Curiosamente a primeira notícia que recolhemos, na
imprensa figueirense, relativa à nossa água, é precisamente sobre as fontes,
que eram as principais fornecedoras de água à população de Tavarede e da
vizinha Figueira. “A Fonte da Várzea, quando no anno de
1861 com ella se gastou inefficazmente a somma de 308$855, alem de valiosos materiais que estavam para diversa applicação, foi pela
tentativa d'uma mina para serem aproveitados os repares, e o resultado foi, que
tendo-se perdido nesses trabalhos a direcção da origem desconhecida, deu que
fazer aos encarregados para readequirir a
antiga, cujo veio chegaram a perder, é no entretanto é extrahida a púcaros
pela profundeza do nivel, sendo
mister derregar as aguas externas por meio de vala de communicação com o ribeiro,
e esta é a encosta do norte do monte a que o correspondente se refere. A fonte da Lapa está em igual profundidade, e é a continuação do
monte. Em Tavarede é a fonte abundante
e de excellente qualidade, porém ao nivel da parte mais baixa da povoação situada na planicie”.
Foi o jornal O
Figueirense que punblicou esta nota no dia 6 de Setembro de 1863. A partir
desta data as notícias sobre a água na nossa terra são muitas.
Mas as águas em
Tavarede nem sempre foram abundantes. E se água para se beber e para os gastos
caseiros várias vezes teve complicações, maior escassez tiveram os nossos
antepassados com a água para as regas das suas sementeiras. Isto aconteceu, por
exemplo, no verão do ano de 1876.
“Pediram há dias alguns proprietários de Tavarede à
Câmara Municipal providências sobre a distribuição das águas para regas. Como,
porem, não fosse até agora escutado este pedido, houve hontem alli uma grande
desordem entre vários indivíduos que se utilisam das águas, desordem esta que
pode repetir-se a cada momento, em quanto a câmara não se decidir a nomear um
homem para a distribuição”.
Mas
nem a fonte de Tavarede escapou. “Há uma fonte em
Tavarede que está em condições tristíssimas. Todos os dias alli há scenas de
pugilato por causa da escassez da água”. Na verdade foi mandada reparar,
mas logo surgiram problemas, pois os operários, enquanto procederam às obras, “privam o público da água da água para as
regas das suas propriedades”.
O verão daquele ano terá sido de muito calor
e seco. Até a fonte da Várzea, de tantas e tão antigas tradições, não escapou. “...... Vamos atravessar este anno uma crise
terrível. Vem bater-nos à porta, sinistro, como as visões esquálidas de um
cérebro em febre, o medonho espectro da sede. Lavra por ahi um clamor
espantoso, como se a villa estivesse soffrendo os horrores de um prolongado
sítio. Não há água! A fonte da Várzea, completamente arruinada, não pode
ocorrer às necessidades da localidade. Ouve-se em torno d’ella um côro de
imprecações e de blasphemias que faz lembrar a gritaria descomposta dos sabbats
mysteriosos das noites nebulosas da Germania. Os chefes de família vêem-se
obrigados a augmentar o numero de creados, por causa do longo tempo consummido
junto à fonte, à espera do ténue fio d’água que não pode supprir as
necessidades de uma povoação populosa como esta.......... Próximo da fonte da Várzea há uma
propriedade, pertencente ao sr. José Maria da Silva, onde o zelo d’este
cavalheiro fez sair do solo um copioso veio d’água, que, na crise actual, tem
sido a providencia de muitos habitantes da villa”.
Mas no ano de 1880 a situação foi
agravada. A cidade da Figueira, cujo desenvolvimento foi rápido e enorme, teve
de resolver o problema do fornecimento necessário aos habitantes. As fontes
existentes eram insuficientes e sentiu-se a necessidade da distribuição
domiciliária da água necessária ao consumo da população.
Estudado o assunto pelas respectivas
entidades, foi publicado, no referido ano, o relatório efectuado que, apesar de
extenso, julgamos de interesse publicar na parte que diz respeito à nossa
terra.
