sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Sociedade de Instrução Tavaredense - 66

Foi mais um triunfo do nosso grupo cénico. “Já 77 anos são passados desde que em 1904 nasceu na velha Tavarede a Sociedade de Instrução Tavaredense. 77 anos que tiveram o condão de operar a milagrosa transformação das suas gentes como nos foi dado observar no seu magnífico (mas já pequeno) Teatro. Não exageramos se afirmarmos que, naquela casa, não se fez teatro mas se escreveu história ao reviver-se todo um passado que se perde no distante século XI (Conde D. Sisnando). Aqueles homens, mulheres e crianças, escudadas embora no saber e perspicácia desse “quase lendário” José Ribeiro e que mesmo amparado à bengala continua a ser o Mestre insubstituível, parecem ter dentro de si a arte dos seus antepassados, tão perfeitas são as respectivas actuações. Em Tavarede não se aprende teatro, respira-se teatro!”, comentou, na ocasião, um jornal figueirense.

Como permuta com a visita que, no ano anterior, havíamos feito a Tomar, a Sociedade Filarmónica Gualdim Pais, daquela cidade, deslocou-se a Tavarede, tendo proporcionado aos nossos sócios um magnífico concerto na tarde de 17 de Janeiro de 1981, além de ter abrilhantado a sessão solene comemorativa do 77º. aniversário. “… É com muita honra que me encontro naquilo que considero um verdadeiro santuário do teatro amador em Portugal, ou melhor, do teatro em Portugal”, foram palavras do representante da Câmara Municipal na referida sessão.

Para participação nas Jornadas de Teatro Amador daq uele ano, a Sociedade de Instrução Tavaredense pôs em cena mais uma peça de Molière. Foi ‘Tartufo’ e o espectáculo agradou em absoluto. “… Esta é a “troupe” do concelho com mais experiência de palco e de maiores créditos dados até agora. Não por isso, mas pela linha de conduta imposta ao grupo, ele constitui um grande exemplo a seguir pelos demais.





Tartufo
Molière



Desde a subida do pano (rigorosamente à hora marcada) até ao final da peça, respirou-se disciplina. Qualquer pessoa, habituada a ver teatro, notou ali a mão de um mestre conduzindo cada elemento e a harmonizar o todo da encenação. No final, alguém nos informou que, efectivamente, a venerável figura que apareceu em palco, trazida pelos actores, era o devotado artífice de tão homogéneo grupo: - José Ribeiro. Verdadeiro sacerdote do teatro, ele conseguiu, ao longo dos anos, uma obra que poderá (e quanto a nós DEVERÁ) apresentar em qualquer festival de teatro, mesmo no estrangeiro”, foi o comentário escrito por um critico que assistiu a esta representação.






Maria Teresa Oliveira
na peça ‘Os Velhos’




Mas, no dia 7 de Dezembro, o nosso grupo sofreu mais uma importantíssima baixa. Maria Teresa de Oliveira, irmã de Mestre José Ribeiro e sua colaboradora de sempre, faleceu com 74 anos de idade. Com uma carreira extraordinária no nosso teatro, além de sócia honorária, a colectividade já lhe havia prestado justa homenagem. “Certamente que os apreciadores do bom teatro não terão esquecido ainda a “D. Constança” (da Conspiradora), “A Genoveva” (de “As Árvores Morrem de Pé”), e “Ana” (de Os Velhos) ou a “Isabel Peixinho” a quem Maria Teresa Oliveira transmitia um realismo tal que levava os espectadores a duvidarem se estava ali uma artista ou a própria pessoa que ela representava. Muitas pessoas dizem que “na pele” da bruxa de Buarcos era mais bruxa que a própria bruxa… Ficou mais pobre o teatro em Tavarede, e em Portugal. Resta-nos o exemplo e a saudade. Oxalá que seguidores da sua arte invulgar”.

Para festejar o seu 78º. aniversário, o grupo dramático da SIT levou nova fantasia à cena. Mestre José Ribeiro aproveitou a ocasião para a nossa colectividade comemorar o primeiro centenário da elevação da Figueira da Foz a cidade. Foi com a peça “Viagem na Nossa Terra”, a que deu o subtítulo de ‘Da folha de uma figueira à folha de uma videira’. “Com 87 anos de idade, José da Silva Ribeiro, o mestre de teatro que para sempre ficará na história de Tavarede e da nossa cidade não descansa… Agora em mãos, quase pronta para ser representada, temos a peça ‘Viagem na Nossa Terra’, 2 actos e 13 cenas que movimentarão para mais de 6 dezenas de figuras. Curiosamente, esta peça da autoria de José Ribeiro, enquadra-se perfeitamente nas comemorações do centenário da nossa cidade. Íamos mesmo jurar que, apesar de não ter sido encomendada, a peça em apreço virá a constituir um dos acontecimentos mais relevantes das comemorações do centenário”, escreveu o jornal ‘Barca Nova’.









