domingo, 17 de janeiro de 2010

Sociedade de Instrução Tavaredense - 12

No ano de 1925, dá-se uma situação pouco vulgar. As duas colectividades locais apresentam, em simultâneo, operetas de autores figueirenses. A Sociedade de Instrução leva à cena “Em busca da Lúcia-Lima”, opereta em 3 actos, escrita por João Gaspar de Lemos Amorim e musicada por António Maria de Oliveira Simões.
O Grupo Musical e de Instrução representa “Ninotte”, também uma opereta em 3 actos, da autoria de António Amargo, com música de Eduardo Pinto de Almeida. Como breve apontamento, referimos que a grande figura da secção dramática do Grupo era Violinda Nunes Medina, “... que nos surpreendeu pela facilidade com que resolve as dificuldades cénicas e nos encantou pela forma correctíssima como cantou os números do seu papel, que requerem um “à vontade” que só uma boa amadora pode conseguir, sem defeitos”.
“Em busca da Lúcia-Lima está escrita com graça, com beleza, aqui e ali com um pitoresco feliz”. O autor situou a acção dos primeiro e terceiro actos em Tavarede e o segundo na longínqua China. Quanto à música “uma partitura soberba, feliz na inspiração e na beleza da orquestração, em números originais tão perfeitos como apropriada é a adaptação dos coordenados”.

Com esta peça, surgiram valores que se distinguiram na cena tavaredense. Além dos consagrados irmãos Broeiros e António Graça, um novo amador se revelou: João da Silva Cascão. Tornar-se-ia no “grande senhor” do grupo da Sociedade de Instrução, durante várias décadas, em que protagonizou e criou figuras verdadeiramente extraordinárias. No grupo das amadores, tomam os primeiros lugares, Maria Teresa de Oliveira, as irmãs Virgínia e Emília Monteiro, Idalina Fernandes e outras.
Em Junho de 1925, acedendo a um pedido da Santa Casa da Misericórdia, da Figueira, representam esta opereta no Parque-Cine. Vejamos, muito resumidamente, as opiniões dos jornais figueirenses de então. Para a “Voz da Justiça”, é “... uma linda opereta com todas as condições de agrado..... está escrita com graça, com beleza, aqui e ali com um pitoresco feliz”. A “Gazeta da Figueira”, depois de referir que o espectáculo satisfez, acrescenta “o Parque não tinha poiso vago. De galerias, balcão, camarotes, frisas, descia uma bicha humana que alastrava pela plateia. E toda a gente quer pontuando com salvas quentes de palmas, a maior parte dos coros...... numa chamada ao proscénio vibrante de sinceridade – claramente demonstrou o seu agrado”. Quanto à peça, escreve a seguir “numa opereta, vulgarmente, há apenas um motivo ligeiro, um fio leve de entrecho, para se fazer ouvir música. “Em busca da Lúcia-Lima”, tem mais que isso, tem seu enredo, começo, meio, fim, tudo afinado e certo”.
Mas, o crítico de “O Figueirense” não afinou pelo mesmo diapasão. “A peça vive dum disparate carnavalesco e quase todo o seu enredo é um disparate completo. Não é admissível, nem mesmo em teatro, que um anúncio carnavalesco publicado num jornal de província, trouxesse a Tavarede, e de aeroplano, dois comerciantes brasileiros, que se faziam acompanhar dum “muléque”, para verem uma mulher, que o já referido anúncio dizia ser formosa... Como se no Brasil não houvesse mulheres bonitas...” Um pouco à frente continua “... e para rematar as minhas considerações acerca da peça, devo dizer que era perfeitamente dispensável a pornografia que a esmalta, que para mais nada serve senão para gáudio da gente ignorante que gosta sempre de ouvir porcarias...”.
Confessamos, muito sinceramente, que já lemos a peça, até mais de uma vez, e não encontrámos uma palavra, sequer, que nos faça entender aquele comentário!


Mas, quanto à música e montagem, todos os críticos foram unâmimes. Muito bem! E terminamos os comentários a esta récita com o que escreveu aquele crítico da pornografia, quanto ao trabalho do ensaiador, José Ribeiro. “Só quem sabe o que é ensaiar amadores, sejam de que arte forem, é que pode avaliar o trabalhão que ele teve para fazer representar a opereta Em busca da Lúcia-Lima, como ela foi apresentada. Boas marcas e muita ordem na entrada e saída dos diversos personagens. Se tivesse duas mulheres que cantassem bem, e um rapaz que tivesse boa figura e boa voz, o sr. José Ribeiro podia abalançar-se a representar operetas, já não digo de autores consagrados, mas peças escritas com ordem e que um público ilustrado ouvisse com agrado, porque tem jeito para ensaiar e sabe disciplinar a sua gente”.

Fotos: 1 - Cenário do 2º. acto de 'Em busca da Lúcia Lima'; 2 - Gaspar de Lemos, autor do texto; 3 - António Simões - autor da música.

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