ABASTECIMENTO DE
ÁGUA À FIGUEIRA Todo o projecto
de abastecimento de águas compreende especialmente duas partes distintas, que
podem constituir o objecto de dois projectos diferentes:
1º - aquisição das águas e execução
das obras necessárias para as conduzir à povoação;
2º - distribuição destas pelas
fontes e pelos domicílios.
Foi do estudo da primeira parte
deste vasto problema com relação à vila da Figueira da Foz que a respectiva
municipalidade, por intermédio do seu exmo. Presidente, me fez a honra de
incumbir, e cujo resultado eu agora apresento.
O projecto que ofereço compõe-se de
três partes principais:
1ª Drenagem do solo por um sistema
de galerias subterrâneas para a captagem das águas na região superior do vale
da ribeira de Tavarede, no sitio denominado o “Prazo”.
2º Assentamento da canalização de
ferro para a condução das águas à vila.
3ª Construção de um reservatório no
alto do Pinhal numa altitude superior à de todas as casas da vila, para a fácil
e regular distribuição da água pelos chafarizes, que se julgue conveniente
estabelecer, e pelos domicílios, quando mais tarde se pretenda este
desideratum.
É claro que, pertencendo o
reservatório propriamente ao sistema de distribuição, deve considerar-se formar
um projecto à parte, tornando-se a sua construção independente da execução dos
outros trabalhos, e podendo provisoriamente substituir-se por um grande
chafariz, se a Municipalidade não estiver desde já habilitada com os meios
necessários para toda a despeza.
Primeira
parte – Trabalhos de exploração subterrânea
Não havendo à superfície do solo nos
arredores da Figueira nenhuma nascente assas copiosa que fornecesse por si só o
volume de águas necessário para o abastecimento da vila, era forçoso recorrer à
exploração subterrânea ensaiada já em Portugal com grande proveito pelo
distinto engenheiro chefe dos trabalhos geológicos, sr. Carlos Ribeiro, para o
abastecimento de Lisboa. Há três anos sucessivos a água fornecida pelos
trabalhos de exploração nas visinhanças de Belas à nossa capital durante a
estação calmosa tem sido o suficiente para permitir continuamente o abastecimento
nos domicílios, o que sem este auxílio seria impossível, como mostraram os
estios de 1874, 1875 e 1976.
Demonstrada a proficiência do
sistema, e sendo as condições para a exploração nas visinhanças da Figueira
incomparavelmente mais favoráveis do que em Belas, não hesitei um momento em
adoptá-lo no meu projecto, confiando firmemente nos resultados.
O sítio escolhido para a exploração
deveria satisfazer simultaneamente às duas condições principais: fornecer água
em abundância, e fornecê-la em altitude bastante para que, chegando à Figueira
com cota assas elevada, pudesse a todo o tempo distribuir-se pelos domicílios
sem haver necessidade de a levantar. Estas condições realizam-se
maravilhosamente no vale do Prazo, acrescendo de mais a circunstância
importantíssima, que os trabalhos podem ali estabelecer-se, de modo que se
desenvolvam quase indefinidamente para o futuro, quando o aumento da população
e as crescentes necessidades do consumo deste precioso elemento o exijam.
O vale de Tavarede é, de todos os
que descem da Serra da Boa Viagem, o que corre em mais baixo nível, cortando
transversalmente um espessíssima série de camadas permeáveis, é nos seus
flancos que brota o maior número de nascentes. A água vê-se com efeito romper
por toda a parte, e especialmente no fundo dos vales e das quebradas uma
vegetação activa e louçã plenamente atesta a frescura do solo.
Seguindo os nossos trabalhos de
exploração em nível inferior ao alveo da ribeira, é claro que as galerias que
abrirmos colherão toda a água que as camadas contiverem no massiço superior ao
plano em que elas forem estabelecidas, massiço importantíssimo, pois o relevo
do solo sobe rapidamente nos dois flancos do vale, não havendo, como se disse,
em toda a extensão da serra nenhuns pontos de descarga mais baixos do que este
vale.
