quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Sociedade de Instrução Tavaredense - 52

O 4º centenário de William Shakespeare foi, também, comemorado pelo grupo cénico tavaredense. Pela primeira vez, em Maio de 1964, foi dado ao povo de Tavarede a oportunidade
de conhecer uma obra daquele genial dramaturgo. Apresentaram a peça “Romeu e Julieta”.

“Qualquer pessoa habituada a ver teatro, depressa chega à conclusão de que esta peça é difícil e de dispendiosa montagem. Só um homem com o querer e a proficiência de José Ribeiro se arrojaria a fazê-lo representar num palco de província e tirar dele o partido que ele conseguiu. Não é porque no palco de Tavarede se não tenha movimentado número mais elevado de figuras do que aquele que “Romeu e Julieta” apresenta perante os espectadores, mas pelas dificuldades naturais da peça. Todas essas dificuldades foram ladeadas e se “Romeu e Julieta” não fizer – porque não faz – carreira compensadora das canseiras e das despesas que a sua apresentação em cena ocasionou, isso deve-se única e exclusivamente ao violento clima passional em que decorre, clima que contende com os desejos de evasão dominantes no geral da massa frequentadora dos espectáculos teatrais. O público de hoje procura o teatro alegre, ainda que roce pela obscenidade. A representação de “Romeu e Julieta” patenteia equilíbrio, homogeneidade”.

Romeu e Julieta

Especialmente para ser representado aos participantes do Congresso de Medicina do Trabalho, realizado na Figueira em Setembro de 1964, ensaiou-se uma “Noite de Teatro Português”, que se compunha dos autos vicentinos “O auto do Vaqueiro” e o “Pranto de Maria Parda”, do segundo acto de “Frei Luís de Sousa” e da peça “O Dia Seguinte”.

Auto da Visitação ou do Vaqueiro

Nesse ano, e com o fim de subsidiar a aquisição de apetrechamentos do palco, a Fundação Calouste Gulbenkian concedeu novo subsídio, no valor de 98.690$00. Para o espectáculo do aniversário de 1965, o grupo cénico preparou um espectáculo extraordinário. Pela primeira vez, em Portugal, foi representada uma peça do dramaturgo hispano-mexicano Sigfredo Gordon. Foi a peça “Omara”. Sobre este dramaturgo, disse José Ribeiro numa entrevista que concedeu: “Foi o figueirense dr. Francisco Montezuma de Carvalho, crítico de alta craveira e apaixonado estudioso das literaturas latino-americanas, que nos proporcionou o feliz ensejo de travarmos conhecimento com o autor de “Omara”. Poeta e escritor, Sigfredo Gordon é um grande, um autêntico dramaturgo, com uma vasta obra de teatro: aos 54 anos de idade, 33 peças, 12 das quais já publicadas nos seus 4 volumes de teatro. E, deixe-me que lhe diga, é uma lástima que os nossos palcos, onde tantas vezes se exibem produções de obras cujos méritos residem somente no facto de serem estrangeiras, não tenham apresentado até hoje nenhuma deste notável escritor de teatro, que tão bem usa a forma clássica como a moderna e cuja apurada técnica é servida por uma linguagem de riquíssima expressão teatral, um grande poder de síntese criador de belas e vigorosas situações dramáticas e uma extraordinária facilidade de dialogar, seja nos domínios da arrojada fantasia ou da teatralização realista”.

E no espectáculo realizado no dia 30 de Janeiro de 1965, novamente Tavarede teve uma honrosa visita. Desta vez, a SIT recebeu, na sua sede, o sr. D. Juan Enrique Bécquer, representante na Europa do dramaturgo de “Omara”, que se dignou vir à nossa terra assistir à representação da peça que, com a autorização do autor, consentira fosse representada pelo nosso grupo cénico, pela primeira vez em Portugal.

Omara

“D. Juan Bécquer, chamado ao palco por entre estrondosas salvas de palmas, confessou o seu espanto pelo que vira e ouvira! “Omara” era uma peça difícil, até mesmo para alguns profissionais... Não fôra, pois, sem alguma preocupação, que acedera a permitir a sua representação pelos amadores de Tavarede. Entretanto, acabava de constatar uma encantadora realidade, uma verdadeira revelação! E não regateou elogios ao amigo D. José da Silva Ribeiro (como afirmou no seu saboroso espanhol) e a todos os amadores da terra do limonete, a quem abraçou cordialmente”.
Finalmente, nos dias 8 e 9 de Maio de 1965, procedeu-se à inauguração da nova sede, “belo edifício que, entre outras confortáveis instalações, comporta um magnífico teatro, grande aspiração daquela benemérita Sociedade, cujo grupo cénico, constituído por distintos amadores e dirigido pelo talentoso Mestre José da Silva Ribeiro, tem sido, a par de outras actividades educativas da SIT, um magnífico veículo de cultura e fonte de bem-fazer, levando a muitas terras do país, com o mais elevado nível artístico, as peças mais representativas do nosso teatro, com o que grangeou para a sua terra e para a Figueira da Foz títulos de merecida glória aureolados com a mais bela expressão de solidariedade humana, ao representar essas peças para fins puramente beneficentes”.

3 comentários:

  1. D. Juan Enrique Bécquer vive desde 1992 na Ilha da Madeira na cidade do Funchal, onde fez sua residencia permanente desde dessa época.

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  2. Muito agradecido pela informação.
    Comunicarei essa informação à Sociedade de Instrução Tavaredense, onde D. Juan Bécquer assistiu à estreia da peça 'Omara'.
    Os nossos cumprimentos a tão ilustre personagem.
    Vitor Medina

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  3. Nélio Filipe Marques8 de maio de 2011 às 11:54

    Acho que era uma informação que devia partilhar, porque desde dessa época que sou amigo de Juan Enrique Bécquer, porque fiz várias montagens de exposições de pintura aqui na Madeira da sua autoria.
    Ainda no ano passado em Outubro no Museu Berardo, foram apresentadas fotos de sua autoria da India dos anos 40 e 50, quando ainda era diplomata, mas desde que veio para cá nunca mais saiu de cá.

    Obrigado

    Nélio Filipe Marques

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