quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

RECORDAÇÕES DE TAVAREDE

Como iamos dizendo - ás cegas percorriamos as ruas de Tavarede sem um raio de luz, e a este propósito, abrimos uns parenthesis, para lembrar á exma. camara municipal a necessidade de ali mandar collocar meia duzia de candieiros a petroleo, o que pouco custaria, attendendo a que existem no armazem das inutilidades alguns, que pertenceram á antiga illuminação da cidade e que poderiam ser aproveitados.


Tavarede, assim como Buarcos, em um futuro mais ou menos proximo, constituirão bairros da cidade, e isso prevê-se pelo continuo estender de casaria pelas estradas que mutuamente as liga. Devia isso trazer um encargo, mais, para o magro cofre municipal, no entanto, mais um real ou dois que cada contribuinte pagasse, sair-lhe-ia da algibeira sem clamor, compensado com o beneficio recebido. Depois, por Tavarede faz se transito nocturno pela estrada que atravessa a povoação, e serve Buarcos á exportação das suas pescarias que se dirigem por ali a Brenha e outros pontos de seus áros.


Uma tal medida, tomada, tendo por base estas rapidas considerações que fazemos, com certeza alliadas a outras que agora não explanamos, seria bem acolhida e digna de benemerencia uma camara que a pozesse em pratica. Oxalá a nossa opinião fosse ouvida.


* * *


Prosseguindo... Palpando (com os pés) aquelle solo de Tavarede e de noite, como diziamos, encontramos um rapazito dos nossos passados tempos - hoje homem - o Joaquim Nunes, a quem pedimos para nos ensinar a morada d’um dos contemporaneos dos primeiros tempos das nossas visitas á povoação, que nunca nos passou da memoria, além d’outras cousas, pelo vermos representar no theatro do Paço de Tavarede, n’um drama - Os miseraveis de Londres - n’um papel em que dizia com toda a ingenuidade local: - Jorze, Jorze! se tens frio não tirel-o o capote...


Este contemporaneo dos bons tempos era, e é - um rapaz, trabalhador, um mouro no trabalho - Antonio d’Oliveira. Mal diria elle que, áquella hora, o procurava, depois d’um interregno de vinte e tantos annos!


Batemos lhe á porta, nós e o Joaquim Nunes.


Ignorando quem seria respondeu-nos da cama:
“Já estou deitado!”


Ao outro dia ficou com pena de se não ter levantado, quando soube quem eramos.


* * *


Ainda com o Nunes por companheiro pedimos lhe para nos indicar a morada de Antonio da Silva Proa e dizendo-nos estar atarefado na construcção d’um theatrinho, lá para o centro da povoação, ali fomos.


Encontrámol-o com dois carpinteiros que trabalhavam no tecido do palco, e no meio de admirações de me ver n’aquella povoação foi me dando o braço arrastando-me a sua casa, aonde fomos dar.


A sua esposa, a Emilia do Cura, d’outros tempos, apresentava-se ainda com a sua natural bonhomia, affavel, boa moça como então era.


Enleiamos uns cumprimentos rapidos cheios de alegria mutua, e o Antonio Proa, arrastando-nos sempre, e sempre prazenteiro, ferrou comnosco na sua adega...


Pouco tempo nos detivemos n’aquella mansão, porque, afinal, o Antonio tinha o theatrito a fervilhar lhe na cabeça. Era preciso lá ir. Palco, panno da bocca, bastidores, etc., absorviam-no.


Se não conhecem o Antonio a que nos referimos, dir-lhe-emos que é o genio mais typico do genero fervilha. Não pára, não descansa, e em tendo que levar por deante um emprehendimento é capaz de não dormir seis dias ou mais.


Generoso como o pae, que a fortuna ainda lhe conserva, é como elle intelligente, e um operario esculptor digno de menção no nosso acanhado meio. (Gazeta da Figueira - 14-3-1896)

Teatro da S.I.T. - Notas e Crírticas - 9

1932

RÉCITA DE ANIVERSÁRIO

Mais uma vez a benemérita Sociedade de Instrução Tavaredense pôde apreciar o número e a qualidade das dedicações e simpatias que a acompanham e facilitam a sua acção meritória.


O 28º aniversário da sua fundação foi brilhantemente comemorado. Tavarede esteve em festa no sábado e no domingo. A população tavaredense associou-se com entusiasmo à comemoração, e fê-lo com sinceridade, porque sabe como tem sido eficaz e proveitosa a acção educativa da Sociedade de Instrução, através da sua escola nocturna, absolutamente gratuita e pública, que mantém há cêrca de 30 anos, e do seu teatro.


Bem haja a benemérita colectividade pelo bem que tem feito, e que novas prosperidades experimente para que prossiga o seu caminho!


No sábado à noite realizou-se no teatro a récita de gala. A sala apresentava um belo aspecto festivo com a sua decoração: colgaduras de damasco artisticamente colocadas nas paredes e balcão, muitas flores, etc. A assistência, muitos sócios, convidados, famílias distintas da Figueira, etc., era numerosíssima. Todos os lugares ocupados e muitas pessoas comprimindo-se nas coxias.


Abriu a récita com a encantadora peça em 1 acto As Três Gerações, original do ilustre dramaturgo dr. Ramada Curto, que gentilmente autorizara a Sociedade de Instrução a representar esta sua obra. A peça tem três papéis – A Avó (Maria Teresa de Oliveira), A Filha (Violinda Medina e Silva) e A Neta (Guilhermina de Oliveira) – todos de grande responsabilidade. Carolina de Oliveira marcou bem a criada. O desempenho deixou a assistência admiravelmente impressionada. As palmas foram vibrantes e sucessivas ovações fizeram subiu o pano repetidas vezes. Foram notados os primores da montagem e o rigor das toilettes. Um acto de verdadeira arte, emfim.


A 2ª parte foi constituída por um acto de recitativos, no qual tomaram parte os amadores: António Broeiro, Manuel Nogueira, Maria Teresa de Oliveira, António Santos, Emília Monteiro, João Cascão, Guilhermina Oliveira, Jaime Broeiro e António Graça, que disseram versos de autores portugueses e brasileiros, sendo todos justamente aplaudidos.


E a récita fechou com a opereta A Herança do 103, desempenhada por Violinda Medina e Silva, José Silva, Manuel Nogueira e Pedro Medina. O desempenho fez rir os espectadores, que aplaudiram calorosamente os intérpretes. Foi especialmente notada a excelente voz de Violinda, que cantou primorosamente a sua parte, e em especial o dueto em que brilhou com Manuel Nogueira e que foi aplaudido com raro entusiasmo. Para o brilho do espectáculo contribuiu a excelente orquestra, sob a direcção do distinto amador sr. António Simões.


Foi uma noite de intensa alegria que a todos impressionou agradavelmente. (Voz da Justiça – 01.20)

AS PUPILAS DO SR. REITOR

Podemos dar hoje a notícia de que o grupo cénico da Sociedade de Instrução inicou já os ensaios duma peça que vai constituir, tal como sucedeu com Os Fidalgos da Casa Mourisca, um êxito extraordinário: trata-se das Pupilas do Sr. Reitor – mais uma peça arrancada à obra tão portuguesa e tão bela de Júlio Deniz, e é possível ainda que para o repertório da Sociedade de Instrução Tavaredense entre também A Morgadinha dos Canaviais.


As Pupilas do Sr. Reitor são um trabalho do distinto escritor teatral Penha Coutinho, em 3 actos e 4 quadros, com partitura do grande e saudoso maestro Felipe Duarte, em 23 números de lindíssima música – obra musical de alto valor em que se reflecte o típico sabor popular e o colorido campesino do romance, digna do nome do insigne compositor e cheia de dificuldades que a superior direcção do distinto amador António Simões e a competência e boa vontade de José Nunes Medina, auxiliado por outros elementos locais, hão de vencer.


A representação deve manter o nome do grupo cénico à altura a que subiu com Os Fidalgos da Casa Mourisca.


As duas pupilas – Clara e Margarida – personagens de responsabilidade e com exigências na partitura, são interpretadas por Violinda Medina Silva e Emília Monteiro, duas distintas amadoras, de excelente voz; Maria Teresa de Oliveira tem a seu cargo dois papéis do seu género, em que vai brilhar como na Ana do Vedor – a mulher do tendeiro João da Esquina e a governanta do Reitor; nas principais personagens masculinas: à cabeça, no João Semana, António Graça; Jaime Broeiro, no José das Dornas; António Broeiro, no Reitor; João Cascão, no Pedro; Manuel Nogueira, no Daniel; Francisco Carvalho, no João da Esquina; e noutros papéis, Guilhermina de Oliveira, Carolina de Oliveira, António Santos, José Vigário, etc., e um numeroso grupo coral. Os diversos coros, e são muitos nos três actos, todos a 3 e 4 vozes.


A montagem está a ser preparada com todo o rigor, de modo a que a representação das Pupilas constitua no nosso meio um acontecimento de grande valor artístico. As quatro cenas, completamente novas, - uma para cada acto, tôdas diferentes – estão a ser conscienciosamente estudadas pelo distinto artista sr. Rogério Reynaud, que apresentará um trabalho magnífico digno de ser admirado e que será uma das suas melhores obras no género. O guarda-roupa vai ser executado a rigor por figurinos da época, e não será também descurado o mobiliário, para que tudo forme um conjunto artístico que corresponda aos esforços empenhados.


A representação das Pupilas do Sr. Reitor, tal como a teremos em Tavarede, exige sacrifícios materiais – não falamos nos de outra ordem, porque êsses todos os fazem de boa vontade – que só dificilmente poderão ser cobertos. Embora: a Sociedade de Instrução não se esquece que o seu teatro o utiliza como instrumento de educação e não de lucros monetários. Atendendo a isto, o autor da peça, sr. Penha Coutinho, e a viúva do maestro Felipe Duarte cederam a obra à Sociedade de Instrução Tavaredense com dispensa absoluta de todos os direitos, o que registamos com o louvor que o acto merece.


As Pupilas do Sr. Reitor devem subir à cena pela Páscoa. (Voz da Justiça – 02.13)

AS PUPILAS DO SR. REITOR

Ao notável esfôrço da Sociedade de Instrução Tavaredense, pondo em cena As Pupilas do Sr. Reitor com inegável carinho e absoluta probidade artística, correspondeu o grande êxito da estreia, que vai afirmar-se de récita para récita.


Impressão de conjunto admirável. Interpretação excelente em todos os papéis, alguns feitos brilhantemente; guarda-roupa bem executado, feito a rigor, seguindo os desenhos de Roque Gameiro na edição de luxo do romance; cenários próprios, de bom efeito. O distinto artista Rogério Reynaud tem nas cenas que pintou para Tavarede um dos seus melhores trabalhos. O 1º acto é lindo, e ficará perfeito com os retoques que não foi possível dar-lhe para a primeira récita, por falta de tempo; mas a cena do 2º acto, a eira do José das Dornas onde se faz a desfolhada, em noite de luar, é esplêndido de desenho, de tonalidade e de efeito teatral. Tôda a montagem representa um esfôrço grande, digno de nota e nada vulgar em amadores. Acrescente-se a tudo isto a bela partitura de Felipe Duarte – 23 números de música deliciosamente portuguesa, de melodia que cai agradavelmente no ouvido e de esplêndidos efeitos de orquestração que o distinto amador António Simões ensaiou com a sua competência – e ter-se-à a explicação do êxito incontestável obtido pela representação das Pupilas do Sr. Reitor. Repete-se no próximo sábado a opereta, com a certeza de que a lotação será esgotada.


O espectáculo começou tarde, em virtude de dificuldades na montagem do cenário. E o último quadro teve de ser representado com cenário velho, por não estar concluído o novo. Estes inconvenientes estão removidos, e assim a próxima récita começará às 22 horas prefixas e acabará cedo, e será apresentado no último quadro o cenário próprio, a sala duma casa portuguesa, cheia de carácter, também um bom trabalho de Reynaud.


