sábado, 30 de junho de 2012

Teatro da S.I.T. - Notas e Críticas - 34

1965.01.14 - BREVE ENTREVISTA COM MESTRE JOSÉ RIBEIRO (A VOZ DA FIGUEIRA)

Continua a Sociedade de Instrução Tavaredense a dar execução ao seu programa de educação e cultura popular através do teatro. A actividade do seu grupo cénico é verdadeiramente excepcional, se atendermos ao meio onde, desde há mais de meio século, ela se desenvolve. Depois do notável programa “Noite de Teatro Português”, com obras de Gil Vicente e Luís Francisco Rebelo, um novo espectáculo está a ser preparado, que será duplamente assinalável: pela peça em si e pela circunstância de se tratar de um autor estrangeiro até agora ainda não representado em Portugal. Referimo-nos à peça “Omara”, que terá a sua estreia no sábado, 16 do corrente, em Tavarede. O facto parece-nos realmente sensacional, e por isso quisemos ouvir o director do grupo cénico da benemérita colectividade, sr. José Ribeiro, que sem o menor constrangimento se dispôs a atender-nos.

. É verdade que os amadores tavaredenses vão representar uma peça estrangeira ainda não representada em Portugal?

. É exacto. A peça “Omara” vai ter a sua estreia em Portugal na Sociedade de Instrução Tavaredense.

Ante a nossa admiração, o nosso entrevistado acrescentou:

. Compreendo perfeitamente que o facto o surpreenda. São tantas e tais as dificuldades dos grupos de amadores na obtenção de peça representável, que causa certo espanto poder o grupo de Tavarede representar uma obra ainda não levada à cena nos palcos portugueses.

. Isto é muito honroso para a Sociedade de Instrução Tavaredense, pois não é assim?

. Sem dúvida, muito honroso, não apenas pela estreia da peça, mas também pela categoria do seu autor, o notável dramaturgo hispano-mexicano Sigfredo Gordon, ainda até hoje não representado em Portugal.

. Como chegou essa obra a Tavarede?

. Foi o figueirense dr. Joaquim Montezuma de Carvalho, critico de alta craveira e apaixonado estudioso das literaturas latino-americanas, que nos proporcionou o ensejo feliz de travarmos conhecimento com o autor de “Omara”. Poeta e escritor, Sigfredo Gordon é um grande, um autêntico dramaturgo, com uma vasta obra de teatro: aos 54 anos de idade, 33 peças, 12 das quais já publicadas nos seus 4 volumes de teatro. E, deixe-me que lhe diga, é lástima que os nossos palcos, onde tantas vezes se exibem traduções de obras cujos méritos residem somente no facto de serem estrangeiras, não tenham apresentado até hoje nenhuma deste notável escritor de teatro, que tão bem usa a forma clássica como a moderna e cuja apurada técnica é servida por uma linguagem de riquíssima expressão teatral, um grande poder de síntese criador de belas e vigorosas situações dramáticas e uma extraordinária facilidade de dialogar, seja nos domínios da arrojada fantasia ou na teatralização realista.

. E foi o autor que indicou a peça para Tavarede?

. Não. “Omara” foi escolhida por nós. É admirável, e exultamos por nos ter sido permitido representá-la. Como igualmente muito gostariamos de representar outras do mesmo autor, por exemplo, La Venus de Sal, Uma Casa en lo Alto, La Muerte, Manda Tres Rosas...

. Pode dizer-nos alguma coisa acerca da interpretação pelos amadores tavaredenses e do critério seguido na encenação de “Omara”?

. Lá o poder, posso – mas não devo. Essas coisas vêem-se no palco – e podem ver-se no sábado em Tavarede, sem necessidade de nos pormos a fazer crítica antecipada, que poderia parecer... desnecessária justificação ou tentativa de desculpa... Direi, isso sim, que todos na SIT nos empenhamos em apresentar a peça com a dignidade e o respeito que a obra e o autor merecem.

. Ainda uma pergunta: a Sociedade de Instrução Tavaredense toma parte no festival de Teatro Amador de Coimbra?

. Sim. Esse Festival, cuja realização se fica devendo ao corajoso Ateneu de Coimbra e ao seu ilustre orientador dr. Mário Temido, está a decorrer com grande brilho. Nele intervêm os grupos de teatro do CITAC, das Caldas da Rainha, de Aveiro, do Ateneu de Coimbra, do TEUC e da Sociedade de Instrução Tavaredense, que levará “Omara”.

Agradecemos a franqueza com que as nossas perguntas foram respondidas. E ao despedirmo-nos arriscámos ainda:

. Ouvimos dizer que esta peça de Sigfredo Gordon foi cedida a Tavarede com isenção de pagamento de direitos de autor, o que nos parece extraordinário, sabendo-se como é difícil aos grupos de amadores obterem autorização para representar certas peças, mesmo pagando direitos...

. Sim, sim... É o caso de Para Cada Um Sua Verdade, do Processo de Jesus... Mas isso é outra história. Adiante... Por muito estranho que pareça, a verdade é que Sigfredo Gordon, com uma gentileza que nos desvanece e muito honra os tavaredenses, autorizou a Sociedade de Instrução Tavaredense a traduzir a peça, no que foi generosamente secundado pelo seu representante, sr. D. Juan Enrique Bécker (Agência Internacional de Teatro e de Literatura Latino-Americanos, com sede na Suiça), que logo autorizou a representação de “Omara” com total isenção de pagamento de direitos de autor. E agora permita-nos a nós uma pergunta: Que diz a esta tão expressiva, e tão rara, manifestação de simpatia pela actividade dos grupos de teatro amador?

Não dissemos nada. E assim terminou a entrevista, com uma pergunta do entrevistado que deixámos sem resposta.

1965.01.16 - TEATRO EM TAVAREDE (O FIGUEIRENSE)

Pode considerar-se excepcional a actividade da velha colectividade da vizinha Tavarede. O grupo dramático da Sociedade de Instrução Tavaredense, que ainda há pouco apresentou o notável programa “Noite de Teatro Português”, com obras de Gil Vicente, Garrett e Luís Francisco Rebelo, oferece hoje ao seu público um espectáculo com foros de sensacional: representa a peça em 1 prólogo, 2 actos e 1 epílogo Omara, original de Sigfredo Gordon.

Trata-se de um grande dramaturgo hispano-mexicano, até hoje ainda não representado em Portugal. E não deixa de ser digno de registo que tenha sido dada aos amadores de Tavarede a honra de a representarem pela primeira vez no nosso país.

Pela peça que hoje subirá à cena em Tavarede – e Omara é uma obra-prima – pode aquilatar-se da craveira do seu autor, cuja vasta produção teatral vai já em 33 peças de teatro, além de outros volumes de prosa e verso. Ora, precisamente porque se trata dum grande escritor, esta estreia de Omara em Portugal reveste-se de significado especial. Foi o próprio autor que autorizou a Sociedade de Instrução Tavaredense a fazer a tradução da peça para o seu grupo cénico, e seguindo-o na mesma atitude, o seu representante internacional D. Juan Enrique Bécquer (Suiça) logo autorizou a representação de Omara com total isenção de direitos. Regista-se o facto, que traduz uma calorosa e eficiente manifestação de simpatia pelos grupos de teatro amador, e que é tanto mais digno de ser posto em foco quando são bem conhecidas as dificuldades que tanta vez impedem os amadores de representarem certas peças, mesmo pagando direitos.

Por todos os motivos se aguarda com invulgar interesse a representação de Omara, hoje em Tavarede.

1965.01.21 - UMA PEÇA NOTÁVEL “OMARA” (A VOZ DA FIGUEIRA)

Foi verdadeiramente sensacional o espectáculo de sábado passado – e que se repete no sábado próximo, dia 23 – na Sociedade de Instrução Tavaredense. A representação de “Omara” despertou uma curiosidade fora do vulgar: porque se tratava de uma obra dramática de alta categoria que ia ter a sua estreia em Portugal no teatro de Tavarede.

Muitas horas antes do espectáculo já a lotação estava esgotada! E muitos foram os sócios da benemérita Sociedade de Instrução Tavaredense que não conseguiram obter lugar, tendo por isso de esperar pela repetição da peça, o que desde já assegura uma nova enchente.

A espectativa não foi iludida. Às qualidades da obra, solidamente construída, forte no realismo das figuras e do conflito e rica de beleza literária, correspondeu um desempenho equilibrado, atingindo por vezes um alto nível artístico, numa moldura cénica ajustada, que honra os amadores tavaredenses.

Sem dúvida, “Omara” é uma admirável obra teatral, e a sua economia de meios avoluma as responsabilidades da representação: o drama surge e é vivido entre mãe e filho, uma criada velha e o velho médico amigo íntimo daquela reduzida familia. Nele intervêm, também, episodicamente, a noiva do rapaz, o jardineiro da casa e um inspector da polícia que nos dá o prólogo e epílogo da peça. Com este reduzido elenco, Sigfredo Gordon escreveu uma obra de grande intensidade dramática, porque o caso é desenvolvido com personagens que são figuras humanas, que têm corpo e têm alma.

