sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Associativismo - Os principios (3)

Mais um pequeno apontamento sobre o referido José do Inácio, de nome completo José Luís do Inácio. Havia casado com Luísa Genoveva, também ela amadora teatral. Foi o segundo casamento dela e Estoern descreve-a assim: “... apesar de duas vezes casada, e por isso um pouco gasta fisicamente, apresentava-se ainda com uma frescura de espírito bastante para invejar”. Foi, por esse tempo, que o casal protagonizou um drama intitulado “Os miseráveis de Londres”, levado à cena no teatro da Casa do Paço.
Luísa Genoveva desempenhava o papel de “uma mãe desgraçada, lamentando a sorte dum filhinho, que jazia num berço a dormir o sono da inocência, enquanto a infelicidade lhe pairava em volta, abrindo-lhe a vereda do fatalismo”. Era um dos então chamados “dramas de faca e alguidar”...
Como curiosidade, referimos que José do Inácio e Luísa Genoveva foram avós de Helena Figueiredo Medina, que, durante alguns anos e a partir de 1914, viria a ocupar o primeiro lugar das figuras femininas no grupo cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense. A seu tempo voltaremos a esta amadora.
Entretanto, nos inícios da década de 1870, a situação modificara-se. O senhor João José da Costa, da Quinta dos Condados, que foi um grande benemérito do povo de Tavarede, tendo sido, inclusivamente, presidente da Junta de Paróquia, depois de haver presidido, por dois mandatos, ao município figueirense, era o proprietário da casa onde funcionava o chamado “teatro do Terreiro”. Foi ele, em 1842, um dos organizadores da Filarmónica Figueirense.
Conhecendo o gosto pelo teatro das gentes de Tavarede, e sabendo das dificuldades com que lutavam nas deficientíssimas salas de espectáculos de então, mandou transformar aquela sua casa num moderno teatro, apetrechando-o nas melhores condições existentes à época.
Fachada do teatro mandado construir pelo sr. João Costa

Pela mesma ocasião, e como já se referiu, também o senhor Conde de Tavarede havia instalado, no seu solar, uma sala de espectáculos, a que deu o nome de “Teatro Duque de Saldanha”, um dos seus avós. Logo se formaram dois grupos de amadores, recrutados entre os componentes das nossas conhecidas “sociedades dramáticas”. Algumas destas, no entanto, ainda persistiram mais algum tempo.
No ano de 1879, o jornal “Correspondência da Figueira”, em local de Tavarede, publica a seguinte notícia: “No próximo sábado, dia 15, duas sociedades de curiosos da localidade, tencionam dar, cada uma em seu respectivo 'soi-disant' teatro, duas récitas. Uma das sociedades, a sociedade antiga, leva à cena o drama em 3 actos “A escravatura branca”; a outra, a sociedade nova, representa o drama em dois actos intitulado “Cravos e Rosas”, a comédia em 1 acto “Mulher por duas horas” e a comédia “Mulher que perde as ligas”, também num acto”.
Não conseguimos apurar, com toda a certeza, qual seria a sociedade antiga e qual a sociedade nova. Atrevemo-nos, convencidos, até, de que acertamos, em situar a primeira na casa do Terreiro (no teatro do sr. João Costa) e a segunda na casa do Paço (no teatro Duque de Saldanha).

"Nós aplaudimos sinceramente esta ideia, de alguns rapazes daquela localidade. Sempre é melhor ouvir a declamação de uma peça de teatro por um actor 'gauché' e o desempenho comprometido de uma actriz de aldeiado que dizer bisbilhotices por casas alheias e gastar a dignidade por tabernas imundas", comenta-se naquela noticia.
Não se julgue, no entanto, que tais espectáculos eram inteiramente pacíficos. A notícia, depois de louvar e elogiar a actividade dos amadores, pela sua troca da “bisca-sueca” das imundas tabernas, pelos proveitosos ensaios nas longas e tristes noites de inverno, pede ao administrador do concelho que tome as providências necessárias “para se não dar, durante as duas representações, algum conflito desagradável entre os curiosos das plateias dos referidos teatros”.
Ainda voltaremos, pelo menos a uma, das antigas “sociedades dramáticas”. Iremos recordar aquela que foi da família Águas. Mas, por agora, vamos narrar um caso que reputamos de interessante. Dispondo já de duas casas de espectáculos com boas condições, ainda se representava noutros locais. A tradição do “Presépio”, pelo Natal, era tão forte que, em Dezembro de 1884, se levaram à cena os “Autos Pastoris” numa das antigas sociedades, com palco e plateia improvisados. Diz-nos uma notícia que “a meio do espectáculo, abateu parte do soalho, indo parar à loja alguns dos espectadores”.
Não houve, felizmente, ferimentos graves, mas temos pena de não conseguir identificar a casa onde aconteceu este “acidente”.


(continua)

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