É
agora ocasião para falar noutra espécie de “ruídos”, bastante mais agradáveis
ao ouvido do que o dos carros de bois e que, de instante a instante, se faziam
ouvir por toda a aldeia. Tavarede, por aqueles tempos, tinha uma vida difícil,
aliás, a vida em Tavarede sempre foi difícil, mas, sem dúvida, muito mais
alegre do que agora. Talvez, sabe-se lá, essa alegria fosse provocada para
esquecer as dificuldades quotidianas, mas o que era verdade é que se cantava
muito, e bem, na minha pequena aldeia.
As costureiras, e havia bastantes em
Tavarede, não paravam de cantar enquanto pedalavam nas suas máquinas, fazendo
correr velozmente a agulha sobre a fazenda; as donas de casa, enquanto varriam,
limpavam ou preparavam o jantar e a ceia familiar; nos quintais e hortas
vizinhas, amanhando as suas hortaliças e novidades ou cuidando das suas flores,
sempre se cantava. Mas era, sobretudo, no ribeiro de Tavarede, perto da Igreja,
que mais se cantava, enquanto lavavam as suas roupas nas pedras bem lisas pelo
continuado uso.
Eram,
normalmente, cantigas do teatro em que, todas ou quase todas, tinham
participado ou participavam, pois raras eram as mulheres da terra do limonete
que, tal como os homens, não haviam participado no teatro.
Não
vou relembrar nomes das cantadeiras. Tenho, no entanto, bem presente uma cena
que se repetia frequentemente nas manhãs de domingo. Quase em frente à minha
casa, moravam meus tios Helena e José Medina. Ela havia sido uma das principais
amadoras do nosso teatro, desempenhando a protagonista em muitas operetas
levadas à cena. Ele foi um excelente amador musical, como executante,
compositor e regente e era o ensaiador dos coros do teatro. Mais adiante
recordarei mais alguma coisa de meu tio José. Pois naquelas manhãs, frente à
porta da rua, aberta, sentava-se ele, com a estante adiante, e da sua flauta
arrancava as mais bonitas canções. Junto à janela, enquanto que mecanicamente
costurava, a tia Helena fazia ouvir a sua linda voz nas canções que ela tão bem
cantava, acompanhada pelo marido. Discretamente, eram muitos os que,
verdadeiramente encantados, paravam um pouco para escutarem e apreciarem.
* * *
Já
que falei nos cabreiros e na venda de leite, entendo oportuno dar uma volta
pela aldeia para recordar as actividades desenvolvidas. Tavarede era uma terra
essencialmente agrícola mas, naturalmente como todas as aldeias, tinha outras
actividades. Aqui havia bem poucas.
Estabelecimentos
comerciais, mercearias e vinhos, haviam quatro. No Largo do Paço era a
mercearia do sr. Jordão. Da parte da frente ficava o balcão e as prateleiras
com os géneros e por trás ficava a taberna. Desta, e por uma porta do lado
poente, subia-se até ao quintal, que está num plano bastante superior à rua.
Era ali que jogavam à malha.
Junto
à casa existia um depósito em cimento que estava coberto por um estrado de
madeira. Por aquela ocasião, havia sido organizado o agrupamento musical
“Lúcia-Lima-Jazz”. Então a rapaziada, sempre imaginativa, arranjava umas
imitações dos instrumentos, em cana, e fazíamos as nossas exibições musicais em
cima daquele estrado, voltados para o largo. O vocalista era o Zé Marreta. Ali
passávamos grandes bocados em ensaios e exibições, e a assistência por vezes
aplaudia as nossas imitações musicais.
A
meio da rua Direita ficava o estabelecimento de Emilinha Cordeiro, que havia
herdado de seu pai, Francisco Cordeiro. Do lado esquerdo da loja, e no patamar
da escada que servia o primeiro andar, estava a cabine do telefone público. Era
daqueles aparelhos em que se dava à manivela para chamar a telefonista. Entre
os vários artigos, a Emilinha vendia farinha de alfarroba para alimentação do
gado. Nós estávamos por ali muitas vezes e, quando o telefone tocava e era
preciso ir chamar alguém, nós lá íamos em correria. De regresso
já sabíamos. A Emilinha deixava-nos ir à tulha onde estava aquela farinha e
escolhermos os bocadinhos maiores que, para nós, eram uma gulodice.
