Santo António
O convento na Figueira
No
lugar onde o Mondego perde seu nome, sepultando suas correntes no abismo do
oceano, fica o da Figueira na margem norte , em relação ao rio, à vista do
qual, e a pouca distância, fica o convento de Santo António, cujo nome glorioso
faz muito avultada a humildade de seus edifícios.
O
sítio, que pertence ao Couto de Tavarede e é jurisdição do Cabido da Sé de
Coimbra, é muito alegre e aprazível com a vista do mar e da terra. Os ares são
frescos e saudáveis. O convento, cuja cerca é ampla e tem muitas árvores de
fruto, é devoto de todos os povos vizinhos. É domicílio de religiosos, que ali
servem a Deus com muita paz e sosego espiritual.
Foi seu fundador o padre Frei António
de Buarcos, natural deste lugar, no ano de 1527. A construção deste convento teve o apoio do rei D. João III e de
António Fernandes de Quadros, Senhor da Casa de Tavarede.
A Igreja de Santo António, também conhecida por Capela da Misericórdia, é o
templo do antigo Convento de Santo António, fundado no ano de 1527, por Frei
António de Buarcos.
Ao longo da sua existência multi-secular viveu a paz e a guerra, a
abastança e a miséria, decorrentes da história da pátria. Com a extinção das
Ordens Religiosas, em 1834, o Convento entrou em decadência, vindo a ser
adaptado a hospital, pela Misericórdia local (fundada em 1839), depois de importantes
obras que se prolongaram até 1886 e que lhe alteraram totalmente a traça
primitiva.
Em 1982 foi, por sua vez, o velho Hospital da Misericórdia adaptado a lar da terceira idade, o actual Lar de Santo António, conservando daquele apenas a fachada principal, neo-clássica, própria do século passado.
Pelo ambiente monacal que ainda conserva, pelas variadas e valiosas obras
de arte que possui, pela antiguidade (o monumento mais antigo da Figueira da
Foz), pela tradição que o envolve e pelo particular carinho que a população
local devota ao seu Patrono, cuja evocação enche toda a Igreja, vale a pena
visitar, com olhos de ver e de sentir, a Igreja de Santo António.
Como espaço religioso apenas resta a Igreja de
Santo António, dado que todos os outros edifícios foram submetidos a outras
funções. Anexa-se a esta edificação a Capela de S. Francisco, pertencente à
Ordem Terceira, cuja construção se situa no início do séc. XIX.
Com
a extinção, em 1834, das Ordens Religiosas, o Convento acabou por ser adaptado
a hospital, sob a alçada da Santa Casa da Misericórdia, fundada em 1839, cujas
obras acabaram por alterar totalmente a traça primitiva.
No
ano de 1982, tendo o hospital sido transferido para edifício próprio construído
na freguesia de S. Pedro (Gala), as instalações foram adaptasdas a lar para a
terceira idade e sede da Misericórdia (Santa Casa). Lembremos, agora, quem foi Santo António.
Santo António
nasceu em Lisboa em data incerta, numa casa, assim se pensa, próxima da Sé, às portas da
cidade, no local onde posteriormente se ergueu a igreja sob sua invocação. A
tradição indica 15 de agosto de 1195, mas não há documento fidedigno que
confirme esta data. Também foi proposto o ano de 1191, mas, segundo um seu
biógrafo, o padre Fernando Lopes, as contradições em sua cronologia só se
resolveriam se ele tivesse nascido em torno de 1188. Tampouco se sabe com
certeza quem foram seus pais. Nenhuma das biografias primitivas os citam, e
somente no século XIV, a partir de tradições orais, é que se começou a atribuir
ao pai o nome de Martim ou Martinho de Bulhões, e à mãe, o de Maria Teresa
Taveira. Fixando-se esses nomes
na memória popular, e com a crescente fama do santo, não custou a biógrafos
tardios atribuírem também aos seus pais uma dignidade superior. Do pai foi dito
ser descendente do celebrado Godofredo de Bulhões, comandante da I Cruzada, e da mãe, que
descendia de Fruela I, rei de Astúrias, mas tal
parentesco nunca pôde ser comprovado. A forma de seu nome de batismo é
igualmente obscura, pode ter sido Fernando Martins ou Fernando de Bulhões.
Fez os primeiros
estudos na Igreja de Santa Maria Maior (hoje Sé de Lisboa), sob a direção dos
cónegos da Ordem dos Regrantes de Santo Agostinho. Como era a
prática da ordem, deve ter recebido instrução no currículo das artes liberais do trivium e do quadrivium, o que certamente plasmou seu caráter
intelectual. Ingressando ainda um adolescente como noviço da mesma Ordem, no Mosteiro de São Vicente de Fora, iniciou os
estudos para sua formação religiosa. A biblioteca de São Vicente de Fora era
afamada pela sua rica coleção de manuscritos sobre as ciências naturais, em especial a medicina, o que pode
explicar as constantes referências científicas em seus sermões.
