sábado, 16 de fevereiro de 2013

O Associativismo em Tavarede - 10




Estandarte do Grupo de Instrução Tavaredense

          O estandarte do Grupo de Instrução foi inaugurado no domingo de Pascoela, tendo sido benzido à missa solene. “É nos dificil fazer uma apreciação exacta do valor que possui aquela rica obra de arte, a que a exma. srª. D. Rita Jardim, sua bordadora, e o sr. Francisco Gil, seu desenhador, souberam imprimir um cunho altamente artístico, de magnífico trabalho e de inexcidivel beleza. A bandeira, de fina seda, de um lado cor de grenat e do outro verde-mar, tem ao centro daquela face um lindo emblema simbolizando a instrução, bordado a ouro, prata e matiz, e ao centro desta uma elegante lira toda bordada a prata, ao cimo da qual brilha a figura do sol, expandindo aurifulgentes raios de oiro. A franja é toda de prata, as fitas de seda e moirée, e a haste é uma pinha toda dourada. (não foi possível, devido ao seu estado, fotografar o verso do estandarte)

         Em suma, aquele estandarte é um distinto trabalho que demonstra ser feito por artistas de verdadeiro mérito, há muito evidenciado por tantos outros justamente apreciados por quem melhor do que nós sabe avaliar o merecimento de tão delicados serviços. Se o sr. Francisco Gil se esmerou em traçar um desenho simples mas muito significativo, a exma. srª. D. Rita Jardim ainda mais se esmerou interpretando belamente a ideia daquele ilustre professor, e produzindo assim uma bordadura primorosa que realça excelentemente no meio das lindíssimas cores da seda da bandeira. Honra lhes seja”. Acrescentemos, desde já, que este estandarte acabou por servir à Sociedade de Instrução Tavaredense até ao ano de 1927.

         Referimos atrás que não existia rivalidade entre as colectividades tavaredenses. Eis uma notícia que o confirma. “Na tarde do último domingo assistimos a uma das festas mais simpáticas que aqui temos presenciado.O novel Grupo Instrução Tavaredense foi cumprimentar a Estudantina, sociedade sua congénere, e a recepção afectuosa e cativante feita àquele grupo foi de todo o ponto muito honrosa para as duas corporações musicais. Agradeceu a amavel visita o director e regente da Estudantina, Gentil Ribeiro.

         O Grupo Instrução executou com muito agrado dos ouvintes uma sinfonia e algumas valsas muito bonitas, pelo que grangeou gerais aplausos.     Seguiu-se-lhe um abundante copo de água e, entre a alegria e prazer que enchia todos os corações, eram lançados calorosos vivas ao Grupo Instrução, á Estudantina, a Tavarede, etc.   O grupo visitante tocou ainda o seu hino, e durante esse tempo foram cruzados os estandartes das duas sociedades. Devemos confessar que, de toda a festa, foi este quadro o mais tocante e o que mais nos impressionou, por encerrar em si um mito de tudo quanto é admirável, sublime e honroso para uma população pequenina como é a nossa: a união fraternal de ambas as sociedades, mais uma vez assim evidenciada, e a demonstração da amizade que, com os seus sagrados laços, une todos os rapazes.    

E é assim que deve ser. Isto é um grande exemplo para outras terras em que os espíritos se não congregam para seguir o caminho da paz e união. Por isso os nossos patrícios compreendem bem o quanto é mais digno reinar entre si a franca amizade, desprezando os caprichos e questiúnculas fomentadas por cérebros rudes e pequeninos, que só provam o seu atraso moral e intelectual.       Nestes termos falou na ocasião o sócio da Estudantina, António de Almeida Cruz, o qual, depois de proferir o seu belo improviso, recebeu uma veemente salva de palmas. E nós, appoiando-o também daqui, apoiamos com mais ardor as suas últimas e vibrantes frases, que incitavam os sócios dos dois grupos ali reunidos a continuarem a estudar e a avançar no seu caminho, que é o da civilisação, do progresso e da fraternidade!

