A Merenda Grande (de 'O Sonho do Cavador')
A vida na aldeia continuava.
Os costumes não se haviam alterado. As tesouras, como sempre, iam cortando nas
casacas alheias; o amola-facas-tesouras dava-lhes umas ajudas. Afinal, nem o
relógio ainda conseguira fazer-se ouvir badalar na torre da igreja! O Manuel da
Fonte chega à aldeia. Saudoso, enche os olhos com a alegria da paisagem da
terra. Anoitece. Ouve-se, então, o sino da torre da igreja tocando as
trindades.
Trindades – “Trindades na aldeia, são horas de ceia... Há tanto
tempo que o povo não nos ouve. Não há quem queira badalar-nos no sino da torre.
E fazemos falta. Trindades!... De manhã, dizemos ao cavador que é a hora de
erguer a enxada para a labuta do pão; à tarde, anunciamos-lhes o fim da tarefa
e chamamo-lo a casa. Trindades na aldeia, são horas de ceia...”.
É
sol posto, finda o dia,
Tocam
trindades na aldeia.
O
cavador volta a casa
Pois
que são horas da ceia.
Todo
o dia a sua enxada
Trabalhou
sem descansar,
Ganhou
o pão da família,
É
noite, vai repousar.
Manuel da Fonte resolve-se. Procura Rosa, a sua noiva. Ainda
o esperaria ela? Ainda o quereria?
Rosa
O
meu amor,
O
meu amor!
Meu
peito estremece,
Bate
o coração,
Com
mais vigor.
Minha
alma entontece
Embriagada
de comoção.
O
meu amor!
O
meu amor!
Embriagada
de comoção
Minha
alma entontece,
Meu
peito estremece,
Bate
o coração
Com
mais vigor.
Manuel
Rosita,
minha vida!
Meu
casto e puro anelo!
Rosa
Manuel,
meu bom Manuel,
Oh!
meu primeiro amor!
Manuel
A minha alma dorida
Teve
enfim guarida
No
teu olhar tão belo.
Rosa
Meu
pobre, meu pobre coração
Bate
com mais paixão
Ouvindo
o meu amor.
Ambos
No
campo onde a alvorada
É
luz, perfume e cor
Perfume,
luz e cor!
A
alma enamorada
De
alegria, de alegria
Não
sonhada
Só
nos fala de amor.
E
que outro pensamento
Ali
teria mais dura
Mais
dura!
Se
nesse encantamento
A
vida toma alento,
Paz,
conforto e ventura!
Se
falam dele a planta,
A
terra, a rocha, a flor,
Se
entre beleza tanta
Tudo
ri, tudo canta
O
seu eterno amor!
Vem
pois, ó minha bela,
Ouve
a prece meiga e singela
De
quem vive a sonhar
A
sonhar
Num
casto e doce enleio!
Vem
viver!
Vem
amar!
O
céu será capela
E
farei meu altar
Bem
junto do teu seio
Para
dormir, sonhar...
Perdoou-lhe. Vinha mais
pobre? Não interessava. Nunca tinha tido a ideia da riqueza e quanto à enxada,
essa guardara-a o Ti João da Quinta. Ali estava ela à sua espera. E quando
Manuel da Fonte abraça Rosa, sob a benção de seu pai, entra um rancho de
cavadores e ceifeiras que saudam, alegremente, o seu regresso. Voltavam a casa,
depois de mais um dia nas sachas. E, como sempre, sem tristezas nas suas almas
de gente simples, mas puras, honrados com a fortuna do trabalho, que, ao final,
era toda a sua grande riqueza.
Coro
Desde manhã ao sol posto,
Arado
ou foice na mão,
Seja
Inverno ou seja Agosto,
Ceifamos
a loira espiga
Ou
pomos à terra o grão.
Cavadores
Vamos
todos sem cansaço
Na
terra dura
Cavar,
cavar.
A
força do nosso braço
Traz
a fartura
Do
nosso lar.
Ceifeiras
Somos
as ledas ceifeiras
Que
vão as messes trigueiras
Segar,
ceifar,
Sempre
ligeiras,
Sempre
a cantar,
A
cantar.
Coro
Cavar, Ceifar,
Ceifar,
cavar,
Sem
descansar.
I N T E R V A L O
Sem comentários:
Enviar um comentário