sábado, 27 de dezembro de 2014

O Associativismo na Terra do Limonete - 108

         Para as V Jornadas do Teatro Amador da Figueira, o grupo cénico tavaredense levou à cena mais uma comédia de Molière, O tartufo. Na penúltima sessão, no dia 27 de Abril, das V Jornadas de Teatro Amador da Figueira da Foz foi a vez do Grupo Cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense apresentar o seu espectáculo, com a peça “Tartufo” de Molière. A partir deste facto há uma série de considerações importantes, na nossa opinião é evidente, relacionadas com a organização das Jornadas, com o grupo de Tavarede e com o próprio texto dramático que são pertinentes. Porém, o tempo e o espaço não nos permitem fazê-las todas de imediato, agora ficaremos pelas mais adequadas.
         Molière é um autor clássico e “Tartufo” uma das suas peças mais conhecidas e representadas, pelo que afirmar que nos últimos anos já assistimos a várias montagens deste texto dramático não será motivo de grande admiração. O que talvez alguns não saibam é que a versão “oficial”, que chegou até nós como peça acabada de Molière, não é única, pois há mais versões feitas pelo próprio autor. Quando se pega num clássico para montar um espectáculo, há dois caminhos que se podem seguir: ou se considera o texto intocável, embora sem esquecer os meios técnicos de que se pode dispor hoje na produção teatral, ou propõe-se uma releitura do mesmo, capaz de explicitar melhor os seus valores no mundo actual.      
        O grupo cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense optou por ser “fiel à obra”, o que não surpreende por estar de acordo com os seus trabalhos anteriores e as ideias do se encenador. Apesar de fazer apenas dois intervalos, entre o 2 e 3º actos e o 4º e 5º actos, o pano de boca desce sempre no final de todos os actos e não podem ser designados por intervalo só porque os espectadores não saiem da sala. Pequeno pormenor sem interesse pensarão alguns, mas que demonstra bem que nem todas as novas técnicas de produção teatral foram seguidas neste espectáculo. No final desta montagem de Mestre José Ribeiro tivemos a sensação de que Tartufo não tinha mostrado a sua verdadeira face dos dias de hoje, apesar de todas as qualidades que o espectáculo encerra.
O bom trabalho da maioria dos actores, apesar da sua representação convencional não impede a impressão de termos estado na sala de um museu onde às obras expostas não são fornecidas as melhores condições para serem admiradas na sua plenitude. Porém, tudo isto não nos impede de afirmar que este é até agora o melhor espectáculo destas V Jornadas de Teatro Amador da Figueira da Foz, e que Ana Paula Fadigas confirma as suas grandes potencialidades como actriz.

Durante as comemorações do 70º aniversário do Grupo, os sócios tomaram conhecimento de que se iniciariam brevemente as obras para a construção da tão ambicionada sede. Foi uma festa simples, mas que marcou uma efeméride importante associada com o arranque da nova sede, estando praticamente pronto o projecto e uma pequena maquete que dá uma ideia do que vai ser esta extraordinária obra.

Também o Diário de Coimbra se associou à iniciativa, publicando uma nota, de que recortamos esta passagem. Não foi fácil, porém, a vida da colectividade. O seu ecletismo e o carácter restrito do seu substrato humano, apesar de toda a carolice, não conseguiram a implantação que se desejava. ...E para tanto terá contribuido a inexistência de uma sede própria e condigna, pois gorada que foi a hipótese de instalação na antiga Loja do Povo, o Grupo Musical e de Instrução Tavaredense passou a albergar-se, desde 1936 (?), no cada vez mais degradado palácio dos condes de Tavarede. Estas vicissitudes podem, porém, a curtyo prazo dissipar-se caso a agremiação consiga levar por diante os seus intentos. Intentos que não são já meros projectos pois, em grupos de audácia, com suor e sacrifícios, os Associados da colectividade levantam o que é o seu desiderato maior: a sede. É uma fase importante da vida do Grupo Musical e de Instrução Tavaredense, nós (e certamente todos os que não têm da cultura uma noção abstracta) fazemos votos para que a sua conduta futura seja de facto mais um bastião numa terra que sabe reconhecer (e respeitar) os valores elementares e nobres da convivência humana.