Na montra da Casa das Jóias, à Praça Nova, estão expostas as maquettes dos cenários. (Voz da Justiça – 04.13)

A REPRESENTAÇÃO DA OPERETA AS PUPILAS DO SR. REITOR

O excelente grupo cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense obteve no sábado um novo e grande triunfo, aliás já previsto; a opereta As Pupilas do Sr. Reitor, fica no seu reportório, depois dos Fidalgos da Casa Mourisca, como um belo êxito artístico.


A interpretação foi sempre boa, das primeiras figuras às simples rábulas, num conjunto harmonioso e brilhante. Nas duas protagonistas vimos duas amadoras distintas: Emília Monteiro na triste Margarida, e Violinda Medina e Silva, na alegre Clara, a que deu a precisa vivacidade – ambas primorosamente. João Semana encontrou em António Graça o intérprete perfeito, o mesmo devendo dizer-se de Jaime Broeiro, no José das Dornas – dois tipos magistralmente desenhados, representação alegre, dando os efeitos cómicos com a maior naturalidade, sem um exagêro. António Broeiro compôs a primor a figura do bondoso Reitor, João Cascão e Manuel Nogueira, deram o carácter próprio ao rústico Pedro e ao volúvel Daniel. Maria Teresa fez com justo sabor as duas características – a mulher do tendeiro e a criada do João Semana; e F. Carvalho tem no João da Esquina um dos melhores papéis que lhe conhecemos. Uma rábula bem feita: a Francisca, por Guilhermina de Oliveira.


Guarda-roupa a rigor e cenários de belo efeito – três cenas diferentes pintadas pelo distinto artista sr. R. Reynaud (a cena do 4º quadro só no próximo espectáculo pode ser apresentada). A música é lindíssima, bem portuguesa, com a assinatura do grande e saudoso maestro Felipe Duarte, que valorizou extraordinariamente a adaptação do experimentado escritor teatral Penha Coutinho. Pena foi que o número de abertura – a linda canção das lavadeiras – saísse com desafinação nas vozes, o que foi devido ao nervosismo com que o espectáculo começou a hora tardíssima (passava das 23!) por virtude da demora na montagem do cenário. O dueto das duas pupilas no 1º acto, foi magistralmente cantado por Emília Monteiro e Violinda Medina, que ouviram uma grande ovação; depois o grande concertante – a chegada do novo médico – difícil e de belo efeito, também aplaudido sem favor, e o côro final. No 2º acto dominou a Canção da Cabreira, em que sobressaiu a esplêndida voz de Violinda acompanhada pelo côro – quatro vozes – que arrebatou a assistência. Poucas vezes se tem feito neste teatro tão demorada e calorosa ovação. Outros números ainda foram aplaudidos e todos os restantes coros foram cantados com perfeita afinação.


Merecem referência as caracterizações de António Esteves, felicíssimas.


Para o belo êxito das Pupilas contribuíram, além dos elementos citados, muitas dedicações desinteressadas e a competência e bom gôsto de dedicados amigos da SIT. É nosso dever registar os nomes de António Simões, que regeu a excelente orquestra – constituída por amadores mas formando um conjunto que se ouve com prazer – e dirigiu superiormente tôda a parte musical; José Medina, que ensaiou as vozes, dispendendo um esfôrço enorme em que foi ajudado por José Silva e Jerónimo Ferreira; e D. Belmira Pinto dos Santos e Pedro Campos Santos, que dirigiram a execução do guarda-roupa.


A todos, e à Sociedade de Instrução, dirigimos as nossas felicitações pelo novo êxito alcançado.


As Pupilas do Sr. Reitor repetem-se no sábado. (Voz da Justiça – 04.13)


EXCURSÃO A TOMAR

No próximo sábado e domingo vai o grupo a Sociedade de Instrução Tavaredense, constituído por 80 pessoas, a Tomar, onde representará, no sábado, As Pupilas do Sr. Reitor e no domingo, Os Fidalgos da Casa Mourisca, revertendo o produto destas duas récitas em benefício da instituição “Sopa dos Pobres”, daquela cidade.


A visita do excelente grupo tavaredense é esperada com entusiasmo pelo povo tomarense, não só pelo fim beneficente das duas récitas como também pelas inesquecíveis impressões que ficaram da visita de há dois anos. Tomar, que tão galhardamente recebe os seus hóspedes, acolheu então os excursionistas com inegualável gentileza.


As notícias vindas daquela cidade dizem que é grande o entusiasmo e que o teatro vai encher-se nas duas noites. E o simpático grupo terá o mais carinhoso acolhimento.


Também aqui há muito entusiasmo por esta visita. Tomar é uma das mais belas entre as belas terras de Portugal.


A sua paisagem, os seus encantos naturais, o seu pequeno e maravilhoso jardim, as margens formosíssimas do Nabão são motivos de encantamento para o espírito do visitante; não mais se esquecem; mas o tesoiro extraordinário das suas riquezas monumentais – a jóia incomparável do Convento de Cristo, Santa Iria, Nossa Senhora da Conceição, os Arcos, etc. – impõem a todos os portugueses o dever duma visita a Tomar. Quem uma vez ali vai, fica de tal modo enamorado das suas belezas que não tem remédio senão voltar para... reacender saudades.

Muitas pessoas desta cidade desejam aproveitar a ida do grupo da Sociedade de Instrução para visitarem Tomar. A viagem pode fazer-se em excelentes condições de comodidade e economia, utilizando a camioneta dos Serviços Municipalizados, que partirá no sábado à tarde e regressará de Tomar na noite de domingo. A inscrição para esta viagem, que custa 25$00, ida e volta, está aberta. (Voz da Justiça – 06.15)

A VISITA A TOMAR

A visita da Sociedade de Instrução Tavaredense constituiu por assim dizer o maior acontecimento que ultimamente aqui se tem registado.


Já o fim altruísta que trazia a Tomar tão simpática Sociedade, já porque ainda não tinham sido esquecidas as magníficas impressões deixadas há dois anos, tudo contribuiu para o bom acolhimento que aos tavaredenses foi dispensado e para o entusiasmo que durante dois dias se observou pela estada entre nós de tão amáveis visitantes.


Conforme fôra anunciado, a Sociedade de Instrução Tavaredense chegou a Tomar pelas 15 horas de sábado. O grupo era constituído por mais de 80 pessoas.


Na estação do caminho de ferro, além de muitos amigos, correspondentes dos jornais e povo, aguardava os visitantes a Comissão da Sopa dos Pobres, presidida pelo sr. capitão Jesus.
Depois de feitas as apresentações e dadas as boas-vindas, dirigiram-se para os hotéis que lhes estavam reservados.


Ao fim da tarde chegaram vários automóveis e uma camioneta com muitas pessoas e famílias que aproveitavam esta oportunidade para visitar a nossa terra. Entre outras pessoas vimos os srs.: dr. José Cruz, dr. Manuel Lontro Mariano, Manuel Jorge Cruz, Firmino Cunha, Fernando Reis, Francisco Freitas Lopes, Eduardo Soares Catita, Araújo, Carlos Traveira, etc. etc.

Refeito da viagem, espalharam-se pouco depois pela cidade, visitando o que temos digno de menção.


Pelas 20 horas foram cumprimentados pela Sociedade Filarmónica Gualdim Pais no Hotel Nabão e pelas direcções das nossas sociedades de recreio.


À noite representou-se no teatro a linda opereta As Pupilas do Sr. Reitor, que agradou bastante. Aos principais intérpretes da peça foram oferecidos ramos de flores e a assistência aplaudiu calorosamente e fez chamadas especiais.


No domingo, a-pesar-da chuva que caíu quási tôda a manhã, continuaram as visitas aos nossos monumentos.


Às 14 horas houve no Grémio Artístico uma matinée e um “Pôrto-de-Honra” oferecidos à Sociedade de Instrução Tavaredense.


Foi uma festa cheia de alegria e entusiasmo, de perfeita confraternização entre tomarenses e visitantes.


Dançou-se animadamente, até às 20 horas. Enquanto no salão de baile se servia um chá às senhoras, num outro salão era servido o “Pôrto-de-Honra”. Usaram da palavra os srs. dr. José Cruz, dr. Lontro Mariano, Manuel Jorge Cruz, dr. Manuel Gomes Cruz, António Medina Júnior e os tomarenses António Duarte Faustino e Domingos Vístulo, que puseram em relêvo o significado desta visita e as consequências que dela resultam para a Figueira e Tomar com tão amistosas relações. Trocaram-se muitos e entusiásticos brindes, ouvindo-se, por vezes, aclamações calorosíssimas.


À noite realizou-se o segundo espectáculo, com Os Fidalgos da Casa Mourisca.


Se a impressão deixada pelas Pupilas do Sr. Reitor tinha sido boa, a dos Fidalgos da Casa Mourisca ultrapassou tudo que se possa imaginar. À medida que a peça ia decorrendo, ia também por sua vez subindo a admiração do público pelo que estava observando. O cuidado da montagem das cenas, a forma de dizer dos distintos amadores, a perfeita interpretação de A Broeiro (D. Luís), de D. Violinda Medina e Silva (Baronesa), D. Emília Monteiro (Berta), D. Maria Teresa (Ana do Vedor), António Graça (Frei Januário), Nogueira e Cascão nos filhos do velho fidalgo, etc., formando um conjunto primoroso, que dava motivo a que a assistência, como que electrizada pelo que estava vendo, aplaudisse com entusiasmo e dissesse com justiça: parecem artistas e não amadores!


Num intervalo alguns amadores de S. Martinho do Pôrto, com o seu ensaiador, também um distinto amador teatral o professor de ensino secundário naquela vila, foi ao palco saudar o grupo tavaredense e oferecer flores às amadoras. O discurso proferido pelo ensaiador do grupo de S. Martinho do Pôrto, no qual se afirmava muita admiração pela forma invulgarmente brilhante como se estava representando a peça e se elogiava a Sociedade de Instrução Tavaredense pela sua formidável obra educativa, arrancou à assistência, que enchia completamente o teatro, novas e prolongadas ovações.


Em seguida, a Comissão da Sopa dos Pobres, à frente da qual estava o sr. capitão Jesus, veio ao palco agradecer a todos os tavaredenses o seu cativante desinterêsse e a sua amabilidade em virem até nós cooperar na grande obra de assistência em que se encontravam empenhados. Estas palavras foram cobertas de ovações calorosíssimas. Tôda a sala, repleta, vibrava de entusiasmo. As ovações repetiram-se quando o director do grupo cénico tavaredense, nosso amigo sr. José Ribeiro, agradeceu.


Muitas flores, muitos aplausos e sobretudo muito entusiasmo e carinho, tudo dá motivo a que possamos afirmar terem deixado nos tomarenses as melhores impressões os dois brilhantes espectáculos que, numa hora feliz, a Sociedade de Instrução Tavaredense veio dar à nossa cidade.


Na primeira noite, a bem constituída orquestra que o distinto amador figueirense sr. António Simões nos apresentou, e que tão apreciada foi, executou, a abrir, numa simpática homenagem à nossa terra, o hino de Tomar.


Terminado o espectáculo de domingo realizou-se um baile no Grémio Artístico, que se prolongou até às 4 e meia de segunda-feira.


Os nossos simpáticos visitantes retiraram na segunda-feira, bem impressionados com o acolhimento que tiveram em Tomar, e os tomarenses viram-nos partir com saudade.


Daqui felicitamos a simpática Sociedade de Instrução Tavaredense.


=À vinda para Tomar, uma surprêsa aguardava os nossos visitantes em Caxarias: na gare da estação estavam as crianças da escola daquele lugar, tôdas levando flores e acompanhadas da nossa patrícia srª D. Iria da Fonseca Baptista e da srª D. Maria Cristina Trezentos, a cuja inteligente acção e belo espírito se deve a realização da récita infantil realizada em Caxarias e de que então demos notícia. Acompanhavam-nas ainda outras pessoas. À chegada do combóio, a srª D. Iria Baptista fez as apresentações e dirigiu saudações ao simpático grupo tavaredense, saudações que o director do grupo agradeceu com palavras de admiração pela obra daquelas senhoras e dos seus cooperadores. Às intérpretes das duas Pupilas foram oferecidos lindos ramos de cravos, bem como ao director do grupo, que por todos agradeceu, sensibilizado. No momento do combóio prosseguir a marcha, ergueram-se vivas calorosos aos tavaredenses e ao povo de Caxarias.


