sábado, 25 de maio de 2013

O Associativimo na Terra do Limonet - 24

Embora não dependentes das nossas colectividades, estavam organizados, na nossa terra, dois ranchos, que animavam as tradicionais festas a S. João de Tavarede. Eram o Rancho da Alegria e o Rancho Flores da Mocidade, qualquer deles tendo as suas orquestras formadas por músicos pertencentes às duas associações. E, entre estes ranchos, havia grande rivalidade. Habitualmente o primeiro actuava num pavilhão instalado no Largo do Forno, enquanto o segundo se exibia no Largo do Paço. E, na verdade, essa rivalidade chegou a levar à confrontação física...

Também novas actividades surgiram, especialmente no Grupo Musical e de Instrução, entre as quais o desporto. Um tavaredense, que veio a desempenhar o cargo de responsável pelas práticas desportivas nesta associação, bem como outros de que mais adiante daremos nota, sagrou-se campeão distrital na corrida da légua disputada em Coimbra, mas em representação do Ginásio Figueirense. Foi ele António de Oliveira Lopes.


António Oliveira Lopes, na homenagem à primeira professora primária em Tavarede, D. Maria Amália de Carvalho

         O Associativismo progredia na nossa terra. Devemos registar, igualmente, as boas relações que continuavam entre as nossas colectividades, bem como com as mais diversas colectividades do concelho. Como exemplo, referimos uma nota publicada na imprensa concelhia e que relata uma visita de retribuição feita pela tuna de Vila Verde. Embora tardiamente, não quero olvidar o facto de a simpática e bem organisada tuna do G.R.M.V, num dever que se lhe impunha cumprir, ter vindo no passado dia 11 do corrente cumprimentar a sua congénere d'aqui - Grupo Musical Tavaredense -, que há mezes havia visitado aquela colectividade irmã, de passagem propositada por Vila Verde.
Deviam ser aproximadamente 13 horas e meia quando ao ar subiam alguns foguetes anunciadores da vinda dos nossos vizitantes, os quaes fizeram a sua entrada pelo lado da Chã, onde a Direção do Grupo Musical os foi receber. O bandeireiro da tuna Vilaverdense aceita troca dos estandartes representativos das colectividades amigas, depois do que a tuna começou de executar uma primorosa marcha até à sede do Grupo Musical.
Convidados os vilaverdenses a entrar, o auctor destas linhas deu-lhes as cordeais boas-vindas, seguindo-se António Victor Guerra, que improvisando um brilhante discurso, terminou por enaltecer, de uma forma aliás bem digna e justa, as excelentes qualidades do homem que competentemente dirige a tuna de Vila Verde - a figura simpática e respeitável do sr. Abinadab Nunes da Silva, a quem em parte aquele povo deve o inesquecível favor de, em tão curto espaço de tempo, o fazer acordar de vez da imperdoável letargia e indolência em que se debatia há tantissimos anos...
Termina o amigo Guerra por levantar, de uma forma franca e sincera, um viva ao Grémio Recreativo Musical Vilaverdense, que foi secundado por todos os tavaredenses que o ouviram. O sr. Abinadab Nunes da Silva agradece reconhecido, de uma forma fácil e fluente, aos rapazes que em palavras tão imerecidas, o estão a colocar assim a uma culminância tamanha. Diz que o convidaram para aquela Obra, portanto, já que faz parte dela, tem por dever envidar todos os esforços por que ela saia sã e forte, ou pelo menos a não o deixar mal colocado, pois que, se os seus rapazes continuarem a compreendel-o e a obedecer-lhe, como presume que sim, tem a quasi certeza que atingirá com eles a maior das distancias que seja possivel à sua modesta competência na sublime Arte de David de Sousa.
Ao terminar, uma estridente e prolongada salva de palmas cobre as suas palavras, ao mesmo tempo que as notas do Hino Vilaverdense imprimiam ao acto, modesto mas solene, uma certa nota apoteótica. Foram convidados a um copo d'agua, o qual decorreu debaixo da maior animação e da mais franca alegria e bem-estar. Quer dizer: este feliz momento veiu contribuir para uma maior aproximação e uma mais cordeal e intensa amizade entre os grupos congéneres, senão para um laço mais vinculado das duas aldeiasinhas, tão fortemente unidas pela inquebrantável corda da tradição...
Também o mesmo grupo vizitou a Sociedade d'Instrução Tavaredense, onde foi bem recebida. Os meus sinceros e veementes votos são para que a simpática colétividade que nos vizitou continue a progredir à medida dos seus desejos, pois que, com a boa vontade que lhe é peculiar, e com a competência do sr. Abinadab à sua frente, ela tem a obrigação restricta de vencer qualquer dificuldade que porventura se lhe possa atolhar.