Estava em curso mais uma campanha para angariação de fundos. Foi desenvolvido enorme trabalho e a imprensa também colaborou activamente. O Grupo Musical e Instrução Tavaredense é uma Associação de Cultura e Recreio que há setenta anos tem a sua existência em Tavarede.
         Mas..., o que é o GMIT? – O Grupo Musical e Instrução Tavaredense, à semelhança do que prolifera por todo o concelho da Figueira da Foz, nasceu da boa vontade de uns tantos, e a sua actividade tem sido continuada pela carolice de bons tavaredenses. – Foi famosa a sua secção dramática, onde se iniciaram figuras que alcançaram lugar cimeiro na arte de bem representar. – Estamos a lembrar-nos de Manuel Nogueira (já falecido), António Jorge da Silva, Violinda Medina e Silva, - (autênticos expoentes máximos do teatro amador em Portugal) -, e tantos outros que foram figuras marcantes da nossa vida artística. – Foi ainda famosa a Tuna do Grupo Musical, assim como a sua Escola de Música dirigida por aquele outro homem que só a sua humildade o não projectou mais além, e que se chama José Nunes Medina.
         De momentos de glória, o Grupo Musical veio a conhecer momentos de extrema decadência. – A razão esteve menos nos homens do que nas dificuldades que progressivamente foram encontrando. – A sua última sede foi, (é?), no velho palácio dos Condes de Tavarede, presentemente em completa ruína. – Por falta de sede a actividade do GMIT ficou completamente paralizada, mas o entusiasmo dos homens nunca foi vencido, e eis que neste momento se encontram a construir a sua nova sede.
         Mar Alto foi até lá e conversou com elementos da Direcção e da Comissão de Obras, e pôde verificar o entusiasmo com que aquele punhado de grupistas se entregam à tarefa de erguer as paredes da sua Associação. – Ficámos a saber que a obra está orçada em cinco mil contos, mas que, com a ajuda de mão de obra dos seus associados, conseguirão erguer as novas instalações com um pouco mais de dois mil contos, quantia que necessariamente não possuem mas que esperam conseguir com a ajuda de todos. – Até este momento gastaram em materiais a quantia de quase duzentos e cinquenta contos, e as paredes estão a atingir a placa do 1º. piso.
         É inegável o reconhecimento daquela boa gente pelo actual Presidente da Câmara Municipal, Dr. Joaquim de Sousa, ao apoio e estímulo que lhes tem dado. Pela Câmara foi oferecido o terreno bem situado na urbanização da Quinta do Paço, e o projecto da obra foi cedido pelo GAT. – Esperam agora, os elementos da direcção do GMIT e da comissão de obras, a ajuda monetária de toda a população para levar a bom termo a grandiosa obra que se propõem levar a cabo. – Homens, e mulheres, naturalmente, que assumiram esta responsabilidade, merecem todo o apoio da sociedade. Em conversa com aquela gente descobrimos já um outro sonho que lhes vai na alma: - Quando tiverem a sede construída, dispõem-se a lançar mão de outro gigantesco empreendimento que é a construção de um pavilhão que ficaria de portas abertas a toda a população, nomeadamente à juventude.
         Leitor amigo, aqueles homens que ao sábado e domingo ocupam o seu tempo na edificação de uma coisa bela, bem merecem que os ajudem. – Nós vamos ajudar!