Já dissemos noutra ocasião e agora repetimos: não é
simplesmente no facto da existência das nascentes visíveis à superfície do solo
do vale do Prazo, nascentes aliás valiosas, que me baseei para aconselhar a
exploração de águas nesta localidade; foram principalmente considerações
geológicas que me firmaram nesta escolha. Com efeito, além destas manifestações
exteriores, que revelam a existência de consideráveis massas de água, no
interior do solo, a garantia da permanência dessas nascentes, sobretudo quando
sejam exploradas em nível inferior ao alveo da ribeira, está assegurada pela
composição íntima e estrutura do solo, que é constituído por camadas pela maior
parte muito permeáveis, sobrepondo-se do Sul para o Norte concordantemente, e
com fraco pendor umas às outras, e inflectindo-se do Cabo Mondego para Maiorca
em forma de bacia, da qual a Figueira ocupa o centro.
A exploração que propomos será por
estes motivos, pois, a mais produtiva, e muito de presumir (ou quase certo) que
poderá suspender-se muito antes do limite que lhe assinamos no nosso projecto.
Os trabalhos são além disso estabelecidos de modo em que não comprometem as
explorações futuras, antes podem sucessivamente desenvolver-se quando convier,
sem que esta ampliação do fornecimento embarace nunca o abastecimento usual.
Para
isso bastará abrir pelo mesmo sistema, em nível superior ao dos trabalhos
existentes, e para montante do extremo superior da galeria colectora, uma rede
de galerias análogas, que poderá estender-se até às nascentes do Olho de
Perdiz, onde nasce a ribeira de Tavarede, ou ainda além através da serra;
estabelecendo-se a ligação dos novos trabalhos com os trabalhos antigos só
depois que aqueles estejam terminados.
Tendo apresentado os fundamentos do
nosso projecto, resta agora descrever as obras aconselhadas.
O sistema de galerias de exploração
que propomos consta de uma galeria longitudinal colectora seguindo proximamente
a linha do thalweg do chamado vale de Sampaio, e de várias galerias
transversais ou travessas partindo desta, e seguindo a direcção das principais
quebradas ou valeiros, que cortam um e outro flanco, e vem convergir naquele
vale. Por agora, para assegurar permanentemente um abastecimento diário de
1.500 ou mesmo de 1.800
metros cúbicos , parece-me mais que suficiente a abertura
da galeria longitudinal e das travessas indicadas na planta e nos perfis
respectivos. Aquela galeria começando a 60 m . a Sul 6º E da ermida denominada na
localidade do Santo Sampaio, num pequeno tanque de depuração que serve de
origem ao canal, seguirá para o norte com a inclinação constante de 0.001 até 108,10 m . para montante da
desembocadura do vale do Custódio, medindo ao todo 817,40 m . de extensão.
Deste aqueduto ou galeria geral
partirão para um e outro lado as travessas de exploração, cada uma de 100,0 m . de comprimento,
pouco mais ou menos, também com a inclinação de 0.001 ou ainda menor,
correspondendo respectivamente aos vales do Cipriano, do Bandeira, dos Gamelas,
dos Ferreiras e do Custódio, vindo assim a medir todo este sistema de galerias 1.352,50 m . de extensão.
Mas, repetimos, julgamos desnecessário concluir estes trabalhos para se obter a
quantidade de água razoavelmente reputada necessária para um amplo
abastecimento da Figueira, nestes primeiros tempos, mesmo supondo o
desenvolvimento que ela deve ter por efeito da construção do caminho de ferro
da Beira.
As travessas, a que assinámos
proximamente o limite de 100,0
m . (mas que poderão prolongar-se até onde o permitir a
ventilação dos trabalhos, ou nalguns casos especiais suspender-se antes daquele
limite, quando por exemplo as dificuldades do trabalho ou a conveniência de não
causar inutilmente alguma nascente o
aconselhem) serão todas fechadas por barragens próximo da sua junção com a
galeria geral, reservando-se a água que elas recebem para suprir durante a
estiagem ou quebras das nascentes que alimentam directamente esta galeria.
Estas travessas, algumas das quais seguem aproximadamente a direcção da
estratificação (N 60º O magnº) serão abertas nas camadas de grés que durante o
avanço da galeria geral se vir que são mais produtivas, ou, se elas cruzarem
obliquamente aquela direcção, inflectir-se-ão de modo que vão procurá-las.