A
seguir à mercearia havia longa loja que estava dividida e que tinha uma
passagem para o quintal. Do lado esquerdo alinhavam-se as pipas com o vinho,
tinto e branco, para venda ao copo ou à medida. Do lado direito, e entre a
mercearia e a cozinha, onde se preparavam os petiscos para a clientela, ficava
a sala de jogo de cartas. Tinha uma mesa comprida e bancos corridos. Recordo-me
muito bem de ali ver disputar acesas partidas. Normalmente jogavam o “garujo”,
com a participação de seis jogadores. Quando eram quatro, uma das variantes do
jogo, chamava-se “liques”; de oito, “ganipo” e de dez “zangarelho”. Dentro de
cada equipa havia um mandante, a quem os outros, da forma mais discreta
possível, passavam sinais do jogo que tinham. Ele, desta forma, sabia o jogo
que a sua equipa tinha e mandava jogar as cartas que entendia. Eram jogos muito
manhosos. Quando viam que tinham bom jogo, havia cantiga. Eram três cartas a
cada um por jogo, ganhando, portanto, a equipa que fizesse duas vasas e marcava
um risco (3 pontos). As cantigas eram de seis, nove e mais, algumas vezes para
acabar a moca. O adversário podia desistir, só perdia um risco, aceitar ou cantar
para mais. Já se sabe, duas partidas ganhas era pedida bebida paga pela equipa
perdedora. Havia vários jogadores que se
auto-intitulavam “mestres”. Dos que conheci, talvez aquele que tinha mais fama fosse
o Aniceto Mocho, um velho e carismático trabalhador rural.
No quintal do
estabelecimento, havia no meio um engraçado pavilhão, coberto de verdura, com
uma mesa e bancos, onde, especialmente nos dias de festa, se faziam grandes
caldeiradas. Ao lado desse pavilhão, e a todo o comprimento até ao armazém, junto
do ribeiro, estavam os tabuleiros para o tradicional jogo da malha.
Um
pouco mais abaixo ficava a “Loja do Povo”, estabelecimento de António Pedro
Carvalho, alcunhado de “Lameira”, nome da terra da sua naturalidade. Seria o
melhor montado, pois além de mercearias, tinha uma grande diversidade de outros
produtos, sempre necessários na aldeia. Do lado poente, em loja dividida,
ficava a taberna, com umas escadas que davam acesso para o quintal, onde, como
nos outros, se jogava, petiscava e bebia.
Junto
ao rio Pereira, indo pelo caminho que parte do largo da Igreja para dar
serventia ao quintal do Ferreira, ficava a loja de António Gato. De todas era a
mais modesta e dedicava-se mais ao negócio de vinhos e petiscos, especialmente
quando havia festas da Igreja, ocasiões em que tinha sempre farta concorrência
de freguesia. Atravessava-se o pequeno ribeiro por uma tosca e velha ponte de
madeira. Em frente à casa, e na outra margem, existiam umas enormes figueiras.
Era ali que a rapaziada ia fazer pontaria com as suas fisgas. Tinham habitáculo
naquelas grandes árvores as pequenitas “carriças”. Nós bem apontávamos mas os
passaritos eram tão pequenos e irrequietos que nunca acertávamos.
Mudando
de ramo, no Largo do Forno estava situada a padaria de Eloi Domingues.
Diariamente, e altas horas da noite, era o enorme forno aquecido a lenha. A
massa, preparada à noite, estava leveda e pronta para cozer, bem cedo. Só havia
dois tipos de pão: as tradicionais carcaças e o pão de segunda, os chamados
casqueiros. Ainda o dia não havia rompido e já estava ao balcão a senhora
Pureza a atender a clientela que vinha em busca do pão fresquinho. Com uns
carros de verga com rodas de bicicleta, forrados com pano branco,
impecavelmente limpo, iam o Olívio Domingues e um colega, fazer venda
domiciliária, à Figueira e a Buarcos.