Apesar de começar a ser muito criticado, como espectáculo teatral, o Grupo Musical e de Instrução, chegada a época natalícia, repunha em cena O Presépio, conquanto já fosse aborrecido tanto Presepe, é certo que, chegada esta ocasião, ele sempre lembra. Por outro lado, dá muito dinheiro, muito, e é dele que precisam todas as colectividades que, como o Grupo Musical, só vivem da quotização e do esforço que por elas envidem os seus sócios mais apaixonados. Vamos, pois, prepararmo-nos para a monumental ‘injecção’.

Entretanto, a Sociedade de Instrução, sempre que tinha possibilidades de o fazer, apelava aos tavaredenses para o associativismo. A sede da S.I.T. abre todas as noites, e ali se reunem alguns associados, que passam umas horas de bom convívio. Porque não deixam as tabernas aqueles que nesta se reunem à noite, envenenando a saúde e contraindo vícios perniciosos a si próprios e à sociedade?

Em Abril de 1924, o Grupo Musical e de Instrução resolveu, em assembleia realizada no dia 21, comprar o edifício  onde se encontrava instalado havia dez anos, e que lhes havia sido cedido, gratuitamente, pelo seu sócio benemérito Manuel da Silva Jordão. Como sabemos, era a casa que, muito anteriormente, havia servido a Joaquim Águas para ali dar alguns espectáculos, nomeadamente o Presépio, de que era um fervoroso entusiasta, e, anos mais tarde, sede do Bijou Tavaredense.

Embora tivessem sido feitos alguns melhoramentos aquando da mudança, entenderam os directores da colectividade que havia necessidade de novas obras, para que pudessem desenvolver a sua acção educacional, cultural e recreativa. Para tal, e aceitando uma proposta que lhes foi feita pelo proprietário do imóvel, resolveram adquirir o mesmo.

... Comquanto seja um pesado encargo para a Direcção, ela está vencendo as peores dificuldades que se lhe teem antolhado, vendo que os seus desejos ora correm de forma bem lisongeira. A compra é feita por acções de 50 escudos, vendo-se já inscritos no respectivo livro grande numero de sócios mais devotados daquela colectividade.
Para aqueles dos sócios que não possam comprar já acções, foi criada uma caixa económica, para a qual eles são obrigados a pagar 1 escudo, ou mais, todas as semanas, sob pena de serem considerados demissionários. A iniciativa é boa, porquanto é um ensejo para se conhecerem os bons e leais amigos do Grupo Musical Tavaredense... Oxalá os directores desta sociedade local consigam levar a cabo os seus louváveis propósitos, para o bom nome da sua associação e engrandecimento desta tão encantadora aldeia.

         Foi o início de um projecto muito importante para esta associação tavaredense. Coincidiu com a instalação da rede eléctrica em Tavarede, o que, aliás, foi de imediato utilizado por ambas as colectividades. Ao mesmo tempo que as obras, ainda que a escritura da compra não estivesse feita, estas prosseguiam em bom ritmo, começaram a preparar o espectáculo a realizar para a inauguração dos melhoramentos efectuados, apontando os festejos para a data do     13º. aniversário da sua fundação.