Nos pontos 1, 2, 3, 4, 5, 6 e
distanciados entre si em média 118 metros , abrir-se-ão poços, que servirão
para a extracção de entulhos, e ao mesmo tempo para a ventilação dos trabalhos,
para o que se farão corresponder verticalmente à galeria geral, e quanto
possível ao alinhamento das galerias transversais. Um deles (o nº 3)
convenientemente revestido, será destinado a servir mais tarde como clarabóia
de serviço, para as reparações que por acaso seja necessário fazer na galeria.
Devendo evitar-se na execução destes
trabalhos o enorme dispêndio que ocasiona a elevação das águas (dispêndio
multiplamente nocivo, porque a elevação de águas estorva o regular andamento
dos trabalhos, e é tanto maior quanto maior é a quantidade de água que se vai
obtendo) a abertura desses poços não será simultânea mas sucessiva, e só depois
que esteja concluído o lanço de galeria que a cada um respectivamente lhe fica
a juzante.
Em casos especiais mesmo, quando a
ventilação permitir o prosseguimento dos trabalhos na galeria geral, o poço só
se abrirá quando esta tiver passado por baixo do ponto que ele deve ocupar,
podendo assim dispensar-se talvez a abertura de alguns deles, ou substituir-se
por um simples furo de sonda. Em todo o caso, como a inclinação das camadas é
para o quadrante do S (530º O magnético, mediana) isto é, para a origem da
galeria, quando o poço vier a abrir-se já terão sido sangradas num nível
inferior as camadas que ele irá atravessar.
O único sistema, pois, que
aconselho, e ao qual está ligada essencialmente a economia da obra, consiste em
o trabalho seguir sempre de baixo para cima por uma só frente de ataque para
cada lanço de galeria, e empregando portanto só dois grupos de mineiros.
Começando os trabalhos simultaneamente na origem da galeria geral junto ao
tanque de depuração, e no poço 1, que tem imediata descarga para o barranco dos
Grilos, podendo rasgar-se a galeria numa das fases para que não haja que elevar
os entulhos, ter-se-á completado aquele primeiro túnel e o lanço da galeria até
à vertical do poço 2 proximamente ao mesmo tempo. (Para maior brevidade do
trabalho poderiam atacar-se ao mesmo tempo os dois topos do túnel e a galeria
do poço 1, vindo então a agrupar-se três grupos de mineiros).
Executada esta primeira parte do
trabalho, e logo que um dos grupos de mineiros tiver concluído a abertura do
poço 2 (aliás de pequena profundidade, 5,574 m .), prosseguirá o avanço da galeria
geral para o poço 3, ocupando-se simultaneamente o outro grupo de mineiros da
abertura da travessa de exploração para o nascente, seguindo o vale de
Cipriano. Concluída esta segunda parte do trabalho, e bem assim aberto o poço
3, poceder-se-á simultaneamente à abertura da travessa de exploração do vale do
Bandeira, e do lanço da galeria geral até à vertical do poço 4; e assim por
diante até se ter obtido a quantidade de água que se deseje.
O poço nº 1, que será a verdadeira
testa dos trabalhos de exploração, não carecerá de revestimento, porque
precisamente nesse ponto passa um banco de calcáreo pisolítico de 5 a 6 metros de espessura,
muito grosseiro, trechiforme, com
muitos grãos e fragmentos rolados de quartzo, na verdade rijíssimo, mas única
única camada desta natureza que os nossos trabalhos terão de cortar.
Seguindo a galeria para juzante do
poço 1 quase perpendicularmente à direcção geral da estratificação consideramos
que haverá somente 8,0 m
de galeria e 5,638 m
de poço a abrir em
calcáreo. Mas como é pequena a espessura do grés (3,0 m em média acima do tecto
da galeria) o melhor será remover este prisma de grés, abrindo como acima
dissemos uma trincheira, isto é, rasgando a face S do poço, profundando e
regularizando o barranco para fazer todo o desmonte a céu aberto, com o que se
conseguirá entre outras vantagens, dar uma entrada ampla de ar para o interior
dos trabalhos e portanto estabelecer uma ventilação mais perfeita, o que poderá
mais tarde traduzir-se talvez numa grande economia dispensando-se a abertura de
alguns poços.