No ano de 1982 comemorou-se o primeiro centenário da elevação da Figueira da Foz a cidade. A Sociedade de Instrução e o seu teatro participaram nas festividades. Mas, antes de nos debruçarmos sobre esta participação, vamos copiar mais uma nota publicada, bastante elogiosa para a nossa terra. Leitor amigo: merece a pena saber o que se passa e se faz numa pequena aldeia próximo da Figueira da Foz e que dá lições às grandes cidades – TAVAREDE.
         Que belo exemplo de sacrifício. Paixão e dedicação! Quanto daria eu para que a estrela da minha simpatia me iluminasse o espírito, dando-me a verve necessária para dizer por intermédio deste bocado de prosa, e comunicá-lo aos leitores, aquilo que senti e vi na noite de 23 do corrente mês no teatro da grandiosa (grandiosa na maneira de agir) Sociedade de Instrução Tavaredense, na qualidade que fui de espectador daquele mimo de teatro de assuntos regionais e patrióticos, peça em 2 actos e 13 quadros intitulada “Viagem na Nossa Terra”, de que é autor o superior teatrólogo José da Silva Ribeiro.
         Quanto maior número de vezes vejo trabalhar o grupo de amadores dramáticos tavaredenses mais se radica em mim a opinião da sua superior categoria.
         Quem é que crê, se o não soubesse previamente, que numa terra de tão pequenos recursos se pode realizar Teatro desta qualidade? Sempre que vejo representar os discípulos do grande mestre José Ribeiro, fico chorando a falta que em certas terras (por exemplo, Torres Vedras) faz um homem desta categoria!
         Mas, vamos à peça, sobre assuntos regionais e patrióticos, que é um mimo de literatura popular, escrita para o povo entender, sem pruridos de frases bombásticas, não deixando de referenciar factos proeminentes da História de Portugal.
         Os seus dois actos, de um movimento cénico digno de nota, porque até causa admiração conseguir-se reunir em instalações de tão diminutas dimensões, um conjunto de intérpretes tão numeroso, de tão vistosos trajos folclóricos, e pela maneira como se desempenham, quer proseando, cantando ou dialogando.
         Não farei referência especial a nenhum dos intérpretes, porque me foi impossível referenciá-los, pela falta de luz no lugar em que me encontrava, e poder anotá-los, acompanhando a exibição. Mas razões há que sobrelevam o que deles se possa dizer – a quantidade de elementos em cena, que não exagero se disser que por vezes eram mais de vinte; a forma certa como executavam os jogos de cena, por se movimentarem tantos executantes; os vistosos trajos com que se apresentam, que deslumbram a vista do espectador; a maneira como, quer orando quer dialogando, como os amadores – e que amadores! – se exprimem, ouvem e contracenam, que nos parece estar em presença de profissionais de certa categoria.
         É claro que tudo isto é possível devido ao competentíssimo e modestíssimo José da Silva Ribeiro, a quem não só se deve a autoria da esplêndida peça em 2 actos e 13 quadros, com constantes mutações de cena; como à direcção de cena, mudanças de cenário, ao folclore dos trajos e, sobretudo, incutir em tantos executantes o seu extraordinário valor de homem que em Portugal, na opinião do grande actor que foi José Ricardo, mais sabia de teatro: José da Silva Ribeiro.
         Não posso, não quero, nem devo deixar de felicitar a Sociedade de Instrução Tavaredense pelo seu 78º aniversário, pelo que tem realizado, pela educação popular através do teatro; como proporciona aos seus associados, instalações, hábitos e práticas de vida que não são aquelas que hoje, infelizmente, a mocidade dos grandes centros exerce e pratica nos meios – “soi disent” – civilizados.
         Findo este meu depoimento, pelo que vi e sinto, por lançar três grandes e sinceros votos: - que a sorte conserve a vida e o resto de saúde, hoje já tão abalada, a José da Silva Ribeiro; que a Sociedade I. Tavaredense continue prosperando; e que o povo da incomparável Tavarede continue dando exemplos de amor bairrista e patriótico a centenas de terras de maiores posses e população, como a minha terra, por exemplo.
         Para José Ribeiro vão as minhas sinceras felicitações, pelo incomparável trabalho e dedicação que presta à sublime e instrutiva Arte de Talma.

         Um grande abraço do velho amador dramático e amigo – Vítor Cesário da Fonseca.

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