Na
véspera dos dias de festa, Natal, Ano Bom e Páscoa, entre outros, muitas eram
as mulheres que, em enormes pingadeiras, levavam ou galo ou coelho, com
batatinhas, para assar no forno, que se mantinha quente muito tempo para além
da cozedura do pão. Era sempre com a melhor vontade que acediam ao pedido que
lhes faziam e os pitéus, assados desta maneira, tinham sempre um paladar
extraordinário. No Inverno, também era frequente aparecerem as pingadeiras para
assar as peras francesas que o vento deitava ao cheio e que, de outra forma, se
não podiam comer, tão rijas eram.
No
caminho da fonte, antes da entrada para o Serrado, estava localizada a forja de
Assalino Cardoso. De manhã à noite, lá se ouvia o martelar vigoroso no ferro
aquecido ao rubro na forja bem ateada pelo enorme fole que ele manipulava com a
mão esquerda, enquanto que com a direita, aquecia o ferro, fixo a uma enorme
tenaz. Todos os utensílios agrícolas ali fazia ou reparava convenientemente.
Havia mais duas forjas na nossa terra. No
Terreiro, era a de Manuel Lindote e no Largo do Forno, a de Isolino Proa. Mas
como ambos trabalhavam, como ferreiros, nas oficinas do caminho de ferro, só à noite e aos domingos estas forjas
laboravam.
Ao
princípio da rua Direita, no Largo do Paço, defronte à mercearia, ficava a
barbearia dos irmãos Joaquim e Manuel Medina. Era profissão herdada do pai,
embora este tivesse como profissão principal a de serralheiro, que exercia nas
oficinas da Figueira. O Joaquim, conhecido pela alcunha do “Jaringa”, era muito
brincalhão,
fazendo mil e uma partidas aos clientes
enquanto os servia. O Manuel, mais tarde, acabou por emigrar para os Estados
Unidos da América, onde constituiu família. Voltou aqui há uns anos, com um
filho e com a intenção de regresso definitivo mas, especialmente seu filho, não
se adaptaram e optaram por regressar à América. Entretanto, também o Joaquim
mudou o seu estabelecimento para a rua Direita, junto ao Largo do Forno, onde
trabalhou até ao seu falecimento, continuando o negócio seu filho.
Também
numa pequena loja em frente à mercearia de Emilinha Cordeiro, existia uma outra
barbearia, mas que só funcionava aos domingos, pois o seu proprietário, Faím,
tinha estabelecimento na Figueira, onde trabalhava durante a semana.
Meu
pai havia aprendido o ofício de sapateiro, na Figueira, antes de cumprir o
serviço militar. Empregou-se, depois, nas oficinas do caminho de ferro mas, por
meados dos anos quarenta, resolveu-se a abrir uma sapataria em Tavarede, para
obra nova e consertos. Para pessoal, convidou seu primo João Medina, oficial de
sapateiro na Figueira, José Soares, que seguia a profissão de seu pai na Vila
Robim, e Eduardo Mota, para aprendiz. Abriu o estabelecimento na loja da casa
onde viveram meus avós e que, por partilhas depois da morte de minha avó,
calhara a minha tia Violinda. A velha adega transformou-se em oficina, embora
não tenha ali permanecido muito tempo, pois mudou-se para o réz-do-chão da casa
da senhora Guia, quase defronte.
A sapataria
passou a ser um dos pontos de encontro da aldeia, principalmente para alguns
mais idosos. Entre estes, recordo o encontro diário de dois dos velhos mais
castiços e simpáticos, mas, igualmente, dos mais “casmurros”, que conheci: meu
avô António e o velho João da Simôa. Ambos tinham sido fundadores do Grupo
Musical. Meu avô, embora também músico, destacou-se no teatro, onde, segundo
notas encontradas, foi um bom amador. João Jorge da Silva, o João da Simôa, foi
um excelente músico, tendo sido um dos iniciadores e regente da tuna daquela
colectividade e da orquestra que abrilhantava os espectáculos teatrais, além de
ministrar o ensino da música, durante muitos anos.