Viagem na Nossa Terra
Homenagem à cidade da
Figueira da Foz


O ‘Jornal de Sintra’, do nosso conterrâneo Medina Júnior, publicou a seguinte carta, a propósito desta representação: “Leitor amigo: merece a pena saber o que se passa e se faz numa pequena aldeia próximo da Figueira da Foz e que dá lições às grandes cidades – TAVAREDE. Que belo exemplo de sacrifício. Paixão e dedicação! Quanto daria eu para que a estrela da minha simpatia me iluminasse o espírito, dando-me a verve necessária para dizer por intermédio deste bocado de prosa, e comunicá-lo aos leitores, aquilo que senti e vi na noite de 23 do corrente mês no teatro da grandiosa (grandiosa na maneira de agir) Sociedade de Instrução Tavaredense, na qualidade que fui de espectador daquele mimo de teatro de assuntos regionais e patrióticos, peça em 2 actos e 13 quadros intitulada “Viagem na Nossa Terra”, de que é autor o superior teatrólogo José da Silva Ribeiro.

Quanto maior número de vezes vejo trabalhar o grupo de amadores dramáticos tavaredenses mais se radica em mim a opinião da sua superior categoria. Quem é que crê, se o não soubesse previamente, que numa terra de tão pequenos recursos se pode realizar Teatro desta qualidade? Sempre que vejo representar os discípulos do grande mestre José Ribeiro, fico chorando a falta que em certas terras (por exemplo, Torres Vedras) faz um homem desta categoria! Mas, vamos à peça, sobre assuntos regionais e patrióticos, que é um mimo de literatura popular, escrita para o povo entender, sem pruridos de frases bombásticas, não deixando de referenciar factos proeminentes da História de Portugal.

Os seus dois actos, de um movimento cénico digno de nota, porque até causa admiração conseguir-se reunir em instalações de tão diminutas dimensões, um conjunto de intérpretes tão numeroso, de tão vistosos trajos folclóricos, e pela maneira como se desempenham, quer proseando, cantando ou dialogando. Não farei referência especial a nenhum dos intérpretes, porque me foi impossível referenciá-los, pela falta de luz no lugar em que me encontrava, e poder anotá-los, acompanhando a exibição. Mas razões há que sobrelevam o que deles se possa dizer – a quantidade de elementos em cena, que não exagero se disser que por vezes eram mais de vinte; a forma certa como executavam os jogos de cena, por se movimentarem tantos executantes; os vistosos trajos com que se apresentam, que deslumbram a vista do espectador; a maneira como, quer orando quer dialogando, como os amadores – e que amadores! – se exprimem, ouvem e contracenam, que nos parece estar em presença de profissionais de certa categoria.

É claro que tudo isto é possível devido ao competentíssimo e modestíssimo José da Silva Ribeiro, a quem não só se deve a autoria da esplêndida peça em 2 actos e 13 quadros, com constantes mutações de cena; como à direcção de cena, mudanças de cenário, ao folclore dos trajos e, sobretudo, incutir em tantos executantes o seu extraordinário valor de homem que em Portugal, na opinião do grande actor que foi José Ricardo, mais sabia de teatro: José da Silva Ribeiro.









Duas cenas de ‘Viagem na Nossa Terra’

Não posso, não quero, nem devo deixar de felicitar a Sociedade de Instrução Tavaredense pelo seu 78º aniversário, pelo que tem realizado, pela educação popular através do teatro; como proporciona aos seus associados, instalações, hábitos e práticas de vida que não são aquelas que hoje, infelizmente, a mocidade dos grandes centros exerce e pratica nos meios – “soi disent” – civilizados. Findo este meu depoimento, pelo que vi e sinto, por lançar três grandes e sinceros votos: - que a sorte conserve a vida e o resto de saúde, hoje já tão abalada, a José da Silva Ribeiro; que a Sociedade I. Tavaredense continue prosperando; e que o povo da incomparável Tavarede continue dando exemplos de amor bairrista e patriótico a centenas de terras de maiores posses e população, como a minha terra, por exemplo. Para José Ribeiro vão as minhas sinceras felicitações, pelo incomparável trabalho e dedicação que presta à sublime e instrutiva Arte de Talma. Um grande abraço do velho amador dramático e amigo – Vítor Cesário da Fonseca

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