sábado, 17 de outubro de 2015

O Senhor do Areeiro - 2

O SENHOR DO ARIEIRO

  
         “... recorda-nos uma outra (capela), que existiu, também para o lado poente de Tavarede. Era situada no cruzamento do caminho directo desta cidade aos Condados, e que daquele que vai de Tavarede a Buarcos, próximo da quinta de Luís António de Sousa e a uns quatrocentos metros para o lado do poente de Tavarede.
        
         Existiu sob a invocação do Senhor da Arieira ou do Arieiro, naturalmente por ser edificada em um lugar aonde o povo ia extrair areia ou saibro para construcção de alvenarias. Em 186.. só existiam dela, no local, uns restos de alicerces e algumas pedras aparelhadas, soltas. Mais nada.
        
         Contava-se na povoação que havia sido interdita e depois demolida em virtude dum sacrilégio cometido: Um desvairado qualquer foi em uma noite pendurar um enxalavar de caranguejos sobre uma cruz que lá existia, profanando assim aquele lugar sagrado, e daí a interdição.
        
         O povo de Tavarede atribuíu o sacrilégio a algum pescador de Buarcos.
        
         Ao certo nada sabemos desta narrativa, contentando-nos apenas da dicção da tradição como era contada entre o povo das proximidades da capela”.

         Antes de continuarmos com a história do Senhor do Arieiro (preferimos esta forma à de Arieira, mas é só uma questão nossa), também queremos referir que, respondendo ao inquérito paroquial de 1721, o então pároco de Tavarede informa que “estava antigamente um nicho com Senhor Crucificado, no fim da terra para a parte do ocidente, que representava ser muito antigo; que hoje está fechado com porta e com toda a decência; que tem obrado muitos milagres; e vai obrando – suando a sua Santa Imagem e a coluna em que está posto, como se tem visto em certos dias”.

         Nas “Memórias Paroquiais de 1758”, o cura Anacleto Pinto refere a ermida do “Senhor dos Milagres ou Arieira”, contigua a Tavarede, mas fora da povoação.

         Depreende-se do exposto, que o nicho com a imagem do Senhor Crucificado foi transformado numa pequena ermida onde estava devidamente resguardada e protegida, a qual, depois do “sacrilégio” do “enxalavar”, foi demolida.

         Quanto à imagem, uma notícia de 1899, publicada na “Gazeta da Figueira”, diz o seguinte: “Acabamos de saber que alguns paroquianos desta freguesia se vão agregar em comissão para colher dos habitantes da mesma freguesia donativos suficientes para o acabamento interior da capela do nosso cemitério, mandada edificar pela junta de paróquia presidida pelo saudoso e benemérito cidadão sr. João José da Costa.
        
        Foi este malogrado cavalheiro quem teve a louvável ideia de se mandar ali construir aquela capela, com o propósito de nela ser colocada a veneranda imagem do Senhor da Arieira, e de servir também para lá instalar o Santíssimo Sacramento e as imagens que se vêem na igreja, quando por qualquer motivo isso fosse necessário.


         Capela do cemitério actual, mandada construir por João José da Costa, presidente da Junta de Paróquia, para lá se colocar a imagem do Senhor do Arieiro
        
A comissão a que nos referimos vai oficiar à junta de paróquia, a fim de esta conceder autorização para levar a cabo os seus honrosos intentos, visto ela não ter até hoje, passados que são uns poucos de anos depois da morte do iniciador da construção da capela, o sr. João José da Costa, conseguido lançar nos seus orçamentos uma pequena verba destinada a acabar tão útil obra, começada por um homem a quem se deviam acatar e respeitar as intenções.
        
         Honra seja, portanto, àqueles que vão concluir a capela, e oxalá que todas as pessoas desta freguesia contribuam para tal fim.
        
         Agora há uma coisa séria a resolver e de que a mesma comissão vai tratar, que é de averiguar a forma como a imagem do Senhor da Arieira, dada a Tavarede pelos proprietários da extinta capela daquele nome, foi ter à casa de depósito do cemitério ocidental dessa cidade, sem que, segundo o que ouvimos, fosse autorizado para o fazer qualquer dos membros da junta.
        
         Eis um assunto que aqui tem levantado grande celeuma, porque não só a imagem representa para os paroquianos de Tavarede um grande valor, mas também porque estava destinada a ocupar um lugar determinado por um homem cuja memória é sempre invocada com todo o respeito.
        

         E, francamente, também não admitimos que a junta de paróquia ou algum dos seus membros possa assim fazer, leviana e inconscientemente, oferta duma imagem daquelas, como se fôra uma coisa sem valor e que de direito não pertencesse à nossa freguesia, que é como quem diz aos tavaredenses.

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