O grupo de amadores tavaredenses brilhou na interpretação de “Omara”, e não obstante uma ou outra ligeira hesitação própria duma noite de estreia, mostrou-se à altura do seu grande cometimento. Violinda Medina e Silva (Omara) foi a mãe apaixonada pelo filho que criou com um amor doentio, ultrapassando o puro amor maternal. Figura dominante da peça, exigindo intérpretes de grandes faculdades histriónicas, Violinda soube dar com espantosa verdade cénica o carácter daquela mulher forte, apaixonada, tão duramente tratada pelo destino e que se não deixa vencer, capaz de todas as violências – até a de matar o filho para que outra mulher, uma noiva, lho não venha roubar – e de todos os sacrifícios – até o do aniquilamento total, que consuma proferindo pela primeira vez a palavra – Mãe. Deu-lhe excelente réplica, no seu difícil papel do filho (Carlos), José Medina, que marcou bem no 1º. acto a alegria dum moço feliz e subiu alto na tragédia do 2º. acto e na renúncia sublime do epílogo, que põe inesperado e belo fecho à peça. João Cascão, excelente, cheio de carácter, rico de naturalidade e de intenção no velho médico da casa (Dr. Ayala); Fernando Reis confirmou seu méritos dando-nos um Inspector seguro no seu ofício, mas desviado pela força das aparências e um tanto por deformação profissional, do caminho da verdade; João Medina meteu-se na pele de Tobias, marcando com sobriedade a nota cómica do Jardineiro. Mas no naipe feminino há ainda dois elementos, duas excelentes amadoras, que merecem referência e mereceram os aplausos: Maria Dias Pereira (Ana), a velha ama, “fiel como um cão” à sua senhora; dolorosa no prólogo e no epílogo, deu a necessária vivacidade nos 2 actos intermédios; e Maria de Lourdes Moura, uma nova amadora que já se evidenciara nas duas peças anteriores (O Fim do Caminho e O Dia Seguinte) e que no papel de Virgínia, a noiva de Carlos, nos deixou a certeza dos seus progressos.

Os espectadores que enchiam a sala a transbordar, aplaudiram calorosamente, com palmas e chamadas: ao contrário do Inspector, que viu o crime onde só existiam total abnegação e sublime amor filial, os espectadores fizeram justiça. O mesmo vai suceder no próximo sábado, de novo com a casa cheia na repetição desta bela obra de Sigfredo Gordon – “Omara”.

1965.01.23 - OMARA (O FIGUEIRENSE)

O extraordinário interesse com que se guardava a nova peça do grupo cénico tavaredense encontrou plena justificação na representação de Omara, no pretérito sábado. Tratava-se de apresentar pela primeira vez em Portugal um escritor e poeta que figura nas primeiras filas da dramaturgia latino-americana – Sigfredo Gordon, autor de mais de três dezenas de obras de teatro, entre as quais Omara, gentil e generosamente cedida à Sociedade de Instrução Tavaredense, e agora posta em cena e representada com a dignidade e o brilho que tanto impressionaram os espectadores desta estreia sensacional.

A assistência era enorme, pois cedo a lotação do teatro se esgotou, pelo que foi grande o número de sócios que teve de resignar-se a esperar pela repetição da peça para poderem admirar uma verdadeira obra-prima teatral e um conjunto de interpretações de incontestável nível artístico. Foram por isso calorosos os aplausos que coroaram a representação de Omara – a cargo dum núcleo de excelentes amadores: Violinda Medina e Silva, Maria Dias Pereira, Maria de Lourdes Moura, José Medina, João Cascão, Fernando Reis e João Medina.

Omara constituíu, sob todos os aspectos, um belo êxito para a Sociedade de Instrução Tavaredense.

Merece especial registo o facto, muito honroso para os tavaredenses, de Sigfredo Gordon e o seu representante internacional, D. Juan Enrique Becquer terem facultado ao grupo tavaredense a representação de Omara, em estreia em Portugal, com total isenção de direitos de autor. Eis uma manifestação activa de simpatia pela obra cultural dos grupos de teatro amador, que não é frequente!

1965.01.28 - “OMARA” (A VOZ DA FIGUEIRA)

Novamente o excelente teatro de Tavarede se encheu no pretérito sábado, e os amadores da Sociedade de Instrução Tavaredense confirmaram o êxito da sua nova peça “Omara”: esta obra admirável foi mais uma vez calorosamente aplaudida por um público interessadíssimo.

Incluida no “I Festival de Teatro Amador”, o grupo de Tavarede levará Omara a Coimbra na próxima segunda-feira, pelo que a peça será representada em Tavarede, pela última vez, no sábado próximo, 30 do corrente.

Esta representação está a ser aguardada com especial interesse pois se trata duma festa de homenagem ao Autor, o grande dramaturgo hispano-mexicano Sigfredo Gordon. Estará presente o ilustre Director da Agencia Internacional de Teatro e Literatura Latino-Americanos, com sede na Suiça, D. Juan Enrique Becquer, representante de Sigfredo Gordon, que, em viagem a Lisboa, Madrid e Barcelona se deslocará propositadamente a Tavarede no sábado próximo, para assistir à representação de “Omara” pelos amadores tavaredenses.

Tem foros de sensacional a despedida do palco de Tavarede de “Omara”. Sábado será uma grande noite de festa na SIT, que está a ser esperada com enorme espectativa.

1965.02.06 - OMARA (O FIGUEIRENSE)

Como anunciámos, subiu á cena, no pretérito sábado, mais uma vez, no teatro da Sociedade de Instrução Tavaredense, a peça “Omara”, obra-prima do notável intelectual hispano-mexicano Sigfredo Gordon, tradução de José da Silva Ribeiro.

Foi uma noite inesquecível, de verdadeira apoteose, que dificilmente se desvanecerá da memória de todos quantos tiveram a felicidade de assistir à memorável récita, que teve a presenciá-la, além dos srs. Presidente da Câmara, vereador do pelouro da Cultura, Director do Museu e Biblioteca Municipais e outras individualidades e distintas senhoras da melhor sociedade figueirense, o sr. D. Juan Enrique Becquer, que, tendo vindo da Suiça ao nosso país em viagem relacionada com os interesses dos seus representados, se deslocara propositadamente a esta localidade para conhecer e apreciar o teatro tavaredense, que mestre José Ribeiro dirige com a maior dignidade e seu profundo saber há mais de 50 anos.

Antes do início do espectáculo, José Ribeiro dirigiu brilhante saudação ao nosso ilustre hóspede e manifestou-lhe o reconhecimento da SIT pela sua tão honrosa visita, que enchia de orgulho os tavaredenses.

O público, de pé, irrompeu numa calorosa manifestação, como raramente temos assistido na SIT, a D. Juan Enrique Becquer.

Então o ilustre diplomata, transmitindo as saudações de que era portador para a prestigiosa colectividade, de sua Exª o sr. Embaixador do México em Lisboa, agradeceu num vibrante improviso as demonstrações de simpatia e carinho de que estava sendo alvo.

A representação decorreu em elevado nível artístico, salientando-se, sem desprimor para os seus companheiros, a actuação da excepcional comediante que é Violinda Medina e Silva, na interpretação de “Omara”, que por isso a numerosa assistência lhe testemunhou e aos restantes intérpretes o seu alto apreço com entusiásticos e prolongados aplausos.

No final do espectáculo e em cena aberta foi oferecido pela Direcção ao sr. D. Juan Becquer um lindo ramo de cravos, que lhe foi entregue por Violinda Medina, depois do que teve lugar um fino “copo de água”, a que assistiram, além do homenageado, as ilustres individualidades presentes e o pessoal que tomou parte na inolvidável representação. Fizeram uso da palavra os srs Presidente da Câmara, Professor Rui Martins, Jerónimo Pais, António Lopes e D. Juan Becquer que renovou o seu reconhecimento pela encantadora recepção que lhe havia sido dispensada.

O sr. D. Juan Becquer, que chegara à Figueira na sexta-feira, regressou a Lisboa no domingo, tendo comparecido a apresentar-lhe cumprimentos e a desejar-lhe boa viagem, directores da SIT, Professor António Vitor Guerra e outros elementos da colectividade.

Durante a sua curta estadia nessa cidade, sua exª visitou, acompanhado dos srs. Professor António Vitor Guerra e José Ribeiro, a Casa do Paço, onde apreciou os artísticos e valiosos azulejos ali existentes, o Museu e Biblioteca, o Grande Hotel e a Serra da Boa Viagem, confessando-se encantado com a Praia da Claridade e o mais que lhe foi dado observar.

Na segunda-feira foi o mesmo grupo cénico a Coimbra, representar no Teatro Avenida, “Omara”, com que tomou parte no I Festival do Teatro Amador, da organização do Ateneu daquela cidade.

O público apreciou a peça e aplaudiu vibrantemente os tavaredenses.