= Alguns rapazes tomarenses foram de automóvel, na segunda-feira, à estação de Chão das Maçãs, e ali esperaram o combóio que conduzia à Figueira os nossos visitantes, levando-lhes ramos de flores, o que deu origem a novas manifestações de carinhosa simpatia. (Voz da Justiça – 06.25)

TEATRO

Já aqui falámos na representação, em Tavarede, das Pupilas do Sr. Reitor e dos Fidalgos da Casa Mourisca. Não iremos, por isso, fazer novas referências à brilhante interpretação que as duas peças tiveram então e agora nos foi dado admirar de novo no Teatro Parque pelo excelente e por todos os motivos tão simpático grupo da Sociedade de Instrução Tavaredense.


O público que expontaneamente acorreu aos espectáculos de sábado e domingo e aplaudiu a representação das duas peças, foi justo, sem ser generoso. Pela excelente interpretação, tanto na parte declamada como na formosa e tão característica partitura que o grande e saudoso Felipe Duarte compôs para As Pupilas como pela rigorosa montagem cénica, as duas récitas constituíram dois belos espectáculos. Os oito cenários diferentes, o guarda-roupa, todo o arranjo das cenas foram notados pelo público, infelizmente pouco habituado a ver tratar as peças com o carinho que estas mereceram. Pena foi que as deficiências de iluminação eléctrica do teatro não permitisse realçar a beleza do quadro da desfolhada, no 2º acto das Pupilas, em noite de lua cheia, para a qual Rogério Reynaud pintou um cenário que honra o seu nome de artista.


Felicitamos a Sociedade de Instrução Tavaredense pelo indiscutível êxito artístico que agora alcançou com estas duas peças tão singelas, tão saudáveis e tão portuguesas e absolutamente integradas no programa de educação moral da sua secção dramática.


Sob este aspecto especial, as récitas de sábado e domingo talvez mereçam a atenção dos orientadores dos nossos vários grupos dramáticos. (Voz da Justiça – 07.06)


AS PUPILAS DO SR. REITOR

De Buarcos – O teatro do Grupo Caras Direitas teve no domingo uma enchente. Representou ali o bem constituído grupo cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense a encantadora opereta portuguesa “As Pupilas do Sr. Reitor”, que é ornada de linda e maviosa música.


Todos os intérpretes se portaram com correcção e acêrto, mas, sem desprimor para os outros, queremos aqui salientar o trabalho de Violinda Medina e Silva, que, pela sua correcção na dicção e pela sua bem timbrada voz, sabe cativar o público que não se cansa de a ver. Interpretou muito bem o papel de “Clara”.


Também nos merecem uma referência especial os irmãos Broeiros, que souberam fazer um “José das Dornas” e um “Reitor” à altura.


O cenário é dum efeito surpreendente, bem como o guarda-roupa.


Todos os espectadores ficaram satisfeitos, sendo bisados alguns números e ovacionados todos os personagens. (Voz da Justiça – 09.21)


A RÉCITA EM BUARCOS

O festejado grupo cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense obteve no domingo passado, em Buarcos, mais um êxito brilhante com a representação dos Fidalgos da Casa Mourisca. A lotação do teatro esgotou-se. Os aplausos foram entusiásticos.


Em carta da Figueira para a Gazeta de Coimbra diz o sr. Carlos de Almeida, que foi um distinto amador e é autor de várias peças teatrais:


“À noite, espectáculo no Peninsular por um grupo de bons artistas e récita no teatro de Buarcos pelo excelente grupo cénico de Tavarede, que representou o drama “Os Fidalgos da Casa Mourisca”, uma das mais bonitas peças extraídas da obra de Júlio Deniz.


Mais uma vez fiquei assombrado com o desempenho dado a uma peça cheia de dificuldades por gente modesta, sem cultura dramática. Por vezes me esqueci e julguei estar vendo representar autênticos profissionais e não gente duma simpática aldeia, em geral operários. O grupo das mulheres possui competências que não se discutem”.


Numa carta anterior, e a propósito das Pupilas do Sr. Reitor, também se faziam as mais elogiosas referências ao grupo tavaredense. (Voz da Justiça – 10.01)

A CANÇÃO DO BERÇO

O festejado grupo de amadores da Sociedade de Instrução Tavaredense vai representar no seu teatro uma peça encantadora, uma verdadeira obra-prima da literatura teatral: Canção do Berço – obra dum poeta que é um grande dramaturgo espanhol, Martinez Sierra. Traduziu-a e adaptou-a outro grande poeta, o dr. Carlos Amaro.


Quando foi representada em Madrid, um crítico distinto, Emile Carrére, escreveu num jornal espanhol:


“Canção do Berço é a mais bela obra de teatro dêstes últimos tempos e o seu êxito é a consagração do artista, que, ao seu temperamento de poeta, seu subtil engenho e sua cultura, liga uma forte vontade de monge beneditino.


E a emoção está na poesia alada, pura e cheia de grande dôr vital do irremediável.


A crítica opinou que o primeiro acto é de assinaladíssima superioridade. Eu creio que o segundo é insuperável, ainda que seja menos harmónico no conjunto.


As toucas negras substituiram as de linho branco, que se irisavam como pombas ao passar sob os vitrais.


Sóror Joana da Cruz e Sóror Marcela têm talvez algum fiosito branco entre os cabelos, e consomem-se no seu próprio amor, condenadas ao bárbaro suplício de amar sem amor. O sol da Primavera, o incensário florido do horto monacal, levam uma ardente conturbação às suas almas de nardo e invade-as uma imensa melancolia que é a nostalgia imensa daquela vida que triunfa para além dos muros pardos.


Teresa encarna a adolescência, o amor humano, a Liberdade. A noiva ardente e enamorada, ao falar do homem a quem adora, faz assomar as lágrimas aos divinos olhos da freira. Quando chega o momento da separação, os corações estalam no peito. É a amargura trágica dos adeuses para sempre. Em cada abraço há um grande tremor de almas. Maio perfuma o sombrio locutório, a cotovia estende o seu vôo e aquela paz de melancolia terá algo de sepulcro monacal momentos depois. Ouvem-se os alegres guisos do carro que leva Teresa. O sino chama para o côro e a liturgia tem melancólicas ressonâncias do “miserere” na divina tarde azul.


Sóror Joana aos graves acordes corais rompe em soluços, que é a divina e única eloquência das grandes dores. Ela foi quem dezóito anos antes arrulhou à filha de ninguém, adormecida no seu berço, com simples, luminosas palavras de uma excelsa ternura.


“Canção do Berço” é a melhor obra do teatro poético contemporâneo, cheio de penetrante poesia, livre de consonâncias, perfumada e subtil”.


Canção do Berço é quási só representada por mulheres: o grupo tavaredense vai apresentar-nos um conjunto de doze amadoras, sendo seis em papéis de responsabilidade, o que é raro e difícil em grupos de amadores. Entram na peça apenas duas personagens masculinas, sendo uma delas o médico do convento de dominicanas, em Espanha, onde decorre a acção. (Voz da Justiça – 11.16)


TEATRO EM TAVAREDE

É no próximo sábado que a Sociedade de Instrução Tavaredense inicia a sua época teatral, levando à cena a encantadora peça em 2 actos, de Martinez Sierra, Canção do Berço, que o dr. Carlos Amaro, o poeta admirável do S. João Subiu ao Trono, traduziu e adaptou primorosamente.


Canção do Berço teve da crítica espanhola, francesa e portuguesa um acolhimento de rara admiração: é uma obra literária formosa e delicada e, ao mesmo tempo, uma sugestiva e equilibrada obra teatral. A peça foi em Espanha, como era natural, muito discutida, nas suas intenções filosóficas, que o autor lhe nega. Martinez Sierra veio à imprensa e falou sôbre a Canção do Berço.


É êle que diz:
“ A “relativa novidade do ambiente” fez com que alguém, surpreendendo-se de que um poeta possa quebrar o segrêdo da clausura, pergunte de que meios me servi para estudar detalhes da vida monástica.


Tudo isto tão simples e tão plácido representa a verdade da tão decantadamente tenebrosa existência monástica? É simplesmente fantasia do poeta? E o acontecimento que constitui o assunto? É imaginado? É real?


Não há prodígio, milagre nem mistério nos pontos de observação que se aproveitaram para esta simplicíssima comédia. Certo: a vida das monjas é assim, e eu tive ocasião de o saber porque vivi sempre na proximidade material e espiritual de conventos e comunidades.


O espisódio ou acontecimento que constitui o “argumento” da obra nada tem de excepcional: certo que nem a todos os conventos de freiras entra pela roda uma criança; mas poucas comunidades haverá em que não tenha atrapalhado o juizo à maior parte das Madres – e a Igreja que lhes pôs o nome lá saberia porquê – um petiz, filho dalguma criada, do médico, dalguma vizinha pobre, dum parente, amigo ou desconhecido.


E quando imaginei esta comédia baseada em um facto real, o meu único receio foi que o incidente, por ser demasiado vulgar ou conhecido, parecesse insignificante à maioria do público.


Com respeito à intenção, e esta é a aclaração mais importante, já o disse no próprio dia da estreia que me propuz unicamente fazer uma obra de arte, aproveitando a intensa poesia de um ambiente que estranho não ter visto já em teatro num povo como o da Espanha, onde é tão familiar”.


A peça é apresentada em Tavarede com uma montagem que está a ser feita com todo o carinho. É vestida rigorosamente, segundo a Constituição das Monjas Dominicanas, pelo guarda-roupa Castelo Branco, e os cenários são pintados por Rogério Reynaud.

Na vitrina na Casa das Jóias à Praça Nova, é exposta amanhã a maquette do 1º acto. (Voz da Justiça – 11.23)


CANÇÃO DO BERÇO

O grupo cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense obteve no sábado um dos seus mais brilhantes êxitos artísticos, com a representação da peça de Martinez Sierra – Canção do Berço. A delicadíssima obra do consagrado dramaturgo espanhol bem merece o carinho e os cuidados com que a apresentou a Sociedade de Instrução Tavaredense.


No género, esta alta-comédia é, sem dúvida nenhuma, a mais bela obra teatral que o grupo tavaredense tem pôsto em cena, e também a de maior dificuldade. É uma peça de conjunto, em que os grandes papéis, por melhor interpretados que sejam, não podem fazer esquecer os outros.


São dez as personagens femininas – além das figuras que não falam, o que é muito difícil de conseguir em grupos de amadores. Tomando em conta tudo isto, mais realça o belo êxito alcançado pela Sociedade de Instrução Tavaredense.


Canção do Berço é uma peça verdadeira, sincera, humana. Simples, pode dizer-se quási sem entrêcho, a sua técnica é sólida, as suas figuras são admiravelmente desenhadas e movem-se naturalmente, no ambiente próprio. O autor dá-nos a psicologia daquelas santas espôsas do Senhor em pormenores sugestivos descobertos, quási inventados – e todavia são verdadeiros – pelo seu talento. Algumas figuras assumem proporções de símbolos, sem nunca deixarem de ser simplesmente e humanamente – mulheres; a Prioreza, tão simpática, é a bondade cristã, sempre disposta a perdoar, dando aos textos da Regra e da Constituição uma elasticidade que, sem ser desrespeitadora, lhe permite ser condescendente; Sóror Joana é ela própria a canção do bêrço – encarna, na pureza ingénua do 1º acto e na saudade pungente do 2º, o amor maternal, o instinto de mãi que perdura mesmo naquelas a quem os votos monásticos condenaram à virgindade perpétua; Sóror Marcela, encantadora figurinha de monja que se define deliciosamente com as imagens do canário e do espelho, é o espírito de liberdade em rebeldia contra a clausura, tão forte que se não deixou morrer mesmo depois de trocado o véu branco do noviciado pelo véu preto e pelo escapulário benzido dos votos definitivos; Teresa, a criança oriunda do vício dum lupanar e que, para o coração e para a alma de Sóror Joana, “veio do céu, como todo o mundo”, essa é o Amor fonte de vida, é a própria Vida, é a Natureza, que não cabe dentro dum convento; por isso ela, criada no claustro, educada pelas freiras, e não obstante o amor verdadeiro “ao seu convento” e às “suas Madres”, deixa a casa santa em que cresceu e se fez mulher para, pelo braço do homem que ama, vir cá para fora, para o Mundo, onde também se pode amar e servir a Deus com mais utilidade cristã do que no convento.


