Muito
mais haveria a contar. Mas algumas das coisas mostradas ao ilustre visitante,
já nós as conhecemos. A água da nossa fonte, por exemplo, não podia ser
esquecida. Quanto às bruxas, as tais das fitas da sacristia, e parece que havia
muitas em Tavarede, essas levou-as o deus Mercúrio para o seu planeta. Deixaram
a terra e parece que nunca mais voltaram. As fitas... bem, essas, ainda
continuaram e continuam. De vez em quando há cada fita na terra do limonete!...
Mas o
que a todos os visitantes, nacionais ou estrangeiros, deuses ou humanos, o que
a todos se mostra, com justificado orgulho, é a força do trabalho do bom povo
da nossa aldeia. Terra de cavadores, que de manhã à noite, de verão ou de
inverno, debaixo dum sol escaldante ou com a roupa empapada pelo suor e pela
chuva, sempre agarrados à enxada, vão cavando o pão de cada dia. Pão de cada
dia que, nas tardes quentes do verão, quando as searas estão bem maduras clamavam
pela foice diligente das ceifeiras, para o colherem, depois do que para as
eiras.
E
sempre, homens e mulheres, novos e velhos, labutando e cantando. A alegria do
trabalho, a consolação da fartura, que os seus braços fortes e honrados
arrancavam às abençoadas terras de Tavarede, é bem mostrada nas suas cantigas
que, de manhã à noitinha, eram soltadas pelas suas gargantas.
Coro
Desde
manhã ao sol posto,
Arado
ou foice na mão,
Seja
Inverno ou seja Agosto,
Ceifamos
a loira espiga
Ou
pomos à terra o grão.
Cavadores
Vamos
todos sem cansaço
Na
terra dura
Cavar,
cavar.
A
força do nosso braço
Traz
a fartura
Do
nosso lar.
Ceifeiras
Somos
as ledas ceifeiras
Que
vão as messes trigueiras
Segar,
ceifar,
Sempre
ligeiras,
Sempre
a cantar,
A cantar.
Coro
Cavar,
Ceifar,
Ceifar,
cavar,
Sem
descansar.
F I M
A Fonte de Tavarede (bersos de Cardoso Marta)
O cavador, a cigarra e a formiga |
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O Sonho do Cavador (desenhos do
prof. Alberto de Lacerda)
(O serão começa ouvindo-se, em
fundo musical, a “Valsa do Sonho”) O
tema musical que estamos a ouvir chama-se “O Sonho”. Manuel da Fonte acabara de
comer e dorme a sua sesta à sombra de uma árvore frondosa. Como desde há uns
tempos atrás, está só. Aborreciam-no as cantigas e as risadas das cachopas,
sempre na galhofa com os rapazes... Por isso, preferia estar sòzinho. Queria
dormir descansado e, como sempre, queria sonhar...
Era
assim que se iniciava a fantasia “O Sonho do Cavador”, representada no nosso
palco, pela primeira vez, em 28 de Abril de 1928. José da Silva Ribeiro havia
escrito o texto e João Gaspar de Lemos Amorim os versos. A música era original
ou coordenada pelo maestro amador figueirense António Maria de Oliveira Simões.
Antes
de prosseguirmos com a nossa história, não queremos deixar de aqui fazer alguns
comentários a esta fantasia. E começaremos por dizer que, até aos dias de hoje,
“O Sonho do Cavador” foi a peça mais representada pelos nossos amadores. Tomar,
Buarcos, Figueira, Coimbra, Pombal, além de Tavarede, foram os palcos onde se
representou esta fantasia. Encontram-se quatro versões diferentes. A primeira,
que foi a que sofreu mais alterações, estreou-se, como dissemos, em Abril de
1928. No dia 29 de Junho de 1930, é apresentada uma segunda versão. Em Dezembro
que 1936 é levada à cena a terceira versão, que se repete em 1942, e em Janeiro
de 1987, em espectáculo evocativo, esta fantasia é reposta em cena, numa quarta
versão, com diversas alterações. A história é sempre a mesma. Muitos dos
quadros é que, ou cortados pela censura ou porque haviam perdido actualidade,
iam sendo substituidos, bem como a música.
As
críticas que se encontram inseridas na imprensa da altura, são bastante
elogiosas. Todas elas referem belos cenários, magnífico guarda-roupa,
espectacular montagem cénica com interpretações correctíssimas e, sempre em
maior destaque, uma música encantadora, muito bem cantada, que o público se não
cansava de ouvir e aplaudir. Hoje, e porque será a que maior interesse pode
despertar, vamos contar a primeira versão.
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