sábado, 6 de março de 2010

Manuel Jorge Cruz


Nasceu em Tavarede, no dia 9 de Outubro de 1880, filho José Jorge Silva e Maria da Cruz.
Tipógrafo da antiga Imprensa Lusitana, adquiriu, em 1 de Janeiro de 1904, a Tipografia Popular e o jornal ”A Voz da Justiça”, do qual foi director durante quase quarenta anos, tornando-o num dos jornais da província mais considerados.
Desempenhou cargos públicos, tendo sido, por diversas vezes, procurador à Junta Geral do Distrito, enquanto se manteve o regime republicano. Deu valiosa colaboração a várias associações de classe, como a Associação Comercial, ou de cultura popular e recreio, como a Associação Artística e a Sociedade de Instrução Tavaredense, de que foi o primeiro presidente eleito da Assembleia Geral, em Janeiro de 1905. Foi ele, aliás, quem escreveu o primeiro Regulamento Interno da colectividade.

Era casado com D. Virgínia Alves de Assunção Cruz e pai de Jorge de Assunção Cruz.
Preso político por diversas vezes e o seu jornal suspenso pela censura, sofreu rude golpe com o roubo que a polícia política fez à sua Tipografia Popular, donde levaram todo o recheio, deixando-lhe unicamente as paredes.
O desgosto que teve terá sido a principal causa da sua morte, no dia 2 de Novembro de 1941. Foi sepultado em Tavarede.
“Andam tão coçados por um uso imoderado e incontinente os adjectivos, que a memória do Manuel Jorge Cruz, sepultado no cemitério de Tavarede em 3 do corrente, exige só estas palavras: era um bom!
Atestaram-no, os centenares de pessoas de todas as categorias, que lhe apresentaram as últimas despedidas.
Humilde tipógrafo na antiga Imprensa Lusitana, tipógrafo quis continuar sempre.
Eterno sonhador, adquiriu há muitos anos a Tipografia Popular, na rua do Estendal.
Ali, durante largo período, cerca de três décadas, foi sempre o companheiro dos seus operários, praticando autêntica obra de solidariedade social.
Ninguém pagava melhor; o salário mantinha-se em caso de doença; concediam-se períodos de descanso remunerados, como se houvesse trabalho efectivo - isto, há muitos anos.
Foi o representante de uma corrente politica, com o seu periódico “A Voz da Justiça”, que se impôs entre a imprensa da província.
Existência imaculadíssima - a do Manuel Jorge Cruz!
Mais tarde, instalou a sua tipografia em edifício próprio, ainda inacabado.
Sonhava mais, ao passo que ia realizando os seus sonhos, em prole dos outros.
Queria fazer da sua oficina um modelo, onde os operários se sentissem bem, com salão para conferências, a impressão apartada da composição, modelares instalações higiénicas.
Obteve-o em parte.
Dificuldades insuperáveis levaram-no a parar, julgava que momentaneamente.
Constituiu-se então a empresa “Tipografia Popular, Lda”, honrando esta cidade com uma das oficinas de artes gráficas mais completas no país.
Nos últimos três anos e meio, votado a inactividade forçada, passou a viver martirizado fisicamente, com sofrimento minaz.
Ao mesmo tempo, oprimia-o sem tréguas sofrimento moral tremendo.
Sem um queixume...
Não deixa um inimigo, tendo sido alguém na politica local.
É que a integridade de um carácter e a brancura de uma alma, parece que ainda mandam no mundo.
Descanse, afinal, em paz, quem não recorda, do último quartel da vida, mais que a esposa, o filho e um punhado minguado de amigos.”
Transcrevemos um outro recorte, publicado aquando da sua morte, da autoria do seu amigo Raimundo Esteves: “… não sei se o Manuel Jorge, que era de Tavarede, e trazia no seu trato uma ponta de humildade e um travo de timidez de aldeão, foi a enterrar na sua terra. Gostaria que tivesse ido. Sinto que ficava bem, por baixo dos torrões do cemiteriozito rústico, de onde se ouvem ramalhar os pinhais do Saltadouro nas noites vesgas, e nos dias doces, cantar a linfa clara que desce da Serra e vem, entre madressilvas cheirosas, fertilizar o chão criador das várzeas onde o limonete oloresce o fino ar.
O Manuel Jorge devia ir farto dos postiços, das vaidades, das mentiras convencionais em que a engrenagem da vida o colheu, o triturou, o reduziu a um fantasma de si próprio! Era deixá-lo voltar ao campo tranquilo onde viu a luz do dia, regressar à aldeia garrida de que partiu com um riso fresco à flor do lábio, os olhos nadando em claridade, todo o seu ser num vibrante anseio de fraternidade humana, - idealista que ingenuamente traduzia a sua aspiração de amor pelo próximo, deixando aflar as pontas da sua eterna gravata à La Vallière, que sempre e romanticamente lhe cobriu o peito, onde batia um generoso, um afável, um bondosíssimo coração”.

Fotos: 1 - Manuel Jorge Cruz; 2 - Jornal A Voz da Justiça; 3 - Regulamento da SIT (manuscrito por Manuel Jorge Cruz)

Caderno : Tavaredenses com História

2 comentários:

  1. Bom dia Sr. Vitor,

    Estou maravilhada com este seu Blog. Adorei continue por favor, pois nós "a malta mais nova" conhece tão pouco da nossa terra.
    Muito obrigada.
    Sandra Grilo

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  2. Olá Sandra
    Gostei muito de ver o comentário, sinal de que as minhas jovens comnterrâneas se interessam em conhecer alguma coisa do passado da nossa terra e dos nossos antepassados que tanto lutaram para que a nossa terra do limonete atingisse o nível que conseguiu.
    Devemos não os esquecer e o que faço para recordá-los é muito pouco, pois na verdade muito pouco sei.
    Cumprimentos para todos
    Vitor Medina

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