No próximo domingo, 14, subirá à cena, em “matinée”, no teatro da SIT, a notável obra, para corresponder às exigências do público que ainda não teve possibilidades de assistir às representações anteriores de “Omara”.

Também no dia 22 do corrente e a convite da Empresa do Teatro Avenida o grupo dramático da SIT se deslocará a Aveiro para ali repetir o esplêndido espectáculo.

1965.02.11 - TEATRO NA SIT (A VOZ DA FIGUEIRA)

Alto momento de vibração bairrista foi vivido na récita de homenagem ao autor da peça “Omara”, que a Sociedade de Instrução Tavaredense conseguiu representar em condições honrosíssimas, como este jornal já largamente noticiou.

Estiveram presentes categorizadas individualidades figueirenses, mas a presença do sr. D. Juan Enrique Becquer, Director da Agência Internacional de Teatro e Literatura Latino-Americano (Suissa) imprimiu à festa um cunho do mais alto significado.

A abrir o espectáculo, mestre José Ribeiro saudou, num brilhante discurso, o ilustre visitante, testemunhando-lhe a gratidão da Sociedade de Instrução Tavaredense pela sua gentileza.

A plateia ergueu-se em peso para se associar, em estrondosa ovação, às palavras finais do orador.

O sr. Enrique Becquer agradeceu, em termos cativantes, o testemunho de simpatia e carinho com que o tinham distinguido, afirmando que era portador das saudações do sr. Embaixador do México em Lisboa, o qual só por motivos estranhos à sua vontade deixara de estar também ali presente.

No final do espectáculo, em cena aberta, foi oferecido ao sr. D. Juan Becquer um lindo ramo de cravos. A actriz amadora D. Violinda Medina e Silva fez a entrega.

Num copo de água realizado a seguir, fizeram uso da palavra o Presidente do Município, sr. Engº. José Coelho Jordão, prof. Rui Fernandes Martins, José da Silva Ribeiro, Jerónimo Pais, António de Oliveira Lopes e D. Juan Becquer, que reiterou o seu vivo agradecimento, pela recepção que lhe haviam dispensado.

Em suma, uma festa que deixou as melhores recordações.

É de justiça assinalar o êxito que o grupo cénico da SIT alcançou em Coimbra, no “I Festival de Teatro Amador”, com a representação da peça “Omara”, êxito eloquentemente traduzido nas vibrantes aclamações que o público lhe dispensou.

1965.02.07 - TEATRO (O FIGUEIRENSE)

Com a “matinée” de domingo último na Sociedade de Omstrução Tavaredense, terminou a série de espectáculos que o seu grupo cénico vinha efectuando com peça “Omara”.

Na segunda-feira, como anunciámos, foi a referida peça levada à cena no Teatro Aveirense.

Como sucedera em Tavarede e Coimbra, onde os intérpretes e seu ensaiador foram ardentemente aclamados, a distinta plateia aveirense também rendeu seus vibrantes louvores aos nossos conterrâneos.

De facto, a dignidade com que a notável obra foi posta em cena, impõe-se de tal maneira a quantos apreciam o chamado teatro sério, que o público, vivendo ardentemente o desenrolar da acção, não pode deixar de exteriorizar com seus aplausos entusiásticos o prazer espiritual que lhe porporciona o grupo de amadores tavaredense.

O pessoal do teatro Aveirense, assinalando a primorosa representação, ofereceu a mestre José Ribeiro uma artística lembrança e um ramo de bonitos cravos a Violinda Medina e Silva, que, na difícil interpretação da principal personagem, Omara, tem uma das suas mais brilhantes criações.

Antes, porém, o distinto advogado dr. David Cristo, saudou os tavaredenses, tecendo-lhes rasgados elogios, tendo palavras do maior apreço para com José da Silva Ribeiro pela persistência com que no decurso dos 50 anos de seu orientador artístico, vem contribuindo, poderosamente, através do teatro, para a elevação do grau de cultura do povo da sua e nossa terra.

José Ribeiro, num dos seus peculiares e sempre brilhantes improvisos, agradeceu a homenagem que lhe havia sido prestada pelos humildes servidores do Teatro Avenida, arrebatando a numerosa assistência que lhe tributou grandiosa ovação.

Como sempre, pelo que lhe ficamos profundamente gratos, a direcção da Empresa cumulou de gentilezas, que não esquecem, a caravana tavaredense.

1965.10.09 - TEATRO (O FIGUEIRENSE)

Com a presença de altas individualidades da Figueira da Foz, que emprestaram ao acto solenidade, representou-se no teatro da Sociedade de Instrução Tavaredense, no último sábado, como referimos, o espectáculo Vicentino, para assinalar o início das comemorações do V Centenário do nascimento do fundador do Teatro em Portugal, a que se propôs o grupo cénico daquela associação.

Noite grande de teatro a que tivemos o grato prazer de assistir. Espectáculo inesquecível, dominante, íamos a dizer de glória para o Teatro Tavaredense. E ousamos esta afirmação em face das opiniões que nos foram manifestadas por grande parte dos espectadores e que eram unânimes em reconhecer que a SIT possui, presentemente, em boa verdade, um esplêndido conjunto de amadores que honra sobremaneira a terra do limonete. É que a sua actuação em qualquer das obras de Gil Vicente representadas, foi de molde a merecer os maiores encómios do público.

Depois, aquele maravilhoso guarda-roupa da Casa Anahorym os artísticos cenários de Manuel de Oliveira e José Maria Marques, a impecável montagem de mestre José Ribeiro, que adequado jogo de luzes mais fazia realçar, quem poderá esquecer?

Antes de subir o pano, José da Silva Ribeiro veio ao proscénio para falar de Gil Vicente. No final da sua brilhante alocução, a numerosa assistência tributou-lhe calorosa ovação.

O grupo dramático da SIT está de parabéns e nós, que admiramos a sua dedicação pelo teatro, não podemos deixar também de lhes testemunhar o nosso melhor apreço e simpatia.

O distinto actor sr. Joaquim de Oliveira, grande estudioso de Gil Vicente, veio propositadamente de Lisboa assistir à memorável récita.

O espectáculo foi repetido no domingo, em “matinée”, tendo alcançado idêntico êxito.

1965.10.09 - UMA NOITE VICENTINA (O DEVER)

A Sociedade de Instrução Tavaredense dá-nos uma admirável lição, cheia de significado e consequências no momento presente: a de que é possível, num meio de características nitidamente populares, numa época em que qualquer actividade amadora que vise apenas a Cultura, parece votada, de antemão, ao mais total malogro, fazer Teatro, manter um genuíno amor por esse Teatro e através dele, educar, na mais bela e verdadeira acepção do termo.

Esse desmentido cotidiano aos que duvidam e aos que se rendem, produto de tanto sacrifício e devotamento, reveste-se de uma extraordinária importância. Mostra a todos nós que vale a pena lutar, que nunca o sacrifício é inglório, mesmo que o pareça, e que não é a bajular covardemente os instintos primários de um público ignorante que se serve esse mesmo público, mas sim a mostrar-lhe o que ele encerra em si de riquezas insuspeitas.

No esplêndido Teatro de Tavarede, sob a batuta de um mágico, repetiu-se o milagre. Gil Vicente ressuscitou, com mais vida, sem dúvida, do que nos saraus da corte joanina, porque ele “vive” nas suas personagens eternas e não nos seus dados biográficos, tão raros, tão vazios e tão inúteis...

Representado por aqueles que lhe forneceram a seiva vivificadora e para quem criou, não teve, é fora de dúvida, neste ano do Centenário homenagem mais digna dele próprio!...

1965.10.30 - SARAU VICENTINO (O DEVER)

Integrado nas festas comemorativas do V centenário do nascimento de Gil Vicente, realizou-se, no passado dia 27 do corrente, no teatro do Grande Casino Peninsular, um sarau Vicentino, que a todos agradou, plenamente, pelo alto nível em que decorreu.

Este espectáculo foi promovido pela Biblioteca Pública Municipal Pedro Fernandes Tomás e a ele assistiram, além de um numeroso e selecto público, individualidades de muito destaque da nossa cidade universitária.

Num brilhante improviso o distinto Director da Biblioteca, sr. Prof. António Vitor Guerra, agradeceu a todos os que com a sua presença pretenderam, também, homenagear a sublime figura de mestre Gil Vicente, o criador do teatro nacional. Com palavras altamente elogiosas endereçou, também, os seus agradecimentos ao grupo cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense, que na arte de representar tem sabido honrar as tradições do nosso concelho, graças ao muito saber e dedicação do seu encenador e director sr. José da Silva Ribeiro, que há 50 anos criteriosamente o dirige.

Antes da representação dos Autos foi a distinta assistência brindada, com uma magistral alocução, pelo sr. José da Silva Ribeiro, que em breves palavras traçou o perfil do criador do teatro português de sabor cómico e hierático de essência popular, revelando-nos a sua vida e obra com a fluência da sua palavra, sendo por isso muito aplaudido ao terminar a sua lição plena de eloquência e erudição.