Há ainda na peça outra figura magistralmente desenhada: é a Vigária – que personifica o respeito à lei, a fidelidade aos votos, a intransigência com o menor afrouxamento de disciplina do convento. Emquanto nas outras fala o sentimento, nesta domina a razão fria. Esta Madre Vigária chega o tornar-se antipática ao espectador, a sua frieza de coração quási parece crueldade – e, todavia,ela interpreta à risca a Regra e a Constituição, ela é, emfim, o espírito vivo da própria instituição: a antipatia que inspira ao espectador, não vem dela, vem da instituição que ela personifica com tôda a pureza.


Emfim, diremos ao leitor que vale a pena ir a Tavarede ver representar a mais bela obra teatral que nos lembramos de ver posta em cena pelos nossos amadores. O conjunto é harmonioso, e, para mais, na montagem da Canção do Berço nota-se um esmêro carinhoso que dispõe bem. Os cenários de Reynaud, são lindíssimos, cheios de carácter e o guarda-roupa é o que a Constituição das Monjas Dominicanas manda que seja.


Canção do Berço repete-se no próximo sábado. O programa é completado com a opereta O 66, de lindíssima partitura, que no sábado passado não pôde ser representada por ter adoecido à última hora o sr. António Simões, o distinto amador que dirige a orquestra.


São muitos os lugares tomados por pessoas da Figueira para a récita de sábado, o que é garantia de que o teatro terá uma enchente. (Voz da Justiça – 11-30)

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

TEATRO DA S.I.T. - NOTAS E CRÍTICAS - 8

1931

RÉCITA DE ANIVERSÁRIO

A Sociedade de Instrução Tavaredense comemorou nos passados sábado e domingo os seus 27 anos de vida, o que equivale dizer: os seus 27 anos de luta.


Não é demais, na notícia descritiva das festas da popular e prestimosa colectividade, dizer que a obra realizada durante estes 27 anos tem sido uma proveitosa obra de ensinamentos, uma patriótica obra de perfeição e educação.


As suas aulas têm dado a muitos espíritos a luz radiosa das letras, tornando mais aptos e mais úteis à vida individual, e a bem da sociedade, que se abeira dos ensinamentos que naquele templo de luz são ministrados.


E não poucas vezes a velha Sociedade tem vindo à Figueira, com o seu prestimoso grupo scénico, dar espectáculos em benefício dos doentes e dos pobres.


Não está mal, pois, que na hora festiva em que uma tão útil colectividade engrinalda as suas salas para festejar um dia cheio das mais caras recordações, que aqui, em homenagem, lhe dirijamos as nossas saudações pelo dia festivo que passou e os nossos cumprimentos pela obra de elevação e benemerência que tem realizado.


As festas comemorativas do 27º aniversário começaram no sábado. Engalanaram-se as salas, com flores e colgaduras de damasco, aliando-se a estas notas de beleza uma caprichosa iluminação eléctrica, a côres. No poste principal, subiu a bandeira glorioso símbolo da Sociedade, que era acompanhada por outras bandeiras que puzeram na frontaria uma nota de côr festiva. Ergueram-se ao ar os primeiros foguetes anunciando a festividade, emquanto a sala de espectáculos se ia enchendo de sócios e convidados.


Dera-se, no palco, o sinal de comêço; cá fora, nem um lugar vago. A orquestra, sob a regência do sr. António Simões, executa o hino da Sociedade, ouvido de pé, tendo a assistência aplaudido com entusiasmo.


E segue a ordem do programa, fielmente, como fôra traçada no programa-convite. Sobe à scena a linda opereta em 1 acto “Evocação” – seguindo-se a formosa opereta em 2 actos “Noite de Agoiro” – da autoria do sr. dr. Celestino Gomes, que teve, no final do 1º acto, uma chamada especial, sendo-lhe oferecido entre calorosas palmas um artístico ramo de flores pelo presidente da Direcção, sr. António Cordeiro.

O espectáculo de gala terminou com a representação da encantadora opereta “66” – tendo os amadores recebido muitos aplausos e sendo, no final do espectáculo, novamente tocado o hino da Sociedade, levantando-se entusiásticos hurras. (Voz da Justiça – 01.21)


TEATRO EM TAVAREDE

A peça que a direcção da Sociedade de Instrução Tavaredense ofereceu no sábado às famílias dos seus associados, representada pelo seu grupo dramático, é, incontestavelmente, das melhores que ali têm subido à scena, e pode dizer-se que a melhor daquele género.


São três actos deliciosos, ricos de graça, com situações explêndidamente criadas e alguns trocadilhos de rara felicidade. O espectador ri com satisfação e, em scenas em que domina a nota sentimental, a ternura dum singelo amor, tão simples e tão puro, a gargalhada cala-se mas não se apaga nos lábios o sorriso que denuncia os inefáveis prazeres da alma. A Luz de Alvorada é uma peça que merece ser vista e escutada, uma peça absolutamente limpa, isenta de escabrosidades, sem duplos sentidos e as graças pesadas a que tanta vez recorrem os comediógrafos para fazer rir os que já não coram. Quando o pano desce sôbre o 3º acto, o espectador levanta-se com uma sensação de alegria e bem-estar moral que lhe dão por bem empregues as três horas que passou a ouvir a deliciosa peça.


A interpretação da Luz de Alvorada não é isenta de dificuldades e exige qualidades que não faltam nos amadores tavaredenses, os quais formam um grupo excelente. E a montagem é cuidada, podemos dizer perfeita dentro das condições do meio. Os scenários são dos distintos artistas Rogério Reynaud, os do 1º acto, e Alberto de Lacerda, os do 2º e 3º.


Resumindo, diremos que a representação da Luz de Alvorada é uma bela nota de arte que a Sociedade de Instrução Tavaredense regista na sua actividade teatral.


= A direcção da Sociedade de Instrução Tavaredense comunica aos seus associados que resolveu repetir no próximo sábado, pela última vez, a peça “Luz de Alvorada”, satisfazendo o desejo de muitos sócios e famílias que não puderam assistir à récita passada. (Voz da Justiça –04.08)

A FESTA DO JARDIM ESCOLA

.................
E seguiu-se a representação da fantasia A Cigarra e a Formiga, pelo modesto e simpático grupo de amadores da Sociedade de Instrução Tavaredense. Todos foram calorosamente aplaudidos, como era de justiça. No 1º acto houve a nota de arte culminante daquela noite de festa: Ilda Stichini disse primorosamente, com o seu formoso talento, e as suas poderosas faculdades de interpretação, A Fantasia e O Riso, belos versos dum artista de pintura que é também um distinto poeta – Alberto de Lacerda. Quando Ilda Stichini apareceu em cena, a assistência irrompeu numa extraordinária, prolongada e calorosa ovação, que bem lhe deve ter mostrado como é querida do público figueirense. Os versos da Fantasia disse-os a Artista ilustre com a vibração da sua delicada sensibilidade e a magia da sua voz. A assistência aplaudiu demoradamente, com sincero entusiasmo. Mas o número do Riso, que Alberto de Lacerda escrevera expressamente para Ilda Stichini, deixou verdadeiramente encantados os que o ouviram e se manifestaram com uma das mais vibrantes e expontâneas e demoradas ovações que naquele teatro se têm ouvido. (Voz da Justiça – 07.29)


OS FIDALGOS DA CASA MOURISCA

Obteve um êxito fora do vulgar a representação da peça extraída do belo romance de Júlio Deniz, Os Fidalgos da Casa Mourisca. A escolha foi acertada, pois a peça está perfeitamente dentro do critério seguido pela Sociedade de Instrução Tavaredense, que só faz representar no seu teatro obras que contenham lição moral e educativa. É o caso dos Fidalgos: todos os seus actos são límpidos, sem a mancha dum só duplo sentido; nêles se exaltam as mais belas qualidades da alma, de faz a apologia do teatro como título de verdadeira nobreza, se combatem os privilégios de casta e defendem os principios liberais, com desgosto do egresso Frei Januário que em tôdas as manifestações de progresso moral e material vê a mão da Maçonaria. Magnífica lição que a Sociedade de Instrução proporciona aos seus associados através dum divertimento espiritual de pouco mais de três horas!


O desempenho, considerado como de amadores, é excelente, primoroso nalguns passos. Os papéis femininos foram entregues a três distintas amadoras: Violinda Medina e Silva, Emília Monteiro e Maria Teresa de Oliveira, que se houveram brilhantemente. Violinda fez a Baronesa de Souto Real com a vivacidade própria, sendo admiráveis a forma e as expressões irónicas nos diálogos com o padre. Muito bem! Emília Monteiro foi uma Berta delicada como no-la mostrou Júlio Deniz; algumas cenas com o orgulhoso D. Luís foram cheias de comoção, dominando o espectador. Maria Teresa interpretou a rude e bondosa Ana do Vedor de maneira que confirmou as suas qualidades já reveladas noutros papéis: é uma excelente característica. Nos papéis masculinos merece referência especial António Graça que fez o Frei Januário brilhantemente, entusiasmando as pessoas que conhecem e sabem apreciar teatro; foi sóbrio, correcto, sem caír em exagêros e ao mesmo tempo sem deixar perder um efeito, sabendo falar e sabendo ouvir admiravelmente. É um bom trabalho, do melhor que lhe temos visto fazer. António e Jaime Broeiro interpretaram respectivamente o D. Luís – orgulhoso dos seus pergaminhos, fechado no seu espírito reaccionário e a final vencido pela ternura e dedicação dos corações que o cercam – e o Tomé da Póvoa, o homem do povo sempre leal, símbolo do trabalho e da honra. Fizeram-nos pondo à prova em papéis de tanta responsabilidade os seus recursos de bons amadores. Nos filhos do velho fidalgo vimos João Cascão (Maurício), exuberante onde era preciso, irreflectido, uma criança grande em quem a bondade faz esquecer os disparates que pratica, e Manuel Nogueira (Jorge), sereno e grave, reflectido na sua pouca idade e sabendo sacrificar as aspirações do coração ao que êle considera o seu dever de filho. Cascão é um amador seguro, articulando primorosamente, sem deixar perder uma palavra mesmo quando a situação exige uma dição precipitada. Manuel Nogueira merece um elogio especial pelo muito que conseguiu fazer, entrando e vencendo quási sempre as dificuldades do papel. Interpretava pela primeira vez uma personagem daquele género, e nunca lhe coubera outro de tanta responsabilidade. Vimo-lo com prazer aproveitando o máximo e correspondendo a quanto dêle era legítimo exigir. Figura simpática e distinta sem afectação, voz bem timbrada, deu-nos um Jorge como o viram quantos leram o romance. Nos fidalgos do Cruzeiro, A. Santos e F. Carvalho; João Nogueira no filho de Ana do Vedor; J. Vigário e J. Gaspar, em papéis de menor responsabilidade, todos ocuparam o devido lugar e fizeram um bom conjunto.


Claro que houve hesitações, já atenuadas na segunda representação, e há ainda falhas; mas seria difícil que as não houvesse em amadores numa peça desta envergadura.


