quinta-feira, 17 de junho de 2010

Grupo Musical e de Instrução Tavaredense - 22


Havia, segundo o conteúdo desta acta, a hipótese de acabar com o Grupo Musical e fundar uma outra colectividade, pois que foi apresentada uma proposta em que se diz “se o Grupo deve ficar ou não com o mesmo título, sendo aprovado por maioria que o Grupo conserve o mesmo nome”. Continuava o problema de sempre, que eram as dívidas. Foi então nomeada uma Comissão de Contas para estudar a situação financeira da colectividade e aprovada uma proposta para que se publicasse, nos jornais figueirenses, um anúncio para que, no prazo de 8 dias a contar da publicação, os credores do Grupo apresentasse as suas contas. Devido a esta proposta, a assembleia foi suspensa, tendo recomeçado os trabalhos no dia 12 de Setembro seguinte.
A conclusão daquele grupo de trabalho foi a seguinte: “O total das contas recebidas atinge o valor de 2 408$10 a que acrescentando uma letra de 1 000$00 de que é credor o sócio Armando Amorim, se atinge o total de 3 408$10. Entretanto, alguns dos membros da Comissão de contas avistaram-se com todos os credores, pedindo-lhes uma redução entre 40 a 50% garantindo-lhes, sob sua palavra, a liquidação das que lhe diziam respeito, dentro do mais curto prazo de tempo possível, e informando-os ao mesmo tempo de que, se não anuíssem ao pedido feito, ficariam na eminência de nada receberem, porque se faria a entrega de todos os haveres a uma comissão liquidatária. Todos concordaram e a dívida ficou reduzida a 2 412$50. Considerava também a Comissão que a própria letra de 1 000$00 do sócio credor Armando Amorim não ofereceria qualquer problema pois este, certamente, daria todas as facilidades de prorrogação, com a indispensável reforma e garantia dos fiadores actuais”.
A última acta deste período diz respeito a uma assembleia realizada em 13 de Outubro de 1932, na qual são nomeados dois sócios honorários e um benemérito (Marcelino Duarte Pinto), sendo de seguida apresentada a seguinte proposta: “Que fique exarado na acta desta Assembleia Geral um voto de muito reconhecimento à benemérita Sociedade de Instrução Tavaredense, pelo grande auxílio prestado ao Grupo aquando da representação em nosso benefício da peça Os Fidalgos da Casa Mourisca. Um voto de muito reconhecimento ao ensaiador sr. José da Silva Ribeiro e a todos os amadores e pessoal de cena que na mesma peça prestaram o seu auxílio. Um voto de agradecimento ao jornal A Voz da Justiça, na pessoa do seu Director, sr. Manuel Jorge Cruz, pela propaganda desinteressada que do nosso Grupo o mesmo jornal tem feito nas suas colunas”.
Vamos, agora, muito resumidamente, dar nota da actividade desenvolvida pelo Grupo, apesar de todos os problemas mencionados.
Para que pudessem levar sessões cinematográficas, foi necessário pedir uma vistoria à Inspecção Geral dos Teatros e o resultado foi que “se encontra em óptimas condições para tais efeitos, podendo funcionar”. Foram vários os filmes apresentados. No dia 23 de Abril de 1930, uma notícia diz que “nos próximos domingo e segunda-feira vão os amadores do Grupo Musical, de Tavarede, representar a Leiria as operetas Entre duas Ave-Marias, Rosas de Nossa Senhora e Herança do 103. Os amadores vão animados do desejo de agradar em ambos os espectáculos”. Não encontrámos qualquer outra notícia sobre esta deslocação, mas no dia 13 de Julho houve récita na sede com aquelas duas últimas operetas, e no sábado seguinte, em espectáculo organizado pelos Sargentos da Guarnição Militar da Figueira, em benefício do Sanatório dos Sargentos, realizado no Teatro do Peninsular, o Grupo deu a sua colaboração com a representação do drama A cruz de guerra e a comédia Educação Inglesa. Pela noite de Natal, depois de vários anos de interrupção, o grupo cénico voltou a representar os Autos Pastoris.