Finalmente seguiu-se a representação de 2 autos e 4 fragmentos de obras vicentinas, que pela forma como foram desempenhados mereceram de todos, quantos a este sarau assistiram, os melhores elogios e as mais justas ovações.

No intervalo do 2º acto, em representação do sr. Presidente da Câmara, ausente em missão oficial, o sr. Vice-Presidente, Dr. Alfredo Antunes dos Santos, acompanhado do Director da Biblioteca, ofereceu um ramo de flores à intérprete mais representativa do grupo cénico, D. Violinda Medina, que, com os restantes elementos e o seu Director, agradeceram esta significativa e muito justa homenagem do nosso Municipio.

1965.11.01 - V CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE GIL VICENTE (A VOZ DA FIGUEIRA)

Em espectáculo promovido pela Biblioteca Municipal Pedro Fernandes Tomás, desta cidade, que sob a proficiente direcção desse alto valor local que é o prof. António Vitor Guerra, não só cada vez mais se prestigia, engrandece e valoriza, como não desperdiça pretexto para exercer relevante e profícua acção cultural no nosso meio, veio até ao Teatro do Peninsular dar-nos uma noite vicentina, esse adnirável grupo dramático da Sociedade de Instrução Tavaredense, em que pontifica a arte, o saber, o talento, a dedicação, o amor ao teatro e o próprio espírito de sacrifício de José Ribeiro.

E sem exagero se pode afirmar que com este espectáculo a Figueira marcou brilhante lugar de destaque nas comemorações do “V Centenário do Nascimento de Gil Vicente”, encaradas estas à escala nacional. Opinião com que, sem dúvida, não haverá ninguém discordante entre a numerosa assistência, mesmo tendo em conta que entre ela se encontravam destacadas individualidades do corpo docente da Universidade de Coimbra e até um mestre e um apaixonado do teatro vicentino como o professor doutor Paulo Quintela.

Usou em primeiro lugar da palavra o prof. António Vitor Guerra, que encantou positivamente todos os presentes com o seu verbo fácil, elegante, em que a beleza da forma se aliou a justeza do conceito. Palavras precisas e convincentes sobre a actuação da Sociedade de Instrução Tavaredense e dos seus amadores, tanto sob o aspecto artístico como beneficente. Objectiva apreciação dos méritos de José Ribeiro nas múltiplas facetas sob que tem dado ao teatro cinquenta anos de persistente actividade, com uma isenção absoluta e uma proficiência notável. Preito de homenagem ao Homem e aos seus dotes de inteligência, de talento e de carácter e também exaltação da sua integridade moral e do exemplo de civismo que representa toda a sua vida. Louvor da obra de Gil Vicente, esse grande português que deslumbrou a Europa do seu tempo e para ler o qual Erasmo aprendeu a nossa língua. Em resumo, uma oração que só por si, na opinião de alguns dos presentes, já justificava a deslocação até ao Peninsular.

Foi depois a vez de José Ribeiro. Um homem do povo de talento falando com compreensão, carinho, paixão e saber, de outro homem do povo, esse tocado pela centelha do génio. Um desfiar de ensinamentos que se procurou tornar acessíveis a toda a gente, independentemente do seu grau de cultura e capacidade intelectual e que para toda a gente tiveram o mesmo interesse. Uma lição sobre Gil Vicente e o seu teatro e, simultaneamente, uma lição de que de todos os assuntos se pode falar com profundidade e elevação e ao mesmo tempo com simplicidade e clareza. Assim se possuam invulgares qualidades e dotes que permitam fazê-lo, o que está por isso ao alcance de poucos.

E com esta excelente preparação se passou a ver representar Gil Vicente, através de primorosa interpretação dos amadores de Tavarede, em “Auto da Barca do Inferno”, “Fragmentos de 4 obras vicentinas” (I – Auto Pastoril Português; II – Romagem dos Agravados; III – Breve Sumário da História de Deus; e IV – Pranto de Maria Parda) e Auto da Feira.

O teatro de Gil Vicente dos amadores de Tavarede é um teatro popular, acessível aos nobres e vilões do tempo em que foi criado e às heterogéneas plateias dos nossos dias. Dele foram, portanto, banidos todos os preciosismos, todas as manifestações de interpretação com pruridos de exótica e qualquer espécie de snobismo falsamente intelectualizado. Respeita-se assim, com consciência e honestidade, a raíz de tal criação artística e presta-se também ao autor a merecida homenagem de considerar a sua obra com mérito bastante para se impor por si própria e em circunstâncias o mais semelhantes possíveis àquelas em que Gil Vicente a fez representar. O que nos parece só merecer elogio e aplauso.

Mas dentro deste critério quanto escrúpulo, cuidado, zelo, carinho, persistência e saber foi mister pôr em jogo para conseguir aquele milagre de assim fazer representar Gil Vicente pelos amadores de Tavarede.

É preciso que nos convençamos de que popular não é sinónimo de grosseiro, tosco, boçal, rude e inferior, pois ao povo podemos e devemos ir procurar as bases das melhores tradições artísticas.

Não cabe, como é óbvio, nos limites de uma simples notícia como esta, apreciação detalhada do desempenho. No entanto não é descabido o apontamento de que a nota mais frisante dele deve sem dúvida consistir na homogeneidade, apuro e equilíbrio do conjunto. Um bravo pois a todos os intérpretes e com muito mais razão a José Ribeiro, que conseguiu o milagre de pôr de pé espectáculo de tal categoria e de assim fazer representar o povo de Tavarede. Evidentemente que a ninguém, por ingenuidade ou má fé, é licito chegar à conclusão, em face do que fica dito, que de qualquer forma se pretenda ignorar ou sequer diminuir, o mérito, até excepcional, da intervenção nas peças representadas, de vários e justamente consagrados amadores da Sociedade de Instrução Tavaredense. Bastaria o exemplo de Violinda Medina para tornar ridícula tal conclusão. A sua “Maria Parda” constitui uma interpretação notável, com a qual só seriam capazes de emparceirar as de algumas das nossas primeiras actrizes. Mas também Fernando Reis (onde estão os profissionais que desdenhassem dos méritos e da correcção do seu Gil Vicente?), António Jorge da Silva (cuja reaparição se saúda e sobretudo em “João Murtinheira, vilão”, deu convincente prova dos seus invulgares dotes histriónicos), João Cascão e outros, tiveram intervenções pessoais que muito contribuiram para o brilho do espectáculo. E até aquela jovem Ilda Manuela Duarte Gomes foi um encantador e verdadeiro “Serafim”. O que não invalida, porém, a nossa já expressa opinião de ser a homogeneidade, o apuro e o equilíbrio do conjunto, a faceta mais destacada do notável espectáculo agora oferecido aos figueirenses, em comemoração do “V Centenário do Nascimento de Gil Vicente”.

1965.11.06 - GIL VICENTE (O FIGUEIRENSE)

Promovido pela Biblioteca Pública Municipal, dessa cidade, realizou-se no dia 27 de Outubro findo, no teatro do Grande Casino Peninsular, o espectáculo celebrando o V Centenário do nascimento de Gil Vicente, pelo grupo cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense, com o mesmo programa que havia sido representado na sede, nos dias 2 e 3 do referido mês, com que a benemérita colectividade local se associou também às comemorações que estão a decorrer em várias localidades do país, em homenagem ao fundador do Teatro Português.

Antes do início do espectáculo, o sr. Professor António Vitor Guerra, ilustre Director daquele notável estabelecimento cultural – que honra altamente a cidade da Figueira da Foz – veio ao proscénio dizer algumas palavras acerca de Gil Vicente e manifestar o seu reconhecimento ao admirável grupo dramático da SIT, de modo particular ao seu proficiente orientador.

Como estava anunciado, o sr. José da Silva Ribeiro, conhecedor profundo da obra de Gil Vicente, proferiu uma brilhante alocução sobre o Grande Mestre de Teatro, que a numerosa assistência, que enchia literalmente a ampla sala, ouviu religiosamente, tributando-lhe no final calorosos e prolongados aplausos.

Sobre a representação, que foi mais um singular êxito alcançado pelos tavaredenses, dizem-no o interesse e o entusiasmo com que a plateia figueirense assistiu e premiou o trabalho dos modestos amadores e ainda as inúmeras saudações recebidas pelo seu ensaiador.

Num dos intervalos, foi pelo sr. Vice-Presidente da Câmara Municipal, que se fazia acompanhar pelo director da Biblioteca, entregue à distinta amadora Violinda Medina e Silva um bonito ramo de flores.

1965.11.13 - COMEMORAÇÕES VICENTINAS (O FIGUEIRENSE)

Em comemoração do V Centenário do nascimento de Gil Vicente, realizou-se no Teatro do Casino Peninsular um grandioso espectáculo oferecido ao povo figueirense pela Biblioteca Pública Pedro Fernandes Tomás, com a colaboração do grupo cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense.