A Sociedade de Instrução não poupou esforços e despesas para apresentar convenientemente esta formosa peça, e consegui-o, embora dispendendo importante quantia em guarda-roupa, cenários, etc.


Felicitamo-la pelo êxito artístico alcançado e felicitamos o excelente grupo de amadores que tão brilhantemente se houve.


Nas duas primeiras noites a lotação esgotou-se. E para sábado, 12, é já grande o número de lugares marcados. (Voz da Justiça – 12.09)

RECORDAÇÕES DE TAVAREDE

Ao tempo em que iamos a Tavarede, época em que tem lugar o que descrevemos, as estradas para lá eram quasi intransitáveis, isto, quer fossemos pela estrada do Pinhal, quer pela da Varzea.


Pela primeira, era barranco que succedia a um barranco, pela outra, um assordeiro a outro assordeiro, entremeados de correntes d’agua. De noite, senão de dia, era preciso muito boa coragem para um menos affoito por lá passar.


E justamente n’este tempo havia uma troupe de rapazes d’aqui que, até nas mais caliginosas noutes de inverno tinha a coragem de ir a Tavarede, a um theatro ou a um presepio. Bellos tempos! De quanto és capaz, mocidade!


De 1865 a 1868 frequentámos aquella pequena aldeia que, pela sua posição e naturaes attractivos se assimilha a Saint-Denis, na Africa Franceza. Como esta, ao sopé de montanhas que a circundam, aqui e além choupos a emmoldural-a, e de d’onde por entre as vareiras da vegetação nos espreita a medo, de longe.


* * *


Até que chegámos ao ponto de explicar a razão porque deveriamos antes dar a estes rabiscos o titulo - Uma viagem á China. Imagine-se que de 1868 para cá apenas estivemos em Tavarede uma hora, isto em Julho de 1874.


Uma declaração tal, a respeito de quem vive ha tantos anos perto d’essa povoação, para aquelles que quasi diariamente a frequentam, a gosar a amenidade da sua posição e do trato lhano e affavel dos seus habitantes, parece quasi inacreditavel.


Pois é uma verdade.


* * *


Por uma noute de Dezembro do anno passado fomos ali.


Um amigo nosso, e muito estimado, lá e aqui, o Antonio de Lavos (como é mais conhecido), commerciante, achando-se bastante doente mostrou vontade de ver-nos. Vencendo a reluctancia ou esquecimento forçado de 22 annos largamos a nossa thebaida da Figueira e depois d’uns preliminares para tão extensa viagem, em dez minutos nos achámos em casa do doente.


O nosso Antonio, que não contava que tivessemos tal heroicidade, ficou espantado ao ver-nos no seu quarto, a horas já um pouco adiantadas da noute.


Felizmente que o achámos melhor, bem capaz de lá para o S. João mimosear os rapazes d’aqui, com mais umas dansas e descantes d’um rancho catita que costuma organizar no seu quintal. A mulher, a Rosita, que em tempos se dedicava ao palco, e que nos deu uns exemplares traquinas, folgasões, cheios da vivacidade da idade dourada, parecia-nos a mesma, com o mesmo genio franco, risonho, endiabrado, somente modificado um pouco pela idade que já se acompanha d’uma filha, a Josephita, loura, brincalhona, viva como a mãe.


Como pouco tempo nos podiamos demorar entre aquella boa gente porque o carro em que haviamos ido... urgia, fomos aproveitando alguns minutos no percurso do povoado, indo quasi ás cegas, levado pelas recordações do passado á cata de amigos e conhecidos.


E dizemos ás cegas por pouco vermos de noute, ás cegas porque aquelle conjuncto de casas amodernadas poucos indicios nos dava dos seus traços passados, e aggravadas mais estas circumstancias, por estarmos habituados aqui á luz clara, brilhante, do gaz, quando ali caminhavamos atravez d’uma densa escuridão, que se não modificava nem ao menos por uns beneficos raios prateados de luar.


(Gazeta da Figueira - 15/2/1896)

Natal







E quem nos dá tanta Luz?



... É Jesus!



(Autos Pastoris - Pastores Brutos)




Um breve apontamento para desejar a todos os meus Amigos e suas Famílias, um Natal cheio de paz e um Novo Ano de 1012 o melhor possível. Boas Festas


(Imagem Internet)

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

TEATRO DA S.I.T. - NOTAS E CRÍTICAS - 7

1930

RÉCITA DE ANIVERSÁRIO

A obra, verdadeiramente notável no capítulo da educação popular, que a Sociedade de Instrução Tavaredense realiza na vizinha povoação de Tavarede, é bem conhecida. Devemos filiar nesta circunstância a expressiva e calorosa simpatia que o público dedica a esta colectividade e que se não dispensa de lhe testemunhar por ocasião dos seus aniversários.

Na verdade, a acção desenvolvida pela Sociedade de Instrução Tavaredense é admirável sob todos os pontos de vista. Mantém, há quási três dezenas de anos, uma escola nocturna onde se recebem alunos, menores e adultos, sócios ou não sócios, aos quais é fornecido gratuitamente todo o material escolar. Não se limita a isto a sua função. Vai mais longe: entra no capítulo da educação e da cultura artística, limitada, como se compreende, às condições do meio -, servindo-se para isso do livro, da palestra educativa e do teatro. A influência moral e educativa exercida por intermédio do teatro, tanto sôbre os que nêle representam como nos espectadores, é evidente. Para atingir êste objectivo, segue-se na escolha das peças – algumas das quais expressamente escritas para êste fim – o critério de que o teatro não deve servir apenas para proporcionar distracção, deve, principalmente, ser um veículo de educação moral e cívica e até, num meio como é o de aldeia, um instrumento de cultura.


Foi-nos muito grato verificar, por isso mesmo, a demonstração vibrante de simpatia pela benemérita agremiação tavaredense, a que deu lugar a festa do seu 26º aniversário.


O programa executou-se com brilho excepcional, havendo nêle alguns números de muito relêvo.


No sábado, a récita de gala reuniu no teatro, artisticamente ornamentado e iluminado – colchas de damasco nas paredes, flores, enorme profusão de lâmpadas eléctricas e um formoso lustre, nas côres da Sociedade de Instrução -, uma assistência numerosíssima e distinta.


Abriu a récita a alta-comédia em 1 acto O Caso de Consciência, de Octave Feuillet, em cujo desempenho Maria Tereza de Oliveira, António Broeiro e João Cascão souberam com justiça fazer-se aplaudir.


Seguiu-se a peça em 1 acto Evocação, que deixou no público, mais pelo desempenho que propriamente pela peça, uma impressão agradabilíssima, diremos mesmo uma sensação de arte que bem se exteriorizou em aplausos calorosos. Emília Monteiro, Maria Tereza de Oliveira, António Broeiro e João Cascão representaram admiravelmente, mantendo uma perfeita harmonia de conjunto como não é fácil conseguir melhor em teatros de amadores duma pequena aldeia. Dignas de nota especial as primorosas caracterizações de António Esteves.


E a récita fechou com chave de ouro – a opereta O 66, cuja dificílima e formosíssima partitura teve execução esplêndida pela orquestra dirigida pelo distinto amador sr. António Simões, que a assistência chamou ao palco para melhor o aplaudir, e foi muito bem cantada por Emília Monteiro, João Cascão e Francisco Carvalho. A representação teve o ritmo próprio, decorrendo com uma animação exuberante. Muito bem! Os aplausos foram entusiásticos e merecidos. A montagem era magnífica, figurando nela um fundo de belo efeito do distinto artista pintor sr. Henrique Tavares. (Voz da Justiça – 01.22)

A RÉCITA DE HOMENAGEM A ALBERTO DE LACERDA

Foi entusiástica e brilhante a festa de homenagem realizada a Alberto de Lacerda. O artista e poeta distinto a quem principalmente se deve o êxito invulgar alcançado pela fantasia A Cigarra e a Formiga, foi alvo de calorosas manifestações de simpatia e admiração.


O teatro da Sociedade de Instrução Tavaredense ornamentado com bom gôsto, oferecia um aspecto atraente. Colgaduras nas paredes e flores, muitas flores por tôda a parte. Era a última representação da encantadora peça – e a casa encheu-se! Da Figueira, do sul do concelho, de várias localidades, os automóveis e camionetas levaram muita gente a Tavarede. Esgotou-se a lotação e foi elevado o número de pessoas que não conseguiram obter bilhete.


A representação decorreu com brilho, sendo aplaudidos muitos números. Desempenho correcto, honrando as tradições do modesto e simpático grupo de amadores, que foi alvo dos maiores e mais expressivos elogios. Nos finais de acto os aplausos encheram a sala, obrigando o pano a subir repetidas vezes. E sobretudo no último, a assistência arrebatada pelos formosos versos do Amor, muito bem ditos por João Cascão, e pela beleza do quadro, irrompeu em ovações intermináveis, chamando os autores da peça e da partitura, os principais intérpretes, José Medina, que foi um valioso elemento no ensaio das vozes, e, por fim, tôda a companhia que tão brilhantemente representara A Cigarra e a Formiga. O público deixou o teatro com saudade, encantado com o espectáculo, tendo feito a Alberto de Lacerda, no final do 2º acto, uma manifestação especial e obrigando-o a vir ao palco, de onde saíu carregado de flores e envolto nas mais carinhosas e entusiásticas ovações.


Têm sido vários os pedidos para que de novo volte à scena esta festejadíssima peça. Estavam-lhe garantidas novas e sucessivas enchentes. Mas é impossível atender de momento estes desejos.


À noite, no Hotel Reis, um grupo de amigos e admiradores de Alberto de Lacerda ofereceu lhe um banquete, que decorreu numa atmosfera de viva simpatia. (Voz da Justiça – 05.14)

EXCURSÃO A TOMAR

Tomar é uma cidade encantadora. A beleza do seu rio, com margens verdejantes e arborizadas, convidando a gozá-las; a variedade de panoramas que oferece; e a maravilha do Convento de Cristo, jóia de arte que só por si basta para celebrizar aquela linda terra, - são motivos que atraem visitantes e justificam a constante passagem por ali de excursões, idas de todos os pontos do país. Quem uma vez fôr a Tomar, vem encantado e não se dispensa de lá voltar.


Pois a Sociedade de Instrução Tavaredense vai oferecer ao seu grupo dramático um passeio àquela risonha cidade, no dia 6 do próximo mês de Julho. Ali representará a linda fantasia em 3 actos A Cigarra e a Formiga, que por certo agradará em Tomar tanto como agradou nas sucessivas representações em Tavarede e na Figueira, onde alcançou um êxito invulgar. Esta peça, que tem uma lindíssima partitura, com cêrca de 30 números de música, será representada em Tomar com absoluto rigor de montagem, com todo o variado guarda-roupa e scenários dos 10 quadros que constituem A Cigarra e a Formiga. Seguirá com o grupo a esplêndida orquestra, dirigida por António Simões, distinto amador autor da partitura.


Sabemos que muitas pessoas estranhas ao grupo, que é constituído por 70 figuras, desejam aproveitar o belo passeio a Tomar. (Voz da Justiça – 06.04)

COISAS... DE TEATRO

Foi esta semana estreada em Lisboa uma revista a que se pôs o título de A Cigarra e a Formiga. Não se trata, bem entendido, da fantasia A Cigarra e a Formiga, escrita para o grupo da Sociedade de Instrução Tavaredense, muito representada em Tavarede, na Figueira e em Buarcos e que no dia 6 de Julho próximo subirá à scena no Teatro de Tomar.


Mas... vale a pena contar a história, que pode fazer-se com a simples transcrição do que disseram os jornais – sem aludir ao que êles não disseram.


Quando há pouco apareceu anunciada A Cigarra e a Formiga nº 2 – chamemos-lhe assim, para a distinguirmos da outra – estava a tratar-se em Lisboa de fazer representar a primeira, A Cigarra e a Formiga nº 1.