Como curiosidade, aqui inserimos uma nota publicada na imprensa figueirense e relativa à inauguração da luz eléctrica. Temos, finalmente, luz eléctrica em Tavarede. Está montada a rêde e há feitas já algumas instalações em casas particulares. A primeira instalação a fazer-se foi a da Sociedade Instrução Tavaredense, que é completa e perfeita, ficando o teatro com todos os recursos de iluminação que podem exigir-se em casas desta natureza.
         A luz ficou ligada no último sábado, despertando o facto um interêsse extraordinário nesta localidade. Muitas pessoas foram à sede da Sociedade de Instrução ver o efeito da nova iluminação, que é deslumbrante. Alguns associados até se reuniram, não ocultando o seu regosijo. A inauguração da luz eléctrica far-se há no dia 13 do corrente, com uma récita dedicada aos sócios. No domingo, 14, haverá baile. Tem a população de Tavarede motivos para estar grata à Sociedade de Instrução Tavaredense, pois, sem o esforço desinteressado de um grupo de sócios desta agremiação, não disfrutaria ainda hoje êste grande melhoramento. A Companhia Eléctrica, trazendo a energia a Tavarede muito antes do prazo a que era obrigada pelo contrato, deu provas duma grande boa vontade, sendo valiosamente auxiliada por aquele grupo de sócios da S.I.T. a que nos referimos, que conseguiu, com donativos vários – entre os quais avulta o de 500$00 da Cerâmica e Exportadora, do Senhor da Arieira – adquirir todos os postes necessários para a montagem da rêde, podendo avaliar-se êste auxilio em 1.500$00.

         Está claro que há mariolas que, não contribuindo com o mais insignificante esfôrço para melhoramentos desta natureza, são depois os primeiros a quererem tirar dêles todo o proveito. Foi sempre assim, e por isso mesmo não estranhamos. A Companhia está prosseguindo activamente na montagem das instalações particulares e na ligação destas à rêde.  

sábado, 18 de maio de 2013

O Associativismo na Terra do Limonete - 23


 
Alegrias e... tristezas!


         Não hesitamos em considerar como uma década dourada a que decorreu entre os anos de 1921 a 1930. Além do nascer de uma nova colectividade na freguesia e do declínio, depois de dez anos triunfais, de uma outra, veremos uma carreira extraordinária, ainda de uma terceira associação tavaredense, por sinal a mais antiga.

         Certamente que será uma década em que nos teremos de debruçar, talvez mais longamente, mas, sem nenhuma dúvida, o Associativismo viveu, durante este período, anos brilhantes e, também temos que o confessar, anos verdadeiramente dramáticos. Encontraremos de tudo. Êxitos triunfais, novas actividades, jornadas memoráveis e declínios bastante tristes e lamentáveis.

         Mas, prossigamos a nossa viagem. Mais uma vez o ano se iniciou com a representação, pelo Grupo Musical, do drama sacro Auto dos Reis Magos. A Sociedade, entretanto, havia preparado, e apresentou, um excelente programa comemorativo de mais um aniversário da sua fundação, o 17º. Deste programa, fez parte a apresentação de uma nova opereta, A Espadelada, que teve a particularidade de ser representada por crianças.
 




Grupo de crianças
que interpretou
A Espadelada





     Segundo o programa, segue-se a operetta em 1 acto, de costumes regionaes, A Espadelada, interpretada por um grupo de creanças. Assim foi, pois que após um breve intervallo o panno sóbe e a petizada começa de representar a alludida operetta.
         De principio a fim eu admirei todos, absolutamente, desde o protagonista ao simples comparsa. Com franqueza: tenho pena de infelizmente não ter competencia para poder relatar com minuciosidade o que vi. Sei que me custa a crêr que um grupo de amadores com mais annos de pratica na arte de theatro do que os que teem de vida aquelles pequenos actores fosse capazes de representar A Espadelada com tanto escrupulo e d’uma fórma tão correcta como o grupo dos 20 e tantos petizes dos dois sexos que Zé Ribeiro com a sua proverbial paciencia pôz em scena lá em cima na Sociedade de Instrucção.
         O filho mais velho do Jayme Broeiro, o Antonio, faz com tanta naturalidade o papel de Thomaz, que me dá a impressão d’um velho amador, batido. É um galã bom. A irmãsita do Zé Ribeiro, a Maria, marca authenticamente o papel de Tereza. É uma velha que eu estou a vêr e não uma creança dos seus 10 ou 11 annos. O Zé Borrasca cahiu bem no filho do Manél Loureiro, que faz sem dificuldades um velho marinheiro. O Antonio Cordeiro dá muita vida ao Ernesto. É um janota magnifico, como a Maria José, da Helena, uma camponeza authentica. Faz a Joaquina muitissimo bem, revelando para o futuro aptidões aproveitaveis. Está um outro, um piriquito, de ferrinhos em punho, que sem dizer uma palavra faz como sóe de dizer-se um papelão. Não há um só espectador, o mais sizudo, que se não ria a bandeiras despregadas com o rapaz, que ostentando ao canto da bocca um cigarro brégeiro quasi tão grande como elle, acompanha lindamente com a cabeça, com o corpo e com o batuque dos ferrinhos, todos os numeros de musica que se tocam durante o tempo que está em scena! É d’uma graça extraordinaria!
         Emfim, todos os pequenitos, desde o mais taludo ao Gentilito, indubitavelmente o mais liliputiano dos engraçados amadores, houveram se d’uma fórma tão brilhante que não devo cohibir-me de os estreitar n’um cordeal abraço de felicitações, bem como ao seu ensaiador, o amigo Zé Ribeiro, por vêr coroado de bom exito todo o seu esforço, toda a sua muita paciencia, revelados no successo obtido com a representação da Espadelada, por um grupo de gentis creanças, n’um dos theatros da minha aldeia.
        