Usou da palavra o sr. professor António Vitor Guerra, director da Biblioteca, que, numa oração brilhantíssima, enalteceu a obra consagrada do fundador do “Teatro Português”. Em seguida falou o sr. José da Silva Ribeiro, fazendo o elogio da vida e actividade de Gil Vicente, em palavras simples mas expressivas.

O “Grupo Cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense” que, além do Auto da Barca do Inferno e Auto da Feira, nos deu fragmentos de 4 obras vicentinas, pode orgulhar-se de possuir um elenco de artistas-amadores digno dos maiores encómios.

O seu director e ensaiador sr. José da Silva Ribeiro, que há longos anos trabalha na organização e aperfeiçoamento do grupo, não se poupando a canseiras, deve sentir-se satisfeito de ter realizado um Festival Vicentino à altura do acontecimento nacional e, portanto, digno dos maiores elogios e reconhecimento do público da Figueira da Foz.

Entre os intérpretes, que mais se distinguiram, queremos salientar o nome de Violinda Medina e Silva que, no “Pranto de Maria Parda”, teve trabalho verdadeiramente excepcional, assim como o de Fernando Reis que nos deu um “Arrais do Inferno” de grande incremento satânico.

De aspecto geral, todos os componentes se portaram com brilho e de forma a dignificar o “Teatro Português”.

O público manifestou o seu entusiasmo, aplaudindo, no final de cada obra, todos os artistas com vibrantes e calorosas palmas.

Quadros - Os Senhores de Tavarede - 10

FERNÃO GOMES DE QUADROS

4º. Senhor de Tavarede - Morgado

Nasceu cerca do ano de 1590. Casou no ano de 1618 com D. Mariana de Melo, filha de António de Melo e Silva e de D. Ana de Melo. O contrato relativo ao dote tem a data de 31 de Outubro do ano do casamento e aquela Senhora foi dotada com o valor de 8 000 000 reis, em bens móveis, jóias e no prazo da Quinta de Valverde, em Rendide, Torres Vedras.

Faleceu no dia 5 de Setembro de 1665. Do casamento houveram três filhos: - Pedro Lopes de Quadros, que seria o herdeiro do morgado mas que faleceu antes de seu pai, em 1663;

- Manuel de Melo de Quadros, que foi servir, como militar, para o Brasil, onde casou com D. Maria Vargas. Julga-se que anteriormente frequentou a Faculdade de Cânones, da Universidade de Coimbra. Regressado a Portugal, esteve na guerra da Restauração, na qual faleceu, em Almeida, na batalha travada em 5 de Julho de 1664;

- e D. Ana de Barros, que foi baptizada na igreja de S. Julião da Figueira da foz do Mondego, no dia 24 de Abril de 1629. Foi em consequência deste parto que D. Mariana de Melo faleceu, quatro dias após ter dado à luz esta filha.

Ainda teve mais um filho, bastardo, de Maria Antónia Cunha Samea. Fernão Gomes deixou a esta senhora uma casa e uma quinta para sustento de seu filho atè à idade “de o poderem fazer frade, ou mandarem para a India, como militar”. Ainda sobre este filho deixou o seguinte recado: “… porque meu filho António é muito pequeno e o padre Miguel de Oliveira é seu padrinho, pelo amor que conheço nele lhe peço que o queira criar…”

Foi cavaleiro professo na Ordem de Cristo e serviu, como militar, em Tânger, África. Como adiante se verá, teve diversos desentendimentos com a Universidade de Coimbra, muitos problemas com vários capitães subordinados ao Duque de Cadaval e, até, com o capitão mor de Coimbra. Terão sido estes problemas a causa de ter sido condenado a pena de degredo por dois anos, em África, tendo recebido carta de perdão em 9 de Dezembro de 1626.

Por alvará de El-Rei D. João III, datado de 10 de Junho de 1624, Fernão Gomes de Quadros foi nomeado capitão mor da praça de Buarcos: Eu Elrey faço saber aos que este Alvará virem que por ser necessaria a segurança dos logares de Buarcos e Tavarede, e quer pessoa que sirva de capitam mór delles sobre quem se encarrege da deffençam nas occasiões em que se offerecerem de inimigos que ja em outras occasiões o tem intentado e tendo por certo que Fernam Gomez de Quadros, fidalgo da minha caza, que no dito cargo me servirá com satisfaçam e dará de si a boa conta que se deve esperar, hei por bem e me apraz que elle sirva o dito officio de capitam mór dos logares de Buarcos e Tavarede, em quanto eu o houver por bem e nam mandar o contrario, com declaraçam de que o Juiz de Fóra de Montemór o Velho, ha de levantar a gente, fazer officio da melicia e ter a seu cargo o exercicio della na forma do regimento das ordenanças em todos logares em que tiver jurisdiçam crime; procedendo e castigando os desobedientes como dis põe o dito regimento, por isso ser conforme as doações do Duque de Aveiro, meu muito amado e prezado sobrinho, cujo he a ditta villa e logares o que está disposto por Provizões muitas e sentenças, que estão dadas no caso; porem nas occasiões de guerra, que succederem nos ditos logares de Buarcos e Tavarede que sam perto do mar, o que a dita de Montemor e mais logares d’aquella jurisdiçam de Duque forem, obrigados a acudir conforme o que neste está disposto; hei por bem e mando que nos ditos cazos, e occasiões de guerra acudam as companhias da villa e logares do Duque ao dito Fernam Gomez de Quadros e estejam á sua ordem em quanto durar a occasiam de inimigos sem elle ter nella alguma outra jurisdiçam e nas mais companhias que nam forem do Duque uzará o dito Fernam Gomez de Quadros do que lhe tocar pelo regimento das ordenanças e desta forma mando a todos officiaes das companhias, e a quem tocar, e a todas minhas justiças e a quem pertencer que haja por capitam mór dos ditos logares de Buarcos e Tavarede, o dito Fernam Gomez de Quadros, e o deixem uzar inteiramente da jurisdiçam, que por esta lhe concedo, o qual por firmeza de tudo lhe mandei dar este Alvará pelo tempo de 4 mezes, se antes disso nam ouver outro assinado meu; em Lisboa, Antonio Correa a fez aos 10 de Junho de 1624.

Seguindo a política dos seus antecessores, procurou aumentar e consolidar os bens pertencentes ao morgado. Assim, no ano de 1635, fez um contrato com suas irmãs, todas elas freiras em Coimbra, sobre os bens de raíz que haviam sido de seu pai. Aqui fica cópia desse contrato:

Saibam quantos este público instrumento de contrato de transação e amigável composição e obrigação ou como melhor em direito dizer chamar se possa, virem, que no ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil seiscentos e trinta e cinco, aos dezanove dias do mês de Outubro do dito ano, no Mosteiro de Santa Clara, junto à cidade de Coimbra, à grade do palratório do dito Mosteiro, onde estavam presentes, da dita grade para dentro, D. Ana de Távora, D. Jacinta de Távora, D. Catarina de Sousa e D. Isabel de Carvalho, todas quatro irmãs e freiras professas no dito Mosteiro, e bem assim, estando igualmente presente, da banda de fora da dita grade, Fernão Gomes de Quadros, fidalgo da Casa de Sua Majestade, cavaleiro professo de Nosso Senhor Jesus Cristo, morador no Couto de Tavarede, pessoa reconhecida de mim, tabelião, e irmão de todas as ditas quatro religiosas atrás nomeadas, logo por elas e pelo dito Fernão Gomes de Quadros, seu irmão que presente estava, foi dito perante mim tabelião e das testemunhas deste instrumento ao diante nomeadas, que elas, partes, estavam contratadas pela maneira seguinte, a saber: que elas, senhoras, todas juntas e cada uma por si, largarão, ao dito seu irmão Fernão Gomes de Quadros, tudo aquilo que precederam de seu pai e mãe, que Deus tem, de suas legítimas, que o Mosteiro lhes largou por ele, Fernão Gomes de Quadros, dar ao dito Mosteiro, além do que era por este público instrumento, se obrigar a lhes dar por suas terras 500 mil reis, em dinheiro de contado, os quais lhe deu por largar as ditas suas irmãs, o mais que além destes 500 mil de suas legítimas, os quais elas sobreditas senhoras todas quatro, lhe largam de hoje para todo sempre, assim e da maneira que foi suas folhas de partilhas lhes couberam e por sentença das ditas partilhas lhes foi julgado, para ele Fernão Gomes de Quadros e para seus filhos herdeiros e sucessores.

