segunda-feira, 26 de abril de 2010

Sociedade de Instrução Tavaredense - 25

Nos finais de Janeiro de 1933, a amadora Violinda Medina e Silva adoeceu. Aconselhada pelo seu médico, o dr. Pinhal Palhavã, a mudar de ares, foi passar uns tempos a Celorico da Beira. Seu marido, empregado nos escritórios da Companhia dos Caminhos de Ferro da Beira Alta, conseguiu que, temporariamente, lhe dessem o lugar de chefe da estação daquela localidade.
Para ocupar as suas longas horas de solidão, solicitou, a Mestre José Ribeiro o empréstimo de algumas peças de teatro, para ler, pedindo-lhe, igualmente, o seu conselho quanto a estas leituras. Vale a pena aqui deixar parte da resposta que recebeu.
“É a “Morgadinha de Valflor”, jóia admirável do nosso teatro romântico. É possível que já tenha visto representada. Mesmo assim, fará bem lendo esse belo e intenso drama. A sua leitura dar-lhe-á uma impressão mais forte da técnica então usada. Verá na Morgadinha os extensos monólogos a que hoje, - porque o teatro se aproxima da verdade, fogem os dramaturgos, mesmo quando escrevem peças a que podemos chamar também românticas, pela psicologia das personagens e pelo assunto.
Em seguida a esta levar-lhe-ei outras peças que há-de gostar de ler porque, para quem tem espírito a quem interessa o teatro, agrada conhecer, porque são modelos de forma, de técnica, de estilo. Do teatro chamado lírico, vale a pena ler “A Madrugada”, que a Ilda (Stichini) vai representar em S. Carlos; é uma peça encantadora, em verso, de Fernando Caldeira, autor também da “Mantilha de renda” e “Sapatinho de cetim”. Como teatro em português, pelas figuras e costumes, as comédias de D. João da Câmara, como “Os Velhos”, mais algumas das obras do profundo dramaturgo Marcelino Mesquita: a tragédia esmagadora da “Dor Suprema”, o drama “Envelhecer”, a comédia “Peraltas e Sécias” – três géneros diferentes. Vai lendo isto vagarosamente, pouco a pouco, e por certo tomará gosto à leitura de obras teatrais. Depois lerá peças de autores modernos – direi melhor, de autores vivos, porque aqueles ainda não são antigos. Assim as suas faculdades críticas ir-se-ão apurando, a ponto de gostar de ler alguns autos do Gil Vicente, velhos de quinhentos anos, mas que parecem de hoje - e que aborrecem algumas pessoas de cultura que supõem desenvolvida e que são tidas como conhecedoras de teatro.
Possuo as obras que indico, e a Violinda lê-las-á quando quiser, à medida que lhe fôr possível. Certamente o que mais há-de desejar conhecer são os autores portugueses; mas, se desejar, poderá ler também alguma coisa das celebridades estrangeiras mais citadas. Isto aborreceria outra pessoa, que não a Violinda, em cujo espírito se alimenta a paixão do teatro. Por isso levo tão longe esta conversa teatreira”.
É interessantíssimo, para quem gosta de teatro, ver a sequência da leitura das peças referidas. Violinda Medina encontrara o mestre de teatro que precisava para desenvolver a sua extraordinária apetência pelo palco.
Entretanto preparava-se mais uma nova peça de teatro português, A Morgadinha dos Canaviais. “Logo que a Violinda venha, começaremos a ensaiar activamente. Parto, bem entendido, da certeza de que a Violinda virá fazer a protagonista, conforme ficou combinado. Julgo que não conseguiram alterar as suas disposições...”.
José Ribeiro escrevia isto porque tinha conhecimento de que aquela amadora havia novamente sido solicitada pelo Ginásio Figueirense. Mas ela estava decidida. Só representaria no teatro da sua terra.
“O que eu lhe desejo é que a sua estada aí tenha aproveitado à sua saúde, que está acima de tudo. Venha bem disposta, para que o teatro – quando ele é orientado com bom critério assim sucede – exerça no seu espírito, como distracção ao menos, salutar influência. Não veja apenas o interesse do ensaiador nestes votos, que partem da minha leal amizade”. Esta carta está datada de 14 de Março de 1933. Violinda Medina breve regressou à Figueira e aos ensaios e, no dia 27 de Maio, como veremos adiante, “A Morgadinha dos Canaviais” foi levada à cena no palco de Tavarede, protagonizada por ela.

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