Foi por isso que um dos autores desta, o distinto artista sr. Alberto de Lacerda, fez as diligências que constam da seguinte carta por êle dirigida aos jornais:


“Exmo. sr. Director do jornal.....
Tendo visto anunciada para breve uma revista com o título “A Cigarra e a Formiga”, venho, como co-autor da fantasia em 3 actos com o mesmo título, já representada em vários teatros da província, pedir a V.Exª o favor de publicar os seguintes esclarecimentos para evitar futuras confusões, quando, porventura, a peça a que me refiro e tem a prioridade do título, venha a ser, como espero, representada em Lisboa:


1º - ao ver anunciada a revista procurei um dos seus autores, meu colega, antigo colaborador em revistas escolares e velho amigo, sr. Fernando Santos, fazendo-lhe ver os inconvenientes de dar à sua o mesmo título da minha peça, que êle conhecia desde o dia seguinte ao da sua estreia em 18 de Maio de 1929, data em que lhe fiz oferta dum exemplar do volume das copias e contei a efabulação de “A Cigarra e a Formiga” nº 1.


2º - que Fernando Santos me prometeu resolver com os seus colaboradores o assunto, trazendo-me depois a seguinte resposta textual: “Não pode ser, tens de ter paciência”.


3º - que cá ficamos, o meu colaborador e eu, com paciência, à espera de aplaudir “A Cigarra e a Formiga” nº 2, fazendo votos pelo seu inteiro sucesso, mas não abdicando do título com que apresentaremos a nossa, a que tem o nº 5 no registo da conservatória da Propriedade Intelectual.

Agradecendo, sou, com a maior consideração...... Alberto de Lacerda”.


Apenas O Século publicou esta carta.


O Diário de Lisboa, talvez porque a carta fôsse... extensa, fez dela um resumo. Fez um resumo? Fez isto que aí vai:


“Do nosso amigo e distinto pintor Alberto Lacerda, recebemos uma carta, em que nos comunica ter uma opereta com o título “A Cigarra e a Formiga”, título êste igual àquele com que apareceu agora anunciada uma revista em que colabora o seu velho amigo e também pintor e colaborador em peças de estudantes, Fernando Santos. Diz mais que a pedido dêste resolveu êle e o seu colaborador ficarem à espera de aplaudir “A Cigarra e a Formiga nº 2”, fazendo votos pelo seu inteiro êxito”.


Compare-se isto com a carta, e digam-nos se isto é um resumo dela.


É pena que num jornal onde se escreve bem, numa secção teatral muito completa, que deve estar a cargo de bons redactores, se não saiba resumir uma carta. Se alguma vez chegar a fundar-se a Escola de Jornalismo, em que temos ouvido falar, deverá incluir-se no programa: - fazer resumo duma carta. Parece coisa fácil – e, todavia, tropeçam nela jornalistas muito distintos.


O jornal República publicou êste diz-se:
“Que o sr. Alberto de Lacerda, co-autor de uma fantasia em 3 actos intitulada “A Cigarra e a Formiga”, vai protestar contra o facto de estar anunciada para breve uma revista com o mesmo título”.


Diz-se?


Recebeu a carta de Alberto de Lacerda e escreveu: - Diz-se...


Que mais precisaria a República para – ter a certeza?
No dia seguinte acrescentava:


“Que o distinto escritor teatral, referindo-se ao nosso último “diz-se” de ontem opinou: - Ora, se alguém devia protestar seria o “La Fontaine”...


E assim matava a questão. Desde que os autores da nº 1 tiraram da fábula de La Fontaine o título para a sua peça, porque não haviam os outros da nº 2 aproveitar êste mesmo título para outra peça?


A República não quis ver mais nada. As circunstâncias em que foi baptizada não lhe interessaram. Como são as coisas! A nós parecia-nos que precisamente estas circunstâncias é que importava considerar. Curteza de inteligência nossa – não pode deixar de ser...


Depois da carta de Alberto de Lacerda, foi enviada aos redactores da secção teatral de todos os jornais de Lisboa a carta seguinte:


“Figueira da Foz, 12 de Junho de 1930.
Prezado Camarada
O signatário, redactor encarregado da secção teatral do jornal “A Voz da Justiça”, da Figueira da Foz, julga do seu dever levar ao conhecimento dos seus exmos. Camaradas o caso que com êle e com o seu colaborador Alberto Vergilio da Rocha Portugal Correia de Lacerda, de Lisboa, se está passando.
Resumirei em poucas palavras.
Sou autor, com Alberto de Lacerda, duma fantasia em 3 actos “A Cigarra e a Formiga”, peça estreada em 18 de Maio de 1929 e representada depois em vários teatros da província. Esta peça está registada, sob o nº 5, na Conservatória da Propriedade Intelectual e é nossa intenção fazê-la representar em Lisboa. Surpreendeu-nos, por isso, o facto de vermos anunciada para breve, em Lisboa, uma revista com o mesmo título.
Nada mais natural, todavia, que aparecerem duas peças com o mesmo título, e nenhum reparo se faria se duma coincidência se tratasse. Sucede, porém, que é um dos autores da revista anunciada com o título da nossa peça, o exmo. sr. Fernando Santos, que eu não conheço pessoalmente mas sei ser amigo e camarada do meu colaborador Alberto de Lacerda, ao qual êste ofereceu, logo no dia seguinte ao da estreia da nossa fantasia, um exemplar do livro das cópias de “A Cigarra e a Formiga”, tendo-lhe ainda contado a efabulação da peça.
Alberto de Lacerda procurou agora o seu amigo exmo. sr. Fernando Santos e fez-lhe ver os inconvenientes de apresentar a sua revista com o mesmo título da nossa fantasia, e pediu-lhe que o substituísse. Esta solicitação não foi atendida, persistindo os autores da revista em apresentá-la com um título que êles muito bem sabem que pertence a outra peça já representada, devidamente registada e que se procurava fazer representar em Lisboa.
Não há, como se vê, simples e natural coincidência nesta igualdade de títulos. Trata-se dum caso consciente.
Não acrescentarei outras considerações. Esta simples exposição de factos é bastante para que com inteiro conhecimento os exmos. Camaradas possam apreciar o acto de que, eu e o meu colaborador, nos confessamos vitimas.
Agradecendo a vossa atenção, subscrevo-me com a maior consideração, Camarada mº. obdº. José da Silva Ribeiro”.


Não se solicitou a publicação desta carta; não se pediu sequer uma referência: pretendeu-se pôr apenas os camaradas ao corrente de factos cujo conhecimento talvez pudesse interessar às suas secções e de qualquer modo facilitaria os seus juízos. Não houve o propósito – que seria desumano, temos de reconhecer! – de incomodar os camaradas. Não há, portanto, que estranhar o silêncio dos que silenciosos se ficaram.


O Rebate, amavelmente, publicou a carta na íntegra. E o Diário de Notícias não pôde reprimir o seu azedume, a que deu escape desta maneira:


“Uma questão de títulos – Escreveu-nos o sr. José da Silva Ribeiro, queixando-se de ter sido espoliado dum título duma peça, que já foi representada e se encontra devidamente registada. Se assim é, não percebemos porque nos escreve o sr. José da Silva Ribeiro. Aos jornais recorre-se, quando a sua intervenção se reputa indispensável. Se o sr. Ribeiro tem a peça registada, isto é, se tem a lei por si, não precisa de incomodar os jornais: invoque a lei e embargue a peça que usurpou o título da sua, e está acabada a questão”.


Se assim é...


Pois claro que é. Que dúvida tem? Não se lhe indicou o número do registo da peça? Se a carta não tivesse sido dactilografada, poderíamos supôr que no Diário de Notícias não entenderam a letra...


A revista ABC, com um desassombro que deve ter deixado assombrados outros colegas, não se esquivou a tratar do caso, e fê-lo desta maneira:


“Do ilustre artista sr. Alberto de Lacerda e do nosso prezado camarada na imprensa da Figueira da Foz, sr. José da Silva Ribeiro, recebemos há dias uma carta relatando um facto grave e que, por dever de justiça e de leal camaradagem, resolvemos dar a devida publicidade.


É o caso que sendo êstes senhores autores de uma peça teatral intitulada “A Cigarra e a Formiga”, que foi representada em 1929 em vários teatros do país e cujo título se encontra registado na Conservatória da Propriedade Intelectual, se consideram espoliados nos seus direitos ao verem o título da sua peça aproveitado por outros para a nova revista actualmente em scena no Teatro da Trindade.


Porém, o mais grave da questão é que um dos autores da nova revista, o sr. Fernando Santos, possuía, por lhe ter sido oferecido pelo sr. Alberto de Lacerda, um exemplar da peça dêste senhor, pelo que não pode alegar ignorância da existência do referido título. Acresce ainda a circunstância de o sr. Fernando Santos ter sido procurado pelo sr. Alberto de Lacerda logo que a nova revista apareceu anunciada e ter-se recusado a modificar o título da peça de que é co-autor.


Dadas estas agravantes, nada nos impede de supôr que, tendo-se os autores da nova revista apoderado do título de uma peça alheia, se tenham também apropriado do resto...”.


Cabe dizer que na Inspecção Geral dos Teatros foi, muitos dias antes da representação da nº 2, apresentada uma reclamação, devidamente documentada, que ainda não obteve despacho.


E, agora que a nº 2 – depois de três ou quatro vezes ter sido adiada a sua estreia – subiu à scena e se viu que a revista tanto pode chamar-se A Cigarra e a Formiga como, por exemplo, Agulhas e Alfinetes, visto que a obra representada nenhuma relação apresenta com o título, ocorre perguntar: que teria custado ao sr. Fernando Santos mudar o título, lembrando-se, quando lho lembraram, que se esquecera de que tinha em seu poder as copias oferecidas por um seu amigo e antigo colaborador, duma peça intitulada A Cigarra e a Formiga e de que êsse mesmo seu amigo era autor?


E aqui está a história. (Voz da Justiça – 06.28)


O SONHO DO CAVADOR

Mais uma récita, ontem, com esta peça festejadíssima. Mais uma enchente à cunha no teatro da Sociedade de Instrução Tavaredense, tendo sido elevado o número de pessoas que não pôde obter lugar. A lotação esgotou-se mais uma vez, como nas vinte e tantas representações anteriores.


No 3º acto, o quadro novo As pragas do Egipto produziu esplêndido eleito. Os scenários são do sr. dr. João Carlos Gomes e o guarda-roupa, que é excelente, foi executado segundo figurinos do sr. Henrique Tavares. As decorações foram feitas pelas alunas dêste distinto artista, srªs DD. Henriqueta Leite da Silva, Maria Eugénia Coelho, Guiomar Gaspar da Mota Veiga, Regina Simões, Cremilde de Freitas, Emília Saraiva, Celeste Amaral e Ilda Carvalheiro.


O número da Fonte de Tavarede igualmente agradou muito.


A assistência aplaudiu calorosamente O Sonho do Cavador, que continua firme no agrado do público. (Voz da Justiça – 07.05)


FIGUEIRA – TOMAR

De Tomar – Impossível dar uma notícia, embora resumida, a tempo de ser publicada na Voz da Justiça de quarta-feira, pela qual os leitores possam avaliar o que foi a recepção que aqui teve a excursão organizada pela Sociedade de Instrução Tavaredense. Imponência, beleza, entusiasmo, sinceridade – eis as características dessa admirável recepção, que não esquece aos que da Figueira vieram a Tomar.


Na estação as duas centenas de excursionistas eram aguardados por enorme multidão. O povo de Tomar – que admirável, hospitaleiro e carinhoso povo, êste de Tomar! – acorreu a receber e saudar os visitantes.


Um cortejo imponente, constituido pelas duas bandas e tuna locais, representantes de várias colectividades, imprensa, etc., atravessou as ruas de Tomar por entre aclamações à Figueira, a Tomar e à Sociedade de Instrução Tavaredense. O aspecto da rua principal era imponentíssimo, com colgaduras de damasco nas janelas. Senhoras gentilíssimas lançavam flores sôbre os visitantes.