Em vista da descrição sucinta que
apresentamos deve concluir-se que a descarga das águas que correrem pela
galeria durante a execução dos trabalhos poderá fazer-se para o barranco dos
Grilos sem que seja necessário percorrerem o túnel entre este barranco e o
tanque de depuração. Assim o túnel, além de contribuir eficazmente para o
abastecimento, porque romperá uma formação de grés muito grosseiras em geral e
muito permeáveis, levantando-se muitíssimo o terreno que elas constituem para o
poente até às cabeceiras dos vales de Pijeiros e dos Condados, prestará ainda a
vantagem de isolar a testa dos trabalhos subterrâneos da dos trabalhos à superfície,
tornando durante a construção totalmente independentes os dois serviços, na
verdade de índole bem diferente, e portanto exigindo o emprego de pessoal
distinto.
Tendo em atenção que as nascentes
descobertas pelos trabalhos subterrâneos geralmente nos primeiros tempos (o que
aliás bem se compreende pela pressão que a água experimentava antes de ter
aquele ponto de descarga) julgo prudente que os trabalhos de exploração se não
suspendam antes que se tenha obtido pelo menos o dobro da água que se julgue
necessária para abastecimento da vila, e que muito largamente pode imputar-se
hoje em 500 mc ou 600 mc diários.
O trabalho de abertura dos poços e
galerias deverá fazer-se por empreitada, e seguidamente às tarefas, dia e noite
sem nenhuma interrupção. Os revestimentos deverão ser feitos por administração,
ou pelo menos devem ser constantemente vigiados por um mestre hábil e de
inteira confiança, para que não haja a recear para o futuro desabamentos, ou
mesmo pequenas reparações, que em todo o caso se tornarão dispendiosíssimas, e
até poderão embaraçar ou interromper o abastecimento.
Durante a execução dos trabalhos
muito provavelmente o traçado das galerias, que indicamos, terá de modificar-se
ligeiramente nalguns pontos, quando por exemplo se reconhecer a inconveniência
de seguir por maior espaço uma camada de grés rijo, permeável, porventura muito
aquífero, e em que a galeria não carecerá de revestimento, evitando-se desta
arte uma camada de argila pelo contrário
improdutiva e difícil de suster.
O perfil da galeria será do tipo
ordinário de volta inteira, com 2,0
m de altura e 0,75 m de largura. Ao meio da soleira correrá
um passeio de lagedo tosco (pedra sava) ou de grés, que dividirá as duas
caleiras, e servirá para a passagem da gente, quando seja necessário visitar o
aqueduto, e dos carrinhos de mão quando se careça de fazer a limpeza das
caleiras ou alguma reparação, sem que a água se turve. Este passeio terá 0,35 m de largura, e
elevar-se à altura de 0,25 m
sobre o pavimento da galeria, vindo portanto cada uma das caleiras a ter 0,20 m de largura e 0,25 m de profundidade. (Com
uma inclinação de 0,001 m
por metro, segundo as permissas de M. M. Darcy e Bazin, cada uma das caldeiras
laterais da galeria com 0,20 de largura e igual profundidade, dará passagem
proximamente a 800 mc por dia supondo-se pouco lisa, isto é, oferecendo a
superfície natural do grés, sendo a velocidade média da corrente de 0,232 m e supondo-se lisa,
isto é, rebocada de cimento hidráulico misturado com areia, dará passagem a mais
de 1.300 mc sendo a velocidade média de 0,402 m por segundo.
As caleiras comunicarão entre si
repetidamente, afim de alongar o trajecto que a água tem de percorrer,
diminuindo-lhe a velocidade, e portanto aproveitando os depósitos dentro da
galeria; esta comunicação estabelecer-se-á, quer deixando estreitos intervalos
de espaço a espaço no assentamento das pedras que formam o passeio, quer
talhando estas de propósito para o objectivo conforme mostra o desenho.
