sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Usos e Costumes na Terra do Limonete - 6

          Muitas vezes temos referido o facto de Tavarede, em tempos que já lá vão, ser uma pequena aldeia cujos habitantes viviam e trabalhavam, na sua maioria, na agricultura. Por conta própria, nas suas terras, ou por conta alheia, eram muitos os cavadores que tiravam, do seu trabalho agrícola, o sustento de sua família.
         Era uma vida bastante dura, muitas vezes trabalhando sob um sol abrasador, enquanto noutras tinham que suportar um frio que enregelava. Além disso, e isto ainda durante a primeira metade do século vinte, não tinham horário, trabalhando de sol a sol, cujo relógio era o sino da torre da igreja, tocando as trindades para o início do trabalho ainda o sol estava a despertar, bem como para anunciar o fim do trabalho, quando o sol já desaparecia no poente.
         No mês de Abril os dias começavam a ser maiores, pelo que foi necessário estabelecer um período de descanso a meio da tarde, para recuperarem um pouco das forças dispendidas. Terá sido esta a necessidade de estabelecer este costume e, assim, surgiu o uso de festejar a tarde estabelecida para a chamada ‘merenda grande’. A nossa terra, seguindo o exemplo geral, também celebrava esta tarde.
         Foi um costume que perdurou durante muitos anos, pois ainda nos recorda, e com saudade, confessamos, quando íamos em ‘ranchada’ merendar fora, normalmente no pinhal sito aos Quatro Caminhos do Senhor do Arieiro, bem perto da velha escola primária.
         A primeira nota que encontrámos respeitante a esta celebração, foi em Abril de 1899. “A srª D. Maria Amália de Carvalho, digna professora da povoação de Tavarede, offereceu na passada segunda feira – dia da merenda grande – uma soirée familiar, que decorreu animadíssima entre despretencioso convívio, até perto da uma hora da madrugada.
         O sr. A. Rodrigues recitou o monologo em verso “O Terrível”, entre francas gargalhadas, sendo também bastante palmeado o sr. A. Proa nas suas cartas de magia. Durante o baile esteve tocando, sob a direcção do sr. João Proa, um quintetto que muito agradou.
         De tarde estivera alli executando algumas musicas a “Troupe Gounod”, sendo-lhe offerecido um abundante copo d’agua. Muito mais tínhamos que dizer, mas o espaço de que dispomos n’este jornal não nos deixa alongar mais”.
         O costume já seria antigo pois, no ano seguinte, mereceu uma nota um pouco maior, num periódico figueirense. “Hontem, ao inicio da tarde, quiz-nos parecer que os nossos visinhos figueirenses tinham julgado ser dia de S. João cá na parvonia. Por essas estradas além viam-se ranchos e ranchos de pessoas, e aqui na povoação passavam igualmente muitos outros com cestos enfeitados de verdura e flôres e recheiados de saborosos petiscos, que iam manducar á sombra d’árvores dispersas por ahi fóra.
         Não era porém dia de S. João, mas sim o da festejada merenda grande, tão suspirado por todos os operarios que até Setembro gosam 2 horas de sesta. Tavarede offerecia-nos mais um tom de quem estava em festa, do que a sua apparencia habitual de monotona pacatez.
         Um grande cortejo de meninas e meninos, alumnos da nossa escola elementar, conduzindo cestos caprichosamente engrinaldados de flôres, percorreram muitas ruas da localidade. Á noite a exma. srª. D. Maria Amalia de Carvalho, sua intelligente professora, reuniu em sua casa muitas meninas suas discipulas e outras das suas relações, e ali estiveram em animado convivio até perto da meia noite. Festas e mais festas”.
         Um outro periódico refere “... houve a costumada romaria, dando a Figueira o seu ‘contigente’ avantajado. Muita alegria; muita festa”. Os figueirenses, como se depreende, aproveitavam aquela tarde para recuperarem forças e procuravam os sítios mais aprazíveis da nossa terra, para saborearem as fartas merendas à sombra das árvores ramalhudas. “Foi grande a concorrência de figueirenses que na segunda feira vieram aqui passar a tarde e festejar a merenda grande. Locandas cheias de freguezes, homens de banza á cinta, mulheres sobraçando cestos recheados de acepipes, danças, vozes argentinas soltando cantigas alegres, um movimento desusado nas ruas, emfim, um bocado de tudo se viu aqui n’aquella tarde. As meninas da escola andaram com cestos enfeitados a percorrer as ruas, depois de terem merendado com alegria E era bonito admirar aquelle grupo de gentis creanças, todo coberto de flores, risonho, cheio de candura, a offerecer-nos um quadro simplesmente bello!. Finalmente, uma tarde bem passada para os felizões que vêem com razão que esta vida são dois dias”.

A professora D. Maria Amália de Carvalho, a quem já atrás aludimos, havia estabelecido o costume de, pelas crianças da sua escola, se festejar este dia. Pelos apontamentos transcritos, percebe-se que o cortejo infantil, com os seus cestos cheios de flores, espalhavam alegria pela rua principal da aldeia até ao local escolhido para a confraternização.




Sem comentários:

Enviar um comentário