A sessão de boas-vindas na Câmara Municipal foi entusiástica.


À noite, a récita com A Cigarra e a Formiga – com uma casa à cunha – atingiu um êxito indescritivel. O pano subiu duas, três, quatro vezes, e as aclamações delirantes, não cessavam. Foi colocada no estandarte da Sociedade de Instrução Tavaredense uma lindíssima fita.


A comissão de senhoras e a comissão de recepção foram duma gentileza rara. Encantaram-nos.


Dentro de 2 horas começará a representação do Sonho do Cavador, em benefício da Misericórdia de Tomar. Grande entusiasmo.

Só no próximo número é possível fazer relato desenvolvido. (Voz da Justiça – 07.09)


FIGUEIRA – TOMAR

A direcção da simpática Sociedade de Instrução Tavaredense tem fortes razões para sentir-se inteiramente satisfeita com o brilho invulgar, com o êxito verdadeiramente notável da sua última iniciativa: a visita a Tomar.


Promovendo esta visita, a Sociedade de Instrução não proporcionou somente um passeio magnífico, tanto sob o ponto de vista de beleza como educativo, aos 80 elementos da sua secção teatral: realizou um acto digno de ser considerado pelo que êle representa de valioso no estreitamento de relações entre Figueira e Tomar, na propaganda recíproca das duas cidades.


Tomar conhece mais a Figueira do que a Figueira conhece Tomar. Ali o número de pessoas que vêm à nossa praia passar o verão é relativamente elevado, constituindo uma colónia em que predominam a admiração e a simpatia pela nossa terra. Com a visita de agora, se esta simpatia naturalmente alastra e se avigora, também é verdade que Tomar conquistou lugar no espírito dos figueirenses, que para a Figueira vieram verdadeiramente encantados. E tanto e de tal maneira, que muitos se dispõem a repetir o passeio e fazem, aliás com verdade, a mais convincente propaganda de Tomar.


E compreende-se que assim seja!


Tomar é uma terra privilegiada de beleza. A cidade não é grande. Quem subiu lá acima ao castelo – que panorama de deslumbramento! – vê-a muito aconchegada, as casas encostadas umas às outras, comprimindo-se, afastando-se dum e outro lado das ruas perpendiculares que vão dar ao sopé do monte, partindo da praça em frente da Câmara, até que a vista encontra, lá ao fundo, a corrente verde-azulada do rio, ensombrado de esguios choupos e langorosos chorões. Mas as suas belezas naturais e o valor artístico dos seus monumentos dão-lhe grande e justo renome como verdadeira cidade de turismo que é.


A paisagem é deslumbradora. Em redor, perdendo-se nos longes, alastra na planície e trepa às encostas a mancha acizentada dos olivedos, sôbre os quais o oiro do sol parece transformar-se em prata.


Mais perto de nós, nos jardins e nos quintais que ficam dentro da cidade, a vegetação é exuberante, o verde é o fundo sôbre que se projecta e brinca e se transforma a luz.


Há frescura saudável – Tomar bebe-a constantemente no seu rio pródigo e lindo, fonte de riqueza e de poesia: são as águas nabantinas que alimentam as noras pitorescas que regam hortas e jardins, e cantam nos açudes a canção da energia que movimenta os maquinismos das fábricas, e dão a graça e a ternura ao arvoredo e às sebes das margens acolhedoras que chamam pelo Amor...


O convento de Cristo é uma jóia que por si só justifica uma visita a Tomar. O espírito sente-se preso no rendilhado daquelas pedras que falam da nossa história – e as horas passam sem que sintamos aproximar o desejo de nos apartarmos de tanta maravilha.


E o povo de Tomar? A sua franqueza, a sua comunicativa sinceridade, o carinho que não esconde aos seus visitantes, o espírito acolhedor que faz a sua tradição de povo hospitaleiro como nenhum outro o é mais!


Tomar vivia há cêrca de um mês no pensamento dos promotores dêste passeio. Até que o dia próprio chegou.


A excursão partiu da Figueira no combóio das 9,50 de domingo, seguindo nela, além dos elementos do grupo teatral da Sociedade de Instrução Tavaredense, muitas outras pessoas da Figueira. Eram cêrca de duas centenas os excursionistas. E muitas mais teriam sido se a Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses tivesse concedido facilidades para o transporte. Além das que seguiram pelo combóio muitas pessoas foram da Figueira em automóveis.


Após uma longa demora na Lamarosa, chega o combóio que conduz a excursão pelo ramal de Tomar.


Os figueirenses sabiam, contavam que seriam recebidos com simpatia. Mas não podiam esperar a grandiosidade das manifestações que lhes reservavam os tomarenses.


Finalmente o combóio parou, e uma grande girândola de foguetes estraleja no espaço. Cá dentro, na gare, trocam-se os primeiros cumprimentos estão a comissão de recepção, representantes da Câmara Municipal, das diversas agremiações locais, imprensa, etc.; está também a comissão de gentis senhoras, a quem o presidente da Sociedade de Instrução Tavaredense oferece, em nome dos excursionistas, um lindíssimo ramo de cravos.


Lá fora, uma multidão enorme aguardava os visitantes. A manifestação é calorosa, ouvindo-se palmas e vivas incessantemente. O estandarte da Sociedade de Instrução cruza com os das associações que ali esperavam. A Tuna Comercial e Industrial de Tomar, a Banda Republicana Marcial Nabantina e a Sociedade Filarmónica Gualdim Pais executam os seus hinos. E, em meio de grande entusiasmo, forma-se um cortejo imponente em que estão representados, além da comissão de recepção, a Câmara Municipal, Associação Comercial e Industrial, Centro Democrático Tomarense, Clube Tomarense, Grémio Artístico Tomarense, Tuna Comercial e Industrial de Tomar, Banda Republicana Marcial Nabantina, Sociedade Filarmónica Gualdim Pais, Sporting Clube de Tomar, União Foot-ball Comércio e Indústria, Associação de Classe dos Caixeiros de Tomar, Orfeão Tomarense, jornal “De Tomar”, jornal “Acção”, Liga dos Combatentes da Grande Guerra, os excursionistas e muito povo.


O cortejo atravessou as ruas da cidade por entre aclamações e vivas. Das janelas pendiam ricas e lindas colchas e as senhoras atiravam flores. Os da Figueira, entusiasmados e reconhecidos, gritavam: - “Viva Tomar! Vivam as senhoras de Tomar! Viva o povo tomarense!” – e logo a multidão correspondia e as muitas centenas de vozes diziam: “Viva a Figueira! Viva a Sociedade de Instrução Tavaredense!”.


O cortejo, enorme, imponente, as bandas de música e a tuna tocando alternadamente, sobe a Rua de Serpa Pinto, cujo aspecto era deslumbrante. As aclamações sucedem-se e as flores não deixam de caír das janelas engalanadas. Ao desembocar na praça, em frente ao edifício da Câmara Municipal, uma grande girândola de foguetes sobe e estraleja no ar.


Os excursionistas são recebidos na escada pela comissão administrativa e sobem ao andar nobre. A sala das sessões enche-se rapidamente, ficando a multidão pela escadaria e no largo fronteiro.


O sr. tenente José da Rocha Mendes, vogal da comissão administrativa que estava servindo de presidente, apresenta saudações de boas-vindas aos visitantes.


No seu discurso fala das belezas de Tomar, dos seus atractivos como cidade de turismo, dos seus monumentos gloriosos. Afirma a sua simpatia pelos visitantes e faz um elogio rasgado e caloroso da acção educativa da Sociedade de Instrução Tavaredense, promotora desta excursão, lamentando que associações como estas não estejam espalhadas por todo o país. Ao terminar, afirmando o seu desejo de que os visitantes levem de Tomar as mesmas agradáveis impressões que de si hão de deixar, ouviu-se uma entusiástica e prolongada ovação.


Respondeu José Ribeiro em nome dos excursionistas. Num discurso breve agradeceu as saudações e afirmou o seu reconhecimento perdurável pelo acolhimento mais do que amável, mais do que gentil, porque era sinceramente carinhoso, que lhes dispensava o povo de Tomar e que ali, na Câmara Municipal, tão eloquentemente se ratificava. E, tendo palavras de admiração pela cidade de Tomar, e pelas qualidades afectivas e virtudes cívicas do seu povo, terminou erguendo um viva a Tomar, que foi secundado e aplaudido delirantemente.


Terminada a sessão de boas-vindas, que foi entusiástica e amistosíssima, o cortejo dispersou.


Depois de a Direcção da Sociedade de Instrução Tavaredense ter apresentado cumprimentos no Quartel General, foi recebida, com mais figueirenses que a acompanhavam, no Grémio Artístico, onde lhe foi oferecido um “Pôrto de Honra” pela comissão de recepção, constituída pelos senhores..........


Trocaram-se entusiásticos brindes por Tomar, pela Figueira, por Tavarede, pelas agremiações de Tomar e pela Sociedade promotora da excursão.


Esta gentileza da comissão de recepção – que não seria a última! – deixou os visitantes reconhecidíssimos.


Muitos excursionistas aproveitaram o resto da tarde para visitar os lugares pitorescos da cidade.


À noite realizava-se no teatro a récita anunciada, na qual o grupo da Sociedade de Instrução Tavaredense representava a fantasia A Cigarra e a Formiga.


Os visitantes, ao entrarem no teatro, não puderam esconder a sua surprêsa. A sala estava ricamente ornamentada. Mas não era apenas a riqueza da ornamentação que deslumbrava: eram, sobretudo, o seu bom-gôsto e a sua requintada feição artística. No proscénio, suspensas no alto, uma enorme cigarra e uma formiga de igual tamanho eram como que o título da peça que ia representar-se ali no palco. Magistralmente construídas, são um trabalho que honra quem o fez, o sr. Augusto Alves Henriques. E tôda a restante ornamentação, que recebeu a influência e foi dirigida pelo sentimento artístico do sr. Francisco António Ainado, era alusiva à peça. Na ribalta, sôbre a verdura das ervas, viam-se dois carreiros de formigas – curiosíssima estilização – carregando caixas e sacos; a um e outro lado do palco, duas grandes cigarras tocando guitarra, com efeitos de luz eléctrica. No primeiro balcão, em tôda a volta, em quadros encimados por uma cigarra, descrevia-se a fábula de La Fontaine; aqui e ali, sôbre as colchas riquíssimas artisticamente dispostas, mais cigarras; e ainda em tôda a volta – um friso de formigas; e muitas flores artificiais, feitas por mãos delicadas de senhoras, agrupavam-se em lindos desenhos. Tudo isto formava um conjunto raro de beleza, produzindo um efeito deslumbrante.


Quando subiu o pano, estavam no palco a comissão de gentis senhoras de Tomar – srªs DD.........., alguns elementos da comissão de recepção e os representantes da Sociedade de Instrução Tavaredense, com o estandarte. A orquestra executou o hino desta colectividade, que a assistência saúda com uma carinhosa salva de palmas.


O sr. dr. Amilcar Tavares Casquilho faz, num discurso brilhante, a apresentação do grupo de amadores tavaredenses e do sr. dr. José Gomes Cruz, que com perfeito conhecimento poderá falar à assistência da acção dêste simpático núcleo. Regosija-se com esta visita, salientando as vantagens que podem resultar dum maior estreitamento de relações entre a Figueira e Tomar, e termina com um viva à Sociedade de Instrução Tavaredense. A assistência aplaudiu demoradamente o sr. dr. Casquilho.


Respondeu-lhe o sr. dr. José Cruz, que agradeceu as referências feitas e explicou a constituição dêste grupo de amadores da sua terra, falando também sôbre a obra educativa da Sociedade de Instrução. Terminou exprimindo a gratidão que ia no espírito de todos os que vieram a Tomar e aqui tiveram o penhorante e inesquecível acolhimento que lhes foi dispensado. Uma salva de palmas, entusiásticas, demorada se ouviu sôbre as últimas palavras do ilustre tavaredense, palmas que de novo se reacendem quando da comissão de senhoras se destaca a figura gentilíssima da sua presidente e coloca na bandeira da Sociedade de Instrução Tavaredense uma fita comemorativa desta visita. É uma riquíssima fita de sêda preta e vermelha – as côres da cidade de Tomar – primoroso trabalho de pintura do sr. Joaquim Tamagnini Barbosa, figura de prestígio moral pelas suas qualidades e virtudes cívicas e que desta forma se associou às homenagens prestadas pelos tomarenses.