Naquele tempo, e isto aconteceu durante décadas, os amadores dramáticos tinham actividade praticamente contínua. Não havia férias e logo que uma peça era posta em cena, de imediato se iniciavam os ensaios da seguinte. Só desta forma se pode compreender o enorme número de espectáculos levados a efeito e a diversidade de peças representadas. Mas não era só o teatro, pois, além do ensino nocturno das primeiras letras, também a música tinha aulas constantes, bem como diversas saídas e, naturalmente, muitos ensaios. Quem verificar, por exemplo, a listagem dos espectáculos realizados pela Sociedade de Instrução (cadernos 100 Anos de Teatro), pode constatar a verdade destas nossas palavras. Havia como que uma sede de instruir e de educar. Disso muito beneficiaram os tavaredenses de então. No jornal ‘A Voz da Justiça’, de 5 de Agosto de 1921, encontrámos a seguinte nota: Grupo Musical Carritense – com esta denominação organizou-se no lugar dos Carritos um grupo musical que, a avaliar pela boa vontade dos seus associados, muito poderá prosperar. É o que lhe desejamos. Estava, pois, constituida a terceira associação da freguesia. E dizemos terceira porque não encontrámos mais quaisquer indicações sobre aquela que havia sido fundada no Casal da Robala, pelo que admitimos tenha cessado o seu funcionamento. Registamos o conselho directivo eleito neste jovem Grupo Musical Carritense: presidente, António Jesus; vice-presidente, César Gaspar; secretários, José Joaquim Lemos e António Esteves; tesoureiro, Mário da Silva Jordão. O seu agrupamento musical apresentou-se ao público carritense, pela primeira vez, pelo Natal de 1921.

Como habitualmente, a tuna do Grupo Tavaredense saíu no domingo de Páscoa, em visita de cumprimentos às congéneres, entidades oficiais e sócios. Era seu regente Manuel Martins. Estavamos nós em confraternização quando ouvimos o magnífico som dos violinos, tocados por unhas bem melhores que as nossas. Viemos à porta e ali deparámos com a tuna de Tavarede que também ali ia cumprimentar o Grupo dos Carritos, lê-se numa notícia da Fontela, onde também se tinha deslocado, a cumprimentar a colectividade local, o novel grupo carritense.

Devemos recordar que o grupo cénico da Sociedade de Instrução, depois de ter reposto em cena a opereta Os amores de Mariana, com a qual deu várias representações, deu um espectáculo na sua sede, com esta opereta, em benefício da Santa Casa da Misericórdia da Figueira. Oxalá esta iniciativa fosse seguida pelos grupos dramáticos das outras freguesias do nosso concelho, visto que os infelizes de todo o concelho acodem nos momentos difíceis da doença ao hospital da Misericórdia desta cidade.

A actividade associativa proseguiu sem desfalecimentos. E damos um pequeno salto até à Páscoa de 1923, para informar que a tuna do Grupo Musical Tavaredense que é incontestavelmente uma das mais bem organizadas do nosso concelho, fez as habituais visitas de cumprimentos, sendo então seu regente o tavaredense José Nunes Medina.







