Transcrevo, a seguir, a tal notícia da inauguração:
“O Grupo Musical Tavaredense realisou no preterito sabbado um espectaculo para solemnisar a inauguração do seu elegante theatrinho.
Fez na abertura uma breve alocução Annibal Cruz, que felicitou os seus patricios pela maneira como trabalham para se instruirem e engrandecerem a sua terra, protestando contra aquelles - que, felizmente, nada valem - que guerreiam a nova agremiação com infamias e cobardias.
Os distinctos amadores desempenharam com correcção as applaudidas comedias O Senhor, Hospedaria do tio Anastacio e Amo, creado e creada e o jovem amador António Medina recitou com graça o monologo Ainda lá vou...
No domingo, repetiu-se o espectaculo com regular assistencia.
Aproveitamos a occasião de felicitar os estimados amadores pelo bom desempenho das comedias, porque não era rasoavel exigir mais, nem tanto esperar. Não são profissionais, não fazem da arte um modo de vida. São, pelo contrario, homens do trabalho, que no vigor da vida antes podiam desejar gastar as suas horas de folga nos prazeres proprios da edade, mas pelo contrario elles dedicam-se ao estudo, ao desejo de se instruirem; e já isso seria digno de registo simples sem o applauso que nasce expontaneo do bom resultado que elles tiram do seu estudo, e de que n’estas noites de festa elles veem dar a prova, perante um publico que com razão os estima e justificadamente os applaude.
Oxalá que o Grupo Musical continue, tanto no theatro como na musica, a instruir com a mesma boa vontade como até hoje, os seus associados, porque iniciou um grande melhoramento social, e abriu uma larga escola de instrucção. Mas precisa não dormir sobre os louros... colhidos no sabbado e domingo; continuar, avançar, progredir, que é lêma dos trabalhadores.
Na terça-feira de Entrudo dedicou aos socios e familias um animado baile de mascaras”.
Também neste espectáculo, no sábado, fez a sua estreia um grupo musical, igualmente o primeiro da colectividade, sob a direcção de João Jorge da Silva Simôa.
Em Março seguinte houve novo espectáculo. Além das comédias que inauguraram a actividade do grupo cénico (O Senhor; Amo, creado e creada; e Hospedaria do Tio Anastácio), hou mais uma outra intitulada “Influências Eleitoraes”. Nos intervalos, o amador António Augusto de Carvalho “cantou as engraçadas canconetas Ri-có-có e Zan-Zariban”, tendo outro amador, António Medina Júnior, recitado o monólogo “Ainda lá vou...”, que alcançaram fartos aplausos.
E prosseguiu a sua actividade. Em Abril seguinte, novo espectáculo. Desta vez “o aparatoso drama em 2 actos “Crime e Honra” e as comédias em um acto “A Mala do Sr. Bexiga” e “O Cometa e o Fim do Mundo”.
Para a posteridade fica o resgito da primeira comédia “O Senhor” e o primeiro drama “Crime e Honra”.
E no primeiro domingo de Maio de 1912, talvez para festejar o êxito alcançado ou, simplesmente, para convívio, houve um passeio à quinta da Calmada, pertença de António Ramos Pinto (este Ramos Pinto pertencia à conhecida família produtora de vinhos do Porto com o seu nome, tendo chegado a ser um dos seus directores e que, ao que consta, uma vida dissoluta e de devassidão o levou à tuberculose, tendo falecido em Tavarede, naquela sua quinta, bastante novo), onde agora está instalado o parque de campismo da Figueira da Foz.
Foi servido aos associados e famílias um opíparo jantar. “Foi muito concorrido e houve sempre engraçados diálogos entre os convivas, que no meio de ampla alegria faziam o enterro a três boas raias que naquele dia tinham sido pescadas para aquele fim e degoladas pelo Zé Maria Cordeiro, que lhe soube dar um gosto agradável. No local da merenda foram tiradas três fotografias pelo hábil fotógrafo figueirense sr. António Maduro. À noite, no regresso a Tavarede, foi entusiasticamente saudado o Grupo Musical, que pelas ruas executou um alegre ordinário que o nosso estimado patrício sr. João Prôa escreveu expressamente para esta festa, Foram queimados muitos foguetes e levantados alguns vivas à classe operária de Tavarede, ao Grupo Musical, etc.”.
