sexta-feira, 4 de abril de 2014

As operetas em Tavarede - 11

         Como? Dando-lhe o pão de cada dia e fazendo dele um trabalhador honrado. Mas riqueza, como ele queria, isso não. Por isso queria ir embora. Bem lhe pediram que não partisse. Primeiro foram os milhos.
Milho Branco -
Feito em farinha,
Branca, mimosa,
Sou, bem cozido,
Broa gostosa

Milho Amarelo -
Na nossa aldeia
Sou muito usado.
Muitos me chamam
Pão de soldado

Milho Encarnado -
Nas desfolhadas,
Eu, nas espigas,
Sou o regalo
Das raparigas.

Os Três -
Branco e amarelo,
Mesmo encarnado,
Vamos à mesa
Do mais pintado.

Milho Branco -
Pareço espuma
Vindo da azenha
Sai obra fina
Cozido em Brenha.

Milho Amarelo -
Sou redondinho,
Vistoso e loiro.

Milho encarnado  -
Posto no lume
É cada estoiro!

Os Três -
Branco e amarelo,
Etc. etc. etc.

         Não os escuta. Há-de ser rico. Também a vinha, que só ele sabia tratar como ela queria, com todo o seu saber e carinho. Na empa e na poda não tinha igual. E a farturinha de cachos, que eram sempre um regalo para os olhos, iria acabar se ele for embora.

Não tem o nome na história
Quem primeiro nos provou.
O que é certo é que o farçola
Colheu, comeu e gostou.

Com a bela descoberta
Do patriarca Noé,
Nasceu o licor divino
Que às vezes causa banzé.

Bendito seja
O pai Noé
Que de nós tirou o vinho
E água-pé.

 O vinho alegra
 Mais que o café.
 Se é bom impele à folgança
 Sem banzé.

Tratadas com mil desvelos
Nas Beiras, no Douro e Minho,
Tanto espremem que nos tiram
O mais variado vinho.

Há quem coma nas vindimas
Uma cestada de cachos.
Nalguns vem dor de barriga
Mas nunca ficam borrachos.

Bendito seja, etc. etc.

         Nada. Não quer ouvir mais nada. Chega de tanto trabalhar para os outros. Até a couve, o feijão e o repolho lhe rogam que fique.

         Manuel da Fonte – “A couve é macia, mas enquanto os outros comem as folhas eu tenho de contentar-me com os talos; o feijão é lindo e graúdo, mas para mim fica o miúdo e o que está furado; e o repolho sai fechado das minhas mãos para outros abrirem. Não, quero mudar de vida, estou cansado de ser pobre e escarnecido.
          
Moinhos 
Lá no alto da serra as velas do moinho
Rodam, rodam sem cessar

Coro
Sim, as velas do moinho

Moinhos
Coração bate mansinho
Não te queiras apressar (bis, o coro)

Lá no alto da serra as rodas do moinho
Moem, moem sem cessar.

Coro
Sim, as rodas do moinho

Moinhos
Teu segredo nem baixinho
Lho podemos confiar (bis, o coro)

Coro
Trigo loiro, trigo bendito
Cresce, cresce, cresce sem cessar.
No teu mistério, mistério infinito
Para a vida hás-de tornar (bis)

         Seus ouvidos estão fechados. Não ouve nada. A sua decisão é inabalável. Nem quando o Ti João da Quinta, o pai de Rosa, o tenta chamar à razão, não acede. “Não há felicidade com a pobreza”. Aquela voz que lhe oferece oiro aos punhados há-de encontrá-la. E quando fôr rico, muito rico, havia de voltar. Não esquecia a Rosa, não senhor. Mas, primeiro, havia de achar a fortuna. Iria em sua busca e depois voltaria.

         Vendeu, por dez contos de reis, a terra que seu pai lhe deixara, vestiu o seu fato domingueiro e, trouxa na mão com os seus poucos haveres, aí vai ele, deixando a aldeia.

  Parto e não levo saudades
  Terra de miséria e dor.
  Tu fôste sempre madrasta
  Deste infeliz cavador.

  Vou em busca da ventura
  E de riqueza também.
  Pode ser que em terra estranha
  Ache os carinhos de mãe.

   Nasci pobre e sempre pobre
   Numa vida amargurada,
   Do sol nado até à noite
   Vergado ao peso da enxada.

   Sem pai nem mãe nem amigos
   Sem grata recordação
   Parto e não levo tristeza
   Levo livre o coração.

         No palácio da Rainha das Flores, a corte está reunida.              (com fundo musical próprio, declama-se o poema da história do Pagem)

   Tendes a alvura do lírio
   E a forma esbelta da rosa
   Sois a Rainha das Flores
   Porque sois a mais formosa
   Mais formosa.

   Uma andorinha
   Vinda do sul
   Quando voava
   Em pleno azul,
   Ouviu o canto
   Dum rouxinol
   Que da alvorada
    Ao pôr do sol,
    Soltava meiga
   Canção d’amor,
   Aos tristes ecos
   Do pinheiral.
   Pobre andorinha!
   Ouvindo tal,
   Ficou rendida
   Duma paixão
   E se escondeu
   Na solidão.
   Em poucas horas
   Ali morreu (bis)
   Dessa paixão.

   Abelhas, flores
   E borboletas,
   São sempre encanto
   Para os poetas.
   Somos da natureza
   Brilho, aroma e beleza.


         O segundo acto começa noutro palácio, este o da Grã-Duquesa de Tavarede. O governo encontra-se reunido de urgência.

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