Tuna do G. M.I. T. Nos anos 20 do século XX

Em Junho daquele ano as duas colectividades de Tavarede tiveram saídas. A tuna do Grupo foi ao Alqueidão e o grupo cénico da Sociedade foi representar Os amores de Mariana à sede da Filarmónica Figueirense, em espectáculo de benefício para os cofres desta filarmónica. Ambas as saídas foram muito aplaudidas.

sábado, 11 de maio de 2013

O Associativismo na Terra do Limonete - 22


       E enquanto no Grupo Musical os espectáculos se sucediam, os amadores da Sociedade, com o regresso do seu ensaiador, retomaram a actividade normal. Os ensaios da opereta Entre duas Avé-Marias decorrem com grande entusiasmo, estando a direcção da parte musical confiada ao sr. Manuel Martins, hábil regente da filarmónica Figueirense, dessa cidade, que se esforça por conseguir o melhor efeito dos variados números de música e especialmente dos lindissimos coros, que lhe estão merecendo especial cuidado. A abertura da época teatral da Sociedade de Instrução vai constituir um verdadeiro sucesso.
         Sabemos estar já definitivamente assente que, logo em seguida à representação desta opereta, entrará em ensaios a linda comédia em 3 actos Nono: não desejarás..., que será representada em récita de gala por ocasião das festas comemorativas do 16º aniversário da Sociedade, a que se procura dar grande brilhantismo. O desempenho desta comédia está confiado aos nossos melhores amadores, pelo que podemos garantir que vamos ter em Tavarede bom teatro, daquele bom teatro que há algum tempo parece ter-se divorciado da nossa terra.
         Muito louváveis são os esforços tenazes dos rapazes que na Sociedade de Instrução procuram agora continuar a sua já importante obra de educação, arrancando ao vicio da taberna os nossos trabalhadores e proporcionando-lhes na associação, por intermedio da escola e do teatro, uma atmosfera sã de educação e de recreio.

         E a década terminou com o teatro em pleno. A Sociedade levou à cena a comédia O grande hotel de sarilhos e o Grupo o drama Gaspar, o serralheiro. Foi muita gente da Figueira assistir aos espectáculos que se realizaram em Tavarede, no sábado na S.I.T. e no domingo no G.M.I.T., lê-se numa notícia de Dezembro de 1920.

         Mas os Autos Pastoris não podiam faltar. Para o Natal teremos ali (Grupo) os Autos Pastoris, que pela certa levarão a este teatro muita concorrência. Infelizmente, trata-se de mais uma representação do Presepe, ensinando os amadores a falar a cantar, tornando-os incapazes de depois declamarem com correcção a mais simples comédia. Era uma opinião, que em nada correspondia à realidade e ao gosto dos tavaredenses.