         Oxalá ele fosse imitado pelos rapazes doutras terras mais populosas e mais importantes do concelho da Figueira. Orgulhamo-nos de dizer isto, creiam-no. O Grupo Instrução retirou depois, sendo acompanhado até à sua aula pelos sócios da Estudantina. Ali foi também servido a estes um delicado copo de água, com o qual, e entre alguns vivas, terminou a simpática festa de domingo”.

         Prosseguiam os espectáculos. Não interessa registar todas as notícias, mas não resistimos a transcrever mais esta, especialmente para deixar registo de alguns amadores. “Apesar das fortes e persistentes bátegas de água com que a noite de sábado passado se dignou mimosear-nos, o teatro do nosso bom amigo sr. João dos Santos bem depressa se encheu de espectadores, que ali iam assistir à récita anunciada para aquele dia e promovida pelo Grupo Instrução Tavaredense. A primeira parte do espectáculo foi preenchida pelo grupo musical, que executou o seu hino, um bonito ordinário e a valsa Riso e Assobio. Esta música, como originalidade pouco conhecida aqui, despertou da plateia muitas gargalhadas. Nesta ocasião a exma. srª D. Maria Águas Ferreira ofereceu ao Grupo uma linda e valiosa fita de seda, colocando-a no estandarte da mesma colectividade.


         Seguiu-se a representação da comédia Aflicções d’um perdigoto, cujo desempenho foi confiado ás meninas Felismina e Leontina, e a Santos Júnior e José Augusto. Os espectadores manifestaram o seu agrado, palmeando-os com frenesi. Do entre-acto Mano João sairam-se sofrivelmente Santos Júnior e José Augusto. Fechou o espectáculo a velha e aplaudida comédia Por causa d’um algarismo. Nela tomaram parte, além de todos os amadores já acima mencionados, J. M. de Almeida Cruz, Manuel Tondela e J. Cordeiro Júnior. Os dois primeiros estavam bem nos seus papéis de Ambrósio, sacristão e de Colaço, confeiteiro. Felismina, Leontina, J. Augusto e J. Cordeiro, ainda que formassem sempre um razoável conjunto, são ainda novatos na dificil arte de Talma e necessitam de mais um pouco de prática e estudo, para poderem pisar o palco com uma certa confiança em si próprios. Ainda assim, são dignos de todos os elogios, e muito os felicitamos por verem que as suas canseiras têm sido sempre coroadas dos mais expontâneos aplausos. Ao terminar esta comédia foram atirados para o proscénio alguns bouquets, havendo também chamadas especiais de envolta com ardentes salvas de palmas. E assim se passou a noite de sábado”.

Achámos alguma piada ao acontecido à tuna do Grupo Instrução Tavaredense que, tal como a tuna da Estudantina, se deslocou a Montemor-o-Velho para abrilhantar os festejos em honra da Senhora do Desterro. “…O melhor, porém, de tudo e o que mais agradou de toda a festa pela graça que todos lhe acharam, foi que, quando à tarde, as raparigas do "Beira Alta" se achavam na praça divertindo-nos com as suas danças cheias de vivacidade, ao som das suaves harmonias do "Grupo Instrução Tavaredense", eis que de repente são surpreendidas por uma fanfarra da Ereira, regida pelo nosso amigo o sr. Henrique Fernandes Duarte, a qual, rompendo por ali dentro, seguida por um rancho do mesmo lugar, em breve ficou senhora de todo o campo. Cheguei, vi e venci. Foi a sorte que coube ao sr. Fernandes Duarte, que assim que chegou, logo derrotou e pôs tudo a um canto, devido ao mimo e grande gosto com que os seus músicos tocavam. Com efeito! Por mais esforços que os tunos de Tavarede fizessem por se ouvir, nunca o conseguiram nem conseguiriam ainda mesmo que rebentassem as cordas dos instrumentos”. Realmente teve piada e acrescentamos que, nesse ano, também a Estudantina ali foi tocar no mesmo dia.

E o século dezanove terminou com a representação do ‘Presépio’ pelo grupo da Estudantina. Mantinha-se uma tradição de muitas décadas. E, tudo o indicava, o Associativismo estava definitivamente enraizado na terra do limonete. As duas associações encontravam-se em plena actividade. Eram frequentes os espectáculos teatrais e as suas tunas desejadas em muitas festas em diversas terras.


Presépio no Grupo M.I. Tavaredense

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