1996.02.02 -
O DIA SEGUINTE (A LINHA DO OESTE)
O
SIT – Sociedade de Instrução Tavaredense levou à cena no passado dia 27 de
Janeiro a peça “O dia seguinte” de Luís Francisco Rebelo.
Nesta
peça, que constitui um hino de incitamento à vida, um jovem casal flagelado
pelas agruras da vida – o desemprego, o abandono, as dificuldades económicas –
sucumbe e opta pelo suicidio. Tendo escolhido pelo “Direito à Morte” o casal é julgado por ter desistido da vida. Convencidos
de que o seu futuro poderia ser diferente daquele que então vislumbravam,
querem voltar à vida. O Juiz dita
então a sua sentença: impossível, só se vive uma vez.
Embora
a sustentação da idea que a peça defende seja frágil, o texto é de inegável qualidade
literária. Com um elenco razoável para amadores destacam-se as interpretações
de João José Silva e José Lopes Medina; seguros, sabem
enfatizar no tom e nos gestos o seu papel. Rosa
Paz exagerou no pendor declamativo com que diz o papel e interioriza de
forma mecânica os sentimentos da sua personagem.
A
luz e o som, sóbrios, bastam ao desenrolar da cena. A cenografia extravasa o
essencial criando referências no espaço cénico que não têm qualquer uso – um
banco de jardim, uma árvore, dois candeeiros.
O
SIT continua a ser uma referência para o teatro no concelho, quanto mais não
seja pela frequência com que encena e monta espectáculos. O público tavaredense
é generoso para com o seu grupo, que bem merece o carinho que lhe dispensam.
1996.09.20 -
JOSÉ DA SILVA RIBEIRO (O
FIGUEIRENSE)
E
José da Silva Ribeiro regressou a Tavarede na noite do passado sábado, tendo
conseguido o milagre, cada vez mais
inviável de concretizar, de esgotar a lotação possível da SIT, de tal forma que
o nosso jornal (que se esquecera de marcar bilhete) passou a noite sentado (e
bem) numa cadeira solta que, por simpatia da casa, conseguiu encostar a uma das
paredes laterais da sala de espectáculos.
Que
bom seria que da próxima ida a Tavarede nos sucedesse o mesmo!
Como
referimos da última edição de “O Figueirense”, no passado dia 13, sexta-feira,
completavam-se dez anos sobre o falecimento de Mestre José da Silva Ribeiro,
tavaredense que acreditamos ser o mais ilustre que a terra, dita do limonete,
viu nascer.
Dele
não iremos ora traçar o bilhete de identidade de nobre cidadão, até porque,
também no último jornal, o fez já – e com brilho – o dr. Pires de Azevedo.
Apenas
recordamos hoje que José da Silva Ribeiro tinha na Sociedade de Instrução
Tavaredense o seu segundo lar, e que sua
gente (palavra para ele tão querida) era toda aquela que com ele criava e
irradiava cultura através do Teatro, no palco e na plateia.
Pois
bem, a sua gente, mesmo alguma que nunca viu o Mestre, marcou de forma
extraordináriamente digna a saudade de 10 anos.
E
como o fez?
Criando
e divulgando cultura através do Teatro – tal como desde 1916 o fez Mestre José
Ribeiro -.
Pelas
tábuas da SIT, num fim de semana super cultural, passaram os amadores de teatro
da Chã. de Carritos e de Tavarede, prova provada que as sementes lançadas pelo
homenageado, ao largo de uma vida, continuam
frutificar em agradável crescendo de vitalidade.
Assistiu
o O Figueirense ao sarau inaugural deste ciclo de teatro e algumas notas,
retiradas com certa emoção, terão certamente mais peso neste despretencioso
apontamento de reportagem.
E
a primeira radica-se, desde logo, no facto da SIT não ter deixado passar em
claro em evento que seria criminoso
esquecer. Assinalou-o agregando à festa da gratidão mais duas colectividades
teatrais da freguesia, numa divisão de honras que enobrece a SIT e,
particularmente, a figura do evocado.
Depois,
já o escrevemos, não nos recordamos, mesmo olhando anos para trás, de encontrar
na SIT uma casa tão repleta e tão participativa, verdadeiro oásis na
desertificação que consome os campos da cultura.
Depois
ainda, - reconfortante e esperançosa realidade – as nossas palmas ecoaram mais
forte quando olhavamos para a quantidade de gente jovem – e talentosa – que os
responsáveis da SIT tiveram a magia de apresentar em palco.
Como
Zé Ribeiro se sentiria feliz se pudesse (será que não pôde?!) aplaudir esta sua
“nova gente”!
Sem
juventude não há futuro e de tal se aperceberam, até pedagogicamente, os
continuadores do Mestre.
Uma
palavra mais para os minutos “sofridos” pela plateia na primeira parte desta
noite de evocação, quando em ecrã gigante se projectou parte de um filme no
qual a personagem é o próprio José Ribeiro, falando de si, do Teatro, d SIT e
“da minha gente”.
O
silêncio na sala durante a projecção da películo e a bombástica ovação final...
para bom entendedor.
Mas,
e o espectáculo?
Lembranças,
de seu nome, ele é corporizado por um conjunto de curtas e variadas
representações a que o Mestre em vida deu vida e que agora em palco (re)vivem
com “gente velha e gente nova”, gente discípula directa do Mestre e gente
(repetimos intencionalmente o termo) que José Rinbeiro gostaria de ensinar.
Também
intencionalmente não falamos em nomes, pois tal não desejariam os amadores
envolvidos nesta homenagem.
Pensamos,
finalmente, que este magnífico espectáculo, mesmo desatempadamente inserido na
data que lhe deu razão de existir, necessitava de ser aplaudido uma outra vez,
até porque certamente na SIT não esteve toda a “minha gente” de Zé Ribeiro.
