No capítulo anterior, referimo-nos à prisão do director cénico, pela polícia política, deportando-o para Angra do Heroísmo, ali permanecendo detido cerca de um ano, do que se ressentiu a acção do grupo dramático, cuja actividade, em 1934, praticamente foi inexistente.
Também sabemos que, entre 1931 a 1933, haviam sido postas em cena, com geral agrado, três peças adaptadas dos popularíssimos romances de Julio Dinis. Numa carta, que então escreveu à amadora Violinda Medina, dizia a determinado passo: “..... Não me esqueço de nada nem de ninguém, não só porque a prisão dá tempo para pensar em tudo, mas também porque não sou atreito a esquecimentos. Estou convencido de que ainda este ano (escreveu em Janeiro de 1934) terei o prazer de ver a Violinda interpretando a minha nova opereta “Justiça de Sua Majestade”, que já comecei e a que vou dedicar-me com mais entusiasmo, embora as condições em que vivo não sejam favoráveis a estes trabalhos intelectuais...”.
A apresentação desta opereta no Porto, em Maio de 1935, foi um sucesso. O jornal “O Primeiro de Janeiro” escreveu que “..... a récita decorreu com entusiasmo e, por vezes, até com brilho mercê, principalmente, da peça representada e da segurança que mostraram no desempenho dos seus papeis os bons elementos que constituem o grupo cénico da Sociedade de Instrução Tavaredense....”. Por sua vez, o crítico teatral do jornal “Povo do Norte” não poupou elogios aos tavaredenses. “... Há, no meio jornalístico profissional do Porto, a monomania de ligar pouca importância aos grupos de amadores teatrais da província. Ainda na última sexta-feira, num espectáculo que se realizou, no Teatro Sá da Bandeira, em benefício do Asilo de S. João, tivemos o ensejo de verificar esta lastimável verdade. Talvez porque se exibia ali um grupo de amadores de Tavarede, interessante aldeia vizinha da Figueira da Foz, não compareceu, naquele teatro, um único redactor dos diários portuenses a cumprir o dever de apreciar aquela tão simpática festa para, sobre ela, bem informar depois a curiosidade do público. E foi pena que assim acontecesse porque o espectáculo marcou, sem dúvida, uma nota artística digna de registo. Devemos confessar que nos surpreendeu o conjunto, que é mais harmónico que muitas companhias de profissionais que algumas vezes nos têm visitado”.
Mais adiante, acrescenta: “.... Não faltou o mais insignificante detalhe de observação nos cenários e guarda-roupa, confeccionados de acordo com as exigências da época. Notou-se nas mais pequeninas coisas que andou ali dedo de quem percebia de teatro... E só assim se compreende o êxito alcançado por um conjunto de amadores, filhos do povo e do trabalho, que nas horas vagas se dedicam àquele modo de se instruirem e civilizarem, em vez de fugirem para os centros maléficos do vício e do crime”.
Ainda no mesmo mês, o grupo deslocou-se a Coimbra, nos dias 13 e 14 para apresentarem, no Teatro Avenida e em espectáculos em benefício do Asilo da Infância Desvalida, obra extraordinária do Professor Doutor Elísio de Moura, as peças “Justiça de Sua Majestade” e “A Cigarra e a Formiga”. A crítica desfez-se em elogios, mas limitamo-nos a transcrever um pequeno retalho da notícia publicada no “Diário de Coimbra”:
“É um trabalho são, que bem merece ser exaltado, pela sua eficiência moral, desviando o povo nas suas horas de ócio, para uma obra de assistência, paralelamente à da instrução. Independentemente de constituir por todos um divertimento salutar, é ainda uma forma inteligente de dar vida a uma sociedade onde todos se educam. Quanto a nós, são estes os principais predicados dos grupos dramáticos. Particularmente, e objectivamente a este que acabamos de ver, manda a verdade que traduzamos o seu valor com esta afirmação: existem em Portugal muitos profissionais do teatro, que muito aprenderiam ingressando no grupo da Sociedade de Instrução Tavaredense.
Não pretendemos depois disto, ferir susceptibilidades, apontando nomes. Todos muito bem. Se é certo que podemos apontar alguns nomes que o público sentiu melhor, não é menos certo que isso se deve apenas à beleza dos papeis, e não ao valor pessoal dos seus intérpretes”.
Entretanto, a escola nocturna continuava a cumprir, plenamente, a sua missão. No relatório de 1935, a direcção escreveu: “Tem continuado a funcionar regularmente, tendo este ano uma frequência excepcional pois atingiu um número de alunos de perto dos oitenta, isto sem dúvida por estar encerrada a escola oficial desta freguesia. Temos feito tudo quanto é possível para os alojarmos o melhor possível, mas dada a exiguidade da nossa sala tivemos de transformar o bufete em sala de aula e mesmo assim temos tido dificuldade em os arrumar por forma a que o ensino possa ser profícuo”. Acrescentamos, como nota, que a escola oficial estava sem professor, e assim se manteve largos meses, devido a ter sido transferido para a Figueira o saudoso professor Rui Fernandes Martins que, até à sua morte, foi presidente da Assembleia Geral desta colectividade.
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