sexta-feira, 2 de maio de 2014

Operetas em Tavarede - 15

   

             Poeta e pintor Alberto de Lacerda

   Antes de avançarmos na nossa narração, queremos recordar um acontecimento, com esta peça, que, sobremaneira, honrou o nosso grupo. No dia 18 de Julho de 1931, a Sociedade de Instrução Tavaredense foi ao Casino Peninsular, na Figueira, representá-la, em espectáculo de benefício ao Jardim-Escola João de Deus. Honrosamente, quis colaborar neste espectáculo a famosa actriz Ilda Stichini. Era uma grande admiradora do nosso teatro e, por mais de uma vez, esteve aqui, em Tavarede, visitando-nos. Vamos ler um pedacinho que extraímos duma crítica.
       “No primeiro acto houve a nota culminante daquela noite de festa: Ilda Stichini disse primorosamente, com o seu formoso talento e as suas poderosas faculdades de interpretação, A Fantasia e O Riso, belos versos dum artista de pintura que é também um distinto poeta – Alberto de Lacerda. Quando Ilda Stichini apareceu em cena, a assistência irrompeu numa extraordinária, prolongada e calorosa ovação, que bem lhe deve ter mostrado como é querida da plateia figueirense. Os versos da Fantasia, disse-os a Artista ilustre com a vibração da sua delicada sensibilidade e a magia da sua voz. A assistência aplaudiu demoradamente, com sincero entusiasmo. Mas o número do Riso, que Alberto de Lacerda escrevera expressamente para Ilda Stichini, deixou verdadeiramente encantados os que o ouviram e se manifestaram com uma das mais vibrantes e expontâneas e demoradas ovações que naquele teatro se têm ouvido”.

         Vamos, então, à história de “A Cigarra e a Formiga”. A primeira personagem a surgir em cena é o “Prólogo”. Ouçamo-lo.

       Ora então...
       Santas noites nos dê Deus!
       Sabeis porque estou contente?
       =Porque estou co’a minha gente,
       Porque me vejo entre os meus,
       No meu torrão!
       O que venho cá fazer?
       Na aldeia como na aldeia:
       Vim aqui, depois da ceia,
       Ao cavaco, p’ra entreter...
       Se havia de ir à taberna
       E sair em pura perda
       A dar a direita à esquerda,
       Trocando perna com perna,
       Vim ao teatro. E então?!...
       Cada um faz o que pode...
       Como o povinho está junto
       E eu tirei cá do bestunto
       Uma formosa invenção
       P’ra divertir o pagode,
       Vou contar-lhes uma história,
       = Coisa tão nova e tão linda
       Que ninguém ouviu ainda
       E doutra não há memória.
       Eu até aposto a cabeça
       (De qualquer dentre vocês...)
       Se houver alguém que a conheça
       E a ouvisse alguma vez.
       P’lo nome parece antiga.
       Mas é novinha, palavra!
       Pensei-a ontem, na cama,
       E é toda da minha lavra.
       E se querem que lhes diga
       Como se chama,
       = Isso é p’ra já:
       “A Cigarra e a Formiga”,
       Ora aí está.

       A Cigarra, velha amiga
       De jovial
       Cantoria.
       Para que o mundo conheça,
       Representa nesta peça
       O ideal,
       A fantasia.
       E esta cara de fuínha,
       “A opulenta
       Vizinha
       Dona Formiga de tal”,
       Vereis o que representa,
       E cotejai os valores
       = Que cada qual tem o seu =
       Enquanto eu
       Me recolho aos bastidores.

         Cigarras e Formigas, figuras simbólicas, na presença umas das outras, tentam fazer valer os seus predicados e mostrar os defeitos das rivais.

     Coro
     Cigarras e formigas
     Não têm o mesmo ideal:
      Os cantos e as fadigas
      Ligam mal.
       Porém, talvez um dia,
       A alguém que tenha jeito,
       A sua companhia
       Dê proveito.
       As qualidades boas
       Que cada uma tem,
       Talvez que nas pessoas
        Liguem bem.

        Cigarra, formiga,
        Afinal
        Talvez façam liga
        Menos mal.

 Cigarra
         Assim,
         Com minha alegria...

Formiga
          Assim,
         Com minha porfia,

Coro
           Talvez um dia,
           Em liga bizarra,
           Formiga e cigarra
           Façam companhia.

         Em casa da Cigarra e da Formiga começam, então, a passar algumas figuras simbólicas que, cantando ou recitando, se apresentam ao público. Não vamos recordar todas essas figuras. Quase que aleatoriamente, fizemos uma pequena escolha. A primeira a apresentar-se foi a “Alegria de Viver”

  Em tudo pôs a mão do Criador
  Um filtro singular!
  A essência da ventura e do Amor
  Respira-se no ar!
  O Eden, afinal,
  É este ambiente
  Que o homem consciente,
  Para obter,
  Dispende unicamente
  O esforço de nascer.
  Para quem fôr
  Da alheia dor
  A caridade,
  É sempre o amor
  O mor factor
  Da f’licidade.
  Pois cada dia
  Que se porfia
  Nessa virtude,
  É, por magia,
  Só de alegria
   E plenitude.

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