1997.01.24 -
LEMBRANÇAS (A LINHA DO OESTE)
A
peça “Lembranças”, encenada por Ana Maria Caetano, foi primeiro representada
por altura do décimo aniversário sobre a morte de José Ribeiro.
Pressionada pela população, o
grupo cénico da SIT (Sociedade de Instrução Tavaredense) decidiu repetir esta
peça, que teve imenso sucesso em Setembro, nesta altura em que a SIT celebra
mais um aniversário.
A peça “Lembranças” é apenas
e simplesmente uma compilação de textos escritos por José Ribeiro, encenador desde
1916. Um homem que marcou profundamente a mentalidade das pessoas e que foi o
“professor” da actual encenadora do grupo de teatro, Ana Maria Caetano.
1998.01.28 -
A FORJA (A LINHA DO OESTE)
A
SIT estreou no passado dia 24 uma reposição de uma peça já levada à cena em
1971. Trata-se de “A forja” de Alves Redol que naquele ano foi encenada por
Mestre José Ribeiro, tendo como personagem principal a também conhecida
Violinda Medina.
Vinte
e sete anos depois o papel masculino foi novamente interpretado pelo mesmo
actor, João Medina, que cumpre agora 50 anos de palco. O papel que então
pertenceu a Violinda foi desta feita defendido por Ilda Simões.
Fazendo
jus ao nome da peça, ficou bem patente, pelo trabalho apresentado, que a forja
da SIT continua em boa actividade. Assim assistimos a três estreias absolutas:
Ilda Simões na encenação e os jovens actores Miguel Louro e Pedro Louro, este
último com apenas 11 anos e já integrante do teatro infantil da SIT, que se
mostraram seguros e bem dirigidos. Dos outros actores vimos interpretações
equilibradas, à imagem da tradição da colectividade.
Este
trabalho revestiu-se de várias dificuldades tendo sido a encenação prejudicada
pela falta de meios que obrigou os responsáveis da SIT a utilizar o mesmo dispositivo
cénico de há 27 anos atrás, suavizada embora pela utilização de outras
técnicas, na altura inexistentes: a luz e o som.
Na
interpretação, João Medina esteve bem a altura dos seus 50 anos de palco e Ilda
Simões também com uma boa interpretação, ensombrada a espaços com momentos
menos seguros, irregularidade essa que poderá ter explicação no facto de também
acumular a responsabilidade da encenação.
Ressalvando
esta reposição, que não deixa de ser interessante por isso mesmo, teme-se que a
SIT venha a perder o ensejo de alguma inovação e “ar fresco”, na escolha de
textos mais actualizados e interventivos.
De
qualquer maneira um trabalho “limpo”, na linha da colectividade de José
Ribeiro. Valeu pelos novos actores e por uma oportunidade de revermos o talentoso
João Medina.
1998.02.05 -
A FORJA (O DEVER)
Com
a peça de Alves Redol reposta em cena vinte e seis anos depois da sua estreia
em Tavarede, encerrou com chave de ouro a Sociedade de Instrução Tavaredense as
comemorações do seu 94º aniversário.
Fazendo
jus à celebrada escola de Mestre José Ribeiro que fez de Tavarede a capital do
Teatro Amador, a representação de A Forja
constituiu mais um êxito, saudado com rasgados aplausos dos muitos assistentes.
Certamente
que Alves Redol, o escritor que tirava da “tragédia de vida” o enredo para as
suas obras, se reveria na representação memorável de João Medina, o Pai que,
tiranizado pela revolta duma prepotência cometida sobre os bens familiares,
transportou para a sua nova família o estigma dessa afronta onde a esposa
(outro excepcional desempenho de Ilda Simões e os filhos não passavam de
simples peças daquele xadrez de sobrevivência que nem a iminência de mortes
fazia vergar.
Com
João José Silva e António Silva a incarnarem os papéis de filhos na oposição à
visão doentia de pseudo-dignidade do pai, activamente, o primeiro, ao optar
pelo “salto” à forja e mais passivamente, o segundo, ao resignar-se ao jugo da
dureza do trabalho e do tratamento que já matara o irmão Miguel (representado
com segurança por Miguel Lontro), também a Mãe soube mostrar quanto vale a razão e o direito ao defender o
filho mais novo (promissora estreia de Pedro Louro) das garras daquela “forja
assassina” para onde o pai o empurrava em detrimento da Escola.
Com
Manuela Mendes (vizinha) a mostrar naturalidade e a Morte (Rosa Paz) a
desempenhar “condignamente” o papel de diabo, não há dúvida que merece o maior
realce o trabalho de encenação (Ilda Simões) sem esquecer a quota-parte que
tiveram no brilho do espectáculo José Maltez e Jorge Monteiro Sousa (montagem
de cenários), Nuno Pinto e José Miguel Lontro (luz e som), Otília Cordeiro
(ponto), João Pedro Monteiro (contra-regra e o coro (Alice Mendes, Susana
Neves, Cristina Almeida e Vanda Oliveira).
“Cátedra”
de tão grande lição, aquele “palco da vida” passou a mensagem esperançosa de
Alves Redol na medida em que, ao exaltar com tanta realidade o dom da vida, não
deixou de realçar o peso dum ambiente familiar onde diálogo aberto constitui obstáculo à
prepotência doentia de “forjas” humanas, mensagem que humedeceu os olhos e
contraíu corações.
Fazer
calar tantas vocações seria um atentado ao nome prestigiado daquela casa, uma
afronta à memória de José da Silva Ribeiro, um crime de lesa Cultura.
Que
ninguém deixe fechar “aquela forja” do nosso Teatro Amador!
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