Como o terreno que as galerias têm
de atravessar é constituído de grés e de marnes, dominando porém muito as
camadas de grés rijos sobre as de grés brandos e de marnes, calcularei que
somente a terça ou quarta parte das galerias a abrir terá de ser revestida. E
ainda, como só a galeria principal terá de conservar-se desembaraçada para ser
visitada, podendo o traçado das travessas modificar-se à vontade, considerarei
que todas estas ficam em bruto; porque para o prosseguimento dos trabalhos de
avanço, nos raros casos em que as travessas terão de cortar rochas brandas,
poderá empregar-se um revestimento provisório de madeira (cofragem), que será
ao depois reforçado, quando a abertura da galeria estiver terminada, com os
entulhos de grés vindos de outro ponto dos trabalhos, e que poderão ali acumular-se
em vez de serem extraídos para a superfíoie
Medindo a galeria geral projectada 807,40 m considerei pois
que somente 250,0 m
terão que ser revestidos, apreciação que certamente está acima da verdade, pois
que, como dissemos, não julgamos indispensável por agora, para satisfazer às
mais urgentes necessidades do abastecimento, levar a abertura desta galeria até
ao extremo norte.
Em compensação as despesas de
desmonte da rocha deverão ser relativamente grandes, porque algumas camadas de
grés grosseiros, contendo grossos e abundantíssimos fragmentos quartzosos,
comportar-se-ão quase como as quartzitas com respeito à acção do fogo, e ao
estrago das brocas e outras ferramentas.
Também a abóbada da galeria, quando
tiver de construir-se, deverá ser relativamente de grande espessura, porque de
ordinário só terá de empregar-se em terreno muito frouxo, nas camadas
argilosas, que alternam com as camadas rijas, as quais pelo contrário não
carecem absolutamente de revestimento. O tipo que adoptámos é o de 0,40 m de espessura para os
pés direitos, tendo a abóbada 0,30 de espessura no fecho. Os pés direitos serão
construídos ordinariamente de alvenaria hidráulica, e a abóbada deste mesmo
material ou de beton. Excepcionalmente, e só quando as circunstâncias
impreterivelmente exijam, serão construídos de enxelharia.
Pela mesma razão acima notada
supomos que a maior parte da extensão dos poços de serviço que tem de abrir-se
não carecerá de revestimento; todavia, como nesta espécie de obras, que estão
mais expostas, há mais a recear os desabamentos, considerei que a entivação dos
poços abrangerá metade da sua extensão total.
A secção dos poços basta que seja de
2 m x 1,60 m para que, mesmo
revestidos de madeira, dêem passagem fácil aos baldes com o entulho. Ao poço nº
3, destinado a servir de clarabóia, dar-se-á a forma circular com 2,0 m de diâmetro interior, a
menos que ele seja aberto em rocha muito rija que não careça de revestimento,
porque em tal caso conservará a forma rectangular. Deixando de fora as paredes
do poço, ou dos lados do quadrado circunscrito ao circulo que o representa a
largura de 0,50 m
para poder assentar-se um sarilho, fechar-se-á este espaço dentro de uma casa
rectangular ou quadrada, com a porta de entrada numa das faces, e uma fresta ou
olhal na parede oposta, e superiormente coberta por uma abóbada de volta
inteira, de beton ou alvenaria hidráulica.
Correspondendo este poço à vertical
da galeria geral convirá cobrir no fundo as caleiras com uma capa de lagedo,
afim de que a água não se suje, mormente quando tiver de fazer-se alguma
reparação.
Para facilidade do serviço terá de
cobrir-se a soleira da galeria com um estrado seguido de madeira, formado de
taipais soltos, por baixo dos quais passará a água sem o que o movimento dos
carros dentro da mina se tornaria muito moroso e incómodo. É este um elemento
de despesa a que há que atender, mas de pouca importância aliás, porque os
mesmos taipais, poderão servir sucessivamente, passando-os de um lanço de galeria já concluída para o outro em
avanço.