Os pastores brutos - Presépio no GMIT - antiga sede

sábado, 4 de maio de 2013

O Associativismo na Terra do Limonete - 21


Escrevemos, atrás, da polémica travada entre os directores do Grupo e o correspondente local, Anibal Cruz. Tal como as colectividades, também Anibal Cruz fez as pazes com os seus antigos consócios. Um dia, um tavaredense emigrado no Brasil, saudoso da nossa terra, procurou notícias. Foi aquele correspondente que lhe respondeu e vale a pena aqui deixar recolhidas as notas que publicou na imprensa figueirense, sobre as nossas associações e para informação daquele conterrâneo.     Perguntas-me como vae a Sociedade d’Instrucção, a collectividade que, com o teu esforço, ajudas-te a fundar. Dizer-te-ei que tem tido grandes progressos nos ultimos annos, principalmente no meio theatral, onde se evidenciaram alguns dos nossos prezados conterraneos, taes como o José Ribeiro (o filho mais velho do Gentil, conheces?) o Armeniosito, como lhe chamavas, e o nosso pandego Jayme Broeiro, que trabalharam pela Sociedade d’Instrucção com amor, sabendo assim erguel-a ao nivel das boas aggremiações educativas. Hoje não há tanto enthusiasmo, porque o Zé Ribeiro foi como sargento para as longinquas paragens africanas defender o nosso dominio colonial, e o Armenio Santos e outros socios foram tambem chamados ás fileiras militares.
         Olha que os nossos rapazes já representaram aqui o Amor de Perdição, aquella soberba peça de Camillo que tu, de quando em vez, me falavas e dizias não haver coisa melhor. E representaram-na muito correctamente, ensaiados por um distincto amador e meu amigo sr. Vicente Ferreira, da Figueira. N’esse dia foi uma enchente á cunha. Pessoas de muitas partes do concelho a Tavarede vieram para assistir ao espectaculo. E eu ao admirar as bellas scenas do drama, muita vez me lembrei de ti, que, apaixonado como és de tudo que seja de Camillo, devias gostar de vêr os nossos patricios a interpretar a sua melhor obra sem a anavalhar como se costuma dizer.
         Pois a Sociedade d’Instrucção tem já uma boa folha de serviços prestados ao nosso povo, ora instruindo-o pela escola, ora educando-o pelo palco. Mas ainda mais fez: - promovem na sua séde algumas conferencias interessantes, sendo conferente o dr. José Cruz que muito tem feito em prol do bem-estar do povo trabalhador. A sua palavra auctorisada combate os vicios prejudiciaes á saude e á bolsa do operario que, n’este meio pequeno, passa o tempo nas tabernas. Emfim já vês que a tua Sociedade vae progredindo consideravelmente.

         O Grupo Musical é uma aggremiação que está em principio, mas já com progressos rasoaveis. Fundou-se sem meios e installou a sua séde n’uma casa pequena, onde construiu um theatrito para as familias dos associados passarem as noites grandes. E foi vivendo com este auxilio e com qualquer donativo recebido quando a sua tuna fazia serviço em festas, e que hoje, dizem me, já vive mais desafogadamente. O sr. Manuel da Silva Jordão, dos Carritos, cidadão de fortuna, offereceu lhe para séde a casa que pertencia ao sr. João Aguas, na rua Direita, e a direcção do Grupo, n’um impulso de vontade, ao receber tão valiosa offerta, metteu obras na casa e construiu um elegante theatro. Mas avalias pelas coisas do teu tempo, o interesse com que os rapazes trabalhavam na realisação das obras. Trabalhavam de noite e aos domingos, os socios, que eram pedreiros, carpinteiros, pintores, etc., sem quererem um centavo sequer. O interesse d’elles era só que a sua sociedade progredisse e isso assim tem acontecido, pois que, o theatro acabado, ali teem effectuado récitas magnificas, representando se dramas de sensação, d’aquellas peças tragicas de que tu eras apaixonado. Os Medinas (principalmente o Zé), são as fabricas do riso d’esses espectaculos. Que fartadella tu apanhavas se o visses na comedia O Cabo de Ordens...
         O João da Simôa é o regente da tuna e, tem sido incansavel, os rapazes apresentam-se afinadinhos e executam módinhas de gosto. O Antonito Medina, o filho do Antonio que tu, por certo, conheces, é tambem muito activo e dedicado socio do Grupo Musical e vem a ser ainda outro tio... Ora aqui tens mais uma sociedade com futuro.