Logicamente,
tinham excelentes recordações dos tempos passados. Ainda não eram decorridos
muitos anos sobre o fim do período áureo do Grupo Musical e, quando estavam bem
dispostos, contavam, com verdadeira saudade, muitas histórias vividas naquela
colectividade, à qual haviam dado tanto da sua vida. Outras vezes, as relações
eram momentaneamente azedadas. É que, além de teimosos, ambos eram uns
refinadíssimos mentirosos. Meu avô, então, usava e abusava dessa “virtude”. Em
qualquer outro local hei-de recordar algumas das suas habituais “petas”.
Contavam e recontavam essas facécias vezes sem conta, mas aí daquele que os
desmentisse ou, sequer, se risse de troça! Enfim, não era por causa dessas
“virtudes” que deixavam de ser estimados e considerados.
O negócio
de sapataria não era mau de todo. Rendia pouco, é verdade, mas sempre ajudava
ao magro orçamento caseiro. Um dia, António Lameira também resolveu abrir uma
nova sapataria e acabou por convidar meu pai para tomar conta dela, mediante
uma renda. Durou pouco tempo, pois entretanto havíamos mudado de residência
para o Terreiro e no quintal meu pai fez uma pequena dependência e ali instalou
a sua loja, poupando o dinheiro da renda.
Havia
outros sapateiros que trabalhavam em suas casas, tendo muita clientela. Um
deles havia que se distinguiu pela perfeição dos seus trabalhos. Foi o Fernando
Santos, por alcunha o Fernando Xanato. Nunca foi um grande amador teatral, mas
a sua boa vontade e dedicação foram inexcedíveis, no que resultava haver sempre
um pequeno papel para ele, ainda que simples figurante. O seu rendimento
familiar dependia exclusivamente do seu trabalho, pelo que trabalhava imenso.
Muitas vezes, para acabar um conserto, chegava atrasado ao ensaio. Ao princípio
perguntavam-lhe o motivo do atraso, e lá vinha a resposta “estive a acabar um
xanato…”. Foi assim que pegou a alcunha, mas era uma excelente pessoa no seu
trato simples.
Recordo,
além dele, mais dois sapateiros em Tavarede. Na rua Direita, mais ou menos ao meio,
José Maria Severino dos Reis, mais conhecido por José Maria Terreiro. Casado
com Felismina Ribeiro, teve três filhos, todos anormais. Os dois rapazes
tornaram-se duas figuras características da terra, deixando muita pena quando
morreram: o José e o António Reis, conhecidos pela alcunha de “Parrecos”. Nunca
fizeram mal a ninguém e, especialmente o José, até eram muito prestáveis,
fazendo os pequenos recados que lhes pediam. E José Vigário, no Terreiro, era o
outro sapateiro que exercia a actividade em Tavarede.
Além das
muitas costureiras que haviam em Tavarede, também aqui tinha o seu “atelier” de
alfaiataria mestre Diamantino Rocha. Primeiramente, esteve instalado na loja de
uma casa na rua Direita, vizinha daquela onde eu morava. Tinha umas quatro a
cinco costureiras e aprendizas. Depois mudou para o largo do Terreiro. Mestre
Diamantino Alfaiate, como era mais conhecido, tocava concertina e era ele que
abrilhantava todas as festas populares ou romarias aqui levadas a efeito. No
largo do Terreiro, por ocasião dos santos populares, não faltavam as festas,
com a tradicional fogueira. A orquestra era constituida por residentes naquele
largo: a concertina de Diamantino Alfaiate, a viola e o pífaro, de Manuel
Lindote e o bandolim de meu Pai, Pedro. Intitulavam-se como “Orquestra da
Malveira”!
Claro que muitos tavaredenses,
que exerciam as suas profissões na cidade, também trabalhavam em suas casas.
Pedreiros, carpinteiros, marceneiros, electricistas e outros, não desperdiçavam
os seus tempos vagos, além de ainda arranjarem tempo para amanharem o seu
quintal e uma ou outra leira de terra. Parece, por exemplo, que ainda estou a
ver o canteiro António Marques Lontro, na loja da sua casa, também na rua
Direita, a abrir as letras nas placas de mármore para o cemitério… Nesta loja,
também funcionava, naquele tempo, a Sociedade Protectora de Gado Suíno,
vulgarmente conhecida por “Compromisso dos Porcos”.