Seguiu-se a representação da fantasia A Cigarra e a Formiga, cujo agrado foi enorme. Logo no 1º acto, quando terminou o número de apresentação de José Cigarra, a assistência irrompeu na ovação mais calorosa que pode imaginar-se. Os bravos e as palmas demoraram-se com um entusiasmo indescritivel. Muitos números foram bisados e nos finais de acto as ovações atingiram o rubro.


A assistência, tendo sabido que estava num camarote o distinto artista e poeta Alberto de Lacerda, obrigou-o a vir ao palco. António Simões teve várias chamadas especiais, sendo aplaudidíssimo com admiração e simpatia.


O teatro estava cheio e os espectadores retiraram com uma impressão de agrado que a ninguém escondiam.


Tomar tem a sua Misericórdia. É uma instituição benemérita, cujo estabelecimento hospitalar é digno de ver-se. Faz honra à cidade. Não será fácil encontrar melhor, nem sequer igual, em terras como Tomar. Quem o visita traz de lá uma impressão que não esquece. A amplidão dos seus corredores, o asseio irrepreensível, o confôrto que se prodigaliza aos doentes, o bem-estar possível, as enfermarias bem arejadas e cheias de luz, a esplêndida e moderna sala de cirurgia – como a da Misericórdia da Figueira -, tôdas as dependências e instalações bem situadas, conforme o plano geral previamente estudado por arquitecto competente, tudo isto e o mais impressiona bem. E êste notabilíssimo desenvolvimento do hospital de Tomar é obra de relativamente poucos anos. Fez-se com um auxílio dum donativo de 240 contos do benemérito sr. João de Oliveira Casquilho, honrado e bemquisto cidadão felizmente ainda vivo, com mais de 90 anos, e cuja actividade e espírito empreendedor estão bem patentes na sua fábrica de papel da Matrena. Mas esta obra benemérita do hospital deve-se também à sua Mesa administrativa, que tem como provedor o respeitado tomarense sr. João Tôrres Pereira, figura de prestígio cujos cabelos brancos falam dos seus muitos anos de dedicação à sua terra; e principalmente, ao distinto médico sr. dr. Cândido Madureira, alma talhada para o bem, dedicando-se inteiramente ao sofrimento alheio. Trabalha no hospital há quási trinta anos, com uma devoção, uma pertinácia e, sobretudo, uma inteligência notáveis. Quando se encontram exemplos como êste do dr. Madureira – que a população tomarense justamente admira com simpatia – não se pode deixar de acreditar na solidariedade e na bondade da alma.


Pois a Sociedade de Instrução Tavaredense ofereceu à Misericórdia a récita de segunda-feira.


O teatro encheu-se de novo. O mesmo entusiasmo. A mesma vibração. O mesmo sentimento de carinho a manifestar-se em tudo e em todos. Se na véspera intérpretes, autores e maestro foram aplaudidos e chamados, não o foram com menos entusiasmo no Sonho do Cavador. A excelente orquestra contribuiu poderosamente para o brilho do espectáculo. Justamente foi de novo chamado ao palco António Simões, a quem os espectadores significaram o seu muito agrado pela formosa partitura. E a récita terminou – tendo José Ribeiro proferido algumas palavras de despedida e agradecimento – em meio dum entusiasmo delirante.


O provedor da Misericórdia e o médico sr. sr. Madureira foram ao palco cumprimentar o grupo.
O regresso fêz-se na têrça-feira, no combóio que sai de Tomar às 12,35.


À estação do caminho e ferro foram apresentar despedidas representantes da comissão de recepção e de várias organizações locais. Também ali estiveram os srs. Tôrres Pereira e dr. Cândido Madureira, representando a Misericórdia. À partida do combóio ergueram-se vivas e trocaram-se despedidas que exprimiam a alegria e a saudade, tanto nos que partiam como nos que ficavam.


Uma outra demonstração de simpatia estava ainda reservada aos excursionistas: um grupo de tomarenses veio de automóvel a Chão de Maçãs, ao encontro do combóio em que a excursão regressava à Figueira, fazendo entrega dum ramo de flores.


= Os excursionistas, dividindo-se em grupos, visitaram os pontos mais agradáveis da cidade, monumentos, fábricas, etc. Demoraram-se no aprazível parque do Monchão, gozando a sua amenidade; subiram ao castelo dos templários, percorreram o famoso e formoso Convento de Cristo; viram funcionar as fábricas de tecidos de algodão, assistiram ao fabrico de papel no Prado e na Matrena, etc. etc. De tôda a parte trouxeram as impressões mais gratas pelas facilidades que lhes dispensaram.


= Assistiu aos dois espectáculos o sr. brigadeiro Lacerda Machado, comandante da região, a quem a comissão de recepção apresentou a direcção da Sociedade de Instrução Tavaredense.


= Muitas foram as amabilidades recebidas. A firma Joaquim José Soeiro, ofereceu às amadoras do grupo dramático uma caixa de finíssimos rebuçados da sua fábrica “A Preferida”.


= A direcção do Grémio Artístico foi duma cativante gentileza para com os visitantes, pondo as suas salas inteiramente à sua disposição. No fim dos espectáculos foram ali oferecidos bailes aos componentes do grupo dramático e pessoas que o acompanhavam, dançando-se animadamente, nas duas noites, até cêrca das 5 horas da madrugada.


= Os excursionistas, que se distribuiram pelo Hotel União Comercial, Pensão Moderna e Hotel Nabão, fazem as melhores referências à maneira como foram tratados.


= A Sociedade promotora desta visita está reconhecidíssima à comissão de recepção, que foi incansável. A gratidão da Sociedade de Instrução Tavaredense é profunda, e não pode exprimir-se em palavras.

Merece também os maiores elogios o Sporting Clube de Tomar, que propositadamente não deu espectáculo no domingo.


Foi ainda importantíssima a colaboração dos briosos rapazes do União Foot-ball Comércio e Indústria, na ornamentação do teatro. Durante noites consecutivas trabalhou-se activamente nas salas dêste clube.


= O jornal “De Tomar” publicou um número especial que foi distribuído pelos visitantes. A primeira página era-lhes dedicada e trazia uma gravura da praia da Figueira.


= Regosijamo-nos com o êxito brilhantíssimo desta iniciativa da Sociedade de Instrução Tavaredense. Felicitamo-la.


E, saudando a hospitaleira cidade de Tomar, formulamos sinceros votos pelo seu progresso. (Voz da Justiça – 07.12)

RECORDAÇÕES DE TAVAREDE

(Muita coisa já tenho recordado destas 'Recordações de Tavarede, escritas pelo figueirense Ernesto Fernandes Tomás, e que foram publicadas na 'Gazeta da Figueira' ao longo do ano de 1896. Pareceu-me, no entanto, que seria interessante recordar toda a notícia. É muito interessante, pois dá-nos a conhecer a vida da nossa terra pelos anos de 1865/1868)



A um pouco que vamos dizer de Tavarede, não seria fora de propósito fazel-o, encimando os rabiscos com a epigraphe - Uma viagem á China. Para o leitor desprevenido ha-de parecer esta introducção a proposito d’um enygma. Pois não é. Explicando:


Ahi pelos anos de 1865, tendo voltado d’umas voltas pela America, no primeiro domingo que tinha adiante, depois da chegada, ouvi falar uns rapazes amigos em uns theatros em Tavarede.


Desde creança, um lamechas por divertimentos de tal genero, acompanhei até lá os amigos e sem mais demora... a caminho de Tavarede.


* * *

Tavarede era então um pequeno burgo, menos desenvolvido que hoje, anegrado por uns grupos de casas em derrocada, que serviram de habitação a uma população pobrissima de trabalhadores laboriosos, vivendo uns dias de trabalho n’esta cidade, enquanto que outros, transformando os terrenos á volta da antiga povoação, nos proporcionavam o gozo de um jardim de cintura, alegre, verdejante, provocando-nos ao viver no campo.


Tavarede assim, a povoação dos tempos coevos da monarchia, engrandecida mais tarde com o foral de D. Manoel, trazia-nos á memoria umas lendas tradiccionaes ali escondidas entre verduras e flores. Bons tempos esses!


Como até hoje, os edifícios que nos chamavam a attenção, mais pelo contraste da sua extensão, com a exiguidade das outras pobres construcções, eram: o Paço, a Igreja, a casa denominada - da Renda e uma outra ao cimo da povoação pelo lado do norte, que nos indicavam como a casa de Ourão. Ainda outra deixava de entrar n’esta relação, e que existe ainda com boa apparencia ao lado do caminho para a fonte da povoação, a que chamavam a - casa do sr. João Anselmo.


Quando por essa epocha entrei, pela primeira vez, no edifício do Paço, velho alcaçar aonde esteve D. Maria Mendes Petit, mãe de Pero Coelho, um dos que fizeram de D. Ignez de Castro uma victima, condemnada pelo seu amor clandestino; quando subi aquellas escadas de pedra, frias e humidas que iam dar ao andar nobre do edifício e percorri aquellas salas vastas, mas sem conforto, lembrou-me mais do que uma vez que por ali teriam andado os passos do velho soldado da India, D. Francisco d’Almada, que por lá teria pizado António Pereira de Quadros, e a ultima habitante do velho solar, D. Antónia Magdalena de Quadros e Sousa.


Estes últimos jazem hoje junto ao altar-mor, em carneiro, na egreja da Mizericordia d’esta cidade, edificado em terrenos que lhes pertenciam e ao antigo couto de Tavarede.


Percorrendo aquella antiquissima habitação, ainda encontrámos os restos d’um altar, n’uma das divisões ao lado do corredor principal que se dirige, no andar nobre, do norte ao sul. Um oratório, apresentando o seu esqueleto em madeira, tosca, conserva ainda ligados uns restos de forro de panno escuro, com umas linhas de galão sem brilho já.


De resto nada de interessante.


Descendo ao rez-do-chão do Paço encontrámos tambem os despojos, de madeira e ferro, de um vehiculo de luxo, que poderiam ter pertencido a uma sege ou carroção a bois, cuja entidade se escondia nas brumas do passado.


Uma tradicção que ouvimos do povo e que se liga á existencia d’umas columnas de marmore branco, muito correctas, que dividem a meio, verticalmente, as janellas da frente do Paço, hoje dos Condes de Tavarede, diz-nos que D. Francisco d’Almada, tendo combatido na India ou na Africa, os infieis, no assalto a um pagode do gentilismo, depois de o tomar, trouxe, para Lisboa, na armada, as columnas do pagode, que foram distribuidas como galardão áquelles que mais se distinguiram na guerra.


A egreja de Tavarede, na sua architectura acanhada e ornatos architectonicos ressentidos do cunho das construcções jesuiticas, é, como todos os outros edifícios, um exemplar dos da época quinhentista. Obedecendo ás pragmáticas e mandados dos frades cruzios, então n’esse caso dominantes, mostra-nos, em um edifício, o obrigativo das suas regras, o seu sello de auctoridade, isto como em tudo que os tivesse de authenticar. Nada sabemos da época precisa da sua fundação.


Nas cauzas que dizem respeito á historia das povoações do nosso concelho, encontramos em tudo uma falha quasi completa de dados auctorizados, que nos faz vacillar, para descrever, sem mentir.


Da casa de Ourão, apenas nos consta que uma gente de linhagem fidalga possuia esta casa, e que alguns habitantes de Tavarede lhe eram obrigados ao pagamento de fóros de que eram senhoria. (Gazeta da Figueira - 8.2.1886)