E que da prova terão elas nas almas todas quatro e demitem de si todo o direito, posse, ação, usufruto, util e directo senhorio que elas, e cada uma delas, tinham e podiam ter em todos os bens que a cada uma delas lhe coube das ditas legítimas heranças, e tudo cedem e trespassam deste dia para todo o sempre, no dito irmão e seus filhos herdeiros e sucessores, para que tudo hajam, logrem e possuam como coisa sua, que fique sendo livre e desembargada e lhe dão poder e licença, a ele, seu irmão, que ele por si ou por quem quiser e mandar sem mais outra ordem nem figura de juizo, para tomar posse de todos os ditos bens, assim de móveis como de raíz e que a tome quer não, a dita posse, que por este instrumento lha haveram elas senhoras por dada e haviam por metido e investido na dita posse real actual e corporal formal cível e natural e enquanto aí a não tornasse se constituam por suas simples inquilinas, até que com efeito a tome pessoalmente e isto com tal pleito e condição que ele Fernão Gomes de Quadros como de feito por este público instrumento, se obrigou, por si e por seus filhos herdeiros e sucessores, a dar às ditas irmãs e a cada uma delas, em dias de sua vida delas, em cada ano vinte e cinco mil reis de tença e vinte alqueires de trigo, pago tudo no dito Mosteiro, à custa e risco e despesa dele Fernão Gomes de Quadros e de seus herdeiros, pagos os 25 mil reis de cada uma delas, cada ano, em três partes iguais, cada quatro meses o que se mostrar a folda (?) livre e os 15 alqueires de trigo a cada uma delas em cada ano, por dia de S. Miguel, de Setembro de cada ano, ao que tudo se obrigaria como de efeito se obrigou em seu nome e de seus filhos herdeiros pagar dias adiados, sob pena de tudo lhe pagarem a fé de juizo, com todas as custas, perdas, danos e vinte vezes que elas senhoras e cada uma delas receberem por se lhe não fazerem os ditos pagamentos, assim do dinheiro como do trigo, e de cada uma delas em mais 200 reis por cada um dia, para a pessoa que andar sobre a cobrança do dito dinheiro e trigo, ou parte dele, ou em execução de alguma demanda com execução de alguma sentença, e para tudo cumprirem, ele e seus herdeiros, obrigou ele Fernão Gomes de Quadros, sua pessoa e todos os seus bens e rendas e dos ditos seus filhos e herdeiros, para o que disse que em seu nome e de seus herdeiros se obrigam responder por todo o conteúdo deste contrato e obrigação, por diante o Corregedor ou Juiz de fora desta cidade os que hoje são e ao diante forem e os ditos cargos servirem para o que disse renunciava todos os juizes de seu foro e dos ditos seus herdeiros, e … de pão e vinho e todos direitos ordenações de que se ajudar possam, porque de nada queira usar nem gozar sem tudo cumprir por si e por seus herdeiros, como neste se contém e havendo de ser citado ele e cada um dos seus herdeiros para o cumprimento deste, em parte ou em todo, constituiria, como logo constituíu, por seus procuradores em causa própria, ao solicitador e porteiro da casa da Santa Misericórdia, da cidade de Coimbra, a ambos e a cada um deles e pelas citações feitas na pessoa de cada um dos ditos seus procuradores, era ele Fernão Gomes de Quadros contente que entre ele e seus herdeiros se houverem sentenças e por elas tiradas do processo, queria fossem eles e cada um deles, ditos seus procuradores requerido e ele Fernão Gomes e seus herdeiros e cada um deles penhorados e executados em suas pessoas e bens, até com efeito pagarem tudo o que estiverem devendo do dito dinheiro e trigo e custas e esta procuração se obrigar ele Fernão Gomes de Quadros, em seu nome e de seus herdeiros, não revogarem até as ditas religiosas não estarem pagas e entregues de tudo o que se lhe estiver devendo por razão deste contrato e revogando-a a tal revogação não valha, e querendo, elas partes, uns e outros, em algum tempo vir com alguma dúvida, demanda, embargos de qualquer qualidade e condição, que sejam as requeiram arrepender que não possam ser ouvidos em juizo nem fora dele, nem ele Fernão Gomes, nem seus herdeiros em causa alguma que por si alegar pena, sem primeiro depositarem na mão e poder daquele que por este contrato estiver dois mil cruzados em dinheiro de contado, que serão entregues a qualquer delas partes que por este estar quiser, sem terem obrigação de darem fiança porque para tudo poderem receber sem ela se haviam uns e outros por abonados até cláusula depositaria juiz ou tabelião aqui de requerimento delas partes e dele Fernão Gomes de Quadros na forma de lei … e as penas levadas ou não este recupere e guarde como nele se contém e outrossim fizeram este contrato em condições e declaração que falecendo qualquer das ditas senhoras atrás nomeadas, a dita tença dos ditos 25 mil reis e 15 alqueires de trigo ficará vaga (?) para ele Fernão Gomes de Quadros e para seus herdeiros e isto se entenderá em todas as quatro, de feição que, falecidas elas, ele e seus sucessores ficarão desobrigados do conteúdo neste contrato e por esta maneira se houveram elas partes e o dito seu irmão Fernão Gomes de Quadros por contratado e tudo prometeram e se obrigaram confiar muito inteiramente como neste se contém, obrigando outrossim ao cumprimento deste as ditas tenças e em fé e testemunho de verdade assim o outorgaram, elas partes presentes e mandaram fazer este instrumento de contrato de transação e amigável imposição e obrigação neste meu livro de notas, em que assinarão de que outorgaram e concederam os instrumentos que elas partes aceitaram, cada um pela parte que lhe cabe e eu, tabelião, estipulei e aceitei, em nome de todas as demais pessoas ausentes a que … pode tomar como pessoas … estipulante e … tanto tempo quanto em direito for herdeiro, a que foram testemunhas presentes, Francisco Fernandes, almocreve, morador na cidade de Coimbra e António Correia, sapateiro, morador na dita cidade. André Carvalho, tabelião, o escrevi, e declaram elas partes, que os pagamentos da ditas tenças na forma sobredita, assim como de hoje em diante e com esta declaração assinaram testemunhas sobreditas, o sobredito Fernão Gomes de Quadros, D. Ana de Távora, D. Catarina de Sousa, D. Jacinta de Távora, D. Isabel de Carvalho.

Continuaram, no entanto, os problemas com o Cabido da Sé de Coimbra. Os fidalgos de Tavarede insistiam em não pagar dízimos nas compras de terrenos que faziam. A este propósito, o Cabido deliberou a seguinte proposta: Aos vinte e sete dias do mês de Janeiro de 1638, sendo primeiro chamado para Cabido, se nomearam os senhores Bento de Almeida, Diogo Ribeiro e o doutor António Fernandes de Carvalho, para ouvirem a Fernão Gomes de Quadros e tratarem com ele a composição que queriam fazer com o Cabido sobre as duas demandas que com ele trazia.

Uma sobre os dízimos com que se havia levantado querendo isentar-se de os pagar, com o privilégio de cavaleiro de Cristo, e outra para se declarar que não podia anexar ao morgado os bens que tinha no Couto de Tavarede, e segundo a informação que os ditos senhores trouxeram ao Cabido, o dito Fernão Gomes assentou com eles que não queria demanda com o Cabido em nenhuma destas matérias, antes queria pagar os dízimos e tirar do vínculo do morgado todos os bens que a ele se achassem anexos e vinculados por morte de seu pai Pedro Lopes de Quadros, e que o Cabido, em reconhecimento deste seu bom ânimo, lhe havia de fazer dízimo a Deus acerca das casas que tem em Tavarede, assim a velha, com um pedaço que determinava meter de novo nela, e logo no dito Cabido foram nomeados para ir fazer vistoria na dita cerca nova e velha, os senhores António Alves e Diogo Ribeiro, e se assentou que com sua informação se tomaria resolução se convinha aceitar este concerto ou prosseguir as demandas com Fernão Gomes. E para constar do sobredito, fiz este assento de mandado do dito Cabido, por ora servir de secretário. O Deão, Francisco de Andrade.

Como sabemos, pouco depois teve lugar a restauração da soberania de Portugal, sendo aclamado rei D. João IV, duque de Bragança. Acreditamos que, por algum tempo, estas quesílias terão sito abandonadas devido à necessidade de se tomarem as medidas que se impunham para defesa dos previsíveis ataques dos espanhóis que procurariam recuperar a posse do nosso território.

Assim terá acontecido, pois no ano de 1641, seis meses após a restauração da independência de Portugal, a Espanha mandou barcos e tropas atacar diversas praças da costa portuguesa, pelo que o rei D. João IV mandou este aviso a Fernão Gomes de Quadros: Sua Majestade, que Deus guarde, ordena a Vossa Mercê se parta logo a acudir aos lugares que estão à sua conta na costa da vila de Buarcos e trate de os defender e fortificar, porquanto se tem avisos que à vista dela aparecem muitas velas do inimigo. Aviso a Vossa Mercê desta ordem para que a tenha entendido.

Nosso Senhor guarde a Vossa Mercê. 24 de Junho de 1641

sábado, 23 de junho de 2012

Quadros - Os Senhores de Tavarede - 9


PEDRO LOPES DE QUADROS

3º. Senhor de Tavarede - Morgado

Pedro Lopes de Quadros, segundo filho e herdeiro de Fernão Gomes de Quadros, nasceu no ano de 1559 e faleceu no dia 6 de Março de 1634. Como referimos, herdou o morgado, sendo filho segundo, devido a seu irmão mais velho, António Fernandes de Quadros, ter sido morto pelos mouros em Mazagão, ainda solteiro, portanto sem descendência.

