quarta-feira, 3 de março de 2010

Sociedade de Instrução Tavaredense - 17

Com a melhor das intenções, a direcção da colectividade anuncia, em Fevereiro de 1929, a “realização dum certame hortícola-pomícola, iniciativa interessantíssima da qual os agricultores da freguesia de Tavarede hão-de colher ensinamentos e as consequentes vantagens”.
Tratava-se duma exposição de produtos agrícolas, não criados especialmente para este fim, mas sim de produção corrente, a promover em 15 de Junho e 15 de Setembro. Abrangia três secções: Raízes e tubérculos; Caules e folhas; Flores e frutos; e Arranjo das culturas. A direcção técnica estaria a cargo do regente agrícola, sr. José Maria de Jesus. Encontrámos algumas referências a esta iniciativa, dizendo que o entusiasmo entre os agricultores era enorme. Mas, nas datas referidas, não encontrámos quaisquer notícias da sua efectivação.
No dia 26 de Janeiro de 1929, o grupo cénico da Sociedade foi, pela primeira vez, dar um espectáculo ao teatro do Casino Peninsular. Representou-se “O Sonho do Cavador” e a receita reverteu a favor da Santa Casa da Misericórdia, da Figueira. A receita bruta foi de 5.578$70 e a despesa, “conforme os documentos que a Mesa da Santa Casa tem em seu poder”, foi de 576$00, resultando um lucro de 5.002$70. Esta instituição, em reunião de 10 de Fevereiro, “resolveu conferir à Sociedade de Instrução Tavaredense a mais alta distinção honorífica consignada nos estatutos: o diploma de irmã benemérita”.
A escola nocturna, sempre a funcionar com toda a regularidade, foi dotada com “material apropriado, e introduzido melhoramentos bastantes, para proporcionar aos alunos o necessário conforto de que há muito carecia”. Também foi criada uma “biblioteca agrícola, para a qual já foram oferecidos diversos livros e, na sala de leitura, encontrarão os associados jornais agrícolas, sendo-lhes também prestadas informações e facilitada a aquisição de catálogos, sementes, etc.”.


E a 18 de Maio, nova estreia se verifica no nosso palco. Tratou-se de “A Cigarra e a Formiga”. E se “O Sonho do Cavador” teve êxito fora do vulgar, esta fantasia não o teve menor. A propósito da sua estreia, o professor Rui Fernandes Martins, que depois foi presidente da assembleia geral da colectividade, durante muitos anos, escreveu o seguinte comentário:
“Estive anteontem na Sociedade de Instrução Tavaredense, onde assisti à primeira representação da fantasia em três actos “A Cigarra e a Formiga”.
Esplêndidamente levada à cena, “A Cigarra e a Formiga” em nada fica àquem do festejadíssimo “Sonho do Cavador”.
E, assim, eu mais uma vez fiquei com a soberba consoladora convicção de que naquela Sociedade há um grande culto pela Arte; de que naquela Sociedade a valer se trabalha para que o nome de Tavarede, ou mais ainda – o da Figueira -, se engrandeça e nobilite.
A Sociedade de Instrução Tavaredense marca indubitavelmente um lugar de incontestável destaque entre as suas congéneres.


Trilhando com nobreza uma directriz formosa, surda a doestos próprios de répteis; indiferente perante os dispautérios de inteligências falidas; sempre trabalhando com paixão fervorosa dos fortes, dos que sabem querer, a Sociedade de Instrução Tavaredense é uma sociedade que tem um passado glorioso, e diante de si um futuro risonho.
De ascenção em ascenção, de triunfo em triunfo, ela chegou onde hoje se encontra: ao cume glorioso que todas as Sociedades congéneres, que muito prezem o seu nome, que muito trabalhem pelo seu engrandecimento, devem apetecer galgar.
Mas, neste concelho, já tive ocasião de observar – e com bastante satisfação o registo – que quase em todas as localidades os homens bons colectivamente trabalham por desviar a população dos antros onde a miséria, a embriaguez e o vício proliferam.
Não é só a Sociedade de Instrução Tavaredense”.




A crítica foi muito favorável. Vamos transcrever um pequeno apontamento.
“Agradou muito a peça, pela sua simplicidade, pelos conceitos que nela aparecem, pela sua função educativa, pela finalidade moral que encerra. Mas os versos que pelos 3 actos estão espalhados surpreenderam pelo seu encanto, pela beleza que neles palpita e pela arte com que estão trabalhados. Versos como os da Cigarra e a Formiga, só um artista de fina sensibilidade e profundos conhecimentos de arte de versejar poderia fazê-los. Citamos ao acaso: a poesia maravilhosamente bela A Fantasia, o Desleixo e o Fatalismo, profundos de observação; o soneto A Tenacidade, modelar na forma e rico de expressão enérgica; o recitativo da Toilette, graciosíssimo de comentário ligeiro; e para não falarmos nas lindas quadras ao sabor popular que se cantam na Desgarrada do 2º. acto, no Prólogo, na Alegria de Viver e em outros números, citaremos os belíssimos versos que fecham a peça – O Amor – que são simplesmente maravilhosos, arrebatadores.
Digamos ainda que a partitura é formosíssima. Sem querermos diminuir o valor da linda música do Sonho do Cavador, afigura-se-nos que na Cigarra e a Formiga tem António Simões um trabalho valiosíssimo, magistral como interpretação do poema, rico pela variedade de expressão. António Simões bem mereceu a chamada entusiástica com que a assistência fundamente impressionada, o alvejou logo no fim do 1º. acto. Muito bem!
E do desempenho que dizer? Que excedeu em muito o que poderia esperar-se do grupo modesto da Sociedade de Instrução. O principal papel foi confiado a João Cascão, que no José Cigarra se manteve brilhantemente à altura a que ascendeu no Manuel da Fonte. Muito bem! No final do número “A cigarra tem guitarra, e a formiga tem barriga”, primorosamente cantado, a assistência irrompeu na mais calorosa e entusiástica ovação que ali temos ouvido, sucedendo o mesmo no recitativo final. Jaime Broeiro cheio de naturalidade no Desleixo e no António do Moleiro; o mesmo diremos de António Broeiro – o seu trabalho no 2º. acto é perfeito, cingido às rubricas da peça, mantendo admiravelmente a figura de João Viúvo dentro da necessária discrição; Emília Monteiro, Maria José da Silva, Maria Tereza, Guilhermina de Oliveira e Carolina de Oliveira mereceram os aplausos que ouviram, devendo também citar-se António Graça, que disse muito bem o Prólogo, Francisco Carvalho (esplêndida voz de barítono), José Vigário e F. Loureiro. Duas boas vozes que brilharam: Alzira de Oliveira e César Figueiredo. E todos os restantes, nos coros, se mantiveram nos seus lugares, formando um bom conjunto”.
Fotos - Sonho do Cavador (1928) - 1 - Sonho Cor de Rosa(Maria Eugénia de Oliveira); 2 - Concurso Hipico; 3 - A Vindima (Alzira Oliveira Fadigas)

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