Entretanto, no dia 10 de Março, o Grupo foi à Figueira, à sede da Figueirense, colaborar num espectáculo de benefício a favor de um operário impossibilitado de trabalhar. A notícia não esclarece se foi colaboração teatral ou musical. O que há registo é que, no dia de S. João de 1912, o Grupo se deslocou a Quiaios, onde, no pavilhão do “Recreio”, executou um excelente programa musical, com a direcção do seu responsável, João da Simôa, e que muito agradou.
E, 1912, embora independente da colectividade mas a ela bastante chegado, havia sido organizado, melhor dizendo, reorganizado, o rancho Flor da Mocidade, que, tal como o outro rancho local, o “Alegria”, alcançaram bastantes triunfos nas suas exibições, especialmente na Figueira, onde este último chegou a ganhar o primeiro prémio doas ranchos do primeiro de Maio. O Grupo colaborava, então, com a parte musical, tendo, no início de Agosto, acompanhado o rancho numa sua deslocação a Caceira de Baixo.
E chegámos à data da celebração do primeiro aniversário. Já referi anteriormente que em Assembleia Geral (a primeira?) haviam sido aprovadas as contas do exercício de 1911/12 e eleitos os novos corpos gerentes. Aqui fica registada a sua composição:
Assembleia Geral
Presidente – José Maria de Almeida Cruz
Secretários – Aníbal Cruz e Joaquim Severino dos Reis
Direcção
Presidente – António Medina
Secretários – António Marques Lontro e Carlos Artur de Almeida Cruz
Tesoureiro – Manuel Vigário
Conselho Fiscal
José Maria Cordeiro, Faustino Ferreira e António Nossa.
A imprensa local noticiou assim o acontecimento:
“Na madrugada e na noite de sabbado passado (17 de Agosto) queimaram-se immensos foguetes em commemoração do 1º. aniversario da fundação do Grupo Musical d’esta freguezia, e realizou-se no seu elegante theatro uma sympathica festa dedicada aos seus associados e familias.
Foi dada posse á nova direcção, e Annibal Cruz, n’um breve discurso, apoiou a florescente collectividade local, incitando a nova Direcção a trabalhar com o mesmo afinco como o fez a transacta, para seu engrandecimento e da nossa terra. Dirige algumas palavras de felicitação ao regente do Grupo, pela maneira incansavel como tem leccionado aos seus socios a sublime arte de Mozart e entrega-lhe um objecto de prata offerecido pela sympathica sociedade, que João da Simôa agradeceu commovido. Levantaram-se no final enthusiasticos vivas ao Grupo Musical de Tavarede, que foi unanimemente correspondidos.
Executa-se em seguida uma valsa e sóbe o panno para Mário José recitar a excelente poesia patriotica Vinga pae!, que foi bastante applaudida.
Com graça recita depois o monologo Eu cá não me ralo... o sr. Antonio Dias Carvalho, de Quiaios. e o sr. Americo Alvitro d’Abreu, habil amador portuense, cantou a engraçada cançoneta Rebenta a Bexiga, que foi bisada. Não me amava, hilariante monologo que Izidoro Loureiro disse com agrado.
O nosso patricio e jovem amador Antonio Medina Junior recitou tambem uma poesia dedicada ás damas de Tavarede, que a assistencia applaudiu bastante.
Fechou o sarau dramatico a comedia em um acto O cometa e o fim do mundo, desempenhada por dois socios do Grupo.
Ás 24 horas e meia principia o baile que terminou ás 7 horas de domingo”.
Fotos: 1 - António Medina (fundador); 2 - Joaquim dos Reis (Fundador); 3 - Rancho da Alegria (1912)
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