Casou com D. Maria de Carvalho, filha de Belchior do Amaral, Desembargador do Paço, e de D. Ana de Abreu, natural de Guimarães. Viveu em Tavarede.

Do seu casamento terão nascido, presume-se, dez filhos, mas, pelo menos dois, terão morrido em crianças. Os restantes oito foram:

- Fernão Gomes de Quadros, que foi seu herdeiro;

- João de Quadros e Sousa, crismado em Tavarede pelo Bispo de Coimbra, António Furtado de Mendonça, no dia 24 de Maio de 1618. Frequentou a Universidade de Coimbra, tendo-se formado em Maio de 1633. Foi nomeado e exerceu as funções de Prior de Tábua. Terá falecido em Tavarede no ano de 1663;

- Belchior de Quadros, nascido em 1595, foi baptizado na igreja de Tavarede no dia 8 de Agosto deste ano, e que viveu com seus pais em Tavarede;

- D. Catarina de Quadros, baptizada em Tavarede em 1 de Outubro de 1596;

- D. Genebra de Quadros, baptizada em Tavarede no dia 9 de Junho de 1529;

- D. Jacinta de Quadros, que também foi baptizada em Tavarede no dia 13 de Abril de 1601;

- D. Isabel de Quadros, igualmente baptizada em Tavarede a 9 de Julho de 1603; - e Francisco Gomes de Quadros, como todos seus irmãos e irmãs, também recebeu o baptismo em Tavarede, no dia 20 de Abril de 1607. De notar que as quatro filhas do casal foram todas elas freiras no Convento de Santa Clara, em Coimbra.

Este Pedro Lopes de Quadros foi o que mais procurou rentabilizar a ínsua da Morraceira, quer por emprazamentos, quer por exploração directa.

No dia 1 de Julho de 1587, e para esclarecimento de que era seu o prazo de Vila Verde, temos o seguinte reconhecimento: … por ele foi dito que ele possuia o dito prazo de Vila Verde em fatiosim perpétuo, por virtude de uma carta de arrematação com licença, que oferece pelo bispo de Coimbra, feita aos 14 dias de Março de 1552, e ainda oferece um instrumento do bispo D. Gil Lopo, de Coimbra, feito a Luís Geraldes e sua mulher Maria Gonçalves, deste prazo de Vila Verde, de fatiosim perpétuo, pelo qual conteúdo o dito bispo lhe aforar em perpétuo com o foro e obrigação de lhe pagar em cada um ano dez libras da moeda antiga, pelo dia de S. Miguel, em Setembro. Feito em Coimbra aos 8 dias de Fevereiro da era de 1540… … o dito prazo por autoridade de justiça a Fernão Gomes de Quadros, seu pai que Deus haja, em arrematação e com licença de que atrás fica feito menção, e o dito Pero, por morte de seu pai, o herdara e pagava em cada um ano o dito foro de pensão de dez libras ao dito senhor bispo e à sua mesa episcopal e reconhecia por direito de senhorio…

Em 1597, fez um arrendamento, por quatro mil e cem cruzados e dez moios de trigo, dois de cevada e um de chícharos. Transcrevemos uma certidão relativa a este arrendamento: Saibam quantos esta certidão virem. Certifico eu, Gregório de Basto, tabelião público e judicial pela Universidade de Coimbra, nesta vila dos Redondos, que é verdade que a Morraceira é jurisdição desta dita vila, assim no cível como no crime, e que todas as justiças desta vila entram nela, na dita Morraceira, com suas varas, quando lhe é necessário e administram suas justiças todas as vezes que é necessário e lhe requerem, por ser jurisdição desta vila e havendo culpados os trazem à cadeia desta dita vila, e os delitos que nela fazem, assim no cível como no crime, se livram nesta dita vila de suas culpas, e que havendo gados nos danos das unidades e ervagem que andam contra vontade do governador dela, os contam, juntam e trazem ao curral dela vila e nela são condenados nas coimas, conforme as posturas da Câmara e privilégio que o senhorio da dita lezíria tem para si e nesta Câmara desta vila se dá o juramento ao guardador que guarda a dita Morraceira, que o senhorio apresenta, por ser jurisdição da dita vila o que tudo me reporto aos autos e posturas e livros de coimas que estão em meu poder e por me ser mandado pelo juiz desta vila passar a presente certidão a passei, por mim assinada de meu sinal que tal é e escrevi, e o juiz aqui assinou também, hoje, aos doze dias de Junho de mil quinhentos e noventa e um. António Gomes, juiz.

Foi igualmente este Pedro Lopes de Quadros quem criou muitas jeiras de cultura, dedicando-se também à criação de gado e à exploração de sal. ‘Criava cada um ano muitas éguas, poldros e poldras, cavalos, mulas e mulatos, asnos e femeas’. Para incrementar a produção de sal, procedeu à criação de muitas marinhas que aforava ou arrendava a marnotos.

Para o serviço de transportes para a Morraceira, mandou construir uma barca de passagem, cujos serviços eram pagos por si e pelos outros utentes da ilha, tendo o preço fixado com base na área que cada um cultivava.

O Cabido de Coimbra, argumentando com os seus presumíveis direitos, procurou determinar qual era o rendimento que o morgado de Tavarede recebia da exploração e dos foros e rendas, para fixar a quantia que lhe devia ser paga. Segundo elementos encontrados, calculou um rendimento de cerca de dois contos de reis, ao que corresponderia um dízimo de duzentos mil reis..

Bem procurou o Cabido receber aquilo a que tinha direito. Recorreu para a Corte Eclesiástica de Braga, em 1609, mas a sua reclamação não foi atendida. Insatisfeito, o Cabido ordenou nova demanda, desta vez para o Juizo dos Feitos da Coroa da Relação do Porto. A defesa de Pedro Lopes de Quadros apresentou argumentação dizendo que D. Sancho I somente doara à Sé de Coimbra os direitos reais que a ele e à Coroa pertenciam no Couto de Tavarede, os quais eram declarados no foral de 1516. Somente estes o Cabido possuia no Couto, sendo que os moradores dele eram senhores dos seus bens, vendendo-os livremente e sem necessidade de licenças ou de pagamento de terradegos ao Cabido. Aliás, o foral, ao fixar o regime tributário e os direitos que o Cabido tinha no Couto, não se referia à obrigatoriedade de as pedir nem de as pagar. Assim, todos os moradores estavam de posse por tempo imemorial de assim procederem (A Casa de Tavarede).

Foram muitas as réplicas e as tréplicas apresentadas pelos demandantes. E neste caso o Cabido perdeu. A sentença emitida pelo Ouvidor do Cabido refere sendo o couto de Tavarede um reguengo da Coroa doado ao Cabido da Sé de Coimbra, verificava-se no entanto que do foral não constava a obrigação de lhe pedir licenças e de lhe pagar terrádegos aquando das vendas e trocas de propriedades. Pelo contrário, ficara provado por testemunhas de ambas as partes que os moradores estavam de posse antiquíssima de os não pagarem nem de as pedir, salvo quanto a algumas propriedades aforadas pelo Cabido, por títulos particulares, que não eram as da contenda. Apelou, por duas vezes, o Cabido para a Santa Sé, em Roma, tendo o último recurso sido recusado por um breve datado de Abril de 1614.

Antes de escrever mais qualquer coisa sobre este breve, refere-se que, para sua defesa, Pero Lopes de Quadros indicou 48 testemunhas, de diversas localidades da região, as quais … provaram que este Couto embargante e todo seu termo é de natureza antiga e reguengo da Coroa, segundo se vê no foral que lhe foi dado pelos reis passados, cujo traslado autêntico se oferece e no qual estão expressamente declarados os direitos reais que os moradores do dito Couto têm obrigação de pagar, nem se podem pedir nem levar outros sobre graves penas contidas no dito foral…

Relativamente a este processo e ao depoimento de todas as referidas testemunhas, encontra-se o seguinte comentário: … Não há que maravilhar as misérias e tribulações que ora vemos tão acesas nos nossos tempos, porque mais me maravilhara eu se os não vira, vendo o que se passa neste feito, e a facilidade com que os homens juram falso por respeitos muito pequenos e de leve interesse: mas basta qualquer que ele seja e um respeito muito pequenino para jurarem muitas pessoas o que não é, o que não foi, o que não sabem, o que não entendem, como se fôra assim, e o souberam e o entenderam. E contudo não devia ser assim.
Paço de Tavarede - Desenho do pintor figueirense António da Piedade
Quer dizer, os representantes do Cabido tinham plena consciência que os declarantes indicados pelo fidalgo tavaredense mentiam por ‘ordem’ do dito fidalgo. Mas, na verdade, o Cabido acabou por perder a questão e, como acima se refere, foi a própria Santa Sé que não aceitou o recurso. … aos 25 de Maio de 1616 se tratou em Cabido de quão trabalhosa e terrível parte era contra o Cabido por Pedro Lopes de Quadros. E as mais de que se valia em negociar com este Cabido cometendo concerto e usando de dilações. E desejando o Cabido de em tudo conservar conservar o proveito da casa, assentou que menos de dezasseis Capitulares presentes se não fale em concerto com Pedro Lopes de Quadros, porque se receia de seu modo de negociar. E que falando-se no tal concerto, seja nulo quantos o fizer como não sejam presentes em Cabido dezasseis capitulares como dito é.



