido inaugurado solenemente. Certamente que seria a organização de uma nova tuna, porque a anterior se teria desfeito. Não podemos avançar muito sobre este assunto, mas a verdade é que, muito pouco tempo após esta notícia, tanto o Grupo de Instrução Tavaredense como a Estudantina acabaram. Em Dezembro, o correspondente de um jornal figueirense lamentava-se assim: Houve tempos – e não vão eles muito longe! – em que aqui, nesta minha terra querida, se representava o presépio na noite de Natal e noutras da época que, de geração em geração, nos tem vindo a relembrar a Natividade de Cristo. Era uma distração simples, mas reunia ela muitas famílias num convívio fraternal, alegre, que nos proporcionava uma horas de satisfação íntima.

         Ia-se ao presépio, revia-se a gente na garbosidade das moças tavaredenses, vestidas a capricho no traje de pastoras, e admiravamos-lhes também as habilidades cénicas, porque elas quase sempre debutavam nesses espectáculos... E daí, os felizes da sorte, regressavam ao lar, e lá iam rodear a certã onde fervia o azeite com os tradicionais filhós, ou onde o forno trasbordava com doces tortas!          Era assim que se passava por aqui esta feliz quadra do Natal. E hoje, se é certo que ao estômago dos afortunados não faltam as abundantes consoadas com que se celebra a data natalícia, há no entanto – triste é dizel-o – a falta de qualquer espectáculo que nos recreie o espírito e que venha quebrar um tanto a insípida monotonia destas longas noites de dezembroParece que a gente moça bem depressa adormeceu sobre os triumphos colhidos!
         Isto escrevo eu, porque é a nitida expressão da verdade; porém, moralmente, sinto muito dizel-o. Comprehendo eu bem que tudo cança, e sei que algumas pessoas há que, por justos motivos, se teem affastado do meio em que tanto se accentoava o desenvolvimento da educação dos meus patricios. Essa circumstancia, porém, não obsta a que muitos rapazes deixem de trabalhar no intuito de se instruirem; e, para isso, umas das primeiras coisas de que deviam tratar, era da creação d’um grupo dramatico. No theatro aprende-se muito, todos o sabem; é uma escola que educa e recreia o espirito sem enfado, e d’ella se auferem resultados proficuos, desde que cada um comprehenda quaes os deveres que tem a cumprir.
         Era n’este caminho que eu desejava ver varios conterraneos meus, que bem precisam de o trilhar, e que, tendo horas de descanço, mal as desperdiçam. Trabalhem, por isso, para se instruir, e, fazendo-o, hão-de colher depois os fructos d’esse esforço.

         As duas colectividades haviam fechado as suas portas. Não nos é possível esclarecer os motivos que a isso as levaram. Mas Tavarede já não podia dispensar o Associativismo. O teatro e a música haviam criado raízes profundas em todos os tavaredenses. Mais, a escola nocturna, que já havia arrancado muitos conterrâneos do analfabetismo, precisava de continuar e, para tal, tinha absoluta necessidade de um apoio colectivo. Não faltaram boas vontades. Os tavaredenses uniram-se e decidiram tomar o encargo de fundar uma nova colectividade que, baseados na prática já adquirida, desenvolvesse a Instrução e o associativismo na nossa terra. Os seus projectos concretizaram-se…

         Não deixa de ser curioso o facto de no teatro do Terreiro se ter realizado, durante os meses de Maio e Junho de 1903,  uma série de espectáculos, mas com a participação de um grupo dramático da Figueira, denominado ‘Companhia Esperança’, sempre muito aplaudidos e a que abrilhantava um grupo musical dirigido pelo anterior regente da tuna do Grupo Musical, João Proa, enquanto que o regente da tuna da Estudantina, Gentil Ribeiro, foi dirigir e reger a ‘Estudantina de Vila Verde’.

                                                                  Gentil Ribeiro

         E em 31 de Janeiro de 1904 surge, no jornal figueirense ‘A Voz da Justiça’, a seguinte nota do seu    correspondente em Tavarede: “Alguns rapazes daqui acabam de organizar uma associação que tem por fim derramar a instrução pelos seus associados e filhos destes. Como já conta grande número de sócios e bastantes elementos, tencionam fundar brevemente uma caixa económica. Os fundadores de tão prestável associação estão animados da melhor vontade. Por certo não faltará quem os auxilie, jamais numa obra tão digna de apoio. Não desanimem, pois que ainda podem recuperar o tempo perdido em coisas sem resultado para o seu desenvolvimento intelectual, que é do que todos os homens devem tratar nas suas horas de ócio”.

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