Poucos anos depois pediu permissão para ser
transferido para o Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, a fim de
aperfeiçoar sua formação e evitar distrações profanas, já que era
constantemente visitado por amigos e parentes. Coimbra era na época o centro intelectual de
Portugal, e ali se deve ter envolvido profundamente no estudo das Escrituras e nos textos dos Padres da Igreja. Nesta época
entrou em contato com os primeiros missionários franciscanos, chegados em
Portugal em 1217, e que estavam a caminho do Marrocos para evangelizar os mouros. Sua pregação do Evangelho no espírito de simplicidade, idealismo e
fraternidade franciscana, e sua determinação missionária, devem ter tocado o
sentimento de Fernando. Entretanto, uma impressão ainda mais forte ocorreu
quando os corpos desses frades, mortos em sua missão, voltaram a Coimbra, onde
foram honrados como mártires. Autorizado a
juntar-se a outros franciscanos que tinham um eremitério nos Olivais, sob a
invocação de Santo António do Deserto, mudou seu nome
para António e iniciou sua própria missão em busca do martírio.
A sua missão
Por essa altura, decidiu deslocar-se ele
também a Marrocos, mas, lá chegando, foi acometido por grave doença, sendo
persuadido a retornar. Fê-lo desalentado, já que não havia proferido um único
sermão, não convertera nenhum mouro, nem alcançara a glória do martírio pela
fé. No regresso, uma forte tempestade arrastou o barco para as costas da Sicília, onde encontrou
antigos companheiros. Ali se quedou até a primavera de 1221, dirigindo-se com
eles então para Assis a fim de participarem do Capítulo da Ordem - o
último que seria feito com a presença do fundador . Em Assis encontrou-se comSão Francisco de Assis e os seus primeiros seguidores, um evento
de grande importância em sua carreira. Sendo designado para um eremitério em
Montepaolo, na província da Romagna, ali passou cerca de quinze meses em
intensas meditações e árduas disciplinas.
Pouco depois aconteceu uma ordenação de
frades em Forlì, quando deixou o isolamento e para lá se
dirigiu. Até então os franciscanos não sabiam de sua sólida formação, mas
faltando o pregador para a cerimónia, e não havendo nenhum frade preparado para
tal, o provincial solicitou a António que falasse o que quer que o Espírito Santo o inspirasse. Protestou, mas obedeceu, e
dissertando para os franciscanos e dominicanos lá reunidos de forma fluente e admirável,
para a surpresa de todos, foi de imediato destinado pelo provincial à
evangelização e difusão da doutrina pela Lombardia. Entretanto, a
prática franciscana desencorajava o estudo erudito, mas em novembro de 1223 o
papa Honório III sancionou a forma final da Regra da Ordem
Franciscana, onde uma formação mais aprimorada se tornou autorizada, desde que
submissa ao trabalho manual, à prece e à vida espiritual. Recebendo a aprovação
para a tarefa pastoral do próprio Francisco, fixou-se então em Bolonha, onde se dedicou ao ensino da teologia na universidade e à pregação. Deslocando-se
em seguida para a França, ensinou nas universidades de Toulouse e Montpellier, passando também porLimoges.
Em 1226 assistiu ao Capítulo de Arles, e em outubro do mesmo ano, após a morte
de Francisco, serviu como enviado da Ordem ao papa Gregório IX, para
apresentar-lhe a Regra da Ordem. Em 1227 foi indicado ministro provincial da Romagna e passou os três anos seguintes pregando na
região, incluindo Pádua, para audiências cada vez maiores. Nesse
período colocou por escrito diversos sermões.
Participou do Capítulo Geral, em Assis, em 1230, onde também assistiu no translado dos restos mortais de São Francisco de Assis, da Igreja de São
Jorge para a nova Basílica.
Nesse mesmo ano, de 1230, solicitou ao papa
dispensa de suas funções como provincial para dedicar-se à pregação, reservando
algum tempo para a contemplação e prece no mosteiro que havia fundado em
Pádua.
Sempre trabalhando pelos necessitados,
envolveu-se também em questões políticas, a exemplo de sua viagem a Verona para pedir a libertação de prisioneiros guelfos feitos pelo tirano gibelino Ezzelino, e em 1231 persuadiu a municipalidade de
Pádua a elaborar uma lei que impedia a prisão por dívidas se houvesse a
possibilidade de compensação de outras formas.
Pouco depois da Páscoa de 1231 sentiu-se mal, declarou-se hidropisia e ele deixou Pádua para dirigir-se ao
eremitério de Camposanpiero, nos arredores da cidade. Aí, há a versão que terá
sido hospedado pelo conde Tiso, devido o
estado de saúde precário, ou que seus companheiros ergueram-lhe uma cabana no
alto de uma árvore, onde permaneceu alguns dias. Percebendo que a morte estava
próxima, pediu para ser levado de volta a Pádua, mas apenas tendo alcançado o
convento das clarissas de Arcella, subúrbio de Pádua, ali faleceu, em 13 de
junho de 1231. As clarissas reclamaram seu corpo, mas a multidão acabou sabendo
de seu passamento, tomou-o e o levou para ser sepultado na Igreja de Nossa
Senhora. Sua fama de santidade era tamanha que foi canonizado logo no ano seguinte, em 30 de maio, pelo
papa Gregório IX. Os seus restos mortais repousam desde 1263 na Basílica de Santo António de Pádua, construída em
sua memória logo após sua canonização. Quando sua tumba foi aberta para iniciar
o processo de translado, sua língua foi encontrada incorrupta, e São Boaventura, presente no
ato, disse que o milagre era prova de que sua pregação era inspirada por Deus.
E incorrupta está até hoje, em exposição na Capela das Relíquias da Basílica.
Foi proclamado Doutor da Igreja pelo papa Pio XII em 16 de janeiro de 1946 e é comemorado no
dia 13 de junho.
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