Pelo Carnaval de 1931 foram apresentadas as comédias A propósito, Casar para morrer e Hospedaria infernal. Apesar da crise este espectáculo foi grátis para sócios e famílias. Em Abril foram a Maiorca apresentar Os dois nenés, Casar para morrer e Herança do 103. Certamente que terão havido outros espectáculos na sede, mas não temos registo. Em Agosto realizou-se uma reunião para se tentar a reorganização da tuna. Foi eleito, por maioria de votos, José Francisco da Silva para regente. Teve logo uma adesão de mais de 35 elementos e, ainda nesse mês, efectuaram diversas saídas para abrilhantar festas na Figueira, no Casal da Robala e em Gatões.
Com a mudança para a casa do Paço, o grupo cénico acabou. Ficou a música e, surge, pouco depois, esta informação na imprensa “na nova sede do Grupo Musical, que entrou numa fase de firme desenvolvimento, continuam as obras. As instalações ficarão muito boas, permitindo a realização de festas que a esplêndida tuna do Grupo abrilhantará”. A inauguração desta sede teve lugar no dia 18 de Outubro de 1931, festejando, também, o 20º aniversário da fundação. “O Grupo Musical entrou numa fase de desenvolvimento consciente e com firmeza, escolhendo com decisão o caminho que quer seguir. Com um esforço enorme, admirável – e quando alguém poderia supor que o Grupo ia morrer ingloriamente e sem o conforto dos sacramentos da Igreja – os rapazes do Grupo Musical conseguiram já reorganizar a sua tuna, agora constituída com muitos e valiosos elementos, e instalar-se na sua nova sede”. O programa constou de bailes, alvorada, almoço de confraternização e sessão solene.
Terminara, digamos que de forma inglória, um período cultural extraordinário. O teatro, com um grupo dramático composto por muitos valiosos elementos, saíra da sua sede e fora apresentar-se em vários palcos, frente a plateias conhecedoras e exigentes. A música, com a sua tuna considerada como a mais completa e bem organizada do concelho, alternou períodos bons com outros menos bons. As aulas nocturnas, de instrução primária, desenho, música e ginástica, deixaram de ter as condições necessárias ao seu funcionamento. Na nova sede, como veremos, a música ainda teve continuidade, assim como, durante algum tempo, as aulas da instrução primária.
Mas, antes de continuarmos, permitam-nos algumas reflexões. Para colmatar a falta do padre Manuel Vicente, morto devido ao acidente de viação ocorrido a caminho de Fátima, foi nomeado pároco da freguesia o padre José Martins da Cruz Dinis. Quando este aqui chegou, constatou que a Igreja era pouco frequentada pelos tavaredenses e pensou alterar a situação. Acabado de sair do Seminário, conservador convicto e admirar professo das ideias do Estado Novo, logo iniciou árduo trabalho para conseguir os seus objectivos. Não cabe aqui narrar a luta travada. Tavarede tinha bem arreigados no seu povo os princípios republicanos e bastará ler os jornais figueirenses da época para nos apercebermos do que foram aqueles tempos na terra do limonete. O padre Cruz Dinis, pessoa muito inteligente, procurou cativar os seus paroquianos através da instrução. As duas colectividades tinham aulas nocturnas e havia a escola primária oficial. No entanto, a freguesia era muito populosa e muitas crianças, e até adultos, não conseguiam frequentar aquelas aulas por falta de vagas. Resolveu, portanto, abrir nova aula para ensino das primeiras letras. Em breve a frequência atingiria os 40 a 50 alunos. A sua casa não tinha condições para manter as lições. Havia que procurar outro local capaz.
Além disso, também sabia que o teatro e a música, como antigas tradições locais, eram meios ideais para atrair a si novos fiéis. Porque não fundar nova colectividade estreitamente ligada à Igreja? Era difícil num meio tão pequeno e pobre. Haveria, talvez, uma outra solução. Certamente que nas colectividades já existentes haveriam muitos católicos, até mesmo praticantes... O Grupo Musical terá sido o alvo escolhido. Como conseguiu chamar a si e trazer para seu lado tantos grupistas que, esquecendo-se do trabalho desenvolvido pela colectividade em benefício da terra, permitiram e, mesmo, colaboraram na queda do Grupo, obrigando-o a vender a sua sede?

Sem comentários:

Enviar um comentário