No dia 11 de Abril de 1925, subiu à cena a opereta
“Em busca da Lúcia-Lima”. Com libreto de João Gaspar de Lemos Amorim, foi
musicada por um grande músico figueirense, o saudoso professor António Maria de
Oliveira Simões. Recordemos um pouco desta peça.
Começava
a acção no largo do rio, junto da Igreja. Estavam em cena as figuras
importantes da aldeia, entre as quais o regedor “Zé Badaleiro”. Este havia
acabado de receber um telegrama, vindo de Lisboa, no qual era informado da
visita à aldeia de dois brasileiros, riquíssimos, Eduardo Leirosa e Tomás
Castanho, que aqui se deslocavam à procura duma determinada pessoa.
Enquanto
esperavam os visitantes e faziam os preparativos para a recepção, as lavadeiras
tavaredenses iam lavando as roupas das suas freguesas, nas águas frescas e
limpas do nosso ribeiro.
A roupa que nós lavamos
A roupa que nós lavamos
É
de vária freguesia.
O
sabão não chega a meio
Para
tanta porcaria.
Lavamos
muita fraldinha
De
pintinhas salpicada...
À
força d’ensaboadela
Fica
sempre obra asseada.
As águas desta ribeira
Conhecem
muito segredo
Das
meninas que namoram
Escondidas
no arvoredo.
De noivas e de casadas
De noivas e de casadas
Toda
a roupa aqui vem ter
Por
isso sabemos coisas
Que
se não devem dizer.
As nódoas que traz a roupa
As nódoas que traz a roupa
Nos
fartamos d’esfregar.
Estas
pedras se falassem
Tinham
muito que contar.
Logo
de seguida aparecem os dois brasileiros, acompanhados pelo seu criado, o
muleque “Dominus Técum”. Haviam aterrado o seu aeroplano na Várzea e são
recebidos festivamente, no largo do rio, por toda a população local. Afinal,
eles eram portugueses, naturais, um do Minho e o outro de Trás-os-Montes.
Haviam emigrado para o Brasil. A vida correra-lhes bem, amealharam grossa
fortuna e, agora, queriam casar.
Num
jornal desta região, que haviam recebido, encontraram o seguinte anúncio:
“Senhora nova, sem fortuna mas formosa, de boa reputação e muito prendada,
deseja contraír matrimónio com cavalheiro respeitável e em condições de manter
o decoro e decência de família digna de toda a consideração. Quem pretender,
dando referências idóneas, queira dirigir-se a Lúcia Lima, Beco das Poias,
Tavarede”.
Não
hesitaram. Meteram-se dentro do seu aeroplano e aqui chegaram em busca da tal
senhora. O pior é que de ninguém era conhecida. E enquanto aguardavam mais
informações, foram provar um copo “do bom”, à adega do senhor regedor.
Havia
na aldeia um tal “Pinga-Amor”, amador dramático e conquistador dos “quatro costados”.
Este, temeroso que algum dos brasileiros requestasse a bela Capitolina, a filha
do regedor que ele pretendia para noiva, especialmente pelo dote dela, logo
arquitectou um plano para os afastar daqui, fazendo constar que a tal Lúcia
Lima havia ido para a China, na companhia de um irmão, capitão da tropa
destacado para Macau.
Engoliram
a patranha. E logo decidiram. Se ela foi para a China, vamos nós, também, à sua
procura. O aeroplano estava pronto para a viagem.
O
segundo acto é passado nos jardins do Mandarim de Tching Fou. Comemorava ele,
nessa dia, as suas 59 “primaveras” e havia ordenado grandes festejos. Todavia,
sua filha, Flor de Chá, estava triste. Havia-se apaixonado por um dos
brasileiros. Estes, porém, ao aterrarem o seu aeroplano, fizeram-no com tal
infelicidade que partiram umas pendurezas do templo e estragaram o arrozal
sagrado, o que causou enorme ira ao Mandarim, que determinou a sua prisão e
que, em julgamento mais que sumário, havia determinado a sua execução.
Flor
da Chá, que seu pai havia prometido em casamento ao seu valido Chi-Fan-Tu, mas
que se apaixonara por um dos brasileiros, canta a sua tristeza:
Sonhos
dourados, grata alegria,
Que
em mim senti; sempre a brilhar
Mundo
d’ilusões em que eu vivia...
Oh! voltai, voltai, e
sem tardar
Que
eu desfaleço nesta agonia,
Nesta
tristeza d’amargurar!
Que
vale ser nova, ser cortejada,
Ser
rica e filha dum mandarim,
Se
a alma trago atormentada
Duma
tristeza que não tem fim!
Viram
meus olhos um estrangeiro;
Presos
ficaram, presos d’amor,
Como
no encanto dum feiticeiro.
Não
sei que chama, que estranho ardor
Fez
em meu peito letal braseiro,
Que
é vida e morte, prazer e dor!
Buda
clemente minha alma implora
Do
vosso poder a protecção.
Tirar-me
o fogo que me devora
D’ardor
intenso meu coração.
Mas a
festa continuava. Emtretanto, Flor de Chá tinha conseguido subornar o
Comandante Ferraóbico. Projectaram a fuga dos prisioneiros. Por sua vez, o
Consul de Portugal, que tivera conhecimento do sucedido, vai interceder junto
do Mandarim, a quem oferece algumas garrafas de vinho do Porto que ele muito
apreciava.
Mas
não era só a liberdade dos brasileiros que Flor de Chá pretendia. Queria mais,
queria casar com Eduardo Leirosa, que também por ela se apaixonara. A festa
prosseguia, mas, antes da execução e com o auxílio do Comandante Ferraóbico,
conseguem fugir para Portugal, trazendo com eles a apaixonada Flor de Chá.
Eu
tinha numa gaiola
Uma linda cotovia,
Era
uma delícia ouvi-la
Chilreando
todo o dia.
Não
era só meu o encanto:
O
maroto dum pardal
Vinha
fazer-lhe namoro
Debruçado
no beiral.
Desde
a alvorada
O tal tratante
Sempre
no posto
Era
constante
A
confessar
Seu
terno amor,
E
a cotovia
Fazia
ouvidos
De
mercador!
Mas
passados tempos
O
tal mariola
Conseguiu
beijá-la
Fora
da gaiola
E
fugiu.
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