Seria
imperdoável não relembrar as figuras da Ti Marquitas do Pires, Clementina Simôa
e Adelaide Pires, as três principais “comerciantes” de tremoços, freiras e
pevides, que tinham os seus “estabelecimentos” à porta de suas residências,
respectivamente no Terreiro, no Paço e rua Direita, frente ao Largo do Forno.
Uma última
recordação sobre este tema. Quase todos os tavaredenses amanhavam um bocadinho
de terra e também quase todos fabricavam o seu vinhito. É que, ladeando as suas
terras de cultura, plantavam videiras, fazendo corrimões. A produção era
pequena e o vinho de fraca qualidade, mas era com gosto e carinho que o faziam.
Havia, no entanto, uma meia dúzia que produziam vinho a sério. Com melhor
conhecimento, recordo meu avô. Na Matiôa tinha ele uma vinha muito boa, pelo
terreno e pela localização. Era cuidada como devia ser. Não lhe faltava com os
tratamentos e só era vindimada quando a uva estava bem madura. A produção dessa
vinha era tratada em separado, pois que igualmente tinha vinha e corrimões na
fazenda da Chã, na Sinceira.
Aquele
vinho da Matiôa chegou a ter muita fama. Na altura própria, pelo S. Martinho,
pregava uma enorme ramada de loureiro na porta da sua loja, que era
transformada em adega, onde vendia o vinho a retalho e ao copo. A clientela,
mais da Figueira e Buarcos, normalmente não faltava e enquanto durasse o vinho
era sempre casa cheia. Muitos clientes também preferiam a deliciosa e
refrescante água-pé, que ele fabricava com as uvas dos corrimões, que misturava
à repisa do vinho e a que juntava uns tantos cântaros de água pura. Quando
abria o pipo da água-pé, recordo que a dava a provar aos amigos por um coco,
onde ela espirrava fresquinha.
Outros
haviam que procediam de igual modo e, por ocasião do vinho novo, era a nossa
terra muito frequentada por grandes grupos que, acompanhando-se dos mais
diversos petiscos, aqui faziam grandes patuscadas.
E acabo
esta parte com uma breve recordação. O ti César Cascão tinha em sua casa,
frente ao largo do Forno, um alambique onde queimava o bagaço das uvas para
fabricar aguardente. A rapaziada gostava de ir ver, além que, quando era tempo
deste trabalho, fazia frio e sabia bem estar ali ao quentinho da caldeira do
alambique. A aguardente caía em fino fio para uma garrafa e estava sempre a ser
pesada, para ver a graduação. A partir de determinado grau deixava de ser
aproveitada. De vez em quando íamos ao caminho do Peso, para roubar figos numas
grandes figueiras de José Serra, e que levávamos para o alambique. Sabia muito
bem comer os figos e beber uma golada daquela espécie de aguardente,
praticamente água quente, que nos dava. Mesmo fraquíssima, não se podia abusar.
A UM CERTO VINHO DE
TAVAREDE
“Entre os
mimos que este abençoado torrão de Tavarede produz e manda ao mercado da
Figueira, há que especializar um vinhinho palhete a quem os apreciadores rendem
as suas homenagens.
Cardoso
Martha, figueirense ilustrado que vive na capital há já longos anos, é um velho
amigo e frequentador da terra do limonete e conhecedor do seu precioso nectar.
Sabendo
isso, um seu amigo tavaredense, presenteou-o há tempos com um piposito desse
palhete, que o inspirou para o seguinte soneto, a que deu o título “A um certo
vinho de Tavarede”:
Encho o meu copo, à luz do claro dia
de um néctar precioso - o vinho amigo,
puro, sem confecções, como o bebia
o bíblico Noé, no tempo antigo.
Depois, em contra-luz, me delicia
sua cor de rubi; e enquanto sigo
na toalha o reflexo, a fantasia
me diz mais que diria quanto eu digo...
Das cepas do torrão de Tavarede,
ó vinho, sê benvindo à minha sêde,
tu, que de muitos és exemplo e espelho
Gole a gole, dou co’a língua um estalinho
e razão a quem disse que o bom vinho
tráz alegria ao moço e sangue ao velho. (Notícias da
Figueira)
Sem comentários:
Enviar um comentário