         Enquanto o Grupo Musical prosseguia activamente, com o teatro e com a música, a Sociedade de Instrução, pelos motivos que já referimos, pouca actividade tinha além da sua escola nocturna. Talvez por isso começassem a surgir os mexericos e, para esclarecer a situação, o correspondente local de um peródico figueirense fez publicar a seguinte notícia. Alguem terá dito que esta briosa colectividade morreu, isto por não se ter ouvido falar nela há muito tempo. Não, senhores. Ela vive e viverá sempre, continuando na sua obra altruista de há já 13 anos.
         Abriu na segunda-feira as portas da sua escola nóturna, não só para os associados e filhos destes, mas para todos que queiram arrancar-se ao analfabetismo. Os alunos são já em numero de 25, e espera-se que seja aumentado. Na abertura da escola fez-se uma preléção aos alunos, estando tambem presentes varios socios, a todos se dizendo o fim para que se fundou aquela Sociedade e o caminho que ela tem seguido e seguirá sempre, os deveres que a todos compete satisfazer para serem homens dignos, etc., etc.
         A Sociedade d’Instrução Tavaredense está a cumprir a sua obra em prole da educação do povo. Da sua escola teem saído elementos que agora sabem honrar o seu nome. Vendo isto, eis porque ela, querendo continuar a afirmar a sua boa vontade, auxiliando o progresso dos filhos desta terra, abriu agora as suas aulas       Os paes não teem razão de se queixar da falta de escolas.
         O que é preciso é que ali mandem os filhos todas as noites e saibam dar o valor ao sacrificio daqueles que estão ali para os educar e os querem vêr seguir bom caminho.
         A obra da Sociedade d’Instrução Tavaredense foi sempre baseada na educação do povo e no levantamento moral da sua terra. Mas para elevar o excelente nome da Sociedade é preciso que todos trabalhem, cumprindo os seus deveres, não desprezando, não pondo ao canto o que tanto trabalho tem levado a exaltar. A Sociedade d’Instrução Tavaredense tem dentro do seu gremio homens firmes. Há de viver sempre e cumprir o seu honrado programa. Levantar, pois, a Sociedade d’Instrução Tavaredense, é erguer o bom nome da nossa terra!

         Depois de fazer a habitual representação do Presépio, pelo Natal, em Janeiro de 1918 o Grupo Musical repôs em cena o Auto dos Reis Magos. E apesar das dificuldades, o grupo da Sociedade, por ocasião do seu 14º. aniversário, representou o emocionante drama social Honra e Dever e a chistosa comédia Um julgamento no Samouco.

         E depois de uma enorme série de representações com o drama Erro judicial, o Grupo Musical saíu fora do concelho, para ir dar um espectáculo com esta peça a Verride, terra natal dos seus fundadores, os irmãos Medina. Foi uma noite bem passada e há muito tempo que nas tábuas do nosso velho palco não são executadas peças com tanta correcção. O programa constou do citado drama e da comédia Os gagos.

         Em Junho de 1918,  o Associativismo tavaredense e a Sociedade de Instrução, em especial, sofreram um rude abalo com o falecimento de Gentil Ribeiro, pai do ensaiador, ausente em África, no cumprimento do serviço militar, regente da sua orquestra, autor do hino da colectividade e que havia sido um dos fundadores da Estudantina, chegando a ser regente da sua tuna.

         Mas em Maio de 1919 regressou a Tavarede, José Ribeiro. A colectividade, plena de regozijo, realizou uma festa de homenagem. Subiram á scena chistosas comedias, cujo desempenho nada deixou a desejar, salientando-se os excellentes amadores Jayme, Graça, Coelho, Emygdio, etc., e a simpatica amadora Helena de Figueiredo que, interpretando varios papeis com toda a correcção, mais uma vez deu provas abundantes das suas largas aptidões para a famosa Arte de Talma.

 
 








                                 José Ribeiro - militar
         Todas as sallas, lindamente ornadas de verdura e flôres naturaes, ostentavam varios retratos do homenageado, caprichosamente engalanados, com sêdas preciosissimas, rosas, cravos, etc., dispostos com fino gosto por mãos habeis de sympathicas meninas da nossa terra, o que dava ás mesmas sallas um aspecto bonito e encantador.
         Foi sem duvida uma festa muito sympathica, reinando sempre a mais franca e sincera alegria em todos os corações dos que a ella assistiram. Foi uma festa familiar. Foi uma festa que deu jus aos homenageandos, que tendo em consideração que José Ribeiro foi para a Sociedade d’Instrucção, antes de se auzentar para Africa, um dos melhores, senão o melhor elemento e um incansavel e desinteressado trabalhador, quizeram provar-lhe que com a festa em sua honra o seu inesquecivel reconhecimento e a sympathia que lhe dedicam.
         Não somos socios d’aquella collectividade, nem tampouco contribuimos com a nossa modesta cooperação, mas, com franqueza, gostámos immenso; a nossa satisfação é tão grande, que não podemos de forma alguma deixar de felicitar os seus organisadores, sendo extensivos até á pessoa do homenageado os protestos do nosso jubilo não só pelo seu feliz regresso, mas ainda por ser alvo d’uma manifestação que revestiu a maior imponencia e brilhantismo.