Teatro da S.I.T. - Notas e Críticas - 33

1964.06.06 - TEATRO (O FIGUEIRENSE)

Constituiu invulgar êxito a representação, no penúltimo sábado, no teatro da Sociedade de Instrução Tavaredense, da famosa peça “Romeu e Julieta” com que o grupo cénico daquela colectividade se associa às comemorações do IV centenário do mais notável poeta inglês, William Shakespeare.

Lotação esgotada. Presentes em lugares de honra distintas entidades oficiais convidadas a assistir à memorável récita.

Antes de começar o espectáculo José da Silva Ribeiro, devotado e prestigioso orientador artístico da SIT, veio ao proscénio para falar da obra monumental legada à humanidade pelo genial dramaturgo, tendo-lhe a numerosa assistência tributado quente e calorosa ovação.

O espectáculo, que era aguardado com justificada espectativa, decorreu com apreciável nível artístico, por isso que os intérpretes de “Romeu e Julieta” receberam a justa consagração do público, que fazendo funcionar o pano de boca várias vezes nos finais dos actos, lhes dispensou clamorosos aplausos.

Mestre José Ribeiro, acedendo às constantes solicitações da assistência, sentiu, nas vibrantes e entusiásticas manifestações com que foi saudado, quanto a sua extraordinária obra dentro da SIT, a bem da cultura do povo, é apreciada.

Estamos, na verdade, na opinião de distintas individualidades que assistiram à récita, perante uma notável realização cénica: cenários deslumbrantes, guarda-roupa magnificente, que apropriado jogo de luzes mais faz realçar.

O mesmo entusiasmo por parte da assistência, que enchia completamente a vasta e confortável sala de espectáculos, se verificou no domingo.Vimos ali pessoas de várias localidades do país, que não quizeram faltar à “première”.

Ainda bem que assim é, que o esforço da SIT está a ser compreendido pois que as responsabilidades financeiras assumidas pela montagem da peça, ainda ascendem a cerca de duas dezenas de milhar de escudos.

Bem hajam, portanto, todos quantos, com a sua presença, correspondem à acção da SIT, no sentido de proporcionar ao povo espectáculos de autêntica arte.

Resta-nos felicitar os componentes do grupo dramático e todos quantos contribuiram para o êxito alcançado.

1964.06.27 - ROMEU E JULIETA (O FIGUEIRENSE)

Com a representação de domingo, em matinée, de “Romeu e Julieta”, terminou a série de espectáculos com que a Sociedade de Instrução Tavaredense se associou às comemorações do IV centenário do grande dramaturgo inglês Skakespeare.

Todos os louvores são devidos à filantrópica Fundação Calouste Gulbenkian pela sua generosa iniciativa que, prestando culto à memória dum dos maiores valores espirituais da Humanidade, tem possibilitado ao público português, no vasto ciclo das comemorações, o prazer de assistir a magníficos e inolvidáveis espectáculos de arte.

Durante as sete representções na SIT da famosa peça, que foi posta em cena com uma escrupulosa montagem, cenários maravilhosos, guarda-roupa sumptuoso e apropriado jogo de luzes, não só os tavaredenses como também muitos apreciadores de bom teatro, provenientes das mais diversas localidades do país, vieram admirar e aplaudir o esplêndido conjunto, formado por mais de 40 figurantes.

Se bem que o total das receitas dos espectáculos, sendo nos informaram, esteja longe da soma das enormes despesas feitas com as exigências da montagem da peça, não podemos deixar de louvar a arrojada deliberação da SIT em tomar parte nas comemorações shakespearianas.

É que, prosseguindo no seu programa de acção, serviu o teatro em prol da cultura do povo, sem qualquer fim material, como, há 60 anos, vem fazendo.

1964.06.18 - ROMEU E JULIETA (A VOZ DA FIGUEIRA)

Embora saibamos que as nossas palavras nenhuma influência possam ter no êxito desta nova jornada artística do categorizado elenco teatral de Tavarede, que se não quis dispensar de marcar presença nas manifestações comemorativas do IV Centenário de William Shakespeare, consideramos de nosso dever deixar expressas em breves linhas – breves por crónica tirania da falta de espaço – as nossas impressões acerca da representação da famosa e popularíssima peça “Romeu e Julieta”.

Qualquer pessoa habituada a ver teatro, depressa chega à conclusão de que esta peça é de difícil e dispendiosa montagem.

Só um homem com o querer e a proficiência de José Ribeiro se arrojaria a fazê-la representar num palco da província e tirar dela o partido que ele conseguiu.

Não é porque no palco de Tavarede se não tenha movimentado número mais elevado de figuras do que aquele que “Romeu e Julieta” apresenta perante os espectadores, mas pelas dificuldades naturais da peça.

Todas essas dificuldades foram ladeadas e se “Romeu e Julieta” não fizer – porque não faz – carreira compensadora das canseiras e das despesas que a sua apresentação em cena ocasionou, isso deve-se única e exclusivamente ao violento clima passional em que decorre, clima que contende com os desejos de evasão dominantes no geral da massa frequentadora dos espectáculos teatrais. O público de hoje procura o teatro alegre, ainda que roce pela obscenidade.

A representação de “Romeu e Julieta” patenteia equilíbrio, homogeneidade. Na generalidade, é evidente. Também mostra algumas dissonâncias que nos dispensamos de concretizar. O ensaiador conhece-as, esforçou-se por extirpá-las, e ninguém mais do que ele as lamenta. Mas o nível geral é de tal ordem elevado que as deficiências se diluem sem dar muito nas vistas.

A jovem Maria Madalena Machado continua a afirmar aquelas extraordinárias qualidades de presença e sensibilidade que desde a sua auspiciosa estreia vem evidenciando.

Ela, João Medina, João Cascão, José Medina, João de Oliveira Júnior, João Pedro de Lemos, Fernando Reis, José Luís do Nascimento e Violinda Medina, nos papéis principais, imprimem carácter à representação.

Todos dão o melhor das suas possibilidades.

Por isso todos merecem louvores, que em primeiro lugar são devidos a José Ribeiro, por mais esta afirmação de garra que nos ofereceu com “Romeu e Julieta”.

1964.10.24 - TEATRO (O FIGUEIRENSE)

Como anunciámos, deslocou-se no sábado a Aveiro, onde foi dar um espectáculo em benefício da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários daquela cidade, o grupo cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense.

Foi representada “Uma noite de Teatro Português”, conjunto de obras de Gil Vicente, Almeida Garrett e Luís Francisco Rebelo.

Sem traírmos a verdade, não exageraremos em afirmar que o exemplar grupo dramático da SIT obteve, na encantadora Veneza portuguesa, êxito extraordinário, pois a numerosa assistência, que enchia a vasta sala, aplaudiu entusiástica e vibrantemente a representação, interrompemdo algumas das principais cenas, magistralmente reproduzidas pelos figurantes, principalmente a distinta amadora Violinda Medina e Silva e a jovem Maria de Lourdes Moura.

No intervalo do 2º para o 3º acto, e em cena aberta, o sr. capitão Firmino Silva, prestigioso Presidente da Direcção dos Bombeiros Voluntários, acompanhado dos 1º e 2º comandantes da briosa corporação, srs. António Cunha e Albano Pereira, e outras individualidades, proferiu um primoroso discurso de saudações, enaltecendo o mérito dos amadores tavaredenses e a sua notável obra cultural e beneficente, a que José da Silva Ribeiro respondeu com brilhante improviso, salientando a humanitária acção dos Bombeiros em prol do bem comum.

Pelo Comandante da Corporação foi então oferecido a Violinda Medina um belo ramo de cravos vermelhos, tendo sido entregue ao Presidente da Direcção da SIT uma artística jarra de faiança com significativa inscrição, executada nas importantes Fábricas Aleluia.

No final do espectáculo foi a caravana tavaredense obsequiada com um beberete, durante o qual trocaram cumprimentos o Presidente dos Bombeiros e o director do grupo cénico da SIT.

Não desejamos terminar este apontamento sem deixarmos aqui expressa a nossa gratidão aos bons amigos aveirenses, de modo particular aos srs. António Cunha e Albano Pereira, ilustres directores da Empresa do Teatro, pelas inúmeras demonstrações de simpatia e consideração com que gentilmente distinguiram os nossos conterrâneos, durante a sua estadia naquela progressiva e sedutora cidade.

Resta-nos felicitar muito sinceramente os dedicados amadores da prestimosa colectividade local pelo seu magnífico triunfo, que, elevando-a, constitue excelente motivo de propaganda da nossa querida terra.