sexta-feira, 6 de junho de 2014

Operetas em Tavarede - 20

         Ao grupo vieram-se juntar o Reitor e João da Esquina, mais a mulher, que estranhando o movimento no largo, quiseram saber de que se tratava. José da Dornas, bem disposto, logo começa a contar as enormes virtudes de seu filho, o novo médico. Pois não era que ele até conseguira demonstrar aos seus mestres que não havia doenças?... E, perante a incredulidade dos aldeões, logo acrescenta: “E olhem, vocemecês, que ele até provou aos professores, e escreveu-o, que “um homem e um macaco é tudo a mesma coisa”... Estava ali um sábio! Pois bem, arranjou-a bonita. Com que então homens e macacos tudo a mesma coisa?

            João e Teresa        
   Que doutor, ai, que doutor falto de caco
    É decerto, é decerto esse alveitar
    Que me quer, sim, que me quer tornar macaco
    P’ra me ver macaquear.

            Reitor  
     Claramente ele não disse
     Nesse livro original
     Que a travessa macaquice
     É condão do racional.

            João e Teresa    
     Não terá nossos carinhos
     Quem faz tal comparação
     Tem decerto macaquinhos
     Ou é grande macacão.

             José
    Vem a coisa bem’ xplicada
    E ao doutor eu dou razão
    Pois há muita macacada
    Na moderna geração.

            João 
     Se eu sou macaco,
     Como explicar
     Que tenho caco
     Para pensar?

            Teresa 
      Se eu sou macaca,
      Sem contestar
     Devo ser fraca
     P’ra matutar.

            José  
     Macacos par’cemos
     Não somos porém,
     Mas, quando nascemos,
     Guinchamos também,
      Caretas fazemos,
       Não temos pensar,
       Macacos par’cemos
       Até no olhar.

            João e Teresa  
    Tal nunca supomos
     Nem disse ninguém
      Macacos não somos
      Que eu vejo-me bem.
      Se acaso par’cemos
      Alguns animais
      De tudo seremos,
      Macacos jamais.
      Passa fora tal doutor
      Que nos vem assim tratar,
       Se não mostra mais valor
       P’ra que foi ele estudar?

       Que doutor, que doutor falto de caco
       É decerto, é decerto esse alveitar
       Que me quer, que me quer tornar macaco
       P’ra me ver encavacar.

            Reitor 
      Claramente ele não disse
      Nesse livro original
      Que a travessa macaquice
      É condão do racional.

            João e Teresa   
       Quem não tenha muito caco
       Não aceita e com razão
       Que lhe digam que é macaco
       Sem andar co’as mãos p’lo chão.

         Margarida e Clara, duas irmãs orfãs, viviam sob a protecção do reitor que, à hora da morte da mãe, lhe jurara velar por elas. Eram bastante diferentes as duas raparigas. Margarida, reservada e pouco expansiva, desde há uns tempos que andava constantemente triste. Pelo contrário, Clara, era alegre e divertida, sempre pronta para as festas da aldeia, e que, por muitas vezes, tentara que a irmã lhe dissesse a razão daquela tão grande tristeza, que ela não compreendia.

            Margarida            
  A débil flor pode à mulher ser comparada
  Em seu aspecto, em seu destino e condição
  Tal como a flor é pela sorte destinada
  A ter vergel ou pertencer à solidão.
  Se quando nasce tem d’abril uma alvorada
  No mundo esparge o mais suave e belo odor,
  Mas se d’inverso em rude escarpa foi brotada,
 Na sua vida simboliza a eterna dor.

            Clara   
  Tal como a flor tu és, irmã,
  Pois no olhar tens o lampejo
  Do astro-rei, que de manhã
  Vem dar na flor o doce beijo
  P’ra que se torne mais louçã.

  Devem na sorte ser iguais,
  Se beija a todos igualmente,
  Pois, quando a luz desce aos rosais
  Brilha também suavemente
  No monte agreste ou salgueirais.

            Ambas    

  Mulheres e flores
  São dois primores
   Que os trovadores
   Bem entrelaçam.
   E sendo flores
   Brotam fulgores
   Dizem amores
   Por onde passam.

            Margarida  
  Porém a flor pode brotar entre um canteiro
  Onde se ostentam lindas rosas do Japão,
  Ou florescer no mais escuro montureiro
  E assim morrer sem um só beijo d’afeição.
  Como dizer que a sorte igual é para as duas?
  Como provar que os seus destinos são rivais?
  Se aquele teve a luz dos sois e brandas luas
  E esta só viu a triste sombra e nada mais?

            Clara  
     Se a boa sorte o bem produz,
    Ninguém demonstra com verdade.
    Pois se a má sorte ao mal conduz
    Bastam os braços da amizade
    P’ra nos dar vida, amor e luz.
    Serás a flor que em seu arvol
    Jamais poisou a cotovia,
    Uma andorinha, um rouxinol.
     Mas outra flor te acaricia
     P’ra que te beije o lindo sol.

            Ambas  
   Mulheres e flores
   São dois primores
   Que os trovadores
   Bem entrelaçam,
   E sendo flores
   Brotam fulgores,
   Dizem amores

   Por onde passam.

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