Finalmente no primeiro lanço de
galeria a juzante do poço 1, as caleiras serão revestidas de uma capa de reboco
hidráulico, para que seja mais fácil a limpeza, podendo conservar-se a caldeira
daquele poço na largura da galeria para servir como um primeiro tanque de
deposição. No resto das galerias as caleiras só serão revestidas onde for
absolutamente indispensável.
As águas exploradas pelos trabalhos subterrâneos
serão recebidas num tanque completamente enterrado, onde começa a canalisação
de ferro. Este tanque, a que chamaremos de depuração ou de deposição, porque as
águas depositarão ali as matérias sólidas, areia ou argila, que arrastarem,
reputo-o de indispensável, porque sendo a canalisação de ferro de pequeno
calibre, (0,15 m )
e seguindo em repetidas ondulações para se adaptar à configuração do solo, é da
maior importância que a água entre nela o mais límpida possível.
Este tanque, de que os desenhos dão
uma perfeita ideia, é dividido longitudinalmente por um muro em dois
compartimentos distintos e independentes, cada um com a sua descarga especial
para a ribeira para se fazer a limpeza, e além disso divididos transversalmente
por três septos, o do meio móvel (corrediça ou adufa submersível), formando uma
espécie de labirinto, que a água é obrigada a percorrer antes de chegar à
tubagem de ferro.
Na extremidade de cada uma das
caleiras há uma adufa, de forma que, estando levantadas ambas e abertas as duas
torneiras de passagem na origem da canalisação, a água passará simultaneamente
por ambos os compartimentos do tanque; pelo contrário, se se fechar uma das
adufas e a torneira de passagem correspondente, obrigar-se-á a passar toda por
um dos compartimentos, podendo fazer-se a limpeza do outro, sendo preciso, sem
a mínima interrupção no fornecimento.
Para quebrar a velocidade da água, à
sua entrada no tanque há uma espécie de descarregadouro a juzante de cada
adufa, crescendo sucessivamente a inclinação do fundo da caleira, e ao mesmo
tempo alargando a superfície onde pode desdobrar-se a lamina de água.
O tanque será encerrado numa casa
rectangular de 2,0 m
x 5,25 m
de área interior, servindo as paredes laterais do tanque em parte de alicerce
às suas duas paredes mais extensas, e coberta por uma abóbada de volta inteira
de beton ou de alvenaria hidráulica.
O acesso ao tanque far-se-á por um
lanço de 5 degraus, disposição necessária para que a tubagem saia do tanque
enterrada à profundidade de 1 m
que deverá manter em todo o seu trajecto, e para que a parede oposta à porta
ganhe a altura conveniente para se poder nela abrir uma fresta ou olho-de-boi
para iluminar a casa e para ventilação.
O muro divisório do tanque será
coberto por um capeamento de lajedo de 0.50 m de largo, para permitir a passagem para
dentro da galeria ao guarda, que deve inspecioná-la, e fazer a manobra das
válvulas de descarga quando seja preciso. Como é óbvio, o fundo deve ter
escoante para estas válvulas.
O fundo do tanque será formado por
uma camada de betão; as paredes laterais e o muro da divisória central, de
alvenaria hidráulica; e as paredes da casa, de alvenaria ordinária. As paredes
do tanque e bem assim as da casa serão revestidas interiormente de uma capa de
reboco hidráulico.
O curso que a água tem de percorrer
até à sua chegada ao alto do Pinhal é muito difícil, porque o solo a que tem de
sujeitar-se a canalisação é muito acidentado. Como se vê na planta a direcção
geral da canalisação não se afasta muito da da direcção rectilínea; no plano
vertical é que é obrigada a dobrar-se em repetidos sifões, seguindo-se sem
interrupção uns aos outros, até que o traçado chega à estrada frente à quinta
de S. João, para transpor as quebradas do solo, que não poderiam tornear-se sem
um grandíssimo desenvolvimento no traçado, e algumas delas nem mesmo assim.
(Este relatório continua a publicar-se em vários números seguintes para
explicarem a condução das águas para a Figueira e a sua distribuição, o que não
copiei por não interessar directamente a Tavarede)
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